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SESSÃO DE 25 DE JANEIRO DE 1886 181

Sempre a mesma accusação, que era um protesto! Sempre a mesma queixa, que era um pedido! E o governo desattende pertinazmente o pedido e o protesto, e conserva o governador civil! De quem é, pois, a culpa de se ter aggravado o conflicto?! É do governo, e só do governo. (Muitos apoiados.)
Todos estes documentos, que acabo de ler á, camara, e ainda outros, encontram-se em o n.º 2 do jornal Vinte e oito de novembro, que é o órgão official da commissão de vigilancia e resistencia da cidade de Guimarães.
Isto é muito. Pois ainda há mais do que isso.
Vou referir-me a documentos, que não vi, e coutar factos, que não presenceei. Por isso, se incorrer em alguma inexactidão, como se acham presentes alguns collegas nossos, que devem ter intervindo n'esses factos, elles faraó o favor de emendar, porque eu antecipadamente acceito e lhes agradeço a rectificação.
Reuniram-se em Braga, para a eleição de pares, os srs. deputados que, nos termos da lei, são membros do respectivo collegio districtal. Antes da eleição dirigiram um telegramma ao chefe do governo, ou, para fallar com mais correcção, ao chefe do partido representado no governo, e pediram-lhe instrucções para a eleição, por não ter o partido em Braga um representante official condigno a quem podessem dirigir-se. Que fez o governo?! Fingiu que não percebeu a ultima parte do telegramma, e mandou as instrucções pedidas na primeira parte d'elle.
Faz-se a eleição. Os deputados communicam pelo telegrapho ao chefe do partido que as suas indicações haviam sido seguidas, e pedem-lhe collectivamente a demissão do governador civil. Que faz o governo? Conserva o governador civil! (Apoiados.)
A camara municipal de Braga, ajunta geral do districto de Braga, a camara municipal de Guimarães e as corporações desta cidade, os deputados pelos circules d'aquelle districto pedem, unanimemente, a demissão do governador civil, que o nosso presado collega, o sr. Franco Castello Branco, declarou ser detestado em todo o districto de Braga. E o governo, surdo a todos estes clamores, como fora surdo aos protestos do próprio decoro, conserva o governador civil detestado e detestavel! (Muitos apoiados.)
Isto é espantoso, é extraordinario, e só é crivel por ser a verdade provada! (Muitos apoiados.)
Eu desejo ser justo. E investigando as causas d'estes factos, que representam uma verdadeira aberração na ordem moral e política, inclino-me a crer que o sr. presidente do conselho obedeceu unicamente a um exagero, em todo o caso censuravel, de generosidade e de benevolencia um pouco misericordiosa.
O sr. presidente do conselho é sempre cortez, o que aliás constituo um dever; e cavalheiroso, o que já e uma qualidade de distincção; e é tambem generoso e largo nas suas complacencias, o que significa uma gentileza. Mas estes predicados, levados ao excesso, produzem na politica resultados deploraveis, e quasi sempre mais funestos, que os provenientes dos defeitos oppostos. O sr. presidente do conselho, para ser mais do paiz, devia ser menos dos seus amigos, ou que como taes se inculcam.
Não se calcula a nefasta influencia d'esta formula os nossos amigos, e o quanto ella tem concorrido para a desorganisação dos serviços públicos, para a ruina das finanças, para a desordem na administração, e para os desacertos de toda a especie, de que enferma a politica portugueza!
Por causa dos nossos amigos collocam se dobradiças nas secretarias e repartições, promulgam-se organisações luxuosas e absurdas, e decretam-se longas listas de aposentações e reformas escandalosas.
Por causa dos nossos amigos tira-se o pão a uns pobres diabos desamparados, perseguem-se empregados honrados, e investem-se no exercicio de melindrosas funcções individuos foragidos á justiça criminal.
Por causa dos nossos amigos põem-se os adversarios fóra da lei, sophisma-se-lhes e rouba-se-lhes o exercicio dos direitos politicos e, o que é peior, não raro se lhes atropellam e usurpam os mais sagrados direitos civis.
Por causa dos nossos amigos construem-se caminhos de ferro com directrizes absurdas, como são quasi todos que ahi temos; traçam-se estradas nas mesmas condições, e emprehendem-se obras loucamente despendiosas, que não podem compensar nunca a perturbação que causam, pelos encargos que custam, nas finanças do estado, e no movimento economico do paiz.
Por causa dos nossos amigos fazem-se violências como as que o telegrapho nos communica de Valle Passos...
O sr. E. Coelho: - Peço a palavra para um negocio urgente antes de fechar a sessão.
O Orador: - Annulla-se uma eleição regularmente feita, e nas vesperas de nova eleição faz-se uma divisão arbitraria das assembléas eleitoraes; deixam-se em liberdade os desordeiros e sem protecção os cidadãos pacificos, e depois vêem os telegrammas informar que correu o sangue e que lá ficaram uma ou mais victimas estendidas, tudo para consolo, gloria, e despojos opimos da victoria dos nossos amigos. (Vozes: - Muito bem.)
E note v. exa. que eu com isto não me estou referindo sómente á situação dominante; estou fazendo a synthese da politica geral portugueza, abrangendo tudo e todos. Podem os quinhões de responsabilidade não ser iguaes, e não o são por certo, mas a situação geral é como a descrevo. Nem o mal seria tão funesto, se não fosse tão vasto e tão profundo. Generalisando assim a minha critica, supponho que terei conquistado d'esse lado da camara (apontando para as Lançadas da maioria), senão um assentimento completo ás minhas palavras, pelo menos o reconhecimento de que exprimo conscienciosamente uma convicção intima. (Apoiados.)
A verdade é esta. E se um espirito analysta, da força de Balzac, se lembrasse de escrever a Physiologia da politica, tenho como certo que elle acharia n'esta formula os nossos amigos assumpto para largos e interessantissimos capitulos.
Esta formula é um ruim legado do antigo jacobinismo partidario. Mas, n'esses tempos, comprehendia-se. Os partidos andavam sempre em guerra armada. Os raros intervallos de descanso eram preparativo para novas luctas. Os nossos amigos eram a antithese dos nossos inimigos. Tudo em favor de uns e tudo contra os outros. É a lei das batalhas, onde muitas vezes se fuzilam, sem piedade, individuos que affectuosos sentimentos deviam unir, e até parentes muito chegados.
As luctas sangrentas acabaram para nós em 1852. Mas a escola politica, que ellas crearam, dominou ainda por muito tempo, e não está ainda totalmente extincta, porque só agora começam a ter preponderancia na direcção dos partidos as gerações que vieram depois das contendas civis.
A formula nossos, amigos é um resto desse jacobinismo. Com a differenca, aliás importante, que não tem hoje, como correspondência e attenuação, as dedicações e abnegações heroicas, a fraternidade cordeal, e a grandeza dos sacrificios que então a acompanhavam.
Quando hoje se falla, com ares torvos, em corrupção, em falta de crenças e de princípios, em acalmnções ou conciliações condemnaveis, mais se obedece ao velho jacobinismo intransigente, do que se segue uma apreciação verdadeira. Sem querer, por fórma alguma, que se baralhem os partidos, ou que os interesses de uns e outros se misturem, convem todavia ter em consideração a influencia dos factos, que successivamente têem amaciado as separações e os attritos resultantes das divergencias partidarias. O antigo jacobinismo intransigente não o tem hoje rasão de ser. (Apoiados.) E não deve ser, para não se falsear a conveniente direcção da politica. (Apoiados.)

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