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porque v. ex.ª, sr. presidente, sabe que a impunidade de um crime faz com que se repitam scenas iguaes a estas (apoiados).

Cortemos o mal pela raiz, que já apparece em larga escala (apoiados).

Por consequencia, quando o sr. ministro do reino estiver presente hei de pedir a palavra para exigir de s. ex.ª alguma explicação que socegue o paiz em geral, e cada um de nós em particular.

(Varios srs. deputados pediram a palavra.)

Peço á camara que acredite que eu tenho cartas particulares que contam o facto tal qual vem narrado nos jornaes, que ha pouco li á camara; dos quaes, se um póde ser suspeito para alguns, o outro creio que o não póde ser para esses mesmos.

Espero pois que a camara permitta que v. ex.ª me conceda a palavra quando estiver presente o sr. ministro do reino. Agora termino porque não tenho quem me responda, e porque, sr. presidente, desgraçadissimamente, factos destes, attentados similhantes contra a segurança individual de um cidadão respeitavel, e que o não fosse, no pacifico goso dos seus direitos politicos, não se commentam, apresentam-se ao paiz, mostram se ao governo e exige-se d'este o cumprimento das leis (apoiados), o rigoroso cumprimento d'ellas.

O sr. Levy: — Eu tinha pedido a palavra para um objecto differente; mas, antes d'isso, permitta-me a camara que eu me explique tambem sobre o incidente suscitado pelo nosso estimavel collega, o nobre visconde de Pindella, sobre o qual não posso guardar silencio.

Estou bem convencido que, se os factos se passaram realmente como se diz, o governo não póde deixar de proceder, sustentando a acção da justiça, e fazendo recaír sobre os culpados toda a severidade das leis (apoiados).

Quando se trata de ataques aos direitos individuaes, e com elles á ordem publica e á sociedade, não ha (e mal de nós se houvesse) questões de partido (apoiados); n'estes casos todos formâmos um só homem para pugnarmos pelas garantias do cidadão. Felizmente todos os dias vão apparecendo provas de que n'estas questões não ha partido; e digo que é uma felicidade, porque assim mostra a sociedade que preza e acata os principios de justiça.

O imperador Napoleão III, fazendo n'um dos seus escriptos a comparação entre o espirito publico da França e da Inglaterra, diz com rasão que, na Inglaterra, quando se trata de offensa ou ataque ao direito individual, não ha questões de partidos, calam-se todas as paixões, e formam todos um só homem para defender o cidadão offendido. Em França já não é assim, e ainda muitas vezes a paixão partidaria suffoca o clamor da justiça.

Em Portugal vejo que vamos progredindo n'este ponto, e que muito nos approximâmos do espirito publico de Inglaterra, tendendo, sempre que apparece um facto attentatorio dos direitos individuaes, a exigir dos poderes publicos a reparação ao offendido, a satisfação á sociedade.

Se o facto, repito, realmente se passou como se indicou, eu sou o primeiro a fazer justiça ao governo, e creio que elle, informado devidamente, não póde ficar silencioso; se o ficára, eu, apesar de ser o ultimo dos meus collegas, seria o primeiro a exigir-lhe toda a responsabilidade, porque sentado n'esta cadeira sou representante do paiz, e não de interesses ou paixões que não podem ter accesso n'esta casa.

Quando ha pouco o sr. João Antonio de Sousa apresentou um projecto para a reforma da lei que rege o recrutamento maritimo, pedi a palavra para declarar que estou de accordo com muitas das idéas apresentadas pelo nobre deputado.

Todos nós sabemos os defeitos que tem a lei do recrutamento maritimo, ou antes o decreto com força de lei de 22 de outubro de 1851. O mais saliente, omittindo outros, é obrigar ao serviço militar da armada os maritimos desde a idade de quatorze até aos quarenta annos!

Isto é intoleravel, e o legislador não póde querer de fórma alguma que o serviço prestado á patria seja mais oneroso na armada do que no exercito. Este assumpto tem provocado a attenção, não só dos membros d'esta casa, mas tambem do governo, e o que succede entre nós dá-se igualmente n'outros paizes; em França, por exemplo, está fazendo o objecto de um exame em uma commissão especial, e entre nós o sr. ministro da marinha tem-se occupado d'este importante assumpto, e é de crer que ainda n'esta sessão apresente á camara um projecto de reforma; sómente notarei que o systema que o illustre deputado nos propõe, applicando ao recrutamento maritimo a remissão seguida no exercito, é objecto muito grave. Esse systema que tem muitos inconvenientes, e que fomos copiar á lei franceza, seja dito de passagem não é novo, é velhissimo, e já era conhecido e applicado entre os romanos com o nome de adaeratio, fazendo objecto de algumas constituições do codigo theodosiano.

Já que toquei em assumptos de marinha aproveito tambem a occasião para lembrar á commissão de legislação a necessidade de dar andamento a dois projectos de grande importancia, que são o codigo penal da armada, e o respectivo codigo de processo. Fallo na reforma do codigo penal commum, e eu sou o primeiro a pugnar por ella; mas a do codigo penal da armada é muitissimo mais urgente, porque para ella temos uma legislação quasi draconiana, ao passo que para os crimes communs temos um codigo penal, defeituoso é verdade, mas temos um codigo.

Chamo a attenção da commissão sobre estes dois projectos e tambem sobre o codigo disciplinar da marinha mercante, porque me parece que está affecto á mesma commissão. E tambem uma das grandes necessidades da nossa marinha mercante, a qual está, por assim dizer, sem disciplina, porque não estão reguladas as attribuições disciplinares dos commandantes dos navios com relação ás respectivas tripulações, o que dá logar a muitas vezes os capitães exercerem uma jurisdicção e auctoridade que não têem ou não devem ter, e a estarem os tribunaes occupados com questões entre elles e individuos das suas tripulações. Para evitar isto, é que o governo apresentou na sessão passada um codigo disciplinar de marinha mercante, que foi approvado pela commissão de marinha; é assumpto este de grande momento, que tem provocado a attenção dos homens publicos e dos governos das differentes nações, e que foi na França julgado tão importante que deu um nome na marinha ao contra-almirante Ducos.

Já no outro dia solicitei da illustre commissão de legislação que com a possivel urgencia apresentasse o seu parecer sobre o codigo penal, cuja opportunidade a commissão declarou reconhecer; espero pois que não se recusará a apresentar quanto antes o seu parecer sobre um projecto cuja opportunidade é a primeira á confessar. Sobre este assumpto, comquanto não esteja presente nenhum dos membros do gabinete, como o que tenho a dizer se ha de ler no extracto das sessões da folha official, aproveito a occasião para fazer sensivel ao governo, e especialmente ao sr. ministro da justiça, a necessidade de se pronunciar sobre uma questão importante, em que todos estamos de accordo, como é a da reforma penal; e prometto solemnemente insistir sobre isto todos os dias, sem largar mão do assumpto.

Todos sabemos que hoje não ha penalidade entre nós; segundo a escala penal temos quatro penas: a de morte, que está abolida de facto, e que em breve o será de direito; a de trabalhos publicos, que tambem está abolida de facto, porque o poder moderador tem tido o bom senso de commutar essa pena, substituindo-a pela de prisão ou degredo. Quer dizer, as duas maiores penas não o são, porque não satisfazem aos fins da penalidade.

Não temos pena de prisão, porque a prisão entre nós não é pena; é unicamente uma escola de immoralidade de que é um specimen o Limoeiro! (Apoiados.) E peço licença para fazer notar á camara um episodio do nosso estado de penalidade. Não temos as prisões para os adultos, mas para os menores ainda isso é peior, porque esses estão mettidos no Aljube, aonde ainda não ha muito o juiz da cadeia era um condemnado á morte. Ora, este estado não póde deixar de provocar seriamente a attenção do governo e da camara (apoiados).

Mas, se tal é a pena de prisão, ou antes senão é pena, a de degredo tambem não é, porque consiste unicamente na transportação para alguma das nossas colonias, e, se o individuo que assim vae transportado para lá soffre uma pena, então tambem a soffrem os magistrados e os mais funccionarios, que estão n'essas mesmas colonias sem serem criminosos. Demais dá se outra circumstancia, e é que os individuos que enviamos para as colonias, a titulo de soffrerem uma pena, são aquelles a quem muitas vezes lá se entrega, como por escarneo, a segurança publica! E não ha muito se deu o caso de haver uma revolta na ilha de S. Thomé intentada por esses desgraçados.

Alem d'isso acrescem os vicios das idéas que ainda vogam entre nós sobre o direito penal. Considera-se como mais grave o degredo para a Africa oriental, e como menos grave o degredo para a Africa occidental. Ora as informações de todos os governadores são concordes n'um ponto, para o qual peço a attenção da camara, e é que os degradados para a Africa oriental, isto é, os considerados como criminosos mais perigosos, são aquelles a respeito dos quaes não ha um só exemplo de insubordinação ou revolta; ao passo que os que a sociedade julga menos criminosos e a que impõe uma pena inferior, a de degredo para a Africa occidental, são os mais turbulentos e os mais perigosos á segurança publica.

Portanto o erro não está na pena, mas no vicio do codigo e das theorias que até hoje têem dominado a penalidade. Em geral, entre gente rustica, nada mais frequente do que commetter um homicidio, que a maior parte das vezes, salvo rarissimas excepções, não denota a perversidade do coração do individuo; mas o jury menos illustrado julga este facto filho da premeditação, e portanto impõe-se ao crime a pena do codigo, que é a pena de morte, e o poder moderador substitue-a pela de degredo para a costa oriental da Africa; ao passo que os ladrões e outros que são julgados por pequenos delictos, mas que estão realmente depravados n'aquellas especialidades do crime, são punidos com uma pena menor.

É por isso que eu faço estas ligeiras considerações, sem querer cansar mais a attenção da camara, para tornar saliente a necessidade de se alterar o systema de penalidade, o que é de alta importancia, não só para a segurança social, senão tambem para a moralidade publica. Para chegarmos a isto é necessario o systema penitenciario, qualquer que seja a theoria adoptada; mas para ser realisado o systema penitenciario é mister que o governo se pronuncie n'esta questão, que diga claramente o systema que prefere, e que venha ás côrtes pedir os meios necessarios para construir as prisões, porque nós não as podemos votar, sem votarmos com ellas os meios necessarios para as construir.

Peço pois ao governo que venha immediatamente ao poder legislativo dizer tambem—é uma necessidade publica o acabar com o systema de penalidade actual, é indispensavel crearmos novos estabelecimentos penaes, mas para crear é necessario que o parlamento vote os meios precisos. Dentro em pouco a sessão estará muito adiantada; e é preciso que nós não fechemos esta sessão sem fazermos alguma cousa que illustre o parlamento ainda mais do que elle já se tem illustrado até agora.

Não creio nem posso acreditar que este negocio seja, descurado pelo governo, e que não lhe mereça as honras da attenção. N'isto não faço politica, mas não posso deixar, tratando da reforma do systema penitenciario, de citar os nomes do meu nobre amigo e collega, o sr. Mártens Ferrão, e do sr. Moraes Carvalho que, quando ministros da justiça, aqui apresentaram na camara projectos para a reforma penitenciaria, tomando a nobre iniciativa d'este assumpto, e pedindo os meios necessarios para realisar a reforma que julgavam essencial ao bem estar da sociedade.

Espero ouvir o sr. ministro da justiça, e prometto-lhe não largar mão d'este negocio. A reforma da penalidade já não é assumpto que occupe unicamente os criminalistas; o povo já a comprehende; e quando Victor Hugo não tivesse outros titulos de gloria, bastaria o seu ultimo livro para d'ella se tornar credor, fazendo sentir ás massas os vicios da penalidade em paginas repassadas de verdade, de sentimento e de elevada philosophia.

O sr. Quaresma: — Eu tinha ha dias annunciado uma interpellação ao sr. ministro do reino de então, a respeito dos factos passados na Covilhã, ou antes sobre a falta de segurança publica n'aquella villa. Como deixou de ser ministro do reino o sr. Braamcamp, e ha outro sr. ministro do reino, eu quero tambem chamar a attenção de s. ex.ª a respeito d'estes factos, que têem grande analogia com os que foram annunciados pelo sr. visconde de Pindella.

De mais a mais para haver ainda maior analogia deram se tambem dois tiros, que foram disparados sobre um collega nosso, que é juiz de direito da comarca da Covilhã, o sr. José Maria da Costa e Silva, collega que está presente, e um dos mais respeitaveis e considerados d'esta camara. Estes factos são gravissimos (apoiados).

Não ficou ali a vingança eleitoral, porque é necessario que v. ex.ª e a camara notem que depois das eleições da camara é que se praticaram estes factos altamente attentatorios da segurança publica; não ficou ali, foi ainda assassinado um regedor, que se dizia trabalhar nas eleições a favor do governo (apoiados). Puna-se o crime aonde elle estiver (apoiados). Infelizmente o facto a que me referi tem mais alguma gravidade do que o apontado pelo illustre deputado, o sr. visconde de Pindella. Ali houve tentativa de assassinato, aqui tambem a houve, mas houve assassinato effectivamente. Portanto estes factos são gravissimos. Contam-se factos que não quero referir á camara, porque os guardo para quando se verificar a interpellação. Somente direi agora que homens a quem está confiado o sacerdocio íam implorar votos ameaçando com a justiça divina; dizendo: «Você se não vota n'aquella lista vae para as profundas do inferno» (riso). Parece-me que este caso não é digno de riso (apoiados), que não merece riso de nenhuma assembléa, quanto mais da primeira assembléa do paiz (apoiados). Este facto é de muita gravidade (apoiados). Vá a responsabilidade a quem toca (apoiados). Em factos de tal ordem, como disse o sr. Levy, não ha opposição nem governo; e é necessario punir-se o crime aonde elle estiver, porque sem isso não póde haver sociedade (apoiados).

Chamo a attenção dos poderes publicos sobre factos d'esta ordem, que realmente envergonham todos os cidadãos portuguezes (apoiados); porque isto prova que em logar do paiz caminhar para a civilisação, que retrogradâmos cem annos no caminho do progresso. E preciso pois que a auctoridade seja inexoravel no cumprimento do seu dever, seja o criminoso de que lado for; mas é necessario não só que o sr. ministro do reino, mas tambem o da justiça, que vejo presente, olhem para estes factos muito seriamente, e meditem bem no estado em que se acha a Covilhã, que aliás é representada por s. ex.ª ou que s. ex.ª aliás representa.

Portanto peço a v. ex.ª que officie de novo ao actual sr. ministro do reino, annunciando-lhe que quero verificar infallivelmente esta interpellação; porque, repito, os factos aqui foram mais graves ainda do que aquelle a que se referiu o jornal em relação á provincia do Minho (muitos apoiados). Aqui, alem de tentativa de assassinato n'um individuo, houve effectivamente assassinato n'outro; e é necessario que o governo vele pela segurança do cidadão, seja aonde for e de que lado for.

O sr. Ministro da Justiça (Gaspar Pereira): — Entrei n'este momento, e pude apenas ouvir que o nobre deputado, o sr. Quaresma, se referiu a factos que tiveram logar por occasião das eleições da camara municipal na villa da Covilhã. Referia-se ao assassinato de um regedor, que me parece ter tido logar no Sobral de Cazegas. É um acontecimento fatal que extremamente deploro. Não tenho informações officiaes a esse respeito. Estou intimamente convencido de que as auctoridades hão de ter instaurado o competente processo, e que ha de seguir os seus termos regulares. O unico motivo por que me levanto, é para dizer que o governo tem muito a peito o velar pela segurança publica de qualquer modo (apoiados), empregando para isso os meios de que póde dispor; e desde já previno a v. ex.ª e á camara, de que hei de dar todos os esclarecimentos que estiverem ao meu alcance, quando se verificar a interpellação dirigida ao meu collega do reino.

Como deputado que sou pelo circulo da Covilhã, hei de tomar parte n'um assumpto que diz respeito á minha patria e ao circulo que represento. Por agora, tenho a certeza de que os processos que se tiverem instaurado hão de progredir nos termos regulares e da lei.

O sr. Camara Leme (sobre a ordem): — Mando para a mesa o parecer da commissão de guerra a respeito do projecto que veiu da camara dos dignos pares sobre certas vantagens concedidas aos sargentos da junta do Porto.

O sr. Sant'Anna e Vasconcellos (para um requerimento): — Uso primeiro da palavra que v. ex.ª me concedeu para verificar o meu requerimento, para que, logo que se entre na ordem do dia, V. ex.ª queira dar para discussão o parecer que acaba de ser mandado para a mesa (apoiados). É um parecer sobre um projecto que já aqui foi discutido