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4 DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS

Publicas para dois assuntos importantes que se referem á região que tenho a honra de representar nesta casa do Parlamento. O primeiro, e principal, é a necessidade de se regulamentar a parte da lei vinicola de 18 de setembro ultimo, que diz respeito ao Dão, região que está atravessando enormes dificuldades por não poder competir com as outras: sul e Douro, que já estão favorecidas com o seu respectivo regulamento, e que teem recebido favores do Governo, emquanto que o Dão continua num estado de desgraçado abandono. (Apoiados).

Da região do Dão, que é a melhor de vinhos de pasto que temos no pais, não sae uma só pipa de vinho. E sabe a Camara porquê? Pelo simples motivo de que, tendo-se feito o regulamento para o Douro, para o sul e para a Madeira, não se fez ainda para os vinhos do Dão! (Apoiados).

Estou farto de ouvir queixas de falta de trabalho, e o que não vejo, é que quem não pede não ouve Deus. A região do Dão ainda não veio aqui dizer que tinha fome, e no Dão ha tambem fome, porque ha falta de trabalho, por os donos dos vinhos não disporem de meios para desenvolver os seus trabalhos agricolas.

Na Beira Alta, e desta, na região vinhateira do Dão, moureja-se a vida desde o nascer ao pôr do sol. Os trabalhadores do campo são sobrios na sua alimentação, e por isso contentam-se com pequenos salarios, porque maiores tambem lhe não podiam ser dados, pois a terra não dá para mais, e a prova está em que nenhum proprietario aumenta a sua fortuna com a industria agricola. Quando ella dá para pouco mais do que cobrir a despesa, pagar contribuições e sustentar modestamente a familia, já todos os proprietarios se reputam muito felizes. Mas na crise presente nem isso acontece, porque a maior parte destas despesas, quando não podem ser custeadas por outros rendimentos, originam cruéis momentos que só pode apreciar quem por elles passa. (Apoiados).

Os trabalhadores da Beira vivem e contentam-se com salarios entre 200 e 240 réis, e levantam as mãos a Deus quando durante o anno e principalmente nos meses de inverno encontram quem lhos dê; ao passo que nas regiões que chamam famintas abrem-se trabalhos publicos, chegando a offerecer-se o jornal de 360 réis e não apparecem! (Aparte do Sr. Tavares Festas). Apoiado, muito bem, é essa a verdade. No meu concelho os salarios não passam de 240 réis.

V. Exa. ainda não ouviu uma unica queixa da região do Dão, ou das duas Beiras, e, comtudo, nessas regiões existe tanta miseria como no Douro e como a que dizem existir noutros pontos do pais. (Apoiados).

O que é indispensavel é que o Estado de execução á lei de 18 de setembro, que concedeu protecção aos vinhos. O regulamento que diz respeito ás regiões do Douro e do sul já está em execução. Falta o da região do Dão e não sei por que motivo, ou, se o sei, não o digo, porque não desejo ser desagradavel a ninguem, mas o que afirmo é que a desigualdade em tratamento por parte do Governo cria uma situação angustiosa á nossa região, que ao abrigo da excepção na lei é explorada vilmente pelas que tiveram melhores patronos ou mais se souberam impor. (Apoiados).

Fiz parte de uma commissão de agricultores da região do Dão que em janeiro veio pedir ao Sr. Ministro das Obras Publicas que não demorasse a publicação do regulamento dos vinhos do Dão, porque essa região estava agora peor do que nunca esteve, desde que a protecção da lei foi já dispensada ás outras regiões. Do sul chegam-nos as avalanches de maus vinhos, que, pela qualidade e extraordinaria producção, se vendem ali baratissimos, isto é, por preços com que não podemos competir. No Douro, a regulamentação dando privilégios excepcionaes, como são o bonus do transporte e a entrada no Porto sem pagamento do real de agua, priva-nos de exportarmos o nosso vinho, porque só estas duas regalias da lei representam um beneficio para os vinhateiros do Douro, de quasi 9$000 réis por pipa!

O resultado é ainda não se mandar para o Porto, que era nosso principal recurso para a venda, uma unica pipa da ultima colheita! Nem V. Exa. calcula o prejuizo que esta desigualdade na execução da lei nos causa!

O Sr. Ministro, a quem expusemos este claro e verdadeiro estado do nosso infortunio, prornetteu attender o nosso pedido, porque o julgava em todo o ponto digno da consideração oficial, e, em termos que nos não deixaram a menor duvida, prometteu publicar o regulamento no prazo maximo de dez dias, pois nelle se trabalhava ha muito e não estava já concluido, porque se levantaram dificuldades, que era preciso remover. Era uma questão muito complexa, mais do que se afigurava quando foi discutida e approvada a lei.

O que é um facto é que, tendo a commissão feito o pedido ao Sr. Ministro, em janeiro, tendo-nos sido marcado o prazo maximo de dez dias para elle ser satisfeito, vão quasi decorridos tres meses e se alguma cousa se fez ainda nada se publicou. (Apoiados).

Ora não, vi a razão disto. O que posso garantir a V. Exa. é que os vinhos do Dão são, como vinhos de pasto ou de mesa, os melhores que ha no país. Não se faz caso d'elles, porque os proprietarios d'esta região não queimam ou mandara queimar os papeis das repartições de fazenda. O Dão tem fome, mas trabalha para a matar. A sua sobriedade reprime desmandos, que o exemplo nos mostra que são ás vezes precisos. (Apoiados).

Bem sei que no Douro ha miseria. E bom que lhe acudamos; mas é necessario attender tambem ás outras regiões que padecem do mesmo infortunio, mas que por indole ou educação não sabem ou não querem impor-se.

Entendo que o Estado não pode supprir todas as faltas, e muito menos satisfazer a todas as exigencias, tantas vezes inspiradas por interesses poucos legitimos. Cada um que se governe. (Apoiados).

A Itaália lutou muito tempo com a crise vinicola. O Governo Italiano soccorreu quanto pôde, e durante muito tempo, os vinicultores; mas chegou a um ponto em que disse: "Não damos mais nada: arranjem-se como puderem". Desde esse momento começou a prosperar a industria vinicola. A iniciativa individual fez o milagre, que ainda hoje dura, de, apesar de ser muito grande em toda a Itália a producção do vinho, todo se vender, dentro e fora do país, por preços mais ou menos remuneradores, conforme a qualidade, mas em todo o caso estabelecendo uma competencia com que nenhum outro país pode lutar.

Hontem vi no Seculo um extracto do boletim official do commercio, publicado pelo Ministerio dos Negocios Estrangeiros, em que se diz que os vinhos de Portugal não se podem vender no estrangeiro, por serem muito caros! A razão é simples: e não pode ser outra. E a acção nefasta do intermediario, de que o productor precisa para vender o vinho!

Eu sou um fraco productor da região da Beira, e, se quiser mandar o meu vinho para fora, tenho de me servir do intermediario.

E pois desta perigosa entidade que a acção protectora do Governo deve cuidar, emquanto estiver resolvido a attender as queixas dos vinicultores, quando pedem a sua intervenção, principalmente no sentido de lhe facultar a exportação.

É preciso que o Governo mande estudar essa questão dos intermediarios; mas estou convencido que só lhe saímos das garras quando nos, lavradores e consumidores, fizermos uma cruzada contra elles.

Temos os nossos productos magnificos, saem das nossas adegas baratos e em bom estado e depois são falsificados e vendidos carissimos!

Pode haver remedio para isto? Pode, e parece-me que