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DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS

tagem do melhoramento das ostreiras. Por consequencia a camara sabe que este contrato e os documentos que se lhe referem não foram examinados! Ora, discutindo-se um projecto ácerca de pescarias, é na verdade inteiramente extravagante que não ouçamos a commissão de pescarias!

Fôra o mesmo que mandar a proposta de lei sobre contribuição industrial unicamente á commissão de commercio e artes. Ella nos fallaria da conveniencia de attender ás tristes circumstancias do thesouro, e por causa d'ellas approvaria a proposta; mas contentar-nos-íamos com este parecer, e deixariamos de ouvir a commissão de fazenda sobre um negocio que é especialmente financeiro?

Portanto, parece-me que o mais regular é remetter este projecto ás commissões de pescaria e de fazenda, para estas darem a sua opinião a respeito d'elle.

Disse o sr. ministro das obras publicas que um dos motivos por que se devia approvar este contrato era por elle dizer respeito a uma grande área.

Nunca pude comprebender bem a força d'este argumento. Não é pelo facto da grandeza da area que se póde considerar bom este contrato. Nós sabemos perfeitamente que, por exemplo, os tres parques imperiaes da bahia de Arcachon comprehendem sómente um 12, outro 10 e outro 40 hectares, e comtudo fornecem uma quantidade consideravel de ostras. Já se vê portanto que não ha necessidade de conceder uma grande área para que a empreza seja bem succedida.

Acrescentarei ainda que em regra é prejudicial a uma companhia applicar a sua actividade a negocios em demasia grandes, e diffundidos por vasta área, porque ha difficuldade em os vigiar bem; não se póde, pois, dizer que uma empresa é tanto mais util quanto maior é a área da sua acção.

O nosso banco hypothecario, por exemplo, não póde ter tantas agencias, quantas são necessarias ao progresso do credito predial n'este paiz. Um dos mais notaveis bancos de França achou maiores lucros desde que supprimiu umas

poucas de suecursaes. Tudo isto é muito natural: cada individuo, ou cada empreza tem forças limitadas, e é em proporção d'essas forças que emprehende e que executa. Se pretende ir alem de seus recursos, damnificase, em vez de lucrar. E se o argumento da extensão valesse muito para este caso, então declaro que eu mesmo pediria á camara, não só a área marcada n'este contrato, mas toda quanta em Portugal fosse possivel conceder-se, e os srs. ministros, de, accordo com as idéas até agora manifestadas, attender-me-íam logo. É verdade que o meu requerimento não tinha a rasão da prioridade; mas eu passo diante d'este pobre argumento; seria crueldade fazer-lhe guerra.

Não sei, pois, o que ácerca da vantagem da grande área me responderá o sr. presidente do conselho ou o sr. ministro das obras publicas. Esclarecer-me-ha o sr. ministro da marinha? Mas consta-me, não sei se é exacto, que a respeito d'este contrato a repartição de agricultura, de que s. ex.ª é digno chefe, tinha dado um parecer contrario. Votará s. ex.ª a favor do projecto?

Será impossivel conciliar o voto de hoje com aquelle parecer, se elle existe.

Rejeita-lo-ha? Desapparecia a solidariedade ministerial.

Na ultima sessão affirmei a importancia d'este assumpto, e que era preciso não fossemos violar um artigo da carta constitucional. Esse artigo é o que garante a liberdade da industria, uma vez que não se opponha aos costumes publicos, á segurança e á saude dos cidadãos; e a ostricultura não se lhes oppõe.

O artigo 395.° do codigo civil citado no decreto de 15 de dezembro de 1868, assignado pelos srs. Sebastião Calheiros e Latino Coelho, diz que é permittido a todos, sem distinção de pessoas, pescar nas aguas publicas e communs, salvas as restricções postas pelos regulamentos administrativos. Ora estes regulamentos não são, não devem ser, a condemnação da liberdade da industria.

A este artigo é que o sr. ministro das obras publicas se referiu quando disse, que este contrato sómente regulava o exercicio de uma industria. Mas realmente todos comprehendem que regula-lo é muito differente de estabelecer um monopolio.

Sr. presidente, não tenho a menor duvida de aceitar a proposta do nosso digno primeiro secretario, que quer que este projecto vá á commissão de pescarias, para que ella formule um projecto ácerca da ostricultura; a proposta de s. ex.ª é que está de accordo com a carta e o codigo civil.

Nós já temos o decreto de 15 de dezembro de 1868, que procurou regular o exercicio d'esta industria, mas não sei qual a execução que tem tido. As disposições d'elle poderão ser alteradas ou ampliadas com proveito do paiz; comprehendo bem que a liberdade da industria não é a liberdade de damnificar as ostreiras; é necessario não confundir o trabalho util com a destruição d'essa riqueza publica.

A maneira por que se tem feito a apanha das ostras é tal que em alguns pontos do paiz tem sido destruidas completamente as ostreiras naturaes.

Alguns navios que vieram a Portugal em 1866 e 1867, creio eu, levaram para o estrangeiro milhões e milhões de ostras e deixaram completamente destruidas algumas ostreiras naturaes da margem esquerda do Tejo.

Não sei se nos diversos pontos do paiz se tem dado, ou não, execução ao decreto a que me referi; mas é natural que não, porque as auctoridades maritimas e os administradores de concelho não têem tempo bastante para tornarem effectiva a execução d'elle.

Os administradores de concelho até se hão de ver entre grandes difficuldades, se porventura a epocha da prohibição da apanha das ostras (porque ha um certo tempo em que ella é defeza) coincidir, por exemplo, com a epocha de uma dissolução do parlamento. É realmente difficil tratar ao mesmo tempo de eleições e de fazer cumprir um decreto sobre ostricultura.

Sr. presidente, não tenho duvida, já o disse, em retirar a minha proposta, adoptando a que foi apresentada á camara pelo sr. Adriano Machado, que me parece mais rasoavel do que a que tive a honra de mandar para a mesa.

A proposta do illustre deputado, attendendo aos artigos citados da carta constitucional e do codigo civil, quer que a ostricultura em Portugal se pratique de um modo mais conveniente; ella attende á manutenção da concorrencia, e eu espero muito mais da concorrencia do que do monopolio, por muito bem que elle seja exercido.

Para conhecermos a differença que existe entre a concorrencia e o exclusivo não precisâmos mais do que comparar a industria antiga com a industria moderna. Tanto basta e até sobeja, por isso escuro de fazer á camara observações que sem proveito lhe roubariam o tempo, que aliás precisâmos aproveitar.

Não dou maior largueza ás observações que tinha a fazer, porque a hora está adiantada e reconheço a conveniencia de resolvermos este assumpto; pois que ha no contrato um artigo em que se dispõe que no praso de tres annos, a contar da data do mesmo contrato, deve estar feito o tanque para a engorda das ostras, sob pena de rescisão; nós não devemos pois adiar para muito tarde, ou indefinidamente, a votação definitiva sobre este contrato.