O texto apresentado é obtido de forma automática, não levando em conta elementos gráficos e podendo conter erros. Se encontrar algum erro, por favor informe os serviços através da página de contactos.
Não foi possivel carregar a página pretendida. Reportar Erro

242 DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS

Nos discursos do sr. Fontes, proferidos no anno passado, outra affirmação insistente encontrei, que o meu espirito não sabe explicar. E aquella em que s. exa. accentuava que uma lei da importancia daquella em que se trata de remodelar as instituições constituciouaes do paiz, devia ser feita com o concurso de todos os partidos. Dizia s. exa. num discurso que tenho aqui presente: «Sempre estive convencido de que uma lei desta importancia (a das reformas politicas), devia ser feita com o concurso de todos os partidos, não podendo um só ficar de fora, sem que I isso produzisse terríveis perturbações, ou, como dizia um escriptor antigo, sem que a nau estivesse ameaçada de tempestades, e sem que o terreno tremesse e fugisse debaixo dos pés».

Ora o sr. Braamcamp declarou guerra ao governo, todo o partido progressista está nisto de accordo, e não é segredo para ninguém que os ministros que o sr. Dias Ferreira deu ao sr. Fontes não representam hoje no ministerio o pensamento político do seu antigo chefe. Mas o sr. Fontes não vê a nau ameaçada de tempestade, não tente o terreno fugir-lhe debaixo dos pés, e continua a querer levar a cabo as suas reformas politicas! Não comprehendo, não posso comprehender mais este reviramento nas opiniões do sr. presidente do conselho. (Apoiados.)

E, visto que fallo dos dois ministros que o sr. Dias Ferreira deu ao sr. Fontes, peço licença para dizer duas palavras de explicação pessoal.

Não vejo, sem profunda tristeza, sentado nos bancos do poder, ao lado do sr. Fontes, o meu antigo mestre e amigo, o sr. Pinheiro Chagas. O sr. Pinheiro Chagas ó, incontestavelmente, uma das glorias das letras portuguezas e da tribuna parlamentar. (Apoiados.} Eu tenho pelo sr. Pinheiro Chagas profunda estima e admiração, porque não me esqueço hoje, nem me esquecerei nunca, de que foi s. exa. quem protegeu e amparou com o seu nome prestigioso o meu modesto noviciado litterario. S. exa. tem valia para muito mais, e eu tenho, repito, a maior pena de o ver sentado n'aquellas cadeiras ao lado do sr. Fontes: e declaro que será uma das maiores amarguras da minha vida publica, se os meus deveres partidários me obrigarem alguma vez a combater o meu antigo mestre.

Outro ministro deu o sr. Dias Ferreira ao sr. presidente do conselho. E o sr. A. A. de Aguiar, ministro das obras publicas. Eu não me referiria ao sr. Aguiar se a sua individualidade política não tivesse assumido ultimamente uma importancia excepcional, em virtude de varias propostas que estão sujeitas ao exame desta assembléa.

Conheço muito pouco o sr. Aguiar, respeito os seus talentos incontestaveis, mas devo confessar que temo um pouco os seus projectos. Acho-os demasiado grandiosos. (Riso.)

Não quero definir com palavras minhas o que representa o sr. Antonio Augusto de Aguiar no gabinete; mas, sempre com a minha mania de ler os annaes parlamentares, encontrei uma sessão de 8 de fevereiro do 1882, da camara dos pares, onde vem um discurso do sr. Aguiar, em que s. exa. com uma intuição, que poderei qualificar de prophetica, dizia o seguinte:

«Eu sou, Br. presidente, e nada ha tão verdadeiro nem tão simples, unicamente um homem bem intencionado. Jamais poderia dar conselhos ao sr. Fontes ou substituil-o ainda mesmo que elle quizesse e podesse fazel-o, nem sequer acompanhal-o de longe na sua política, a não ser como uma dessas estrellas, cujo fulgor os olhos não chegam a perceber no firmamento em que fosse s. exa. o astro mais radiante e de maior brilho.»

Por consequência, Br. presidente, já nós sabemos o que o sr. Aguiar representa no poder ao lado do sr. Fontes. É apenas uma estrella bem intencionada. (Riso.) Foi o proprio sr. Antonio Augusto de Aguiar que o disse na camara dos pares.

Assim nas vesperas das reformas politicas achâmo-nos no meio de um descontentamento geral em todo o paiz, da desaggregação e guerra aberta da parte de todos os partidos políticos, e nestas circumstancias o sr. presidente do conselho não vê que a nau esteja ameaçada de tempestade, nem sente que o terreno lhe fuja debaixo dos pés, e prosegue impávido no intuito de juntar aos seus grandes feitos as glorias de reformador da constituição do paiz.

É certo que no firmamento do poder ternos o sr. Fontes, orno astro, e o sr. Aguiar, como estrella. Mas francamente o sr. Fontes parece-me astro de mau agouro para o paiz, e o sr. Aguiar uma estrella cujo brilho vae custar demasiado caro á nação. (Riso.)

Demais, a par desta crise política temos um dejicit do 7.000:000$000 réis, os encargos da divida publica excedendo 50 por cento da nossa receita, os fundos portuguezes baixando no mercado de Londres a uma cotação a que não tinham baixado ha muitos annos.

Aqui têem em largos traços o quadro dos resultados famosos de quinze, annos de governo discricionário do sr. Fontes, que prosegue sem hesitação neste caminho funesto, sem sentir a nau ameaçada de tempestade nem o terreno a tremer c, a fugir-lhe debaixo dos pés. (Apoiados.)

Eu não faço estas referencias por animadversão pessoal; a pessoa do sr. Fontes merece-me o maior respeito e consideração. Nem tenho tempo ainda de ter contrahido inimisades na vida política, porque cheguei aqui hontem; mas hei de empregar todos os esforços para as não alcançar, porque me hei de afastar dos debates irritantes e das questões de personalidades, e hei de usar dos princípios de cortezia que não são incompatíveis com a nobre e viril intransigência do ancien régimt.

Mas o sr. Fontes é um symbolo, uma synthese da situação política em que nos encontramos, e essa situação declaro que a reputo gravíssima e perigosa. (Apoiados.) O sr. Fontes governa omnipotentemente este paiz ha um larguíssimo período, e por isso cabem-lhe inteiras e precipuas as responsabilidades da crise financeira que nos assoberba e da crise política em que nos debatemos. Quem quer todo o poder, não póde declinar toda a responsabilidade.

E o sr. Fontes manda tudo o todos neste paiz! Mas o que me causa profunda rnagua é que, tendo usado de um poder tão discricionário e possuindo tão incontestáveis talentos pessoaes, o sr. presidente do conselho não possa do futuro obter dos historiadores imparciaes, como resumo da apreciação da sua/influencia política neste paiz, senão uma phrase analoga aquella com que um historiador inglez concluo o seu juízo critico sobre Walpole:

«O verdadeiro homem d'estado não é aquelle que occupa o poder e que o occupa por muito tempo; é aquelle que tem uma politica, e que a sabe seguir com firmeza e dignidade, ainda com sacrifício do poder, até com sacrifício da popularidade. Walpole não teve esta coragem, e por isso ha de ter sempre um logar secundario entre os homens públicos do seu paiz.»

Tenho dito.

Vozes: - Muito bem, muito bem.

(O orador foi cumprimentado por muitos deputados de ambos os lados da camara, e por bastantes pares do reino, que se achavam na sala.)

Leu-se na mesa a seguinte

Moção de ordem

A camara, lastimando o procedimento do governo durante o interregno parlamentar, continua na ordem do dia. = Carlos Lobo d'Avila.

Foi admittida.

O sr. Presidente: - Tem a palavra o sr. Arroyo.

Não quiz ser desagradável ao sr. deputado Lobo d'Avila, convidando-o a subir â tribuna, igualmente não desejo ser desagradável ao sr. deputado Arroyo, fazendo-lho o mes-