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SESSÃO DE 24 DE JANEIRO DE 1885 245

culminante e principal, a reforma da camara alta. (Apoiados.)
Que fez o governo?

Adiou a reunião das cortes revisionaes para 15 de dezembro próximo passado, habilitando os membros do parlamento portuguez a utilisar-se de uma lição proveitosíssima, porque parte de um paiz onde existem publicistas illustres e preclaros, porque n'ella collaboraram homens de sciencia e parlamentares distinctissimos, que a França se ufana de possuir.

Existia algum compromisso do gabinete, em sentido opposto ao adiamento, com qualquer das parcialidades opposicionistas da camara? Não existia.

Declarou unicamente s. exa. o sr. presidente do conselho na anterior sessão que o gabinete faria tudo quanto podesse para a revisão constitucional se levar a effeito dentro do anno findo. Não passa disto a declaração feita pelo sr. Fontes Pereira de Mello. Depois de encerrada a ultima sessão parlamentar, é que motivos imperiosos e de grande peso, levantados em volta do governo, de tal modo lhe roubaram o tempo e a attenção que o impossibilitaram de realisar o desejo por elle francamente manifestado na outra casa do parlamento.

O que ha, pois, de censurável no procedimento do ministerio, procedimento motivado por circumstancias imperiosas que não podia prever, por causas occasionaes que não podia adivinhar? (Apoiados.)

Tal compromisso não existia, porque nenhum gabinete o acceitaria: teria de se basear no suíficiente desafogo da administração publica, que o governo não podia assegurar, e no conhecimento antecipado da forma por que correriam os trabalhos parlamentares, a respeito do que o governo não podia nem devia tomar responsabilidade alguma. (Apoiados.)

O gabinete, adiando as actua es cortes revisionaes, deu um passo motivado por circumstancias de politica externa e interna. (Apoiados.)

A declaração feita pelo governo na sessão anterior não o impedia de realisar o adiamento das actuaes cortes, adiamento justificado plenamente, mais uma vez o dizemos, pelos motivos ponderosissimos que se agglomeraram em volta dos homens que estão collocados na mais alta esphera da governação do estado.

Quanto aos actos de dictadura que comprehender as bases para a reforma do exercito, a reforma do quadro dos officiaes de marinha militar, e as medidas adoptadas contra a invasão do cholera-morbus) direi o que considero necessario para justificar, nessa parte, a moção por mim apresentada.

Como jurisconsulto que sou, embora no começo do noviciado, repugnam-me, em these e sob o domínio do systema constitucional, os actos de dictadura.

A dictadura não é senão a exorbitancia do poder executivo, por forma a invadir as attribuições do poder legislativo.

Ora, o systema constitucional tem, como base fundamental, o principio da divisão dos poderes.

A dictadura, sob o domínio deste systema, não se justifica antecipadamente, pois é incompatível com elle; mas, em hypothese, como facto consummado, legitima-se por vezes perante os motivos que a causaram e pela sua propria natureza.

A face das circumstancias, em que se achava o actual governo, é que cumpre avaliar se os actos de dictadura decretados em maio de 1884 foram convenientes e motivados, e se attenderam a necessidades publicas.

Antes de tudo, observarei que, se os actos dictatoriaes de maio de 1884 acarretam a mesma responsabilidade legal para o governo que qualquer outro acto de dictadura, não collocam o governo em igual responsabilidade, sob o ponto de vista da moralidade e do direito publico constitucional. Sob estes pontos de vista, a responsabilidade do gabinete é muito menor, é quasi nulla.

Os actos, decretados dictatorialmente em maio de 1884, tinham a esse tempo a quasi inteira consagração do parlamento, pois haviam sido approvados na camara dos deputados e haviam alcançado parecer favoravel das commissões respectivas da camara dos pares.

Não se trata de uma dictadura contra a lei vigente, mas simplesmente de dar força legislativa a medidas já favoravelmente informadas pelas competentissimas commissões da segunda instancia do parlamento, depois de sanccionadas pelo voto da camara dos deputados.

Não se trata de actos que tivessem influencia grave na politica geral, de actos que podessem produzir alteração na situação politíca da diversos partidos políticos, ou perturbar a vida económica ou especulativa do povo portuguez; trata-se de realisar reformas technicas, de reformar serviços cspeciaes, em conformidade com as conveniências publicas, e tendo-as exclusivamente em vista.

Relativamente á reforma do quadro dos officiaes de marinha, cumpre attentar na necessidade urgente de termos officialidade suffieiente para os novos navios de guerra da marinha portugueza, e de attender às necessidades do serviço, que esses navios devera satisfazer, nas diversas estações das províncias ultramarinas.

Por ultimo, lembraremos que os referidos actos dictatoriaes tiveram por fim attender aos interesses de uma das mais importantes classes do paiz, que não podiam ser impunemente postergados, o que já a camara dos deputados e as commissões da camara dos pares haviam previamente reconhecido, fixando o praso de um anno como limite máximo, dentro do qual o governo devia reformar o exercito, em conformidade com as bases approvadas pela camara popular e pelas referidas commissões da camara dos pares.

Que significa, portanto, o medo exaggerado de um abysmo para onde caminhamos, e a que nos conduz o procedimento do governo? Que rasões ha para tão grande temor, que os oradores opposicionistas teem manifestado? Provém elle de o governo haver decretado dictatorialmente medidas úteis, necessárias ao bem publico?

Permittam-me os homens sectarios das politicas extremas, jacobinos ou ultramontanos, demagogos ou absolutistas, que eu, embora novo, lhes de um conselho sincero e prudente.

A cholera e a dar, quando extremas, perturbam o homem, allucinam-no, fazem-lhe perder a justa medida das cousas o das acções.

Assim acontece tambem com as expressões supremas da colera e da dor das sociedades, com as revoluções sociaes.

Os povos, inteiramente soltos das peias que o movimento emancipador conseguiu quebrar, perdem a rasão por forma que, às vezes, no mesmo logar em que supplicam o poder anteriormente constituído, sacrificam homens dirigentes do movimento revolucionário! O despotismo de um só e o despotismo da multidão caem sob o mesmo golpe. O machado, que decepa a cabeça do déspota, decepa muitas vezes a cabeça do demagogo. (Muitos apoiados. - Vozes: - Muito bem.)

Danton e Robespierre acompanham no cadafalso a Luiz XVI e a Maria Antonietta. A lamina da guilhotina é a representação material e symbolica do momento histórico em que os programmas exagerados, que a revolução atacou ou preconisou, são amputados ou destruídos, como syntheses extremas de eystemas políticos contrários, de modo a transformarem-se no movimento moderado da politica evolucionista! (Apoiados.) Tomem cautela os intransigentes e radicaeá na maneira como redigem os seus programmas e na forma por que pretendem insuflar e activar o movimento revolucionário da nação portugueza; nada de zelo excessivo, porquanto póde acontecer que a onda, no momento em que affogue o poder derrubado, affogue igual-