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SESSÃO DE 25 DE JANEIRO DE 1886

Presidencia do exmo. sr. Ignacio Francisco Silveira da Mota

Secretarios os exmos. srs.

João José d'Antas Souto Rodrigues
Henrique da Ganha Matos de Mendia

SUMMARIO

Deu-se conta de um officio do sr. presidente do primeiro conselho de guerra permanente da primeira divisão militar, pedindo licença para que o sr. Avellar Machado possa ir no dia 29 do corrente depor como testemunha perante aquelle conselho em audiencia de julgamento. - Foi concedida a licença. - Teve segunda leitura um projecto de lei dos srs. Martinho Camões, José Novaes, Luiz de Lencastre e Cypriano Jardim, equiparando o actual porteiro do tribunal da Boa Hora, e os que lhe succederem, para os effeitos do vencimento e da reforma ou aposentação, aos porteiros das secretarias destado. - Foi approvado um parecer da commissão de poderes com referencia a uma vaga de deputado no circulo de Aveiro, e em conformidade com o disposto no § 2.º do artigo 5.° da lei de 21 de maio de 1881 foi proclamado deputado e chamado a preencher a vacatura o cidadão Fernando Affonso Geraldes Caldeira, como o mais votado em seguida ao sr. José Frederico Pereira da Costa, que era o representante da minoria pelo circulo referido e que hoje é par do reino. - Manda uma declaração de voto o sr. Vicente Pinheiro. - Apresentaram representações: o sr. Vicente Pinheiro, da associação commercial de Braga; o sr. Pereira Leite, da camara municipal da Povoa de Lanhoso; o sr. Adolpho Pimentel, da camara municipal de Villa Nova de Famalicão. - Apresentaram requerimentos, pedindo informações, pelos differentes ministerios, os srs. Luiz José Dias, Simões Dias, Frederico Laranjo e Eduardo Coelho. - Justificaram faltas os srs. Miguel Tudella, Vicente Pinheiro, J. Augusto Teixeira e Correia Barata. - O sr. Simões Ferreira chama a attenção para a syndicancia dos actos do administrador do concelho de Meda. - Responde-lhe o sr. ministro do reino.
Na ordem do dia continua o incidente relativo aos acontecimentos de Braga e Guimarães. - Usam da palavra os srs. Emygdio Navarro; ministro do reino, respondendo ao sr. Navarro; Luiz Jardim, José Novaes, Antonio Centeno e Santos Viegas, os quaes todos apresentaram moções de ordem. - A questão ficou pendente. - No fim da sessão o sr. E. Coelho disse ter recebido informações de Valle Passos, em que se lhe dizia que por occasião da eleição da commissão de recenseamento fora ali alterada a ordem. Perguntava ao governo se tivera noticias de que tal facto se dera, e, no caso affirmativo, que providencias havia tomado. - Responde-lhe o sr. ministro do reino.

Abertura - Ás duas horas e tres quartos da tarde.

Presentes á chamada - 76 srs. deputados.

São os seguintes: - Lopes Vieira, Agostinho Lucio, Moraes Carvalho, Garcia de Lima, Albino Montenegro, Alfredo Barjona de Freitas, Silva Cardoso, Sousa e Silva, Antonio Candido, Antonio Centeno, Garcia Lobo, A. J. da Fonseca, Moraes Sarmento, Moraes Machado, Carrilho, Santos Viegas, Sousa Pavão, Pereira Leite, Neves Carneiro, Caetano de Carvalho, Sanches de Castro, Lobo d'Avila, Conde da Praia da Victoria, Conde de Villa Real, Cypriano Jardim, E. Coelho, Emygdio Navarro, Fernando Geraldes, Filippe de Carvalho, Francisco Beirão, Francisco de Campos, Frederico Arouca, Guilherme de Abreu, Matos de Mendia, Silveira da Mota, J. A. Pinto, Augusto Teixeira, J. C. Valente, Searnichia, Franco Castello Branco, Souto Rodrigues, João Arroyo, Teixeira de Vasconcellos, J. Alves Matheus, Ponces de Carvalho, Joaquim de Sequeira, J. J. Alves, Teixeira Sampaio, Amorim Novaes, Avellar Machado, Azevedo Castello Branco, Ferreira de Almeida, Borges de Faria, Elias Garcia, Laranjo, Figueiredo Mascarenhas, José Luciano, Oliveira Peixoto, Simões Dias, Luciano Cordeiro, Luiz de Lencastre, Luiz Dias, Luiz Jardim, Luiz Osorio, M. P. Guedes, Marçal Pacheco, Martinho Montenegro, Guimarães Camões, Miguel Tudella, Pedro de Carvalho, Gonçalves de Freitas, Pereira Bastos, Vicente Pinheiro, Visconde de Ariz, Visconde de Balsemão e Consiglieri Pedroso.

Entraram durante a sessão os srs.: - Adolpho Pimentel, Adriano Cavalheiro, Torres Carneiro, Antonio Ennes, Cunha Bellem, Jalles, Pinto de Magalhães, Almeida Pinheiro, A. Hintze Ribeiro, Urbano de Castro, Augusto Poppe, Barão de Viamonte, Elvino de Brito, E. Hintze Ribeiro, Firmino Lopes, Vieira das Neves, Correia Barata, Castro Mattoso, Barros Gomes; Sant'Anna e Vasconcellos, Costa Pinto, Baima de Bastos, Melicio, Simões Ferreira, Dias Ferreira, Lobo Lamare, Pereira dos Santos, José Maria Borges, Reis Torgal, Manuel d'Assumpção, Pinheiro Chagas, Miguel Dantas, Pedro Correia, Santos Diniz, Pedro Roberto, Rodrigo Pequito, Dantas Baracho, Tito de Carvalho, Visconde das Laranjeiras, Visconde de Reguengos, Visconde do Rio Sado e Wenceslau de Lima.

Não compareceram á sessão os srs.: - Agostinho Fevereiro, A. da Rocha Peixoto, Pereira Corte Real, Lopes Navarro, Pereira Borges, Fontes Ganhado, A. M. Pedroso, Seguier, Augusto Barjona de Freitas, Ferreira de Mesquita, Fuschini, Avelino Calixto, Barão do Ramalho, Bernardino Machado, Carlos Roma du Bocage, Conde de Thomar, Ribeiro Cabral, Sousa Pinto Basto, Góes Pinto, Estevão de Oliveira, Mártens Ferrão, Wanzeller, Guilhermino de Barros, Franco Frazão, Ribeiro dos Santos, Ferrão de Castello Branco, Sousa Machado, J. A. Neves, Coelho de Carvalho, Correia de Barros, Ferreira Freire, J. M. dos Santos, Pinto de Mascarenhas, Julio de Vilhena, Lourenço Malheiro, Luiz Ferreira, Bivar, M. da Rocha Peixoto, Correia de Oliveira, Manuel de Medeiros, M. J. Vieira, Aralla e Costa, Mariano de Carvalho, Barbosa Centeno e Visconde de Alentem.

Acta - Approvada.

EXPEDIENTE

Officio

Do primeiro conselho de guerra permanente na primeira divisão militar, solicitando auctorisação para o sr. deputado José Alves Pimenta de Avellar Machado depôr como testemunha n'aquelle concelho no dia 29 do corrente pelas dez e meia horas da manhã.
Concedida.

Segunda leitura

Projecto de lei

Senhores. - No tribunal da Boa Hora existem valores importantes arrecadados nos depósitos d'aquelle edificio e confiados á guarda de um empregado nomeado para esse fim em 6 de agosto de 1874.
A esse empregado compete tambem a guarda do tribunal e a fiscalisação da limpeza e todas as obrigações e responsabilidades, que impendem aos porteiros das secretarias d'estado, acrescidas com o onus gravissimo de ser responsavel pelos valores que entram nos depositos do tribunal, quer em virtude de penhores feitos em execuções de fazenda ou de particulares, quer em virtude de arrolamentos e espolios de cidadãos fallecidos ab intestato e sem familia conhecida ou herdeiros legaes.
Attendendo á mesquinha retribuição que foi arbitrada a esse empregado;
Attendendo ás responsabilidades que pesam sobre elle;
Attendendo a que é de justiça que se defina claramente

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a categoria d'esse empregado, tenho a honra de submetter á sancção da camara o seguinte projecto de lei:

Artigo 1.° O actual porteiro do tribunal da Boa Hora, e todos os que lhe succederem, são considerados para o effeito do vencimento, da aposentação ou de reforma, aos demais porteiros das secretarias d'estado.
Art. 2.° Fica revogada toda a legislação em contrario.
Salla das sessões 23 de janeiro de 1886. = Martinho Camões = José Novaes = Luiz de Lencastre = Cypriano Jardim.
Leu-se na mesa, foi admittido e enviado á commissão de fazenda.

REPRESENTAÇÕES

1.ª Da associação commercial da cidade de Braga, contra o projecto de lei apresentado pelo sr. Franco Castello Branco na sessão de 13 do corrente, para ser annexado o concelho de Guimarães ao distincto do Porto.
Apresentada pelo sr. deputado Vicente Pindella, enviada á commissão de administração publica e mandada publicar no Diario do governo.

2.ª Da camara municipal do concelho da Povoa de Lanhoso, no mesmo sentido da antecedente.
Apresentada pelo sr. deputado Pereira Leite., enviada á commissão de administração publica e mandada publicar no Diario do governo.

3.ª Da camara municipal do concelho de Villa Nova de Famalicão, no mesmo sentido.
Apresentada pelo sr. deputado Adolpho Pimentel, enviada á commissão de administração publica e mandada publicar no Diario do governo.

REQUERIMENTOS DE INTERESSE PUBLICO

1.° Requeiro que, pelo ministerio do reino, sejam com urgencia enviados a esta camara os seguintes esclarecimentos:
I. Copia da representação dos habitantes da freguezia das Carreiras, do concelho de Portalegre; contra o modo por que se estava procedendo á cobrança administrativa do serviço braçal na mesma freguezia;
II. Copia da informação, documentos ou esclarecimentos apresentados pelo administrador do concelho de Portalegre ao governador civil do districto relativamente ao mesmo assumpto;
III. Copia da ordem dada pelo governador civil do mesmo districto ao administrador do mesmo concelho para suspender quaesquer actos administrativos que se tivessem praticado para effectuar a cobrança da contribuição pessoal;
IV. Copia ou declaração de quaesquer resoluções do governador civil do districto. sobre o referido assumpto, posteriores a 11 de janeiro do anno corrente. = O deputado, José Frederico Laranjo.

2.° Requeiro que, pelo ministerio da fazenda, seja enviado com urgencia a esta camara o seguinte:
I. Orçamento das obras a realisar nas repartições da alfandega;
II. Nota das despezas já realisadas por conta desse orçamento. = O deputado, José Frederico Laranjo.

3.° Requeiro que, pelo ministerio das obras publicas, seja enviada com toda a urgencia a esta camara:
Copia da portaria que nomeia um segundo official da repartição de industria para uma commissão estranha ás funcções que lhe competem como chefe de secção n'aquella repartição. = O deputado, José Frederico Laranjo.

4.° Requeiro que, pelo ministerio das obras publicas, seja enviada a esta camara uma nota dos processos da aposentação dos empregados telegrapho-postaes, com indicação do numero d'esses processos existentes actualmente n'aquelle ministerio, e das differentes categorias de empregados a que os mesmos processos se referem. = O deputado, José Simões Dias.

5.° Requeiro que sejam enviados a esta camara com urgencia os processos de aposentação seguintes:
I. De Francisco Florido da Cunha Toscano, nomeado primeiro official da alfandega do Porto em 30 de julho de 1882, e aposentado em 23 de outubro de 1885;
II. De Raphael Augusto Rodrigues, nomeado primeiro official da alfandega do Porto em 6 de março de 1884 e aposentado em 23 de outubro de 1885;
III. De José Julio Raposo de Carvalho, nomeado chefe da fiscalisação maritima em fins de 1883, e aposentado em 23 de outubro de 1885;
IV. De João Paulino de Proença Vieira, verificador que foi da alfandega do Porto;
V. De João Rodrigues da Silva Santos, verificador que foi da alfandega de Lisboa;
VI. De Francisco Coelho de Matos Fragoso, verificador que foi da alfandega do Porto;
VII. De Arthur António dos Santos Monteiro, verifica dor da alfandega do Porto;
VIII. De Augusto César de Novaes Pinto de Azevedo, chefe fiscal que foi da alfandega de Bragança;
IX. Do primeiro official da alfandega de Lisboa, Raphael Rodrigues Sette;
X. Do empregado que serviu de archivista na alfandega do consumo;
XI. Do terceiro official da alfandega de Lisboa, Antonio de Sousa Machado;
XII. Do empregado, chefe de secção externa, Correia, e copia da portaria, ou de qualquer diploma ministerial, que annullou a aposentação deste funccionario, e copia de quaesquer documentos que servissem de base a esta annullação e justificando que fosse collocado como addido para ser opportunamente empregado;
XIII. Copia de qualquer participação dada contra o alludido empregado Correia pelo sub-chefe da fiscalisação maritima directamente ao inspector Vasconcellos, e declaração se pelo mesmo foi dada participação igual ao administrador geral das alfandegas, Costa Gomes, e o destino que teve essa participação. = O deputado, Eduardo José Coelho.

6.° Requeiro que, pelo ministerio do reino, me sejam remettidos para a camara, com a maior brevidade, os seguintes documentos:
I. Relação do pessoal e empregados da administração e da camara municipal do concelho de Monsão, aos quaes a mesma camara se tem recusado a pagar os ordenados com o fundamento de se não acharem satisfeitos os direitos de mercê;
II. Copia da correspondência trocada entre a dita camara, o conselho de districto e o governador civil de Vianna, a respeito do pagamento desses ordenados, e bem assim dos accordãos do mesmo conselho que ordenaram ao thesoureiro da camara o pagamento, violando a lei e prejudicando a fazenda nacional;
III. Copia das glossas e commentarios feitos pelo conselho de districto de Vianna ao orçamento municipal de Monsão, no anno de 1885, e dos accordãos do dito conselho que mandaram applicar as verbas glossadas ao augmento dos ordenados do pessoal da administração, já depois de ter sido este pessoal alliviado do serviço das operações do recenseamento militar, e bom assim do accordão que mandou ao thesoureiro effectuar o pagamento d'esse augmento sem que os empregados tivessem satisfeito os direitos de mercê;

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IV. Copia dos accordãos e determinações que augmentaram o pessoal da administração do concelho de Monsão sem ouvir a camara;
V. Copia das deliberações da camara acerca, do augmento de pessoal, depois de terem passado para ella as operações do recrutamento militar, e dos accordãos do conselho de districto a respeito d'esse assumpto;
VI. Copia de todas as deliberações da camara do Monsão para construir ou mandar construir o cemitério municipal o dos accordãos do conselho de districto sobro este assumpto, e bem assim copia de toda a correspondência official que lhe diga respeito e do procedimento da auctoridade administrativa com relação ao mesmo negocio;
VII. Xota do dia, mez e anuo, em que fui demittido do official pregoeiro da camara Manuel Correia, do dia, mez e anuo em que foi nomeado official de diligencias da administração do concelho, copia do requerimento em que este pediu á camara o pagamento de seus ordenados, a contar da data de demissão, das deliberações da camara e do conselho de districto a respeito d'este assumpto;
VIII. Copia das deliberações da camara de Monsão ácerca do apontador fiscal, das ordens e deliberações do conselho de districto a respeito do mesmo logar e do pagamento dos ordenados ao mesmo empregado e da correspondencia, e deliberação sobre o pagamento dos direitos de mercê, devidos polo referido apontador fiscal;
IX. Para intelligencia dos documentos anteriores, attestado da administração e da camara sobre se o apontador iscai mencionado é pessoa habilitada e competente para exercer o logar, se presta serviços á camara, e se é ou não creado e serviçal do governador civil substituto do districto de Vianna;
X. Copia das deliberações da camara municipal ácerca da escola elementar e complementar e das resoluções e ordens do conselho de districto e do governador civil de Vianna, que mandavam dar posse da mesma cadeira, por intermédio do administrador do concelho, a um individuo que só tem o curso elementar, e tudo isto sem ouvir a camara municipal;
XI. Nota das quantias que sairam do thesouro publico com destino a soccorrer os pobres que vão tomar banhos a Monsão deado 1881 até 1880 inclusive, e nota das contas e da pessoa a quem essas quantias foram entregues para as distribuir na conformidade da lei;
XII. Nota da somma a que montam os dinheiros de beneficencia, no concelho de Monsão, desde 1881 até 1880 inclusive, e onde param essas quantias, por quem foram gastas, e copia das ordens, que aã mandaram desviar da sua justa e legal applicação;
XIII. Relação dos requerimentos que têem sido presentes á camara de Monsão a pedir subsidio de lactação e qual o destino e o tempo que a commissão districtal conserva paradas em seu poder essas petições, e qual o destino dás quantias que deviam ser applicadas para este subsidio e o não têem sido;
XIV. Copia das deliberações da camara de Monsão sobre medidas hygienicas e meios prophylacticos com relação ao cholera e copia das ordens e accordãos do conselho de districto com respeito ao mesmo assumpto;
XV. Copia da representação que a camara municipal dirigiu ao governo contra o conselho de districto por causa do assumpto a que se refere o requerimento antecedente;
XVI. Copia das ordens e nota das providencias adoptadas pelo governo com relação ás queixas gravissimas que a camara de Monsão, na representação referida, fazia contra o conselho do districto de Vianna;
XVII. Copia do accordão do conselho do districto de Vianna, que em julho ou agosto de 1884 annullou arbitrariamente a eleição da junta de parochia de Segude, do concelho de Monsão feita em 1883;
XVIII. Requeiro finalmente que seja remettido á camara dos senhores deputados e collocado sobre a mesa da presidencia o orçamento original da camara de Monsão para o anuo de 1886, para que todos leiam, pesem e admirem a doutrina o os fundamentos do accordão do conselho do districto, que glossou e rejeitou esse orçamento. = O deputado, Luiz José Dias.
Mandaram-se expedir.

JUSTIFICAÇÕES DE FALTAS

1.ª Mando para a mesa a declaração de que por motivo justificado não pude compacer a algumas sessões. = O deputado, Miguel Tudella.

2.ª Declaro que faltei ás ultimas sessões por incommodo de saude. = O deputado,
Vicente Pinheiro.

3.ª Declaro que por incommodo de saude tenho deixado de comparecer a algumas sessões. = O deputado pela Madeira, João Augusto Teixeira.

4.ª Declaro que por motivo justificado não compareci a algumas sessões desta camara. = Correia Barata.
Para a acta.

DECLARAÇÃO DE VOTO

Declaro que, se estivesse presente na sessão de 20 do corrente, teria rejeitado a moção e ordem do sr. deputado Franco Castello Branco, e approvado a proposta de inquerito do sr. Mariano de Carvalho. = O deputado, Vicente Pinheiro.

O sr. Presidente: - Em virtude da lei, consulto a camara, sobre se permitte que o sr. Avellar Machado possa ir no dia 29 do corrente depor como testemunha em audiencia de julgamento do primeiro concelho de guerra.
O sr. Luiz José Dias: - Pedi a palavra para mandar pare a mesa dezoito requerimentos pedindo esclarecimentos ao governo. (Movimento de admiração.)
Os illustres deputados admiraram-se? Pois não têem de que!
Se eu pedisse todos os documentos sobre os actos em que o governo tom andado mal o desprezado as leis, não seriam só dezoito, teria que acrescentar a esse numero algumas cifras.
(Leu.)
Não é só nas secretarias d'estado e nas altas repartições publicas que se praticam actos de illegalidade; tambem nos conselhos de districto e nas administrações dos concelhos as leis são violadas, em prejuizo da fazenda nacional.
(Leu.)
Estes documentos são importantissimos para avaliar a seriedade e a consciencia com que se administram os interesses dos povos, porque, depois de terem passado os encargos do recrutamento para o serviço militar para as camaras municipaes, é que as auctoridades administrativas se lembraram de augmentar o numero de empregados da administração, elevando-lhes os ordenados; já vêem os illustres deputados que não é para admirar que eu apresente dezoito requerimentos, pedindo esclarecimentos sobre um ponto tão restricto da administração publica, porque podia fazer muito mais; pois a administração do governo do sr. Fontes é má em toda a parte, e sob o seu imperio e consulado por todos os pontos do paiz fervem os escandalos e se esbanjam os dinheiros do povo.
(Leu.)
O conselho de districto entendeu, contra a lei clara e expressa, que podia administrar por sua conta e risco o municipio de Monsão, mandando distribuir as receitas camararias pelos seus afilhados e protegidos.
Segundo a lei são todos os annos distribuidos 200$000

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réis pelo cofre da beneficencia aos pobres que na epocha balnear vão a Monsão fazer uso de banhos e aguas; a lei marca a applicação d'esse dinheiro e indica o modo da distribuição e as estações competentes para a fazer, e como o provedor da misericordia de Monsão não tem recebido esse dinheiro, eu desejo saber o que ha e tem havido a este respeito.
Já vêem os illustres deputados qual a ordem de esclarecimentos que peço, e portanto não têem que se admirar; admirem se dos abusos e irregularidades que os subalternos do governo praticam e commettem por toda a parte impune e impudentemente.
(Leu.)
Se eu contasse estes factos talvez a camara e os srs. ministros me não acreditassem; hão de vir os documentos e então verão que a camara municipal de Monsão tem estado em lucta aberta com as auctoridadades superiores o determinadamente com o conselho de districto, pugnando aquella pela moralidade e pela justiça e lançando-se este no caminho do impudor, do escandalo e da veniaga torpe, vil e indecente, praticando actos que envergonhariam o mais vil e ignobil garoto das praças publicas.
As auctoridades superiores do districto mandaram dar posse da cadeira de instrucção primaria elementar e completar a um individuo que não tem as habilitações exigidas e contra todas as disposições da lei.
A posse foi dada por meio do administrador do concelho, sem que a camara fosse ouvida para a nomeação de tal professor!!
(Leu.)
Já vêem os illustres deputados que não é só nas repartições do estado, que apparecem desvios e saques aos cofres publicos, tambem nas administrações e conselhos de districto acontece o mesmo, tambem lá por fóra os pequenos regulos imitam o exemplo de seus superiores.
A camara de Monção queria usar de meios energicos para se oppor á invasão do cholera, na occasião em que começaram a circular boatos aterradores acerca de casos suspeitos, que se tinham dado na Galliza e muito perto d'aquelle concelho.
Tomou as medidas mais rigosas ao seu alcance, com a maxima energia e actividade, mas o conselho de districto, não só não approvou as verbas orçadas para tal fim, mas até negou ou não deu approvação ás posturas que diziam respeito á hygiene e salubridade publica. Um conselho de districto d'este jaez está abaixo de toda a critica e principalmente quando se recusa a approvar despezas de reconhecida urgência e se presta a desperdiçar os dinheiros municipaes em favor de seus amigos e dos serviçaes e creados seus apaniguados.
Creio que na Cochinchina não se praticam d'estes desaforos.
A camara de Monsão, julgando na sua ingenuidade, que o sr. ministro do reino tinha tomado a serio a questão da salubridade publica, dirigiu-se-lhe em representação, quixando-se amargamente do procedimento insolito e reprehensivel dos conselho de districto, pedindo ao mesmo tempo as providencias que o caso reclamava.
Ainda hoje espera pela resposta e pelas providencias do governo.
(Movimento de impaciencia e admiração.)
Já que os illustres deputados se incommodam ainda hão-de ouvir mais.
(Leu.)
O conselho de districto, note bem a camara, annullou em julho ou agosto de 1884 uma eleição de junta de parochia, feita em 1883, fundando-se em leis o decretos que ninguem n'este paiz conhece.
Factos d'esta ordem devem realmente causar espanto, porque só se podem esperar de gentes barbaras e despoticas, e nunca de pessoas que vivem n'uma sociedade que seja medianamente civilisada. Veja a camara em que mãos está depositada uma grande parte da administração do districto de Vianna!! Veja o paiz, por este pequeno panno de amostra, se tem ou não rasão a imprensa quando taxa de irregular, escandalosa e abusiva a administração do conselho de districto de Vianna.
Peço a v. exa. que se digne dar a estes requerimentos o destino conveniente.
Aguardarei o tempo preciso e rasoavel para a sua remessa e dado é caso que ella não se effectue, tratarei d'este assumpto numa interpellação que farei ao sr. ministro do reino, que é de quem estes negócios dependem, ficando desde já s. exa. certo de que me não poderá responder - venham as provas.
Espero da lealdade e cavalheirismo do sr. ministro que não me pedirá provas, recusando-se a mandar-me estes documentos.
Muitos dos factos a que aqui se allude, comquanto dependam da pasta do reino, não os julgo da inteira responsabilidade do sr. Barjona, no emtanto cabe-lhe ella pela maior parte d'elles.
O sr. Vicente Pinheiro: - Mando para a mesa uma representação da associação commercial de Braga, contra o projecto apresentado nesta casa pelo deputado por Guimarães o sr. Franco Castello Branco.
Esta representação já a recebi ha dias, no emtanto sabe a camara que incommodos de saude me têem obrigado a faltar às sessões e por isso só agora a posso apresentar.
Reservo-me o direito de sobre ella fazer as considerações que entender convenientes, quando sobre este incidente me couber o uso da palavra.
Por esta occasião mando para a mesa uma justificação de faltas e uma declaração de que, se estivesse presente, teria rejeitado a moção do sr. Franco Castello Branco, e teria approvado a proposta para o inquérito parlamentar, feita pelo sr. Mariano de Carvalho.
O sr. Pereira Leite: - Mando para a mesa um parecer da primeira commissão de verificação de poderes, declarando vago o logar de deputado pelo circulo de Aveiro, em vista do sr. José Frederico Pereira da Costa ter tomado assento na camara dos dignos pares.
Peço a v. exa. que consulte a camara sobre, se dispensando o regimento, permitte que este parecer entre desde já em discussão.
Foi dispensado o regimento e admittido á discussão.
É o seguinte:

PARECER

Senhores. - Á vossa commissão de verificação de poderes foi presente o officio da presidencia da camara dos dignos pares do reino, participando haver tomado assento n'aquella casa do parlamento, na qualidade de par electivo, o sr. José Frederico Pereira da Costa, deputado às cortes pelo circulo 34 (Aveiro).
N'estes termos é a vossa commissão de parecer que seja declarado vago o logar occupado pelo, mesmo senhor, e em conformidade com o disposto no § 2.º do artigo 5.° da lei de 21 de maio de 1884, seja chamado a preencher aquella vacatura e proclamado deputado da nação, o cidadão Fernando Affonso Geraldes Caldeira, que a vossa commissão no seu parecer n.° 80 de 1884 e approvado em sessão de 22 de dezembro do mesmo anno, verificou ter obtido 1:611 votos, e ter sido o cidadão immediatamente mais votado em seguida ao sr. José Frederico Pereira da Costa, actual membro da camara dos pares e que era o representante da minoria pelo circulo acima referido.
Sala das sessões, em 25 de janeiro de 1886. = Luiz de Lencastre = Frederico Arouca = Moraes Machado = Pereira Leite, relator.
Foi approvado o parecer e em seguida proclamado deputado, o sr. Fernando Affonso Geraldes Caldeira,

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O sr. Simões Dias: - Mando para a mesa o seguinte requerimento. (Leu.)
Vae no logar competente.
O sr. Miguel Tudella: - Mando para a mesa uma justificação de faltas.
O sr. Frederico Laranjo: - Mando para a mesa tres requerimentos, pedindo esclarecimentos ao governo, os quaes me são necessárias para fazer interpellações ao sr. ministro do reino.
Vae no logar competente.
O sr. E. Coelho: - Mando para a mesa os seguintes requerimentos. (Leu.)
Espero que v. exa. mandará fazer a remessa com a devida urgência, até para poupar a esta camara o dissabor de presencear, que alguns ministros para se desculparem a si proprios, imputem á mesa, como já tem acontecido, menos zelo no expediente d'este serviço, opinião que eu não tenho.
Não precisa o meu requerimento de ser justificado; é uma consequencia logica do procedimento do governo. Desde o momento que o sr. ministro da fazenda, com uma obstinação digna de melhor causa, se oppoz ao inquerito parlamentar, e impossivel deixar de recorrer a estes meios. (Apoiados.)
O sr. ministro da fazenda, se não tivesse o seu espirito, aliás tão esclarecido, demasiadamente apaixonado, quando se pediu o inquérito parlamentar, por certo não o impugnaria; e se agora reflectir um pouco, conhecerá facilmente que, entre tantos erros, que tem commettido, ainda nenhum foi maior e menos justificado. (Apoiados.)
O sr. ministro, impugnando o inquerito, fel o de modo pouco correcto, antecipando a sua opinião á deliberação do parlamento, o que tem certa gravidade. A opinião dos ministros em tal caso póde parecer uma imposição.
O sr. Urbano de Castro: - E o mesmo que os senhores queriam que o governo fizesse com relação a Braga e Guimarães, é que antecipasse a sua opinião.
O Orador: - Eu não preciso saber agora a opinião do governo a respeito de Braga e Guimarães; o que é preciso saber é se um ministro da corôa póde de ante-mão impor, ou insinuar ao parlamento a sua vontade, e especialmente quando se trata de um assumpto grave, como é de certo o inquerito parlamentar. (Apoiados.)
Não duvida a camara, não duvida ninguem, que certas repartições publicas do estado estão sob o peso de accusações gravissimas, e convem dissipal-as, e ao mesmo tempo dar satisfação á opinião publica preoccupada. N'estas condições não devia negar-se o inquerito parlamentar; e se foi negado, não podem queixar-se das censuras, que d'este lado da camara se levantam. (Apoiados.)
Ha publicações, ha denuncias, saídas das repartições fiscaes, nas quaes se affirma que de 1881 a 1883 tem havido desvio de dinheiros publicos na importancia de 200:000$000 réis.
N'este estado de cousas, não se podiam fechar as portas da secretaria d'estado a um inquerito parlamentar. (Apoiados.)
Negam os documentos para apreciar o procedimento dos srs. ministros, e parece que se irritam!
Reservo-me para, quando vierem os documentos que peço, mostrar á camara e ao paiz que o sr. ministro delapidou os dinheiros publicos, fazendo aposentações illegaes ...
Vozes: - Ordem, ordem.
(Susurro.)
O sr. Ministro do Reino (Barjona de Freitas): - O que é delapidar?!
Vozes: - Não é phrase parlamentar.
O sr. Franco Castello Branco: - O sr. deputado há de retirar a phrase. (Muitos apoiados.)
(Susurro.)
O sr. Vicente Pinheiro: - Quem e o presidente da camara?
O sr. Presidente: - Peço ao sr. deputado que rectifique a phrase que empregou.
Vozes: - Ha de retiral-a.
O Orador: - As interrupções não me incommodam.
O sr. Franco Castello Branco: - Eu pergunto a v. exa. se o sr. deputado retirou á phrase ou não?
O sr. Presidente: - Peço ao sr. deputado que retire a palavra, que significa uma injuria.
O Orador: - Qual é a palavra que v. exa. deseja que eu retire?
O sr. Presidente: - A palavra delapidou.
O Orador: - A palavra delapidação, no sentido que a emprego, não póde ser considerada como injuriosa, nem é essa a minha intenção.
O que eu quero significar é que, com aposentações illegalmente decretadas, não se deu aos dinheiros do estado a devida applicação.
É o que espero demonstrar á camara quando fizer o exame dos processos, cuja remessa agora peço.
E assim, torno a repetir, eu quiz dizer que o sr. ministro não deu aos dinheiros públicos aquella applicação que a lei exige. (Apoiados.)
Não podia, pois, ser meu intento atacar a probidade pessoal de qualquer dos srs. ministros. Discuto os seus actos, arguindo-os de illegaes; e na hypotheses restricta das aposentações digo que, sendo illegaes, como espero demonstrar, os dinheiros publicos não tiveram a devida applicação, e por isso a fazenda publica foi prejudicada. (Apoiados.)
Depois que este incidente tomou proporções que eu não desejava, que elle attingisse, espero que o governo não faça demorar a remessa dos processos pedidos, porque, com referencia a elles, tenciono annunciar uma interpellação ao sr. ministro da fazenda. (Apoiados.)
O sr. Franco Castello Branco: - Peço a palavra sobre este incidente.
Desejo saber se o illustre deputado retirou ou não a palavra delapidação, porque mo julgo tambem offendido com essa expressão. (Apoiados.)
O sr. Avellar Machado: - Peço tambem a palavra sobre este incidente.
(Susurro.)
O sr. Presidente: - Peço ordem. Não me parece necessario abrir-se uma discussão sobre este incidente. (Apoiados.)
O sr. deputado Eduardo José Coelho tirou á palavra que tinha empregado toda a significação de injuria ou de affronta. (Apoiados.) Desde que assim fez não posso deixar continuar este incidente. (Apoiados.)
O sr. Costa Pinto: - Pedi a v. exa. para declarar que se constituiu a commissão administrativa d'esta casa, nomeando para seu thesoureiro o nosso estimado collega o sr. Estevão do Oliveira. (Apoiados.)
O sr. Adolpho Pimentel: - Mando para a mesa uma representação da camara municipal de Villa Nova de Famalicão, adherindo a uma representação da camara municipal de Braga, contra a desannexação do concelho de Guimarães.
Requeiro a v. exa. que consulte a camara sobre se permitte que esta representação seja impressa no Diario do governo.
Foi auctorisada a publicação no Diario do governo.
O sr. Pereira Leite: - Mando para a mesa uma representação da camara municipal de Povoa de Lanhoso, na qual protesta contra o projecto de lei n'esta casa apresentado pelo sr. deputado Franco Castello Branco, ácerca da desannexação do concelho de Guimarães do districto de Braga. Parece-me de toda a justiça o pedido d'aquella respeitavel corporação municipal.
Com a approvação de similhante projecto os encargos que hoje pesam no districto, e que são muito avultados, iriam assoberbar de um modo extraordinario os concelhos que continuassem a constituir aquelle districto, o que seria

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uma injustiça flagrante, visto existirem despezas importantes que permaneceriam ainda que se effectuasse a pedida separação.
Requeiro a v. exa. que consulte a camara sobre se permitte que esta representação seja impressa no Diario do governo.
Foi auctorisada a publicação.
O sr. Simões Ferreira: - Sr. presidente, como está presente o sr. ministro do reino, aproveito a occasião para lhe dizer que as suas ordens em relação aos actos do administrador do concelho de Meda furam sophismadas.
Suspendeu-se efectivamente o administrador de Meda, que saiu do concelho, e foi um administrador de fora fazer a syndicancia ordenada; mas, passados dois dias, o administrador voltou ao concelho e está dirigindo os trabalhos da mesma syndicancia.
Ora, como isto não póde ser em face da lei, eu peço ao sr. ministro do reino que de as suas ordens, para que a lei se mantenha.
Como o administrador suspenso é substituto, porque não tem habilitações para ser effectivo, succedeu uma cousa que tem novidade: foi nomeado um administrador substituto interino, que mora a 4 kilometros da cabeça do concelho, e o administrador suspenso é quem, realmente, está dirigindo a administração do concelho, sendo a suspensão uma pura e simples formalidade, que tem existência official, mas se não torna effectiva nas cousas.
Ora, isto é uma verdadeira sophismação das ordens, e creio que das intenções do governo, e não póde nem deve continuar.
Aquelle administrador, depois dos factos de que a camara tem conhecimento, é um elemento de perturbação na ordem moral d'aquelle concelho, e é preciso providenciar para que se não conserve.
Nada mais, por agora.
O sr. Ministro do Reino (Barjona de Freitas): - Direi ao illustre deputado que vou pedir informações ao governador civil e que vou ordenar positivamente que se faça a syndicancia com a maxima imparcialidade, porque ninguém tem interesse em que os factos sejam deturpados e em que se proceda de um modo contrario ás leis.
Estou convencido do que o governador civil tem estado sempre e está ainda no propósito de proceder regularmente, mas aproveito a informação do illustre deputado para lhe perguntar o que ha a este respeito e para lhe recommendar que a syndicancia se faça em termos de verdadeira imparcialidade.

ORDEM DO DIA

O sr. Emygdio Navarro (sobre a ordem): - Principio por ler a minha moção de ordem, que é a seguinte:
«A camara, desejando que o conflicto entre Braga e Guimarães se resolva de prompto, para poder desembaraçadamente occupar-se da questão de fazenda, passa á ordem do dia.»
Entro n'esta discussão vivamente contrariado, e por mais de um motivo. Contrariado pelo assumpto em si, contrariado pelo incidente tumultuoso que acaba de dar-se e que me leva a modificar um pouco, se não as minhas idéas, a exposição d'ellas; e sobretudo contrariado por motivos particulares, que nada interessam directamente á camara, mas que sobre o meu espirito actuam de tal modo, que me obrigariam a ficar silencioso, se um dever partidario mais forte me não obrigasse a fallar.
Declaro, franca e lealmente, que de coração desejaria pôr-me ao lado do governo na questão, que se ventila, e que considero essencialmente de ordem publica.
Um tanto por impulsos do temperamento, e mais ainda por suggestões da reflexão e do estudo, reputo as questões de ordem publica as mais serias entre todas, e que a todas devem preferir e dominar. De bom grado daria, por isso, o meu apoio ao governo para que elle afastasse de nós, se podesse, esta questão irritante, que nos consomme o tempo, reclamado por outros assumptos de maior tomo, e as attenções que n'elles deveriamos concentrar. A comprehensão, que tenho, dos gravíssimos melindres da conjunctura, persuade-me de que, neste momento, ha objectivos parlamentares mais importantes. Caminhamos para conflictos muito mais ameaçadores e perigosos do que os que trazem mal avindas e incendiadas duas cidades do reino, sejam ellas, embora, das mais notáveis e dignas dos nossos cuidados. E entretanto, o governo, nem mesmo com o apoio do nós todos, poderia resolver satisfactoriamente o conflicto, que deixou nascer e medrar, e que, não estando, pela sua natureza, á altura do parlamento e dos poderes publicos, todavia se impõe fatalmente, pela força das circumstancias, á attenção dos poderes publicos e do parlamento. (Muitos apoiados.)
Permitia-me a camara que falle de mim, para accentuar melhor a lealdade destas declarações. Desde que rebentou o conflicto entre as duas cidades minhotas, não deixei na imprensa de advogar a conciliação, e de recommendar a todos prudencia e cordura. Não me apossei d'elle, para o explorar em sentido partidario. Não exacerbei os resentimentos de uns, nem provoquei e aticei a reacção dos outros. Não acariciei as paixões de um lado, nem preparei e fomentei do outro lado explosão igual. Abstive-me até de dar rasão a uns ou a outros, e só insisti em dar conselhos de moderação aos litigantes e ao governo avisos previdentes. A minha acção não teria força sufficiente para avolumar o conflicto, ainda que de outro modo procedesse; e se de mim fallo é só para mostrar que, no pouco que em mim estava, fiz o que pude para que o conflicto se não aggravasse. E só quando elle entrou no período agudissimo, em que o vemos, só quando a ordem publica se viu seriamente ameaçada pela continuação d'elle, é que eu saí d'aquella reserva conciliadora. O que digo de mim, digo-o de todos os meus amigos políticos. (Apoiados.) De cá, ninguem procurou utilisar este lamentavel conflicto como assumpto e arma de guerra partidaria. (Apoiados.)
O sr. presidente do conselho, para se defender de ter estado de braços crusados desde os lastimosos acontecimentos de 28 de novembro - e prouvera a Deus que assim estivesse estado, e que não tivesse asoprado ao incendio! - o sr. presidente do conselho perguntou á opposição o que tinha ella feito durante este tempo. A resposta, muito verdadeira, mas muito triumphante, é esta: Nada! A opposição não fez cousa alguma. E está nisso precisamente o seu elogio. (Apoiados.) A opposição deixou o governo livre de attrictos, e complicações partidárias e perfeitamente desembaraçado para serenar as paixões, apagar os dissentimentos, e reconciliar os animos. (Apoiados.) A opposição foi cordata o patriotica; o governo é que não foi previdente nem prudente. (Muitos apoiados.)
É isso, esse peccado original, que torna hoje extremamente difficil a situação do governo. É esse o motivo, por que o nobre presidente do conselho não póde responder, clara o categoricamente, á pergunta que lhe foi feita pelo illustre chefe do partido progressista, e meu amigo, o sr. Luciano de Castro. O nobre presidente do conselho, apertado pelas instancias, que deste lado lhe foram feitas n'esse sentido, respondeu: - «Essa resposta não a dou, porque não quero!»
Porque não quero! Devo dizer, que não me escandalisei com a altaneria d'estas palavras. Pelo contrario; confesso aos meus amigos o meu peccado: gostei da arrogancia. N'estes tempos que vão correndo, de tanto desprestigio para o poder, e de tanto rebaixamento e fraqueza no exercicio da auctoridade, apraz-me a mim que sou um auctoritario, ver affirmada assim, embora por um repellão, a firmeza d'essa auctoridade e a altivez d'esse poder. Direi mais: Não quero é uma phrase, que está á altura do homem eminente, que é chefe do governo e do partido regenerador,

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e que tão largo predominio politico e de governo tem exercido n'este paiz. Nem todos a poderiam proferir; mas elle, póde. Precisamente, do que o paiz principalmente se queixa, é de s. exa. não empregar para repellir as solicitações de uma politica desordenada e ruinosa essa mesma phrase, que empregou para desattender uma pergunta, que não era indiscreta nem mal cabida. (Muitos apoiados.)
A phrase estaria á altura do sr. presidente do conselho; mas a verdade, aqui, não é essa. Peço venia para rectificar. O governo não responde... porque não póde. Não é porque não quer! (Apoiados.)
O governo metteu-se n'um beco sem saída. Deseja fugir, e não vê caminho aberto. Prendeu se numa rede, e, quanto mais esbraceja, mais as malhas o enlaçam e lhe tolhem os movimentos. O meu presado amigo, o sr. Antonio Candido, definiu perfeitamente a situação,, dizendo que esta questão é irreductivel para o governo. É, sim. O governo lucta, de um lado, com a justiça que assiste a Braga, e do outro, com os compromissos que contrahiu com Guimarães. Braga tem por si a força das rasões 5 mas Guimarães tem a força da palavra, que o governo levianamente comprometteu. (Apoiados.)
Foi este o pensamento do sr. Antonio Candido; e é elle de rigorosa verdade. A questão é irreductivel para o actual governo, mas só para elle. Não o seria, para outro ministério, ainda que fosse de igual côr politica, porque esse não teria os compromissos particulares e pessoaes, que são para este difficuldade invencivel. O governo actual, se attender ás solicitações de Guimarães, como lhe prometteu, offende a rasão e à justiça, que estão pela causa de Braga. E não é impunemente que poderia fazel-o. Se obedece á rasão e á justiça, e desattende as pretensões de Guimarães, offende os compromissos, que tomou, e que, entre os contrahentes, têem força tambem de justiça e rasão. Por isso affirmou o sr. Antonio Candido que a questão é irreductivel para o governo. Por isso digo eu, que elle se metteu num beco sem saída, e que, quanto mais esbracejar, mais se enredará em dissabores, (apoiados.)
A questão só se tornou grave, e póde tornar-se gravissima por esta rasão; é porque, para o governo, não tem saída.
O governo vae conciliar! Quer conciliar! Depois de ter empregado em acirrar as paixões o tempo, que devia ter empregado em as acalmar, pretende agora o governo ganhar tempo, a ver se consegue desfazer o mal que fez, e se a sua boa estrella lhe suggere algum expediente, que lhe permitia approximar aquelles que absolutamente querem distanciar-se, e levar a uma transacção honrosa e conciliadora esses que em nada querem hoje transigir! Infelizmente, as circumstancias mudaram. Hoje não é hontem.
O que o governo intenta fazer não é conciliação; pelo contrario, é um convite á agitação. (Apoiados.) Isto não. é pacificar, é abrir concurso de preferencias para a desordem e para a anarchia. (Apoiados.)
Disse o governo que a questão tinha duas phases: antes de Braga se manifestar e depois de se manifestar. E porque teve estas duas phases?
Braga, primeiro, esteve calada, disse o governo; como fallava só Guimarães, elle inclinou-se para Guimarães; depois Braga fallou, e o governo recuou logo, e ficou hesitante, por não poder immediatamente decidir qual d'essas duas cidades era a mais forte e mais poderosa, e qual tinha pujança para fallar mais alto e com maior vigor!!
Pois não vêem v. exas. que desde que a questão é posta nestes termos, as hesitações, por parte, do governo são um convite para que Braga e Guimarães continuem a sustentar a sua justiça e as suas pretensões, cada vez com mais energia, cada vez com mais vehemencia?!
Se a questão não é de justiça, que já podia estar averiguada, mas de força que ainda é peciso liquidar; se ella tem de resolver-se pela persistencia nos processos, que até aqui têem actuado sobre o governo, é claro que vencerá a
final, aquella que for mais energica e mais persistente. A que fraqueje, ficará vencida, porque será desattendida, E ahi estão os factos a comproval-o. Cada uma das duas cidades procura supplantar a outra com a importância das manifestações. Nenhuma fraqueja nem cede, antes pelo contrario, lucta cada vez com mais ardor! E a agitação não se acalma, porque nessa agitação é que está a esperança da victoria!
Por ora, as manifestações mantém-se no terreno pacifico, mas comprehende-se facilmente, que não é possível conservar por muito tempo n'essa temperatura macia os animos exaltados. (Apoiados.) Os disturbios não podem vir longe, porque a isso convida o governo os dois partidos, desde que poz a questão em terreno tão perigoso. Braga e Guimarães estão como dois gladiadores, que successivamente empenham todas as forças para vencer o inimigo. O que cair por mais fraco, esse ficará vencido e morto. O governo assiste ao combate, a ver para onde se inclina a força, a fim de coroar o vencedor. Isto é inadmissivel! (Apoiados.) E é muito perigoso, porque com o fogo não se brinca. (Apoiados.)
Não accuso o governo de ter provocado muito propositadamente este conflicto. Accuso-o de o ter deixado nascer por imprevidência, e aggravar por imprudências e complacencias reprehensiveis.
Seria de politica tresloucada, que o governo, luctando com graves dificuldades, fosse de animo leve attrahir sobre si mais esta, que é gravissima. Não o julgo incurso na anecdota de Alcibiades. O elegante e corrupto atheniense tinha um cão formosíssimo, e muito admirado; vendo-se a braços com serias complicações de governo, de que desejava afastar as attenções dos seus concidadãos, foi-se ao cão, e cortou-lhe a cauda. O pobre animal, partiu correndo e ganindo lamentosamente. E, como os espiritos futeis das epochas de decadência seguem as mesmas correntes era toda a parte, durante muitos dias seguidos Athenas desinteressou-se da marcha dos negocios publicos para inquirir quem e porque tinha sido cortada a cauda ao cão de Alcibiades. O astucioso atheniense conseguira a diversão desejada. Ora eu não creio, que o governo nos arranjasse com igual intuito este conflicto entre Braga e Guimarães; porque, em summa, tantas são as causas que perturbam a marcha regular da governação do estado, e algumas, como as de natureza financeira, são de preponderancia tão accentuada, que o governo não poderia em caso algum realisar esse proposito. Por mal de nós todos, e superiores a quaesquer ardilezas, ha assumptos de sobra, inexoravelmente impostos pelas circumstancias, às discussões da imprensa e do parlamento. (Apoiados.)
O conflicto entre Braga e Guimarães nem era preciso para animar as discussões, nem poderá escurecer os outros assumptos. Não obstante, é forçoso dizer, que este conflicto, nas suas origens, é da responsabilidade exclusiva do governo; e que elle procedeu com tal imprevidencia, e permitta-se-me a palavra, que vae sem animo injurioso, com tal leviandade, como se o quizesse crear!
A questão não teve unicamente duas phases, como disse o sr. presidente do conselho: antes e depois de Braga se manifestar. Teve tres; e a primeira, foi antes das lamentaveis occorencias de 28 de novembro, e nos dias, que immediatamente se seguiram. N'essa primeira phase é que se affirmam principalmente as responsabilidades do governo, e mais a claro se manifestam as suas culpas.
O governo, hoje, tenta, mas em balde, acabar com o desaccordo, que divide aquellas duas cidades. Houve, porém, um periodo em que uma e outra estiveram de accordo, e só em desaccordo o governo. Vou ler os documentos comprovativos, que não deixam a minima duvida, a este respeito.
No dia 30 de novembro reuniu-se, em sessão extraordinária a camara municipal de Braga, representante do res-

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pectivo concelho, e no livro das suas actas consignou o seguinte:

«A camara municipal de Braga deplorando os acontecimentos que tiveram logar no
dia 28 do corrente, contra os procuradores á junta geral do districto por Guimarães, sente que não se tivessem tomado as devidas providencias para os evitar, e passa á ordem do dia.»

No mesmo dia reuniu-se a junta geral, representante do districto de Braga, e consignou nas suas actas um voto de censura analogo:

«Como prova de deferencia e lealdade para com os seus collegas insultados, não póde esta janta deixar de lamentar tão insólito procedimento da parte dos desordeiros, bem como da parte da auctoridade superior do districto, que, segundo nos consta, tendo conhecimento com antecipação do proposito em que estavam os manifestantes, não só não cohibiu essa manifestação, mas até parece que a tolerou. Protesta, portanto, a junta geral do districto de Braga contra esses factos violentos e arbitrários, e manda que se exare na acta esta sua declaração, tornando-se assim bem manifesto o seu desgosto, e que se tirem copias, que devem ser remettidas aos seus collegas offendidos e ao exmo. ministro do reino.»

Tanto uma como outra corporação censuraram o governador civil, imputando-lhe a culpa principal nos lamentaveis acontecimentos de 28 de novembro. A acta da junta geral foi mandada por copia ao sr. ministro do reino. Que fez o governo em presença d'estes votos de censura, inflingidos por votação unanime ao seu delegado de confiança? Conservou no seu cargo o governador civil accusado!
Dir-se-ha talvez que a camara municipal do concelho e a junta geral do districto de Braga procuravam por este meio declinar de si, e descarregar sobre a cabeça do governador civil, o odioso dos acontecimentos do dia 28; mas as declarações dos queixosos, as accusações dos representantes de Guimarães, são ainda mais expressas e frisantes!
A camara municipal de Guimarães reune-se em sessão extraordinaria, com assistencia dos procuradores concelhios á junta geral e de muito povo. Entre outras deliberações, resolve cortar todas as relações officiaes com as auctoridades de Braga. Não commentarei agora esta resolução, que o governo deixou de pé durante racz e meio, como sancção da anarchia! (Apoiados.) Á camara communicou esta resolução ao governador civil do districto, e, no respectivo officio, fundamentou-a quasi exclusivamente com as seguintes rasões:

«A camara municipal de Guimarães convenceu-se de que aquelles crimes proseguiram por occasião do procurador dr. Meira, descer as escadas do governo civil, entre vaias e apupos, estando v. exa. e o sr. commissario de policia dentro do governo civil; convenceu-se mais de que sendo estes acontecimentos premeditados e esperados não estava no governo civil nenhum agente da auctoridade, ou se estava foi cumplice nos actos apontados; convenceu-se mais de que v. exa. e o sr. commissario saíram do governo civil durante aquelles factos, e por isso não podiam ignorar o que se estava passando, e na presença da attitude hostil da população, não se tomaram nenhumas providencias para que fossem respeitadas as pessoas dos nossos representantes; convenceu-se de que durante o espaço de muitas horas se agglomerou muito povo, mais de 2:000 pessoas, enchendo o largo de Sant'Anna, largo do Barão de S. Martinho, rua de S. Marcos, etc., sem que v. exa. ou o sr. administrador do concelho ou o sr. commissario de policia tomassem as menores precauções para defender os nossos procuradores, quando é certo que já durante o seu jantar no hotel dos Dois Amigos não faltaram os assobios, os apupos, os morras, apresentando-se a multidão tão perigosa que não faltou já quem receiasse pela vida dos nossos representantes, e por isso os avisasse de que fizessem partir as carruagens vastas, e saíssem pelas Congostas, para a fúria popular assalariada se quebrar de encontro aos vehiculos e entretanto elles salvarem-se, o que os nossos representantes corajosamente não acceitaram ; convenceu-se que tudo isto era impossivel que succedesse com insciencia de v. exa. e das demais auctoridades.»

E porque se convenceu de tudo isto, e só por isto, foi que a camara municipal de Guimarães cortou as suas relações officiaes com as auctoridades de Braga. Não póde haver libello mais formidável, nem de proveniencia mais insuspeita. E que fez o governo? Conservou no seu posto o governador civil accusado!
Ainda mais. Os queixosos dirigiram um telegramma ao sr. ministro do reino, contando-lhe estes factos; e os delegados por Guimarães ao collegio districtal para a eleição de pares do reino, por telegramma o informaram do que, não tendo em Braga segurança individual, não iriam á eleição. O sr. ministro do reino respondeu ao primeiro dos signatários com o seguinte telegramma:

« Telegraphei immediatamente ao governador civil ácerca do lamentavel acontecimento a que v. exa. se referia. Já se levantou auto e segundo me assegura o governador civil estão tomadas todas as providencias para garantir o livre exercicio dos seus direitos e ampla liberdade das suas opiniões. Peço a v. exa. queira communicar este aos outros cavalheiros signatários do telegramma. = Barjona de Freitas.»

Quer a camara saber qual foi a replica?! Os queixosos enviaram em resposta ao sr. ministro do reino o telegramma seguinte:

«Desordeiros campearam ovantes durante horas no coração de Braga, sem uma prisão. Deram depois voto de louvor ao governador civil que os abraçou. Em taes circumstancias os procuradores e delegados consideram-se inhibidos de exercer seus direitos a que não renunciam.»

E assim continuaram os queixosos de Guimarães a accusar o governador civil como principal culpado, fautor e protector do ultrage que tinham recebido. Que tez o governo?! Continuou a dispensar a sua confiança ao governador civil accusado, e cuja demissão teria sido satisfação prompta e calmante para as paixões irritadas! (Apoiados.)
Ha mais. O governador civil dirige-se aos delegados de Guimarães ao collegio districtal, e pede-lhes que compareçam na eleição. Esses delegados respondem directamente ao governador civil, negando-se a comparecer, e dizendo-lhes, entre outras cousas, o seguinte:

«Tudo isto se fez sem a menor intervenção da policia, indo depois os criminosos muito socegados para um meeting, de onde levaram a v. exa. um voto de louvor, correspondido por v. exa. com abraços e as carinhosas palavras de que seria sempre contra os malevolos e a favor de Braga»

Os offendidos dirigem uma representação a El-Rei. N'esse documento lêem se as seguintes palavras:

«Permittiu-se ou promoveu-se que os nossos procuradores fossem apupados e apedrejados por uma multidão de 2:000 pessoas, evidentemente chamadas e concitadas para este fim; nem podemos suppor que as auctoridades não tivessem conhecimento do que se preparava. A arruaça durou muito tempo; a multidão estava já reunida com algumas horas de antecedencia; e todavia não se tomou nenhuma medida policial.»

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Sempre a mesma accusação, que era um protesto! Sempre a mesma queixa, que era um pedido! E o governo desattende pertinazmente o pedido e o protesto, e conserva o governador civil! De quem é, pois, a culpa de se ter aggravado o conflicto?! É do governo, e só do governo. (Muitos apoiados.)
Todos estes documentos, que acabo de ler á, camara, e ainda outros, encontram-se em o n.º 2 do jornal Vinte e oito de novembro, que é o órgão official da commissão de vigilancia e resistencia da cidade de Guimarães.
Isto é muito. Pois ainda há mais do que isso.
Vou referir-me a documentos, que não vi, e coutar factos, que não presenceei. Por isso, se incorrer em alguma inexactidão, como se acham presentes alguns collegas nossos, que devem ter intervindo n'esses factos, elles faraó o favor de emendar, porque eu antecipadamente acceito e lhes agradeço a rectificação.
Reuniram-se em Braga, para a eleição de pares, os srs. deputados que, nos termos da lei, são membros do respectivo collegio districtal. Antes da eleição dirigiram um telegramma ao chefe do governo, ou, para fallar com mais correcção, ao chefe do partido representado no governo, e pediram-lhe instrucções para a eleição, por não ter o partido em Braga um representante official condigno a quem podessem dirigir-se. Que fez o governo?! Fingiu que não percebeu a ultima parte do telegramma, e mandou as instrucções pedidas na primeira parte d'elle.
Faz-se a eleição. Os deputados communicam pelo telegrapho ao chefe do partido que as suas indicações haviam sido seguidas, e pedem-lhe collectivamente a demissão do governador civil. Que faz o governo? Conserva o governador civil! (Apoiados.)
A camara municipal de Braga, ajunta geral do districto de Braga, a camara municipal de Guimarães e as corporações desta cidade, os deputados pelos circules d'aquelle districto pedem, unanimemente, a demissão do governador civil, que o nosso presado collega, o sr. Franco Castello Branco, declarou ser detestado em todo o districto de Braga. E o governo, surdo a todos estes clamores, como fora surdo aos protestos do próprio decoro, conserva o governador civil detestado e detestavel! (Muitos apoiados.)
Isto é espantoso, é extraordinario, e só é crivel por ser a verdade provada! (Muitos apoiados.)
Eu desejo ser justo. E investigando as causas d'estes factos, que representam uma verdadeira aberração na ordem moral e política, inclino-me a crer que o sr. presidente do conselho obedeceu unicamente a um exagero, em todo o caso censuravel, de generosidade e de benevolencia um pouco misericordiosa.
O sr. presidente do conselho é sempre cortez, o que aliás constituo um dever; e cavalheiroso, o que já e uma qualidade de distincção; e é tambem generoso e largo nas suas complacencias, o que significa uma gentileza. Mas estes predicados, levados ao excesso, produzem na politica resultados deploraveis, e quasi sempre mais funestos, que os provenientes dos defeitos oppostos. O sr. presidente do conselho, para ser mais do paiz, devia ser menos dos seus amigos, ou que como taes se inculcam.
Não se calcula a nefasta influencia d'esta formula os nossos amigos, e o quanto ella tem concorrido para a desorganisação dos serviços públicos, para a ruina das finanças, para a desordem na administração, e para os desacertos de toda a especie, de que enferma a politica portugueza!
Por causa dos nossos amigos collocam se dobradiças nas secretarias e repartições, promulgam-se organisações luxuosas e absurdas, e decretam-se longas listas de aposentações e reformas escandalosas.
Por causa dos nossos amigos tira-se o pão a uns pobres diabos desamparados, perseguem-se empregados honrados, e investem-se no exercicio de melindrosas funcções individuos foragidos á justiça criminal.
Por causa dos nossos amigos põem-se os adversarios fóra da lei, sophisma-se-lhes e rouba-se-lhes o exercicio dos direitos politicos e, o que é peior, não raro se lhes atropellam e usurpam os mais sagrados direitos civis.
Por causa dos nossos amigos construem-se caminhos de ferro com directrizes absurdas, como são quasi todos que ahi temos; traçam-se estradas nas mesmas condições, e emprehendem-se obras loucamente despendiosas, que não podem compensar nunca a perturbação que causam, pelos encargos que custam, nas finanças do estado, e no movimento economico do paiz.
Por causa dos nossos amigos fazem-se violências como as que o telegrapho nos communica de Valle Passos...
O sr. E. Coelho: - Peço a palavra para um negocio urgente antes de fechar a sessão.
O Orador: - Annulla-se uma eleição regularmente feita, e nas vesperas de nova eleição faz-se uma divisão arbitraria das assembléas eleitoraes; deixam-se em liberdade os desordeiros e sem protecção os cidadãos pacificos, e depois vêem os telegrammas informar que correu o sangue e que lá ficaram uma ou mais victimas estendidas, tudo para consolo, gloria, e despojos opimos da victoria dos nossos amigos. (Vozes: - Muito bem.)
E note v. exa. que eu com isto não me estou referindo sómente á situação dominante; estou fazendo a synthese da politica geral portugueza, abrangendo tudo e todos. Podem os quinhões de responsabilidade não ser iguaes, e não o são por certo, mas a situação geral é como a descrevo. Nem o mal seria tão funesto, se não fosse tão vasto e tão profundo. Generalisando assim a minha critica, supponho que terei conquistado d'esse lado da camara (apontando para as Lançadas da maioria), senão um assentimento completo ás minhas palavras, pelo menos o reconhecimento de que exprimo conscienciosamente uma convicção intima. (Apoiados.)
A verdade é esta. E se um espirito analysta, da força de Balzac, se lembrasse de escrever a Physiologia da politica, tenho como certo que elle acharia n'esta formula os nossos amigos assumpto para largos e interessantissimos capitulos.
Esta formula é um ruim legado do antigo jacobinismo partidario. Mas, n'esses tempos, comprehendia-se. Os partidos andavam sempre em guerra armada. Os raros intervallos de descanso eram preparativo para novas luctas. Os nossos amigos eram a antithese dos nossos inimigos. Tudo em favor de uns e tudo contra os outros. É a lei das batalhas, onde muitas vezes se fuzilam, sem piedade, individuos que affectuosos sentimentos deviam unir, e até parentes muito chegados.
As luctas sangrentas acabaram para nós em 1852. Mas a escola politica, que ellas crearam, dominou ainda por muito tempo, e não está ainda totalmente extincta, porque só agora começam a ter preponderancia na direcção dos partidos as gerações que vieram depois das contendas civis.
A formula nossos, amigos é um resto desse jacobinismo. Com a differenca, aliás importante, que não tem hoje, como correspondência e attenuação, as dedicações e abnegações heroicas, a fraternidade cordeal, e a grandeza dos sacrificios que então a acompanhavam.
Quando hoje se falla, com ares torvos, em corrupção, em falta de crenças e de princípios, em acalmnções ou conciliações condemnaveis, mais se obedece ao velho jacobinismo intransigente, do que se segue uma apreciação verdadeira. Sem querer, por fórma alguma, que se baralhem os partidos, ou que os interesses de uns e outros se misturem, convem todavia ter em consideração a influencia dos factos, que successivamente têem amaciado as separações e os attritos resultantes das divergencias partidarias. O antigo jacobinismo intransigente não o tem hoje rasão de ser. (Apoiados.) E não deve ser, para não se falsear a conveniente direcção da politica. (Apoiados.)

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Ora, assim como desappareceram já os velhos odios, e vão desapparecendo os ferrenhos antagonismos contra os nossos inimigos, é necessario que desappareçam tambem as complacencias exageradas, a sujeição cega e o apoio decidido a todas as exigencias e caprichos dos nossos amigos. (Apoiados.) A politica das complacencias exageradas em favor dos amigos é parceira da politica do facciosismo contra os adversarios, e uma e outra são por igual funestas á boa orientação dos partidos e á boa governação do estado. (Muitos apoiados.)
Póde ser que n'isto, que venho dizendo, haja uma tal ou qual abjuração de doutrinas antigas, e penitencia por passados erros. Se ha, o que não contesto, dou-me por contente em poder hoje fazer confissão da culpa e protestar mudança de rumo.
O conflicto entre Braga e Guimarães, que ameaça entrar no periodo da irritação febril, teve e tem ainda como estimulante a formula os nossos amigos.
Na sua origem ainda é peior do que isso, porque o plural uca reduzido a um singular pouco agradavel. Em vez dos nossos amigos, achamos, como rasão determinante do procedimento do governo, o nosso amigo. E que amigo!
Não sei muito bem como hei de entrar n'este capitulo especial, que é escabroso. Todavia, necessario é que entre, porque a politica seria uma cousa muito miseravel, se, tendo liberdade para certas fraquezas, não tivesse energia para certas censuras. Procurarei sair de dificuldades com o auxilio de alguns circumloquios.
O sr. presidente do conselho não é um litterato, porque desde a sua mocidade teve de dar-se a estudos de administração publica. Mas o sr. ministro da marinha, que padece muito d'aquella doença, suggeriu-lhe talvez a idéa de fazer na politica uns ensaios de Renascença, como se fez nas bellas artes, e em outros ramos da cultura do espirito humano. Assim como Boito poz a Renascença em musica no seu Mephistopheles, assim o sr. presidente do conselho quiz pôr no governo civil de Braga uma Renascença dos costumes antigos.
Levado por esta ideia, o sr. presidente do conselho despiu a sua farda, sempre correcta, despojou-se da sua sobrecasaca, sempre fidalga, por sentir appetites de se entrajar com a toga dos imperadores romanos. É um traje magestoso.
Houve em Roma um imperador, chamado Nero, que mandou incluir o seu macaco no numero dos deuses.
Outro imperador famoso, Calligula, nomeou o sen cavallo consul. Mas Nero, que era um espirito superior, um grande artista - pelo menos assim o pintam alguns historiadores que se incumbiram caridosamente de lhe rehabilitar a memoria - procedeu assim, certamente por ter uma intuição, ainda que vaga, das doutrinas de Darwin. Sendo o macaco o pae commum dos homens, não ficava mal entre os deuses. (Riso.)
Calligula, que ainda não achou quem o rehabilita-se para a historia, tambem merece desculpas. Porque em sumiria, tanto na antiguidade, como nos tempos modernos, têem sido nomeados consules pachydermes menos nobres do que o cavallo. (Riso.)
(Com vehemencia.)
Mas nem Calligula, nem Nero escolheram para essas exaltações o porco!
(Sensação.)
(Pausa.)
Era isto o que o sr. ministro da marinha (só como litterato que é) devia ter explicado ao sr. presidente do conselho, se s. exa. se deixou dominar pela phantasia de fazer na politica uma evolução da Renascença romana.
Talvez fosse phantasia litteraria. O sr. presidente do conselho, apesar de absorvido em cuidados pela governação publica, não deixa de ler os bons livros. Um dos melhores livros, senão o mais profundo e brilhante, que Victor Hugo escreveu, foi o que tem por titulo William Shakespeare, e que serve de introducção á traducção das obras do grande tragico inglez.
N'esse livro, Victor Hugo falla dos genios, que são, no mundo dos espiritos, como no mundo physico, as grandes montanhas. Todas ellas topetam com as nuvens, estão em contacto com os céus, e conversam com os astros, qualquer que seja a sua estructura e constituição, em qualquer latitude, que estejam situadas. Todas ellas, quando se contemplam de longe, alvejam com as neves eternas, que scintillam, reverberando feixos de luz, que cegam os olhos miseros, e que só as aguias podem afrontar impavidas.
Victor Hugo falla assim de Homero, a poesia immensa, Eschilo a tragedia titanica, Juvenal o látego sibillante, Tacito o ferro em brasa da historia, Dante a epopeia dos espectros, Miguel Angelo a idealisação gigantea da humanidade e de outros. Entre estes, inclue Ezechiel...
O sr. ministro da justiça sorri-se! É que já percebe!
A Ezechiel chama Victor Hugo le porc prophéte, o porco propheta. E diz que elle é sublime, porque ingeria no estomago o que os magnates do seu tempo tinham na alma.
Quiz acaso o sr. presidente do conselho, por uma phantasia litteraria, arranjar tambem para interprete da sua lei, para oráculo dos seus principios, para vidente e guia do seu partido um propheta assim?! Se tinha a immundicie, faltava-lhe o genio!
Oh! Mas a litteratura, com ser uma dama de muito mais pudor e recatos que a politica, tem liberdades e arrojos, que a politica não póde ter.
Victor Hugo podia escrever aquellas palavras, como escreveu outra ainda mais arrojada a respeito de Waterloo; mas o sr. presidente do conselho é que não podia sem desdouro levar á assignatura regia o decreto da nomeação d'aquelle governador civil. (Apoiados.)
O antigo governador civil substituto de Lisboa, demittido... por irregularidades na sua representação exterior, só podia ser propheta em Braga com as trapagens da procissão dos farricôcos; mas, como governador civil, nem em Braga nem em parte alguma. E a nomeação de um tal individuo para um tal cargo é que foi a origem primaria do conflicto que todos deploramos. (Apoiados.)
Detestavel litteratura, e, em todo o caso, depravada politica essa, que suggeriu e resolveu uma tal nomeação!
O que havia a esperar de uma tal auctoridade? Se os precedentes conhecidos, se um desprestigio completo, se uma carencia absoluta do senso moral podem dar garantias de boa administração n'um districto, então mudemos os nomes ás cousas, e refundamos o codigo das leis moraes.
Succedeu o que devia succeder. O governador civil começou por ser um elemento dissolvente entre os amigos politicos do governo, e acabou por ser um instigador da desordem, que originou o conflicto gravissimo, de que nos occupâmos !
E este governador civil, depois de tudo isto, só é demittido porque elle proprio se digna pedir a sua demissão! E pede-a, declarando que procede assim por muito bem o querer, e que o governo ainda demorou por vinte dias a satisfação a este pedido! Não queria desfazer-se de tal prenda! (Riso.)
Elle tinha dito numa carta, celebre como documento de ira dementada, que havia de ser governador civil emquanto quizesse, e que o sr. presidente do conselho preferia perder tudo a perdei-o a elle! Pois esta vergonha, esta aberração, este atrevimento de insania, confirma-se ser uma verdade! Que grande tristeza isto causa! (Muitos apoiados.)
Oh! srs. deputados, aqui ha alguma cousa de extraordinario! (Muitos apoiados.) Estas anomalias, que não estão á altura do governo actual, porque não estão á altura de nenhum governo, só podem explicar-se rasoavelmente por uma causa mysteriosa. Confesso que o meu espirito hesita entre esta explicação, e a que attribue tudo a um

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exagero de complacencias por parte do sr. presidente do conselho, como ha pouco disse.
Ha um homem que devia reputar-se perpetuamente inutilisado para exercer um cargo publico, e esse homem é nomeado governador civil; desencadeiam-se todas as iras contra elle; a junta geral e as camaras municipaes dão-lhe votos de censura; os deputados do districto pedem a sua demissão: e o governo, tão solicito em desfazer outros attrictos, rompe por tudo e contra todos, e não dá a demissão a esse homem!
Para o demittir, e preciso que elle se digne pedil-o. E o pedido é feito em condições taes, que constituem uma nova offensa para a dignidade do poder! (Apoiados.)
De tudo isto resulta, que aquillo, que a principio parecia uma lenda ridícula é hoje para muita gente uma convicção arreigada. A lenda consistia em se considerar o ex-governador civil de Braga, como possuidor de papeis ou segredos compromettedores, e que elle fazia valer como ameaça. Pois hoje, muita gente crê n'isso! E crê, porque é mais absurdo explicar os factos de outro modo.
Conta-se que o ex-governador civil costuma fallar em Braga com ares mysteriosos de um cofre, em que tinha guardadas varias joias e elixires preciosos. (Riso.) Graças á protecção inexplicavel do governo, o tal cofre converteu-se aos olhos do vulgo, primeiro, e depois aos olhos de muita gente boa, n'uma especie de boceta de Pandóra, que em se abrindo espalha a peste, (luso.) e que se não espalhará tambem a fome e a guerra, pelo menos deitará abaixo o governo e alluirá pela base as instituições. E assim diz-se, que o governo condescendeu com todas as exigencias do ex-governador civil, para elle não abrir a boceta (Riso.) e não fazer esses maleficios.
Isto tem um lado picaresco, que provoca a hilaridade dos meus prosados collegas, e á qual não posso de todo subtrahir-me; mas tem tambem um lado serio, que é o do decoro dos poderes publicos. (Apoiados.) E tem ainda um lado inexplicavel, porque é preciso que haja alguma cousa de extraordinário para que estes factos se realisem! (Apoiadas.)
Não ha outro meio de explicar esta situação violenta, que deve ter sido desagradavel para o governo, como lhe tem sido incommoda; não se concebe, por outra fórma, que um tal governador civil podesse converter-se, durante semanas e mezes, em pesadello affroutoso para um districto e para um partido inteiro, acabando por fomentar um conflicto, que póde ser de funestas consequencias, como já é de lamentaveis perturbações! (Apoiados.)
Existe um mysterio? O ex-governador civil de Braga possue effectivamente algum papel, que uma leviandade ou subtracção criminosa lhe pozesse nas mãos? Uma inconfidencia, uma indiscrição, um acaso tornou-o depositario de algum segredo, que não convenha se divulgue? Não o creio; não o quero crer. Mas se me engano, se a tal boceta de Pandóra não e só uma allusão caustica, exhorto o sr. presidente do conselho, em nome da fidalguia do seu cargo, em nome da fidalguia da sua pessoa, a que não hesite, nem tenha receios. Por mim e pelos meus amigos políticos lho juro: fecharemos os olhos, taparemos os ouvidos...
Uma voz: - É só preciso tapar o nariz.
O Orador: - Sim! Taparemos tambem o nariz, abafaremos todos os nossos sentidos, para nada sabermos do que se queira assoalhar. E toda a gente, que se preze, fará o mesmo! (Apoiados.)
Não tenha o sr. presidente do conselho o minimo receio de que a opposição vá facciosamente especular comas armas que possam sair d'esse tal cofre; porque a origem não seria sufficientemente limpa para que nós lhe dessemos a honra de as empregar contra o governo como armas de combate. Póde á vontade varrer esse lixo. (Apoiados.)
Eu tenho uma grande consideração pelo sr. presidente do conselho. E felicito-me poor as disposições mais serena e reflectidas do meu espirito me permittirem poder proferir estas palavras, que em parte valem como uma reparação. Fazendo-lhe esta justiça, faço tambem justiça anos todos e ao meu partido. Porque, em amesquinhar o sr. presidente do conselho, amesquinharia o paiz, a cujo governo durante tantos annos tem presidido, e os meus correlegionarios, que com tanta galhardia e esforço o combatem. Não direi que nesta lucta se tenha pugnado de um e outro lado com armas iguaes e rigorosamente constitucionaes. Mas, em todo o caso, é o sr. presidente do conselho um vulto, que na historia se não póde apagar, e a nós, que o guerreamos, fica bem o dizer, como e em verdade, que elle é ainda, entre os nossos adversarios, o que mais se avantaja como lidador. A preeminencia da posição, que occupa, é-lhe justificada pela preeminencia dos seus dotes pessoaes. Tenho, por isso, uma grande consideração pelo sr. presidente do conselho; e é inspirado n'esse sentimento, pelo muito que me doe uma fraqueza offensiva da dignidade da sua pessoa e do seu cargo, que eu, cordealmente, lealmente, sem intenções reservadas, sem proposito que não seja franco e honrado, lhe digo: varra esse lixo! Varra esse lixo!
Espero que assim succeda. E sobretudo supplico ao governo que se poupo e nos poupe a uma ultima ignominia. Que não vá o governador civil demittido de Braga ser transferido para outro districto!
O que tenho exposto á camara prova á evidencia que o governo, com um simples decreto, o da demissão do governador civil, podia ter suffocado á nascença o conflicto entro Braga e Guimarães. (Apoiados.) E esse decreto, só não lhe era exigido havia muito tempo pela dignidade do poder, porque, antes d'essa demissão, ella exigia, que não tivesse havido nomeação. (Apoiados.)
Podia continuar n'este capitulo, mas não quero. E releve-me a camara de o ter feito tão extensamente, e ás vezes com alguma dureza. Assim era preciso para fixar bem as responsabilidades do governo. Nada ha que o absolva! Nada ha que o desculpe!
E se por desgraça as paixões se exacerbarem até o ponto de correr sangue, como poderá o governo apagar em suas mãos essa nodoa tremenda e terrivelmente accusadora? Pois é para ahi, que as cousas se encaminham!
Depois d'este peccado original, fonte primaria de toda esta desordem e do aggravamento do conflicto, vieram os compromissos com os nossos amigos. Então, entrou em scena o plural. Terriveis amigos são esses, que às vezes, por intransigências do orgulho e de vaidade irritada, fazem o que por falta de entendimento fez o urso da fabula! Esmagam a cabeça ao amo. N'esta phase da lucta, o governo tomou para si o papel de judeu no Mercador de Veneza. Fez um pacto leonino, resgatando o governador civil, cuja demissão todos lhe pediam e estipulou para resgate a mutilação do districto de Braga. Pensou que podia ir por diante por ter em si o poder e a astucia. Mas a justiça vale mais do que isso. Shylock tambem foi vencido pela justiça! Braga, que estava quieta, alvoroçou-se, protestou, reagiu, e mais ha de reagir, se tentarem levar por diante um projecto, que, alem do desconcerto administrativo, é para ella, nos termos em que foi apresentado, um castigo, e portanto uma injuria e uma offensa. (Apoiados.) Braga protesta, Guimarães insiste, e o governo, mettido n'um bêco sem saída, não sabe para onde voltar-se, nem como desenvencilhar-se da meada, em que se enredou. O que resultará de tudo isto? Não o sabe o governo, mas, seguramente, nada resultará de bom.
O sr. ministro do reino, parece ter indicado como expediente salvador a ampliação aos concelhos e districtos do decreto de 1869, que permitte as desannexações das freguezias, quando nesse sentido requeiram dois terços, pelo menos, dos seus habitantes.
(Siynal negativo do sr. ministro do reino.)
O nobre ministro diz-me que não indicou esse expediente. E muito estimo que assim seja. O decreto de 1869, que não foi favoravel para o bom regimen parochial, me-

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nos o poderia ser para a administração dos municipios e dos districtos, se a elles fosse ampliado. A primeira consequencia seria generalisar-se a desordem.
O conflicto, que hoje existe, entre Braga e Guimarães, estender-se-ía a outras terras. (Apoiados.)
Uma parte do districto de Vianna pediria para ser annexada a Braga; Alcobaça e Caldas da Rainha quereriam sair de Leiria; Thomar pediria para separar-se de Santarem, e assim por diante por motivo dos antagonismos existentes.
O proprio concelho de Guimarães seria retalhado. As freguezias, que hoje constituem a região das Taipas, sustentam com fervor o projecto da desannexação do concelho de Guimarães. Mas não se pense, que é por solidariedade de aggravos e de destinos! Muito ao contrario. Assim como a cidade de Guimarães accusa Braga de a não contemplar equitativamente na repartição dos beneficios districtacs, assim as freguezias das Taipas, onde havia nascentes thermaes de grande nomeada, accusam a camara municipal de Guimarães de as ter deixado cair no mais lamentavel abandono, concentrando o auxilio e todos os favores nas caldas, rivaes, de Vizella. E querem a desannexação do concelho, com o pensamento reservado de pedirem depois a sua constituição em concelho autonomo, ou a sua annexação ao concelho de Braga. Com Guimarães e Vizella é que nada querem. (Apoiados.)
Isto, que conto á camara mostra por outro lado quanto estas questões são pequenas para estarmos consummindo com ellas um tempo precioso. (Apoiados.) O conflicto entre Guimarães e Braga não é, na sua essencia, mais importante, e é, talvez, muito menos justo, que a animosidade entre as Taipas e Vizella. E é para isto, para discutir estas questiunculas, que nós aqui estâmos? (Apoiados.) O parlamento não é para isto; as preoccupações do governo não podem ser para isto; e direi tambem que o paiz não está para isto. (Muitos apoiados.) Lamentavel é que, parecendo estarmos todos de accordo n'este ponto, nos vejamos obrigados a discutir o que não merecia ser aqui discutido, e que os erros accumulados pelo governo tornem grave o que não devia ter passado de um incidente insignificante. (Apoiados.) Tudo vem da palavra levianamente empenhada. Uma questão local, facilmente resoluvel, transformou-se por esse modo n'uma grave e embaraçosa questão de governo! (Apoiados.)
Srs. deputados. O pensamento da minha moção é que o governo resolva de prompto o conflicto, se é que o póde resolver, para a camara se occupar de assumptos mais momentosos, e em especial da quentão da fazenda, que é urgente, em harmonia com a promessa feita no discurso da corôa.
Disse-se que esta sessão seria principalmente, quasi exclusivamente, destinada á discussão e exame de providencias de ordem financeira e administrativa. Em vez dessas propostas, que ainda não appareceram, foi apresentado aqui o projecto para desannexação do concelho de Guimarães. E, de accordo com o governo, pediu-se a urgencia para esse projecto. Quereriamos discutir finanças o administração. Mas temos de discutir o que só nos deram : um projecto irritante, que mais aggravou o conflicto, que os desacertos do governo tinham feito nascer. (Apoiados.) As culpas do governo accumulam-se, e o tempo vae-se desperdiçando com grave damno para o paiz. Urge que se restabeleça a ordem no Minho e simultaneamente a boa direcção nos trabalhos parlamentares. (Apoiados.)
De todos os ministros eu creio sinceramente que o da fazenda é aquelle a quem, neste momento, esta questão interessa mais. Creio piamente, que elle desejaria muito que ella fosse escolho mortal para o governo, a fim de por esse modo se eximir a apresentar o orçamento rectificado e as propostas de fazenda, que hão de ser o seu calvario. (Apoiados.)
Sou um admirador sincero dos altos dotes do sr. ministro da fazenda. S. exa. conquistou com brilhante denodo o logar que occupa. Tem feito uma carreira distinctissima, e afirmado qualidades de governo superiores a todo o elogio. (Apoiados.) n'um espaço de tempo, relativamente curto, como é o da sua vida parlamentar, não se vão mais longe, nem se vae mais alto. (Apoiados.) Por isso mesmo, mais ha de sentir ver-se em perigo imminente de naufragio.
As responsabilidades financeiras são de todo o governo, mas recaem principalmente sobre o ministro que gere a respectiva pasta. E ellas são terriveis! Apesar de muito ousado e valoroso, o sr. ministro da fazenda estou certo que treme diante d'ellas.
Não está na nossa mão escurecer e attenuar o poder inflexivel dos factos. Esta questão do conflicto entre Braga e Guimarães teria surgido muito a proposito como diversão favoravel para o governo, se as circumstancias fossem outras. Mas as circumstancias são inexoraveis!
Os nossos fundos estão a 431/2, a divida fluctuante está em 12.000:.000$000 réis, e no fim do anno civil estará em perto de 20.000:000$000 réis. (Apoiadas.) O emprestimo de 1884 acha-se em carteira, porque os tomadores, para o collocarem, teriam de soffrer avultado prejuizo. O deficit vae caminhando para 10.000:000$000 réis, e a situação geral ha de aggravar se com os encargos das obras, que estão delineadas ou em execução. Não podemos esperar que nos venham recursos do Brazil, porque o cambio continua desfavoravel, e não deve-nos descansar na confiança de termos um novo anno abundantissimo em colheitas. Tudo isto, e o muito que omitto e que a vossa intelligencia suppre, quer dizer que é muito grave a questão de fazenda, e que não é desafogada a situação economica do paiz.
Isto, senhores, é muito mais serio do que o conflicto entre Braga e Guimarães. (Apoiados.)
Faço, portanto, votos para que o governo resolva o mais promptamente possivel este assumpto, a fim de podermos entrar desembaraçadamente no exame da questão de fazenda, e das outras questões correlativas.
Vou concluir.
A minha moção não tem, nos sen s dizeres, nenhuma significação politica. Traduz um pensamento, que supponho ser pensamento de toda a camara. Está perfeitamente dentro da letra e do espirito do discurso da coroa, que é o programma ministerial.
Sem embargo, não espero que ella seja approvada, porque a fundamentei em considerações que não são anodynas. Todavia, se a moção não pode ser approvada, que seja. seguido o pensamento que ella traduz. Assim o pedem os mais sagrados interesses públicos. (Apoiados.)
Conta-se que um glorioso general, vencedor de Annibal, sendo accusado no forum pelos seus inimigos, desviára desdenhosamente a accusação, dizendo: «Romanos! vamos ao Capitolio dar graças aos deuses, porque faz hoje um anno que salvei Roma!» E o povo seguiu-o, acclamando-o. O governo não tem glorias de vencedor que adduzir, e o povo não tem pelos serviços d'elle acções de graças que dar; mas precisâmos tambem de deixar a praça e de ir ao templo... a implorar para os nossos desatinos um raio de luz salvadora, e para os desastres imminentes o favor da divina misericordia!
Vozes: - Muito bem.
(O orador foi muito comprimentado.)

Leu-se na mesa a seguinte:

Moção de ordem

A camara, desejando que o conflicto entre Braga e Guimarães se resolva de prompto, para poder desembaraçadamente occupar-se da questão de fazenda, passa á ordem do dia. - Emygdio Navarro.
Foi admittida.

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O sr. Ministro do Reino (Barjona de Freitas: - Sr. presidente, a muita consideração que tenho pelo illustre deputado que acaba de sentar-se obriga-me a tomar a palavra ainda n'este debate, quando eu aliás sou da opinião de s. exa. de que a causa publica não ganha muito em que elle se prolongue depois das explicações dadas per um e outro lado da camara. (Apoiados.)
É bom que se esclareçam todos os assumptos, sobre tudo os que, ou possam envolver as responsabilidades do governo, ou affectar mais ou menos a ordem publica; mas, uma vez dados esclarecimentos de lado a lado da camara, uma vez habilitada a camara e o paiz a formarem o seu juízo sobre o procedimento do cada um, nós podiamos, me parece, passar adiante, porque não são pequenos nem de pouca monta os trabalhos que temos de emprehender. (Apoiados.)
Estou, pois, de accordo com o illustre deputado n'este ponto.
Direi apenas que nós, governo, não temos culpa de não caminharmos para diante, visto que esta questão não foi levantada por nós, mas pela opposição. (Apoiados.)
Está na ordem do dia a resposta, ao discurso da corôa, o primeiro documento que a camara teria de votar, segundo o estylo e segundo as praxes.
A questão do que se trata agora foi levantada antes d'ella, e nós que estamos aqui, não nos podiamos retirar diante das explicações e dos esclarecimentos que pedia a opposição.
Tendo sustentado o debate, dando esses esclarecimentos e essas explicações, tomos cumprido o nosso dever: (Apoiados.) e não temos a responsabilidade do mais cedo se não ter entrado em outros assumptos, aliás importantes. (Apoiados,)
O illustre deputado que acaba de sentar-se fallou, e eu gosto de fazer justiça a todos, mesmo aos meus adversarios, sendo um facto que nunca a neguei a ninguem, n'um tom de imparcialidade que, a dizer a verdade, podia incommodar mais o governo do que as vezes a paixão acerba e vehemente, que não prova senão o estado de espirito de um ou outro deputado.
Toda esta imparcialidade deriva de algumas phrases apresentadas pelo illustre deputado, no meu entender justissimas, mas nem sempre!...
Disse o illustre deputado que o governo tinha creado este conflicto! O governo era o auctor de todos estes males, e attribuiu o illustre deputado ao governo a origem d'esse conflicto. Mas não podendo escapar-se completamente ao espirito partidario, e ao meio em que se encontra envolvido, attribuiu ainda ao governo a culpa d'esta quentão não ter morrido no começo, e a culpa era porque o governo não tinha demittido o governador civil de Braga!
Este ponto affecta essencialmente a responsabilidade do governo, e o governo é obrigado a dar resposta peremptória.
O governo não creou o conflicto entre Guimarães e Braga. Toda a gente sabe e para que o estamos a occultar, que a rivalidade entre as chias cidades é antiga, que os pretextos e motivos de resentimento a que se attribue essa rivalidade vem de longa data, posto que agora se manifestem mais abertamente.
O governo não creou o conflicto, mas o illustre deputado imaginou que elle poderia ter acabado se porventura tivesse dado a demissão ao governador civil de Braga.
Vejamos se os factos são estes, se os factos podem demonstrar que esse devia ser o caminho a seguir, e que o governo poderia ter destruido completamento esse conflicto se tivesse seguido a indicação de s. exa.
A camara e a junta geral de Braga, lamentando os acontecimentos que se tinham dado entre alguns cavalheiros de Guimarães, deu um voto de censura ao governador civil. Isso que prova? É que havia cavalheiros de Braga que estavam descontentes com o governador civil de Braga; e a questão e com Guimarães!
Peço a attenção do illustre deputado para este ponto. Não se póde dizer que as censuras dirigidas por as corporações administrativas ao governador civil demonstrassem plenamente que Guimarães se sentia aggravada com o governador civil.
Mas ha mais alguma cousa, e peco licença para apresentar á assembléa estes factos, que não podem ser contestados.
Em Guimarães nunca se pediu a demissão do governador civil de Braga, e disse-se sempre, que quer fosse demittido, quer fosse conservado, queria ser desannexada do districto de Braga e annexada ao do Porto. (Muitos apoiados.)
Procedeu logicamente nos seus intuitos, que não estou aqui a discutir e que hão de ter discussão noutra occasião.
Guimarães não podia fazer depender a sua conservação no districto de Braga, de ter este ou aquelle governador civil: a sua pretensão era a desannexação do districto de Braga; qualquer que fosse a auctoridade superior do districto, essa ou outra, desejava realisar a desannexação e nunca pediu a demissão do governador civil de Braga.
Mas ha mais alguma cousa.
Veiu aqui uma commissão de cavalheiros de Guimarães, esses cavalheiros fallaram com o governo, e o governo já aqui declarou o que disse a essa commissão.
E aproveito esta occasião para me dirigir ao meu illustre amigo o sr. Franco Castello Branco, que pareceu ver uma certa discordancia, entre aquillo que elle julgava ter ouvido ser dito por parte do governo aos cavalheiros de Guimarães e as minhas palavras n'esta casa.
Creio que essa discordancia não existe, e que o que póde haver é talvez um equivoco, da parte do illustre deputado, proveniente de s. exa. confundir as declarações do governo á commissão de Guimarães com os motivos. que o governo tinha para dar a resposta que deu.
Não sei segue explico bem, mas se for preciso fazer alguma rectificação, no sentido de apurar a verdade, não tenho duvida em a fazer, porque procedo sempre em harmonia com os dictames da minha consciencia. O que declarei á commissão de Guimarães é o que declaro aqui, e em toda a parte, porque não occulto a verdade a ninguem.
Mas dito isto, essa commissão veiu aqui, fallou com o governo: o governo tratou de averiguar o que queria essa commissão de Guimarães, o que Guimarães pretendia.
Guimarães não pediu nunca a demissão do governador civil! Quer o governador civil fosse demittido, quer não, Guimarães o que pedia era ser desannexada de Braga e annexada ao Porto. (Apoiados.)
Como é, pois, que o governo podia ter acabado com este conflicto, só demittisse logo o governador civil de Braga? (Apoiados.)
E peço licença para dizer ao illustre deputado, que não basta que haja em qualquer districto alguns cavalheiros descontentes com a auctoridade administrativa, para que o governo deva immediatamente apressar a demissão d'essa auctoridade; o governo precisa de informar-se, para não sacrificar levianamente as suas auctoridades administrativas, porque n'isso sacrifica tambem a sua auctoridade moral, a todos os caprichos e a todos os resentimentos, sem primeiro ter averiguado se esses caprichos e esses resentimentos têem fundamento no interesse publico e nos bons principios de administração. (Apoiados.)
Foi o que fez o governo, quiz averiguar primeiro, não quiz sacrificar ninguem, qualquer que fosse a auctoridade administrativa, ás difficuldades que se levantavam no districto, por parte de alguns cavalheiros, aliás amigos do governo, nossos amigos, na phrase do illustre deputado; quiz averiguar, repito, se effectivamente as queixas eram justificadas e se tinham ou não fundamento nos bons princi-

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pios de administração. Nada mais, nada menos. (Apoiados.)
E agora duas palavras a proposito da phrase apresentada pelo illustre deputado, e sem animo de censurar ninguem, porque s. exa. disse com a maior imparcialidade que esta phrase, os nossos amigos, tinha dominado differentes situações de procedencias politicas diversas, e que elle mesmo não duvidava penitenciar-se de qualquer parte de responsabilidade que possa ter n'essa phrase os nossos amigos, phrase que era preciso arredar-se da politica portugueza.
Mas vejamos bem, eu entendo que a justiça não tem amigos, é igual para todos; (Apoiados.) entendo que a auctoridade tambem os não póde ter e que deve manter as leis, fazer executal-as, fazer manter a ordem, respeitar a liberdade e os direitos de todos os cidadãos.
O que eu acho mau em qualquer situação politica é que se sacrifiquem os bons principios em favor dos amigos, sempre com a idéa de perseguição aos adversarios. Se ha situação que não possa ser accusada de ir por esse caminho do parcialidade, é decididamente o partido regenerador. (Apoiados.)
O illustre deputado sabe que foi exactamente para acabar com esse systema de ser exclusivamente pelos nossos amigos contra os nossos inimigos, que se levantou a bandeira da regeneração, a bandeira de tolerancia para com os adversarios.
É possivel que se possa ter abusado ás vezes d'esses principios de tolerancia, que haja complacencias, que possam ser mais ou menos condemnaveis.
O illustre deputado deve lembrar-se de que os governos são representados por homens, e os homens são falliveis. Mas, entre os dois perigos, de ser sempre implacavel contra os adversários, e ser sempre tolerante para com todos, permitta-me o illustre deputado que, apesar de qualquer exageração, eu seja antes deste partido que do outro. (Vozes: - Muito bem.)
Dito isto, parece me que tenho convencido a camara, ou pelo menos tenho procurado convencel-a, e essa é a minha obrigação e a minha convicção, de que, qualquer que fosse o procedimento do governo em relação á auctoridade administrativa, nada tinha evitado em relação ao conflicto que se deu entre Braga e Guimarães. Não foi o governo que creou o conflicto, nem foi a auctoridade administrativa.
Toda a gente sabe que o conflicto originou-se da opposição que alguns cavalheiros de Guimarães fizeram na junta geral á creação de algumas cadeiras no lyceu de Braga. Levantou-se indisposição contra esses cavalheiros, e d'ahi resultaram os deploráveis incidentes que todos nós conhecemos. Esta foi a origem do conflicto. Os cavalheiros de Guimarães queixaram-se ao governo, e este immediatamente mandou um telegramma ao governador civil, perguntando qual era a causa d'esses deploraveis acontecimentos, ordenando-lhe que tomasse todas as providencias indispensaveis para que fosse mantida a esses cavalheiros a liberdade da sua opinião e o exercicio dos seus direitos, e assim o communicou o governo em telegramma a um d'esses cavalheiros de Guimarães, para o participar aos outros.
A auctoridade superior disse áquelles cavalheiros do Guimarães que podiam ir a Braga quando quizessem, porque estavam tomadas todas as providencias para que lhes fosse garantido o exercicio dos seus direitos, e que estivessem certos de que áquelles incidentes não se repetiriam. Esses cavalheiros entenderam que não deviam lá voltar, ou porque desconfiaram que taes actos se podessem repetir, ou porque entenderam que aquillo era base sufficiente, ou antes um pretexto seguro para pedirem a desannexação de Guimarães do districto de Braga.
Qualquer que fosse a causa, o que é certo é que por parte da auctoridade administrativa e por parte do governo se deram a esses cavalheiros todas as satisfações e seguranças de que podiam continuar a exercer livremente em Braga o seu direito, e a manifestar livremente as suas opiniões.
Portanto nada mais havia a fazer.
Eu já hontem expliquei á camara qual tinha sido o procedimento do governo, qual era a rasão por que dividiu em dois períodos e não em tres, como o illustre deputado queria dividir, a questão, sendo o primeiro aquelle em que o governo devera ter sacrificado a auctoridade superior do districto.
Eu já declarei que tal sacrificio não servia para nada. Daria satisfação a alguns cavalheiros de Braga, mas não daria satisfação aos cavalheiros de Guimarães.
Parta o illustre deputado d'este principio, quando eu tiver a convicção de que uma auctoridade procede mal, o sobretudo se ella ataca ou offende os direitos, sejam do quem quer que for, perturba a ordem ou de algum modo procura minar ou attentar contra as liberdades publicas, creia o illustre deputado que eu, sendo ministro, não o sustento nem um dia. Póde uma auctoridade ter defeitos, porque infelizmente ninguem é perfeito n'este mundo. E lembra-me uma phrase do um amigo meu, que me dizia muitas vezes, quando eu estava no ministerio da justiça, fallando dos defeitos do uns certos funccionarios: «é que nós não temos outros portuguezes». (Riso.)
Mas, dizia eu, é possivel que uma auctoridade tenha defeitos, e n'este caso nem sempre por qualquer defeito a auctoridade deve ser demittida da missão que lhe foi confiada; porém quando essa auctoridade abusa do seu logar e tenta contra os direitos de alguem, creia o illustre deputado que não a sustentarei nem mais um dia. (Apoiados.)
Outra circumstancia, para que chamo a attenção do illustre deputado, o é que eu estando a defender a auctoridade superior do um districto, estou defendendo só como auctoridade, porque a minha responsabilidade só póde ser tomada n'este sentido; não discuto nem tenho costume do discutir as pessoas. Discuto unicamente as auctoridades, (Apoiados.) auctoridade que não é moderna, porque já tinha exercido este logar mesmo no districto de Braga, tendo sido nomeado pelo duque d'Avila, e nomeado exactamente por um ministerio que muitos dos meus adversarios apoiavam. (Muitos apoiados.)
Uma voz: - Isso foi antes da aventura.
O Orador: - Não sei a que o illustre deputado se refere e por uma rasão, é porque o meu espirito não é tão aventureiro como o do illustre deputado. Não corro atrás de aventuras. (Riso.)
Resta-me unicamente responder a uma observação feita pelo illustre deputado que acabou de sentar-se. S. exa. disso que o governo, referindo-se ao decreto do 1869 tinha manifestado a intenção de proceder talvez ao alargamento da divisão administrativa.
Posso assegurar que este não foi de modo nenhum o meu pensamento. Se o tivesse, dizia-o francamente. Se o governo visse n'isso um remedio vinha dizer á camara: o remedio que encontramos para resolver este conflicto entre Braga e Guimarães é este.
Mas não tivemos tal pensamento.
Quando eu alludi ao decreto do 1869 foi unicamente para mostrar que o governo não tinha procedido tão incorrectamente como se crê, na questão de Guimarães quando dizia aos de Guimarães, suppondo que havia completo accordo da parte de Braga, que não havia inconveniente administrativo em que pasmassem para o districto do Porto.
E esta pretensão de Guimarães tinha já o seu procedimento fundado, no decreto de 1869, a que me referi, porque esse decreto quando deixava dependente do pedido de duas terças partes dos eleitores de uma freguezia a desannexação para se unirem a outra, reconheceu implicitamente o principio da vontade popular, e essa vontade era a que se manifestava de um modo evidente em Gui-

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marães. Por consequencia, esse decreto affirmava de algum modo o direito allegado pelos representantes de Guimarães. Foi unicamente nesse sentido que eu fiz referencia as decreto de 1869.
Digamos a verdade. O illustre deputado referiu-se ao artigo da imprensa, escripto por s. exa., e eu tive o gosto de lel-o. Vi ali tratada a questão com a maior parcialidade. S. exa. tirou d'ahi argumento para dizer:
«Eu que tenho sido imparcial até aqui, vejo-me obrigado a accusar o governo, e não lhe quero crear embaraços, elle é que se metteu num beco sem saída, porque não sabe se se ha de encostar para o lado de Guimarães ou para o lado de Braga.»
A este respeito já tive occasião de dizer na ultima sessão que eu acho feliz a opposição porque já sabe para que lado se ha de encostar, tem o seu voto esclarecido, sabe que deve collocar-se ao lado de Braga contra Guimarães. O que sustento e sustentarei sempre é que uma questão desta ordem, que póde affectar a paz publica, nunca se deve decidir precipitadamente, porque a precipitação é a peior maneira de resolvel-a. (Apoiados.)
O que eu não sei é como o illustre deputado e os seus collegas imaginam que se póde acalmar a agitação levantada em Guimarães, que ainda hontem foi representada por um meeting numeroso, dizendo, nós somos contra vós porque não sois a favor dos interesses de Braga. Esperam que a força das baionetas vá esmagar a manifestação popular? Não sei que acalmação e pacificação seja essa. Seja como for, vejo-me obrigado a dizer que effectivamente a opposição até agora não tinha fallado n'este incidente. Já na ultima sessão perguntei porque seria. Seria porque estava á espera de saber qual era a opinião do governo? Não sei. Seria para se encostar ao mais forte? Não me parece que seja muito patriotico, e por isso que não imagino que seja essa a idéa da opposição.
A respeito d'esta questão li o que dizia um jornal de hontem, jornal que em tempo foi dado como órgão do partido progressista e não sei se ainda o é, porque hoje por parte d'esse partido ha uma completa ausencia de declarações e programmas, que eu aliás julgava absolutamente indispensaveis, por isso que, tendo elle passado por uma nova phase, e tendo um novo chefe, precisava definir as suas idéas actuaes, em vez de se ficar n'um silencio absoluto, maior do que no primeiro periodo da questão de Guimarães. (Riso.) Se esse jornal é orgão do partido, eu leio o que vi n'elle escripto... mas não leio porque não quero tornar responsavel ninguem pelo artigo...
Vozes: - Leia, leia.
O Orador: - Leio? Então é órgão do partido (Riso.) pois vale a pena ler.
Refiro-me ao Progresso. N'esse jornal dizia-se hontem o seguinte.
(Leu.)
Este periodo é realmente significativo. Os illustres deputados tomaram maior parte a favor de Braga; pediram explicações ao governo, o governo respondeu, e apesar do partido decidido que os illustres deputados tomaram por Braga, os de Braga parece que não ficaram muito satisfeitos, e este jornal, que é órgão d'aquelle partido, diz que Braga ficou socegada. Vejamos o que acontece em Guimarães, por isso que seguem a desordem em toda a parte, seja em Guimarães ou Braga.
Dizem: nós estivemos callados até agora, porque não queríamos crear embaraços ao governo, queriamos deixar-lhe livre a sua acção para resolver o assumpto.
Sinto que a opposição, e isto é uma apreciação minha, que tão bem tinha procedido, não possa continuar a merecer-me este elogio.
Vozes: - Muito bem.
(S. exa. não reviu as notas tachygraphicas dos seus discursos.)
(O orador foi cumprimentado.)
O sr. Luiz Jardim: - Sr. presidente, em conformidade ás praxes seguidas n'esta casa; começarei lendo a moção de ordem, que o meu dever me incumbe de enviar para a mesa.
(Leu.)
Vejo-me n'uma posição especial, em face do melindroso assumpto que tratamos. De um lado, o sr. Emygdio Navarro, combatente da opposição, proferindo um discurso todo de ordem e paz; do outro, um ministro da corõa, talento reconhecido, discursando de molde a avolumar a excitação dos ânimos, attentas as declarações que acaba de fazer.
O illustre deputado o sr. Emygdio Navarro engrandeceu o seu eloquente discurso de ditos espirituosos, de citações litterarias, de conceitos de muito sizo, e, convidando os animos á concordia, chamou a attenção da camara para a questão fazendaria.
O sr. ministro da corôa, culpado em tudo isto, porque ao seu desleixo administrativo se devem as iras reaccesas entre os dois povos do Minho, Braga e Guimarães, ousa, nesta conjunctura produzir declarações, a que não seria de mais chamarmos-lhes - incendiarias.
É ou não s. exa. o unico culpado d'este conflicto que rescalda ha dois mezes aquellas duas cidades, conflicto que os telegrammas de hontem e de hoje dizem ir se alastrando do centro dos dois concelhos às freguezias ruraes? Pois isto não representa realmente um estado de discordia, que por desgraça póde converter-se em desordem?
Na sessão anterior o illustre chefe do partido progressista, o sr. Luciano de Castro, provocou o governo a que desse explicações categóricas ácerca do conflicto levantado entre as cidades desavindas; que nos dissesse quaes as providencias que tencionava adoptar na pacificação dos ânimos excitados. Debalde foi a interrogação; e tão inúteis foram as instancias dos deputados, que proseguiram no assumpto, pedindo ao governo que declarasse o modo como havia de derimir a contenda dos descontentes.
O governo então, e ainda agora, furtou se a declarações precisas e claras, balbuciando apenas que não tinha por emquanto opinião definida. Que ao começo do conflicto se inclinara a favor de Guimarães, mas que depois, protestando Braga, ficara perplexo, e que em taes circumstancias não podia o governo resolver sob o influxo das paixões, e que nem o governo nem a camara poderiam tomar resoluções precipitadas.
Tal qual a resposta do governo! E esta foi ainda hoje a affirmação da dialetica armada do sr. ministro do reino. Mas que importa, se pela discussão se averiguou que ao governo competiam serias responsabilidade n'este conflicto, não só a começo, mas tambem no seu desenvolvimento?
Os deputados de Braga e os da opposição já convenceram a todos de que essa responsabilidade era gravissima; grave porque o governo alimentou o conflicto das duas cidades; e mais grave ainda, porque a sua resposta, nada resolvendo, prolonga a irritação dos ânimos. (Apoiados.)
Foi isto o que se averiguou na verdade dos factos; e foi isto o que os argumentos n'elles baseados vieram demonstrar; de modo que o governo, apertado nestas circumstancias, ou ha de responder, ou tem de se demittir.
Respondendo, daria signal de vida e força. Se não, é porque não tem auctoridade nem vigor, para resolver o conflicto creado: - demitta-se.
Mas o governo não se demitte, nem dá ingresso a outrem, que não creou compromissos ou responsabilidades, para que solva a questão. D'este modo, resta-nos tão sómente o direito de protestar.
O governo é o auctor d'este conflicto, logo é responsavel por elle.
E se o homem, na vida particular, é responsavel por seus actos, muito mais lhe é obrigação de o ser na via publica.

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Porque razão o governo creando este conflicto, o não resolvo? Quem lhe deu causa?
O seu desleixo administrativo, a sua nenhuma attenção pela auctoridade moral que deve revestir todo o funccionario publico, e a sua protecção a poderosos de competencia ignorada.
Foram estas as causas que deram logar ao conflicto e que o excitaram por maneira, que hoje se transformou em grave questão de ordem publica a que o governo não encontra remedio.
Porque, srs. deputados?
Levanta-se um conflicto entre alguns homens, aggridem-se nos jornaes, vêem aos corpos collectivos, invocam-se rasões, promovem-se meetings, revolvem-se as massas populares, e o governo não procede nem toma providencia alguma?
Ha quasi sessenta dias, que diante dos olhos do paiz admirado, se desenrolla este quadro extraordinario, por certo, de duas cidades importantes e sympathicas por tantos motivos, a degladiarem-se, e em cujo peito se vão atiçando os odios á proporção que se demora o remedio para o conflicto que as separa.
Ninguem outrem, senão o governo, é o responsavel por este estado violento que lhe accusa a fraqueza e a impossibilidade absoluta em que se afundou, de manter a ordem quando seja alterada.
São os seus actos que assim o juram.
Qual Cesar romano, que a um ou outro general do pretorio dava um governo longiquo, na Asia ou na Africa, a explorar, libertando-se d'esta maneira de temivel concorrente; assim o sr. ministro do reino, tambem Cesar, deu o districto de Braga ao sr. marquez de Vallada, para suffocar as ambições, tanto de respeito, d'aquelle magnate e procere! Libertou-se da palavra, auctorisada por certo, que lhe punha medos no animo; mas, á similhança d'aquelle sabio da meia-edade creador de um homunculo, é esse que o mata hoje, ao governo, enroscando-se a elle, e baqueando-se com elle em terra.
Quando o edificio do governo desabar em ruinas, logo que desfeita a grande poeirada, ver-se-ha o que ficou d'esta situação cheia de promessas, de sophismas, (como se sophismas fossem verdades)! cortada de palavras sonoras, de despezas avultadas, de reformas grandíloquas, de promessas constantes; o que tudo, na realidade das cousas, não medo uma acção, boa, antes, encobre uma conta de injustiças, que está pedindo a final liquidação.
Deixemol-as, por agora; que esta, a que sobresalta uma provincia, e que se vae alargando, como tudo, a que dão interesse, vida e convicção as paixões do povo. - que esta, digo, não é a somenos!
Sr. presidente, não desejo abusar da attenção da camara; e vou portanto, ser breve. Alem do que, eu sou respeitador dos srs. ministros, e o que eu protesto é contra a sua administração, da qual me cumpre, como deputado, pedir-lhes a responsabilidade.
Vejamos de como o governo deu nascimento ao conflicto; de que maneira lhe encaminhou os passos, e de que arte, ao crescer dessa questão em discordia, a ungiu dando-lhe a beijar, em premio, o sêllo da sua auctoridade.
Um dia, a 28 do novembro ultimo, honestos procuradores de Guimarães saíram da junta geral de Braga, por quererem abster-se de votar um melhoramento, por certo de interesso publico, mas que se lhes afigurava a elles oneroso para os concelhos do seu districto.
Ao partirem de Braga aquelles procuradores, insultaram-os com vaias, chufas, gestos aggressivos, levando-os, finalmente, á pedrada durante duas leguas!
N'uma cidade do outro qualquer paiz em que tal succedesse, ninguem poria duvida em que a auctoridade iria proceder. Pois em Braga, cidade distante, e onde regia um general de pretorio, a auctoridade deixou de proceder, como se o insulto fosse caso de pouca monta. (Apoiados.)
Fez mais, recebeu de boa sombra os arruaceiros e se congratulou com elles. (Apoiados.)
A camara, a junta geral, a imprensa periodica, e as pessoas sensatas e gradas de Braga, todos reprovaram as arruaças dos insultadores; aquelles a quem corria o dever e a obrigação de castigar os desordeiros, approvaram-lhes o seu procedimento; (Apoiados.) e o ministro que ha pouco havia louvado o seu proconsul administrativo, deixou tudo correr á revelia, e não tomou as necessarias providencias!
(Apoiados.)
Succede, porém, que esses procuradores eram representantes de uma cidade; e que esta, perfilhando a offensa que lhes tinha sido feita, resolveu pedir a sua desannexação da antiga metropolita das Hespanhas, cortando desde logo as relações officiaes com Braga, e durante um mez, sem que o governo tomasse qualquer medida de governação. (Apoiados.)
Aqui está um jornal do dia 30 de novembro, em que se diz que Guimarães ficaria contente com a demissão do governador civil. Pois este funccionario, sem prestigio por tantos e tantos motivos, e mais desauctorado ainda, por lhe haverem eleito, os proprios regeneradores, uma camara municipal contra a vontade d'elle...
(Interrupção do sr. José Borges.)
Apesar de tudo isto: o governo não aproveitou o ensejo para o demittir, conciliando assim os animos sobresaltados.
A junta geral do districto, já a 2 de dezembro, lançára na acta das suas sessões um voto de censura ao governador civil, por não haver elle tomado as providencias necessarias e repellido o acto aggressivo da populaça.
N'essa occasião igualmente todos haviam significado profundo sentimento pelo acto a que me estou referindo; e o governo, não só desprezou o ensejo, repito, para conciliar os animos; mas fez mais: quando depois os delegados de Guimarães vieram a Lisboa, affirmou-lhes que faria propria a sua causa, e que tomava o maior interesse em que ella fosse decidida consoante o desejo d'aquelles povos. Tenho aqui o jornal onde isto vem estampado. É uma folha de Guimarães, dizendo que os delegados, depois de terem fallado com o sr. presidente do conselho e com o sr. ministro do reino, voltaram á localidade a transmittirem essa declaração.
N'estas circumstancias, e coincidindo a affirmativa do governo com a apresentação do projecto do sr. Franco Castello Branco, n'esta casa, os habitantes de Guimarães não duvidaram que os poderes publicos estavam firmes em
patrocinar os seus desejos. (Apoiados.)
O governador civil já affirmou na camara alta haver mandado levantar um auto de investigação sobre os factos occorridos; não me consta, porém, a mim que elle o tivesse mandado para juizo.
A mim não me consta, repito, que o tivesse mandado: para juizo, nem conheço tão pouco quaes foram as penas impostas aos insultadores; se eram de injuria, de insulto, ou pelo crime de volta: emfim ignoro de que natureza foram.
O que me consta apenas, é que depois d'estes acontecimentos o governo não procedeu; que não teve força nas suas auctoridades; que não empregou os meios suasorios; e que finalmente, sem consultar os deputados de Braga; dava rasão a uma das partes, sem a outra ser ouvida.
Por estes factos se concluo evidentemente que os acontecimentos, que ora estou discutindo, são... filhos naturaes do governo; e se agora os não quer legitimar, elles, todavia têem a posse de estado, pois têem documento publico, em que seu pae os reconhece. Por isso vae correndo o processo.
Sem duvida um processo irritado de paixões, em que os animos sobresaltados estão a pouco trecho da desordem.
Mas que importa isso ao governo? Elle diz que não resolve por emquanto.
Quando a agitação, commum ás duas cidades, se affirmar

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mais forte; quando a discordia se dilatar pela intransigencia que as multidões costumam acarretar em sua paixão: quando isto vier, então veremos, que o governo, consoante ás suas idéas de afagar o poderoso, só voltará para o lado da força. (Apoiados.)
Eis porque eu protesto, como deputado, contra um governo que não tem auctoridade para manter a ordem; (Apoiados.) contra um governo que saíu fóra da legalidade, (Apoiados.) e os governos que saem fóra da legalidade devem abandonar as cadeiras do poder. (Apoiados.)
A questão politica é esta: o governo incita a desordem.
(Apoiados.)
Tenho dito. Termino, agradecendo a v. exa. e á camara a benevolencia com que me escutaram.
Vozes: - Muito bem.
Leu-se na mesa a seguinte:

Moção de ordem

A camara, reconhecendo o governo responsavel pelo conflicto entre os concelhos de Guimarães e Braga, e que elle não tem ao presente a força necessaria para conciliar os animos, mantendo o socego publico, a camara reconhecendo isto, passa á ordem do dia. = Luiz Jardim.
Foi admittida.

O sr. José Novaes: - Vou ler a minha moção de ordem:
«A camara, ouvidas as declarações do governo, confia plenamente que elle saberá manter a ordem publica no districto de Braga, habilitando o parlamento a resolver livremente esta questão de harmonia com os bons principios administrativos.»
Sr. presidente, se a disciplina partidaria é uma das condições indispensaveis para a opposição ter accesso ao poder, a opposição progressista está, por emquanto, muito longe da governação publica. (Apoiados.)
O illustre chefe do partido progressista declarou que não desejava dar a este incidente a feição politica, e coherentemente, não mandou para a mesa, moção alguma.
Considerou-a, porém, assim o sr. Alves Matheus, nos ardores do seu temperamento, no enthusiasmo das suas palavras: levantou-se o sr. Antonio Candido, n'aquelle estylo que tem as scintillações famosissimas dos finissimos crystaes, brilhante como uma constellação luminosissima de estrellas: (Vozes: - Muito bem.) tratou-a ainda o sr. Emygdio Navarro, não com aquella palavra energica, com tons revolucionarios, que no principio d'este seculo, em França, seria a palavra de Danton, que, nos nossos tempos e no parlamento portuguez, era apenas uma manifestação de habilidade parlamentar de s. exa., mas com um primor de phrase, com uma gentileza do exposição, com uma habilidade politica, com uma feição tão sensata e prudente, que lhe daria, se já o não tivesse, um legar eminente na tribuna portugueza. (Vozes: - Muito bem.)
A s. exa. o testemunho sincero da minha admiração.
Mas a questão politica tratou-se, (Apoiados.) e eu, sr. presidente, vi, não sem estranheza, a proposito d'este incidente, passar, com a palavra do sr. Antonio Candido, por diante da camara, a já cansada e debatida questão dos pobres guardas da alfandega, (Apoiados.) cem um cortejo de adjectivos que significam commiseração, que dizem pobreza, d'esses pobres guardas da alfandega que um illustre deputado da opposição já nos deixou ver no cairel do abysmo na aresta do crime, se não ia nas gehennas da deshonra, uma especie de João Valjean, sem que é espirito romantico e a condolencia, generosa, de s. exa. a podesse phantasiar mais tarde no bello typo de contricção de Maugdalaine, creação formosissima do auctor dos Miseraveis. (Apoiados. - Vozes: - Muito bem.)
Eu não faço commentarios. Que os julgue a opinião publica, e que o illustre chefe do partido progressista contenha se quizer e podér (Riso.) os seus amigos e correligionarios nos rigores apertados da disciplina partidaria.
(apoiados.)
Não discuto tambem, sr. presidente, se o governo vive, como hontem disse o sr. Alves Matheus, corrompendo e esmagando fraquezas.
O governo não corrompe, nem podia corromper, que os seus adversarios são de caracter nobre e alevantado: o governo não esmaga fraquezas, que s. exas. são uns gigantes (Riso.) e tão gigantes, que do alto do seu amor proprio ainda ha dias diziam que os ministros lhe tinham medo, e nos tratavam a nós de... pequenos Davids, sem se lembrarem que muitas vezes ferimos com mão certeira a estatura elevada dos Golias. (Apoiados. - Riso. - Vozes: - Muito bem.)
Não discuto ainda es actos do sr. marquez do Vallada como governador civil de Braga.
O Diario do governo já o demittiu, e a historia, que levanta templos, que tem altares, que erige estatuas aos que bem mereceram da patria, tem tambem o monturo do ridiculo, que é a cadeia aonde a critica policial da historia deixa amarrados os que, nos seus actos publicos, mal serviram o paiz. (Vozes: - Muito bem.)
A historia imperturbavel, serena e fria, que lhe de o competente destino. (Vozes: - Muito bem.)
Não discuto tambem o projecto, que ainda não está em discussão (Apoiados), nem ao menos a commissão se reuniu para lhe dar parecer. (Apoiados.)
Se o discutisse, eu diria franca e claramente, sem tergiversações nem ambages que sou terminantemente pela integridade do districto de Braga.
Mas se o projecto vier á discussão, será então occasião adquada para fundamentar a minha opinião sobre este assumpto. (Apoiados.)
O que eu discuto, o que eu defendo, é a resposta que o governo deu, do todo o ponto correcta, verdadeiramente constitucional. (Apoiados.)
Agita-se um questão grave entre Braga e Guimarães.
Guimarães relembra e phantasia, quiçá, odios e inimisades antigas e articula, como causa immediata da sua pretensão, os acontecimentos lamentaveis do dia 28 de novembro.
Braga oppõe-se á petição, contestando o libello, e a proposito dos acontecimentos do dia 28, declara que a cidade, pela, camara, municipal e junta geral, deu satisfação fidalga e cavalheirosa aos offendidos, e que, se essa satisfação devia partir do povo, por ser elle quem offendeu, que essa mesma lhe foi dada applaudindo o povo o primeiro orador do comicio popular do dia 29, que principiou por lamentar os acontecimentos do dia 28.
Em uma e outra cidade está agitada, a opinião publica, e, n'este caso, o que fazer o governo?
Ao governo cumpre unicamente manter a ordem por todos os meios legaes, depois do esgotar os de conciliação: (Apoiados.) ao governo cumpro esperar que o tempo, que tanta influencia tem para acalmar as agitações populares, sereno os animos e elucida os espiritos. (Apoiados.)
E o governo deve esperar muito do tempo que, em presença do nosso caracter e temperamento meridional, eu não duvido classificar como um dos factores sociologicos de maior importancia. (Vozes: - Muito bem.)
E foi esta a resposta do governo, e é unicamente por ella que o devemos tornar responsavel. (Apoiados.)
O resto, o que a opposição pede, não é prudente, e seria inconstitucional. (Apoiados.)
Não é prudente que, quem tenta conciliar, se declare por um dos litigantes: (Apoiados.) não é constitucional porque seria antecipar uma resolução da camara que devo ser muito estudada, e reflectida. (Muitos apoiados.)
Não é contra o decoro da camara, não e a agonia do parlamento, como disse o sr. Antonio Candido. (Muitos apoiados.)
Contra o decoro da camara seria, estando o parlamento

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aberto, unico juiz que tem de resolver sobre o projecto, que o governo, declarando a sua opinião, lhe antecipasse, ou pelo menos difficultasse, uma resolução que deve ser reflectida. (Apoiados.)
A agonia do parlamento seria que os representantes do paiz viessem pedir a opinião do governo sobre um projecto em que só a sua illustração e consciencia tem de julgar (Muitos apoiados.)
Isto é que seria a agonia do parlamento no Ave Cesar, morituri te salutant. (Muitos apoiados. - Vozes: - Muito bem.)
Eu, que sou amigo dedicado do governo, que confio n'elle, que ponho à sua disposição os meus serviços, nem por isso abdico das minhas regalias, nem o governo as pretende, para que lhe peça a sua opinião sobre uma questão em que unicamente os bons principios administrativos, o mappa chorographico do districto, as relações e interesses dos povos têem de julgar e resolver. (Muitos apoiados.)
O governo mantenha a ordem: a camara que julgue o projecto na sua muita illustração. (Apoiados.)
Vozes: - Muito bem.
(O orador foi cumprimentado.)
Leu-se na mesa, a seguinte

Moção de ordem

A camara, satisfeita com as declarações do governo, confia plenamente em que elle saberá manter a ordem publica no districto de Braga, habilitando o parlamento a resolver a questão, de harmonia com os bons principios administrativos, e passa á ordem do dia. = José Novaes.
Foi admittida.

O sr. Antonio Centeno: - Começo por ler a minha moção do ordem.
(Leu.)
Entrando n'este debate, não tenho esperança alguma de conseguir que o governo dê uma resposta satisfactoria ás perguntas que lhe têem sido feitas; não podia eu, deputado o menos auctorisado, a voz menos eloquente d'este parlamento, conseguir aquillo que não conseguiram, tanto o illustre chete do partido progressista; como todos os mais oradores que me precederam, eloquentes e muitíssimo mais auctorisados do que eu.
Entro apenas n'este debate, para que o governo saiba, que emquanto não fizer terminar este incidente, dando explicações categoricas, dando uma resposta clara e precisa, ou mandando abafar a discussão, todos os deputados da opposição se insurgirão contra elle e protestarão energicamente contra o procedimento que tem tido até agora e continua a ter, procedimento que póde levar o paiz a desastrosas consequencias. (Apoiados.)
Não discuto, nem acho que seja conveniente discutir n'esta occasião, os acontecimentos succedidos em Braga em 28 de novembro ultimo; pouco me importa que esse facto, por si só, constitua ou não motivo bastante para que se apresentasse em cortes o projecto de lei para a desannexação do concelho de Guimarães do districto de Braga, projecto que tem a assignatura do sr. Franco Castello Branco; o que tenho a declarar desde já é que não tenho interesse algum, nem directo, nem indirecto, ligado a esta questão; não resido, nem sou contribuinte em nenhuma d'estas duas cidades; particularmente, tenho amigos em ambas; politicamente, tenho relações com uma e outra; as minhas sympathias partilho-as igualmente entre estes dois povos, ambos portuguezes, e portanto com direito a exigirem de mim e de todos nós a protecção que é devida a irmãos o compatriotas. (Apoiados.)
A opposição não quer de maneira nenhuma exigir do governo que esmague Guimarães em favor de Braga, nem que esmague Braga em favor de Guimarães.
O que a opposição deseja, quer e exige do governo é que a ordem publica seja mantida, é que se faca justiça a quem a merece, é que se castiguem os culpados, se por acaso os houver, pois já lá vão dois mezes, e até hoje nada se fez; e, sobretudo, o que a opposição deseja é que o conflicto, já de si grave, na occasião presente, e que póde de um momento para o outro ter as mais desastrosas consequencias, seja resolvido e acautelado devidamente. E não se diga que o empenho da opposição, n'este assumpto, é menos patriotico.
A opposição cumpre com o seu dever; sobre isso não ha duvida nenhuma. Muito menos se deve accusar a opposição de fazer uma especulação politica com este assumpto.
Seja-me, porém, permittido dizer, ainda que incidentemente, que depois dos acontecimentos de 28 de novembro, tendo a camara municipal e a junta geral do districto de Braga dado satisfações completas aos cavalheiros de Guimarães que haviam sido insultados pelo povo d'aquella cidade; desde que essas corporações, as legitimas e directas representantes do povo, davam essas satisfações, é de suppor que os cavalheiros de Guimarães teriam ficado satisfeitos, esta cidade teria desistido do seu proposito de desannexação, se o governo, por sua parte, tivesse feito alguma cousa, isto é, se tivesse feito o seu dever. Mas infelizmente nada fez. Porque? Eu não tenho auctoridade para o dizer, mas repito o que já ouvi dizer n'esta camara.
O governo nada fez, ou por medo ao sr. marquez de Vallada, ou por desleixo.
Não sei por que rasão foi, mas, se foi pela primeira d'estas rasões, um governo que não tem força para manter era ordem qualquer delegado seu, abandona o poder. (Apoiados.) Se foi pelo segundo, um governo que leva a incúria e o desleixo a deixar avolumar a este ponto aquelle conflicto, cede o seu logar a outro, que mais enérgica e mais dedicadamente saiba cumprir os seus deveres, promovendo o bem estar do paiz, assegurando o socego e tranquillidade publica. (Apoiados.)
A proposito direi que não me parece muito boa a opinião avançada n'esta casa na ultima sessão, pelo meu bom amigo e illustre collega sr. Franco Castello Branco, de que a cidade de Guimarães não tinha ficado satisfeita completamente; e não o podia, nem devia ficar, com as explicações dadas pela camara municipal de Braga e pela junta geral do districto, por isso que essas satisfações envolviam uma censura áspera e dura ao governador civil; isto querendo inculcar que, se o dar taes informações não fornecesse ensejo para inflingir uma censura aquelle funccionario, a camara municipal e junta geral do districto de Braga não teriam cumprido, como cumpriram, com o seu dever.
Mas, sr. presidente, ninguem póde prescurtar as intenções alheias, nem entrar no foro intimo da consciencia de cada um. A verdade é que se deram satisfações, as mais completas e cabaes, e pelas mais competentes auctoridades. N'essas satisfações vinha incluida uma censura ao governador civil? Isso que importa? A verdade é também que se deram essas satisfações, e não as podiam dar sem se referir desagradavelmente a essa auctoridade.
O sr. Borges de Faria: - Foi este o causador de tudo.
O Orador: - Por essa mesma rasão.
Perguntámos ao governo a maneira como tenciona resolver. A camara ouviu, de certo com desgosto, as explicações dadas anteriormente pelos srs. presidente do conselho e ministro do reino, e de todas as suas respostas o que se ficou sabendo e que sobre o assumpto o governo não tem opinião de espécie alguma. (Apoiados.)
Não pensou ainda sobre o caso, permanece de braços cruzados diante de Braga e Guimarães, que estão actualmente num estado de excitação bastante grave, podendo de um momento para o outro travar-se um conflicto de consequências gravissimas. (Apoiados.)
Eu bem sei que é difficil a posição do governo na actual

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conjunctura, mas a verdade é esta: é que o culpado é o governo e não a opposição. (Apoiados,)
Ao governo cumpre, pois, resolver de prompto. Elle podia de principio ter acalmado este conflicto se tivesse procedido energicamente e ao mesmo tempo prudentemente; mas não o fez, e ahi estão as consequências. (Apoiados.)
O governo diz que vae agora fazer luz sobre o assumpto. Isto na occasião em que o estado de agtiação de Braga e de Guimarães exige uma resolução prompta do conflicto travado entre as duas cidades. (Apoiados.)
A occasião não é agora para pensar. Desde 28 de novembro do anno passado que havia tempo para isso; a occasião agora é para resolver e para proceder como procede um governo serio e enérgico. (Muitos apoiados.)
E para corroborar as minhas affirmações veja o governo o resultado das suas evasivas, das suas indecisões e da sua perplexidade na ultima sessão. (Apoiados.)
Foi apresentado um projecto de lei pelo sr. Franco Castello Branco para desannexar o concelho de Guimarães do districto de Braga, anuexando-o ao. districto do Porto; Braga agitou-se immediatamente, e protestou contra este facto. Guimarães insistiu, perfeitamente desdenhosa a taes protestos e agitações, porque tinha por si a promessa solemne, do governo de que seria attendida a sua pretensão de desannexação do districto de Braga, por isso que elle se tinha compromettido a dar apoio e protecção decidida ao projecto do sr. Franco Castello Branco.
Este incidente é tratado aqui no parlamento. Fazem-se perguntas ao governo, e como Guimarães vê que as declarações feitas pelo governo no parlamento não correspondem exactamente às promessas anteriormente feitas, e como percebe que o governo foge aos compromissos anteriormente tomados, Guimarães agita-se também, o povo abandona os trabalhos para formar meetings, espalham-se proclamações e ameaça-se oppor a força á força, se tanto for necessario.
E n'um telegramma chegado hontem li que se pensava em crear ali clube republicanos.
Ahi tem o governo o resultado da sua indecisão.
O governo prometteu a Guimarães a desannexação, pois fez mal, fazendo tal promessa. (Apoiados.)
E de nada vale o argumento do sr. presidente do conselho tambem adduzido pelo sr. ministro do reino, de distinguir na questão duas phases, uma antes, outra depois da agitação de Braga.
Antes da agitação de Braga, disseram s. exas., como Guimarães queria separar-se, Braga não se oppunha a isso, não tiveram duvida em acceder a tal pedido de desannexação.
Ora eu tomo a liberdade de dizer aos illustres ministros que, nem pela occasião em que são feitas, nem pela forma por que são apresentadas, nem pelos fundamentos em que se baseiam, se deve deferir a pretensões de tal ordem. (Apoiados.)
A circumscripção administrativa não póde nem deve estar á mercê dos caprichos pessoaes, nem das rivalidades levantadas de um momento para o outro entre duas cidades, simplesmente porque, tendo os procuradores de Guimarães votado contra a creação de uma cadeira que julgavam onerosa para o concelho que representavam, foram insultados pelo povo de Braga, resultando dahi o conflicto do dia 28 de novembro. (Apoiados.)
Que mais tarde o governo, ouvidas as estações competentes, a respectiva junta geral e camaras municipaes, e por motivos de interesse publico, que são aquelles que foram indicados, decidisse fazer a desannexação do concelho de Guimarães, comprehendo; mas proceder á desannexação simplesmente, porque os procuradores de Guimarães foram enlameados por indivíduos de Braga, acho isso perfeitamente inexplicável e inadmissível. (Apoiados.)
Procura-se defender o governo da leveza com que andou nesta questão, com o que disse a imprensa de Braga, allegando-se que, quando Guimarães apresentou o seu protesto, a imprensa de Braga respondia: «Podeis ir-vos embora, não fazeis cá falta. As contribuições pagas pelo vosso concelho não chegam para a sua despeza. Sois um encargo para o districto. Se fordes para o Porto muito vos agradeceremos».
É preciso fazer uma rectificação.
Em primeiro logar não foi toda a imprensa de Braga; mas apenas uma parte della.
(Interrupção do sr. Alves Matheus.)
Diz-me o meu collega que, havendo lá nove ou dez jornaes, apenas dois se manifestaram nesse sentido; e quando mesmo se manifestassem, todos em tal sentido não era occasião asada para decidir, porque as paixões estavam muito
agitadas e muito exaltados os espíritos. (Apoiados.)
Eram decorridos apenas poucos dias depois do conflicto, como quiz o governo decidir com justiça e imparcialidade, inclinando-se immediatamente o sr; ministro do reino e o sr. presidente do conselho para a pretensão de Guimarães?
Pois o próprio sr. presidente do conselho, dois mezes depois, nega se a dar uma resposta terminante á opposição, dizendo que o governo não podia, nem devia, resolver o conflicto, quando as paixões estavam irritadas; e cinco ou seis dias depois de se ter dado esse conflicto julga a occasião opportuna para se dar uma solução á questão, no sentido da se desannexar o concelho, sem cuidar no exame de elementos que é preciso ter em conta? (Apoiados.)
Não será isto uma perfeita contradicção? (Apoiados.)
Note a camara que s. exa. disse que não resolvia a questão por estarem irritados os espíritos; mas s. exa. resolveu-a cinco dias depois dos insultos se terem dado. (Apoiados.)
E estavam os ânimos exaltados nas duas cidades. Pois se Guimarães tinha justa rasão por terem sido insultados os seus procuradores á junta, tambem Braga tinha direito de se offender com Guimarães, que não havia attendido as satisfações dadas na junta geral e na camara municipal, e, não se importando com essas satisfações, foi insistindo na sua pretensão de desannexação.
A camara sabe que quem recusa uma satisfação franca e lealmente dada, e com o merecimento ainda de ser expontânea, faz mudar os papeis e o iusultador passa a ser o insultado.
Tem-se atacado a opposiçâo por ella fazer especulação politica com estes acontecimentos, e a propósito disse o sr. ministro do reino que antes da agitação de Braga, tanto o governo, como a opposição estavam de accordo.
Antes da agitação que se dá hoje, a opposição não tinha que dizer, nem que escrever.
A opposição sabia do conflicto, sabia que os procuradores de Guimarães á junta geral tinham sido insultados em Braga, e que estes animavam o pedido da desannexação; sabia que o sr. deputado Franco Castello Branco havia ido a Guimarães entender-se com os seus eleitores, e que viera uma commissão a Lisboa; mas tudo ficou no mesmo socego.
Em vista disto, a opposição entendeu que o governo havia tomado uma solução, e que não se levantariam embaraços. (Apoiados.)
Agora a cidade de Braga agita-se e vê-se que o governo não consultou a junta geral, nem a camara municipal, nem mesmo os próprios deputados do districto. (Apoiados.)
Disse o sr. presidente do conselho que havia consultado os deputados do districto de Braga ácerca do conflicto levantado entre aquella cidade e a de Guimarães, a fim de tomar uma solução sobre o assumpto; mas o sr. José Borges, que é deputado por Braga, declarou na sessão anterior que não fora ouvido.
Fallou em seguida o sr. Adolpho Pimentel, cuja dedicação ao governo ninguém póde pôr em duvida, e declarou que tambem não fora ouvido.
Daqui conclue-se que o sr. presidente do conselho, declarando que havia consultado todos os deputados do dis-

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tricto de Braga, não o fez, porque, pelo menos, dois ou tres não foram ouvidos, por isso é que eu me queixo.
O sr. Presidente do Conselho de Ministros (Fontes Pereira de Mello): - Elles não estavam cá.
O Orador: - Valia bem a pena que se escrevesse a esses deputados e que se chamassem. O que se não póde admittir é que venha aqui dizer-se: todos os deputados por Braga.
O sr. Presidente do Conselho de Ministros (Fontes Pereira de Mello): - Eu não disse todos; os que cá estavam.
O Orador: - Peço perdão, mas v. exa. disse: «os deputados por Braga», entendia-se que eram todos.
Uma voz: - Todos os que estavam cá; os que não estavam não podiam fallar.
O Orador: - Eu sigo na minha ordem de considera-ç5es.
Quem é que se contradiz? O sr. Luciano de Castro, conforme disse o sr. Barjona de Freitas, que deu um sentido demasiado litteral às suas palavras, sentido que ellas não tinham, ou o governo, que desde o principio não tem feito outra cousa senão contradizer-se?
Por mais que queiram dizer não, não póde deixar de se ver nas palavras do sr. José Luciano uma forte censura ao governo.
A resposta dada á commissão de Guimarães foi terminante. «Querem desannexar-se do districto de Braga? Não ha duvida nenhuma n'isso.»
São bem claras as palavras do meu illustre amigo e collega o sr. Alves Matheus.
Disse s. exa. que a commissão de Guimarães, quando chegara áquella terra disse aos seus conterrâneos que não era preciso mais nada, porque o governo havia promettido o seu apoio ao projecto apresentado pelo sr. Franco Castello Branco.
Eu podia dizer o mesmo, que ouvi a um membro dessa commissão, e que ainda está em Lisboa.
Temos mais a declaração do sr. Franco Castello Branco.
O habilissimo discurso de s. exa. em que se procurava alliar os deveres de lealdade partidária com os sentimentos de dignidade e independência pessoal, deixava transparecer bem claramente em todas as suas palavras a profunda magna que lhe ia na alma por ver que o governo tratava já de illudir as promessas anteriormente feitas. Tenho bem presentes as suas palavras com referencia á promessa feita:
«O que o governo prometteu á commissão de Guimarães dil-o-hão os membros d'ella que cá vieram.»
Para mim a verdade é o que diz o sr. ministro do reino, e se por acaso noto alguma discrepância entre as suas declarações do agora e as promessas de então, o erro é meu e não do sr. ministro do reino.
N'um assumpto tão importante e de tanta responsabilidade para o sr. Franco Castello Branco, s. exa., estando presente, como esteve, á conferencia havida entro o ministro e a commissão, não é possível que em tão poucos dias tenha duvidas sobre o que se prometteu á commissão.
Quando ainda houvesse alguma duvida tirava-a o socego completo que se estabeleceu em Guimarães apenas a commissão lá chegou voltando, do Lisboa, socego que contrastou com a agitação anterior, provam bem que houve promettimento expresso do governo.
Em seguida aos successos de 28 de novembro, a cidade de Guimarães agitou-se, realisaram-se meetings, fizeram-se proclamações, e os lavradores abandonaram os seus trabalhos do campo e tudo protestou contra o procedimento de Braga.
Apenas chega a commissão; tudo no maior socego, tudo na maior paz!
É porque o governo lhe havia promettido que accederia aos seus.
Notarei ainda mais outra contradição dos illustres ministros.
O sr. presidente do conselho disse no principio desta discussão que a opposição o que queria era saber a opinião do governo para se pôr do lado contrario; e o sr. ministro do reino disse que era mais feliz a opposição do que o governo, por isso que esta já tinha opiniões definidas e claras e já sabia que se havia de inclinar por Braga. Então o sr. presidente do conselho diz que a opposição queria saber a opinião do governo para se collocar do lado contrario e o sr. ministro do reino diz que a opposição era pelo lado de Braga? Isto é uma contradicção palpável.
Mas a verdade é que a opposição não deseja esmagar nem Braga riem Guimarães; não deseja que Braga fique esmagada por Guimarães, nem que Guimarães fique esmagada por Braga; o que deseja é que se resolva o conflicto de uma vez para sempre e que o governo diga o modo como ha de resolvei-o.
O illustre deputado o sr. Franco Castello Branco disse que o sr. Luciano de Castro, como homem de estado, é que devia dizer o modo como o conflicto devia ser resolvido: parece-me que o sr. Luciano de Castro não tem obrigação de dizer o modo como o negocio ha de ser resolvido; o governo, que tem andado nestas negociações, que o resolva como melhor lhe parecer.
Portanto, termino instando novamente com o governo para que faça com que o incidente não continue, e que diga claramente como tenciona fazer com que o conflicto acabo de uma vez para sempre.
Se continuar no seu systema de indecisão e de perplexidade e se a situação se aggravar, se as ameaças violentas se realisarem que seja tudo da responsabilidade do governo, porque a opposição não hade ter remorso algum por isso que cumpriu o seu dever, porque a tempo pediu que o governo terminasse o conflicto, declarando-se prompta a collocar-se com toda a lealdade ao lado do governo desde que isso seja preciso para se manter a ordem.
Vozes: - Muito bem.
Leu-se na mesa a seguinte

Moção de ordem

A camara, lamentando que o governo tenha sido menos solicito no cumprimento das obrigações que lhe impunha o conflicto levantado entre duas cidades importantes do reino, passa á ordem do dia. = Antonio Centeno.
Foi admiti ida.

O sr. Santos Viegas: - Sr. presidente, obedecendo às prescripções do regimento, tenho a honra de mandar para a mesa a moção que passo a ler:
«A camara, satisfeita com as explicações do governo, aguardando as informações, que lhe forem dadas ácerca do conflicto entre Braga e Guimarães, e que transmittirá á mesma camara, passa á ordem do dia.»
Comprehende a camara, que sendo, como já a ouvi classificar, gravo e momentosa esta questão, difficilmente posso eu entrar n'ella pelo apoucado dos meus recursos, pela insufficiencia da minha palavra, e ainda porque se acha largamente discutido este incidente; mas a circunstancia de ser deputado pelo districto de Braga, que me abriu as portas do parlamento, e a de julgar justa e sensata a pretensão dos habitantes de Braga, que pedem se mantenha a integridade do districto, me obriga á vir aqui consignar o meu voto, por forma que se conheça bem claramente o meu modo de ver, o que penso ácerca della.
Num assumpto tão grave, numa questão de tal maneira melindrosa, eu desejava que nenhuns manejos políticos, nenhumas considerações partidárias levassem este ou aquelle deputado, que entra no incidente, a aproveitar-se delle em beneficio do seu partido.
Não posso acompanhar quem de uma questão d'esta ordem fizer uma questão partidária; e só o poderei fazer

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áquelles, que a considerarem política na elevada e genuina accepção da palavra, a considerarem, digo, como uma questão de ordem publica e de administração. (Apoiados.)
Sou partidario sincero da integridade do districto de Braga.
Ninguem ignora que tenho propugnado sempre, tanto quanto posso, para que se resolva em harmonia com a representação dos povos d'aquelle districto este lamentavel incidente; mas não posso; como partidario sincero e leal da actual situação politica, acompanhar este ou aquelle grupo partidário, este ou aquelle collega, quando trate esta questão por forma a impritriir-lhe um caracter faccioso ou partidário. (Apoiados.)
Eu disse que estava ao lado do governo, como estou ao lado da pretensão de Braga.
Estou ao lado do governo, porque confio em que elle ha de manter a ordem publica, e procurar todos os elementos que lhe possam suggerir a sua prudência e o seu bom senso para que termine o conflicto a contento de uns e outros. (Apoiados.)
Estou ainda ao lado do governo pela prudência com que tem andado neste negocio, não o resolvendo de salto; porque os caprichos ou as paixões, as susceptibilidades, mais ou menos offendidas, não podem servir de fundamento para a solução de um problema tão melindroso como é aquelle de que se trata. (Apoiados.)
Se o governo procedesse por modo diverso d'aquelle por que prometteu proceder, certamente não lhe daria o meu apoio nesta questão.
Estou ao lado da pretensão de Braga, porque a considero justa e patriótica.
Hei de em occasião opportuna fundamentar a minha opinião com argumentos, que, é meu parecer, não serão engeitados pela camara.
Este debate tem seguido um caminho completamente diverso d'aquelle que a boa rasão e até mesmo as conveniências sociaes aconselham na presente conjunctura.
Vá a culpa a quem toca.
Quando chegar, repito, a opportunidade, hei de tratar desse ponto, e emittir a minha opinião a respeito d'elle o convicto estou, de que a proposição enunciada não poderá ser combatida.
Eu não discuto agora o projecto de lei apresentado pelo sr. Franco Castello Branco, porque não ha ainda sobre elle um parecer qualquer.
Está affecto a uma commissão, que o ha de estudar e dar depois á camara e ao paiz a sua opinião a respeito d'elle.
Desde o momento em que esse parecer vier á tela do debate, então eu sustentarei, com os argumentos que a minha rasão me suggerir, que as conveniencias sociaes me aconselharem, e o bom senso me dictar, a opinião que actualmente tenho, de que deve manter-se a integridade do districto de Braga. (Apoiados.)
Agora não faço isso, e não o faço, porque não quero faltar á lealdade, aos bons princípios e às declarações feitas, que mantenho.
Acentuo muito de propósito a phrase «declarações que mantenho».
Já disse, e repito á câmara, que sou partidário sincero da pretensão de Braga; mas entre o ser partidário sincero da pretensão de Braga e acceitar a maneira, porque a opposição ao actual governo encara esta questão, ha uma differença grande.
Eu desejo não transviar a questão; a opposição, que aliás se quer inclinar um pouco para a pretensão de Braga, busca transvial-a. As questões de methodo são as que mais luz fazem em todos os assumptos, que tenham de tratar-se.
Neste sentido, assim como hei de votar contra o projecto de lei apresentado pelo sr. Franco Castello Branco, votarei igualmente contra todas as propostas, ou moções, que tendam a significar desconfiança no governo ou á emissão
de qualquer opinião sobre um projecto a respeito do que não póde ainda haver opinião, porque não está dado parecer sobre elle. (Apoiados.)
Eu sou constitucional, e pertenço a uma camara igualmente constitucional; portanto não se admirem os illustres deputados de que eu faça esta declaração.
Ahi vão os motivos.
Pergunto eu: de quem é o projecto de lei que tem por fim a annexacão do concelho de Guimarães ao districto do Porto? E porventura da iniciativa do governo? Está ligada a esse projecto de lei a responsabilidade do gabinete?
Não. O projecto de lei é de iniciativa particular; não pôde o governo ter a responsabilidade delle, a não ser que a tome, declarando a sua opinião, quando no momento opportuno, quando na occasião da discussão essa opinião sobre o assumpto lhe seja pedida. (Apoiados.) Logo são inconstitucionaes todas as moções que queiram levar o governo a emittir a sua opinião, logo é do meu dever rejeitar essas moções, e só approvar aquella que convidar o governo a dar á camara todas as informações que ácerca do incidente elle possa ter, para que a mesma camara, tomando-as na devida couta, e apreciando-as, como convém, resolva com prudencia e justiça.
Esta é que deve ser a ambição da maioria, este o desejo da opposição. is os todos devemos proceder por esta forma e empenhar para tal fim. os nossas esforços. Como assembléa politica, como assembléa soberana, devemos realmente proceder, legislando, usando dos grandes poderes que o paiz nos deu; por forma igualmente soberana, sobretudo, nas nossas relações com o governo, devemos proceder e legislar com a franqueza, com a placidez de espirito, com aquella sabia cerca inspecção e prudência correspondente á grandeza da missão que os povos nos confiaram. (Apoiados.}
Devemos querer que o governo esteja em verdadeira paz e harmonia das suas opiniões com as da camara; mas não devemos querer, como constitucionaes, que o governo viva na dependência d'esta assembléa politica; o isto parece querer inculcar a opposição desde o momento em que insinua ao governo que ácerca de um projecto de iniciativa particular dê a sua opinião e expresse o seu parecer.
Não haja confusão de poderes; (Apoiados.) a camara tem-os importantes, como o governo igualmente os tem; não haja esta confusão.
Pois em que ficaria a independência do governo e a independência da camara, se porventura não se cumprissem os deveres e direitos igualmente correlativos?
Quer a camara que o governo se imponha a cila, ou quer o governo que ella se imponha ao mesmo governo?
Declaro, sr. presidente, em frente desta assembléa politica, constitucionalmente constituída ou formada, que não póde ser outro o procedimento do governo senão este.
Sr. presidente, em todos os assumptos que importam gravidade na sua resolução deve haver prudência; esta prudência importa a todos, mas muito especialmente importa áquelles que têem a seu cargo dirigir e governar o paiz, de cujas resoluções podem vir para o mesmo paiz conflictos graves ou a ordem e paz publicas; e é precisamente isto que o governo tem em vista, dizendo á camara «que aguarda o tempo preciso para que os seus delegados lhe dêem informações directas ácerca do conflicto». (Muitos apoiados.)
Está a dar a hora, e não desejo protelar o debate; pelo contrario, desejaria que, para bem d'elle, se terminasse. Portanto, vou concluir, afifrmando á camara que sou pela integridade de Braga, e que no emtanto confio e espero que o governo resolverá em conformidade com os bons principio, dando á camara as informações que os seus delegados de confiança lhe possam fornecer em tão melindroso assumpto como este n'este sentido, como disse, hei de sempre dirigir a minha opinião e formular sempre os

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argumentos que possa adduzir para garantir estes principios.
Deu a hora, e por isso termino as minhas considerações, pedindo desculpa á camara dos momentos que lhe roubei, agradecendo a benevolência que me dispensou e a attenção com que me ouviu.
Vozes: - Muito bem, muito bem.
Leu-se na mesa a seguinte

Moção de ordem

A camara, satisfeita com as explicações do governo, e aguardando as informações que ácerca do conflicto entre Braga e Guimarães lhe forem dadas e que transmittirá á mesma camara, passa á ordem do dia. = Santos Viegas.
Foi admittida.

O sr. Presidente: - O sr. Eduardo José Coelho pediu que lhe fosse concedida a palavra, antes de se encerrar a sessão, para tratar de um negocio urgente, e em conformidade com o regimento d'esta casa, participou á mesa qual o objecto de que deseja occupar-se. Eu, considerando perfeitamente opportuno o assumpto de que s. exa. deseja occupar-se, vou conceder-lhe a palavra.
O sr. Eduardo José Coelho: - Recebi ha pouco um telegramma de Valle Passos, no qual se diz, que foi alterada a ordem publica, por occasião de se proceder á eleição da commissão de recenseamento, havendo mortes!
Pergunto ao sr. ministro do reino se já teve alguma participação official a este respeito, e no caso affirmativo, quaes são as providencias que tem tenção de pôr em pratica, para accudir a este estado de cousas.
Depois da resposta do sr. ministro, e quando me cheguem os elementos de apreciação, tratarei nesta casa de avaliar a responsabilidade do governo sobre estes factos.
O sr. Ministro do Reino (Barjona de Freitas): - Posso declarar ao illustre deputado, que não recebi aqui telegramma algum, que dissesse respeito a acontecimentos em Valle Passos. Ê possível que alguns telegrammas viessem e estejam, ou em minha casa, ou na secretaria, e logo que os tenha, virei dar conta á camara do seu conteúdo. Á única cousa que sei, mas isso é já anterior, é que um cavalheiro, intitulando-se chefe do partido progressista naquella localidade, me dirigira um telegramma, pedindo força, porque receiava desordens na próxima lucta eleitoral.
Dirigi-me, em vista disto, ao sr. governador civil, determinando-lhe que desse ordens terminantes às auctoridades, para que se abstivessem completamente de qualquer intervenção na lucta eleitoral, e que fosse enérgico na repressão de todos e quaesquer abusos, requisitando força, se fosse necessária, para manter a ordem.
Depois disto não tive conhecimento official de facto algum nesse sentido.
O sr. Eduardo José Coelho: - Pedi novamente a palavra a v. exa. para agradecer ao sr. ministro do reino as explicações que se dignou dar-me, esperando que s. exa. ou algum dos seus collegas, amanhã venha a esta camara confirmar ou destruir a exposição que fiz ha pouco, desejando até muito que as minhas informações sejam inexactas.
Se, porém, ellas forem exactas, não posso deixar de dizer que lamento que as auctoridades superiores do districto fossem um pouco mais retardatárias em prevenir o governo dos acontecimentos que ali se deram. Tenho dito.
O sr. Presidente: - A ordem do dia para a sessão de amanhã é a continuação da que estava dada.
Está levantada a sessão.

Eram seis horas da tarde.

Redactor = Rodrigues Cordeiro.

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