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102 DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS

d'alem mar, os enormes dispendios com expedições, as rudes offensas ao patriotismo, a exacerbação das turbas, o accesso das paixões, a improficuidade dos mais pujantes cérebros para debellar o mal, a bancarota lugubremente ameaçadora, emfim, a crise politica, financeira, economica e moral, e, por cima de tudo, o desvairamento e impotencia da partidos politicos, a que, em particular, se devem attribuir muitas dictaduras.

Já em 1853, um notabilissimo parlamentar ponderava que a principal causa das dictaduras residia na indisciplina dos partidos e na relaxação das discussões parlamentares, descendo até discutir as personalidades em logar de tratar dos grandes interesses do paiz.

Na verdade, os partidos politicos para merecerem este nome, hão de ser a expressão dos grandes estimulos que animam os povos e a manifestação das forças latentes das nações. Do seu esforço, das suas rivalidades procede o aperfeiçoamento das instituições e a riqueza economica e politica; da sua lucta dimanaram as grandes conquistas que assignalam na Inglaterra a victoria dos sectarios do regimen coutractual sobre os apologistas do regimen do estado. A differença de ideal separa no presente, com traços profundos, os dois importantes grupos liberaes e aristocratas, que na Russia se degladiam, separaram os nossos liberaes e absolutistas e ainda os cartistas e setembristas. Hoje, porém, na Gran-Bretanha, como em Portugal, póde dizer-se que não existe propriamente o embate dos principios.

Lá, entretanto, não obsta isso a que todos prosigam no intento de melhorar praticamente, positivamente, os interesses geraes; lá, sob um clima de bom senso, não floresce a exotica planta chamada obstruccionismo; nem se comprehendem os processos para estorvar, de caso pensado, o exame dos imperiosos problemas sociaes, por meio de minusculos incidentes, perguntas pueris e premeditados disturbios.

N'estas lamentaveis deformidades, nas tendencias subversivas, antes anachronicamente desordeiras que civilisadoras, e na penuria do educação civica das classes e individuos temos outras tantas causas de dictaduras; são ellas tambem que explicam e desculpam os actos dictatoriaes de 1893, 1894 e 1895.

Se a segurança publica está comprometiida; se a momentosa questão consisto, não em augmentar as liberdades, mas em firmar a ordem, ponto de apoio do progresso; se a harmonia dos poderes desapparece e o parlamento se converte em mero instrumento de continuas perturbações; o remédio a adoptar é destruir os elementos desordenados e precaver contra futuros desatinos, mesmo em passageiro detrimento dos preceitos constitucionaes.

Ora, em documentos publicados pelo governo, ao lado de amargos queixumes pelas irregularidades dos trabalhos parlamentares, rememora elle circumstancias sufficientes para ser relevado da responsabilidade em que incorreu, assumindo funcções legislativas. Effectivamente, nos dois mezes que durou a sessão de 1894, não obstante a importancia das propostas de lei apresentadas pelo ministerio, desde a remodelação das contribuições até a reforma da instrucção, quasi todo o tempo, incluindo a primeira sessão da junta preparatoria, tão tempestuosa que foi suspensa, se gastou em pequeninos incidentes, importunas retaliações, interpretação do regimento e ataques pessoaes, entrecortados de systematicos tumultos.

N'estas condições, desde que o poder legislativo se desvirtuava e o impedia de cumprir o seu officio, o ministerio lançou-se no terreno da dictadura, mas procedendo com isenção, evitando exercer violencias, omittindo conveniencias partidarias, sacrificando, por isso, não raro, a sympathia dos proprios correligionarios e promulgando medidas de vasto alcance, cujas consequencias se estão já sentindo de maneira bastante benefica.

Por todos estes motivos, que a largos traços acabamos de expender, e outros muitos, que occorrem ao esclarecido espirito da camara, e tendo em consideração que as dilações na reunião das cortes procederam de attritos, que era preciso desfazer para garantir a ordem, e dos prévios e indispensaveis trabalhos para executar a nova reforma eleitoral, publicada no proposito de corrigir defeitos e fortalecer a dignidade do parlamento, temos a honra do submetter a vossa approvação a proposta e o projecto de lei abaixo formulados. Não receiamos ser acoimados de desempenhar o papel de certo personagem celebrado nas canções de Berenger, porque estas dictaduras estão justificadas pelas condições singulares em que, de ha seis annos a esta parte, se encontra a sociedade portugueza; têem a sancção do povo, na acquiescencia que lhes dispensou, e o merito nos melhoramentos que d'ellas hão fluido. De resto, dos relatorios, que precedem os diversos decretos, constam as rasões que os determinaram.

Mas, mais uma vez, importa accentuar a necessidade de evitar periodos dictatoriaes e restituir ao parlamento o seu prestigio, porque elle é a base das instituições representativas e o esteio da liberdade.

Concluindo, propomos que seja eleita uma commissão especial para dar parecer ácerca das medidas de caracter legislativo decretadas até 31 de dezembro de 1892, que excedessem as auctorisações da carta de lei de 26 de fevereiro do mesmo anno, e que os decretos publicados pelo governo, desde 28 de agosto de 1893 a 30 de dezembro de 1890 inclusivamente, sejam remettidos ás respectivas commissões mencionadas no artigo 123.° do regimento interno da camara dos senhores deputados para emittirem os seus pareceres, com excepção do decreto de 28 de março de 1890, referente a matéria eleitoral, e do decreto de 25 de setembro do mesmo anno, contendo alterações constitucionaes, que serão relatados, cada um em separado, por esta vossa commissão; temos mais a honra de submetter a vossa approvação o seguinte projecto de lei:

Artigo 1.° É relevado o governo da responsabilidade em que incorreu: assumindo o exercicio de funcções legislativas, ordinarias e constitucionaes; prorogando o praso legal da reunião das cortes geraes da nação para o dia 1 de outubro de 1894, pelos decretos de 31 de janeiro e 4 de maio do mesmo anno; encerrando a sessão das camaras legislativas por decreto de 28 de novembro de 1894, dissolvendo a camara dos senhores deputados por decreto de 28 de março de 1895 e differindo a reunião das cortes geraes da nação até ao dia 2 de janeiro do corrente anno.

§ unico. Continuarão em vigor, até nova resolução das camaras, as providencias de caracter legislativo promulgadas pelo governo do 28 de agosto de 1893 a 30 de dezembro de 1890 inclusivamente.

Art. 2.° Fica revogada a legislação em contrario. = Antonio Ribeiro dos Santos Viegas = Teixeira de Sousa = Teixeira de Vasconcellos = Quirino Avelino de Jesus = Cabral Mancada = Luiz Osorio = Bernardino Carvalho Cincinato da Costa = Manuel Fratel, relator. = Tem voto dos srs.: Adolpho Pimentel = Luciano Monteiro = Visconde do Banho.

N.° 1-A

Senhores. - Encerradas em 28 de novembro de 1894 as camaras legislativas pelos imperiosos motivos desenvolvidamente ponderados no relatorio, que precedeu o decreto da mesma data, e sendo já então indispensavel, como n'elle se declarou, a promulgação de diversas providencias exigidas por capitães e inadiaveis interesses do estado, forçoso foi que o governo assumisse o exercicio de funcções legislativas.

A longa expedição de todas as providencias comprehendidas no plano politico e administrativo, pelo governo adoptado como indispensavel ás circumstancias, interesses e necessidades do paiz, obrigou a dilatar a convocação do parlamento; acrescendo ainda, que a reforma da legisla-