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DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS

«Considerando que, alem de outras, incontestavelmente é substancial a formalidade estabelecida no artigo 62.° do codigo administrativo, estatuindo preceptiva e terminantemente que nas actas se mencionem todas as reclamações dos eleitores e quaesquer decisões sobre ellas tomadas pela mesa, certamente com o fim de nas estações superiores se poder apreciar a procedencia de taes reclamações e a justiça com que foram decididas, e serem a final definitivamente resolvidas — § 4.º do citado artigo 62.°;

«Considerando que, supposto das actas da eleição municipal do Barreiro não conste ter havido reclamação alguma, comtudo os eleitores protestantes denunciam a sua existencia e pelos contraprotestantes é confirmada, já com relação á especificada falta de identificação dos eleitores, já com relação a outras reclamações que classificam de sem importancia, o que bem demonstra por modo insuspeito a veracidade da arguição dos protestantes ácerca das reclamações e decisões tomadas, e que por isso não se podem agora apreciar como era mister;

«Considerando que a identificação dos eleitores, aliás essencial, foi por esta o outras formas preterida;

«Considerando que d'este modo as actas da referida eleição não são, como cumpria, a pura e fiel expressão de toda a verdade, tão recommendada e indispensavel em taes actos, não podendo por isso ser acreditadas no mais n'ellas mencionado, o que equivale á falta total das mesmas actas, formalidade aliás substancialissima;

«Considerando alem isso, e finalmente, que em presença das diversas peças d'este processo, pelo menos fica duvidosa a plena liberdade dos eleitores, já pela condemnavel intervenção da auctoridade administrativa na eleição, já pela sordida pressão interesseira exercida contra os mesmos eleitores:

«Por todas estas rasões, e pelo mais que consta do processo, d'onde aliás se não póde bem conhecer se ao menos se observou o estrictamente indispensavel, julgam nulla a referida eleição da camara municipal do Barreiro, verificada no dia 25 e seguintes de novembro do corrente anno, e designam para a nova eleição o dia 3 de fevereiro de 1878.

«Lisboa, sala do conselho do districto, em sessão de 27 de dezembro de 1877.»

Agora os restantes documentos, sobre os quaes chamo a attenção da camara.

Disse-se na imprensa, e foi uma triste verdade, que o administrador Madail tomára uma parte tão activa, directa e escandalosa no acto eleitoral, que até dentro da assembléa, sem reclamação do presidente, se entremettêra n'esse acto, a ponto de insultar tão grosseiramente o continuo da camara, José Ignacio Nunes, que este caíra fulminado com uma congestão cerebral de que, horas depois, falleceu. Este desventurado era contrario ao partido do administrador.

Vejamos o que a tal respeito resam os seguintes documentos:

«Illmo. e exmo. sr. presidente da assembléa eleitoral do concelho do Barreiro. — Dizem os abaixo assignados, cidadãos eleitores do concelho do Barreiro, que precisam que v. ex.ª, para bem de sua justiça, lhes certifique o seguinte:

«Se é ou não verdade que o administrador d'este concelho, João Cosme Leal Madail, por occasião das eleições municipaes que tiveram logar n'esta villa nos dias 25, 26 e 27 de novembro proximo passado, se entremetteu no serviço da mesa eleitoral, dando ordens, expendendo opiniões, sem que para isso fosse reclamado por v. ex.ª, ou mesmo pedida a sua opinião;

«Se é ou não verdade ter-se o mesmo administrador dirigido asperamente ao continuo da camara, José Ignacio Nunes, dando-lhe ordens sem auctorisação nem reclamação de v. ex.ª;

«Se é ou não verdade que, depois do continuo ser tão rispidamente reprehendido, sem o merecer, pediu a v. ex.ª licença para se retirar, por motivo de doença, e que momentos depois v. ex.ª soube que tinha sido acommettido de uma congestão cerebral, de que falleceu horas depois;

«Se é ou não verdade que, sem lhe ser pedido ou reclamado por v. ex.ª, o administrador do concelho se impoz a redigir as actas no dia 27 de novembro proximo passado, as quaes foram redigidas a seu bello prazer.

«Os abaixo assignados esperam, a bem da sua justiça, que v. ex.ª certifique os pontos acima com a lealdade e verdade que o caracterisam: por isso — E. R. M.ce — Barreiro, 20 de dezembro de 1877. = Luiz dos Santos = José Ferreira.»

Attestado do presidente da assembléa, eleitoral do Barreiro, deferindo a petição supra.

«João Maria de Abreu Moreira, presidente da camara municipal do concelho do Barreiro, etc.

«Attesto que na occasião em que presidia á eleição da camara municipal nos dias 25, 26 e 27 de novembro ultimo, vendo que na igreja se tinham juntado muitos rapazes e que estavam fazendo bulha, ordenei ao continuo da camara, José Ignacio Nunes, para que os fizesse retirar d'ali, e não tendo este ouvido as ordens por mim dadas, o administrador do concelho, João Cosme Leal Madail, se dirigiu asperamente ao dito Nunes, dizendo-lhe que cumprisse immediatamente as ordens do sr. presidente, ao que o dito Nunes respondeu que ali só recebia ordens e reprehensões do sr. presidente: que depois Nunes lhe pediu para ir para casa por se achar incommodado, porém que só á noite, depois de acabado o acto eleitora. d'aquelle dia, é que sube que tinha sido atacado de uma congestão cerebral, de que falleceu na mesma noite.

«Que no dia 26 o cidadão Augusto Rodrigues lhe requerêra para que, chamasse á ordem o administrador do concelho que se estava entremettendo na maneira de verificar a identidade de alguns eleitores maritimos que não têem quota de decima, e muito mais que elle administrador não se achava recenseado como eleitor, ao que immediatamente attendi, e se continuou a praticar pela mesma fórma que se estava fazendo.

«Quanto ás actas originaes foram escriptas pelo secretario José Silvestre Junior, e dictadas pelo secretario Manuel Vicente Caleiro, e na ultima, na occasião em que este estava dictando, o administrador fez observações á sua redacção, de cujas observações foram acceitas as que pareciam que o deviam ser.

«Barreiro, 22 de dezembro de 1877. = João Maria de Abreu Moreira.»

A camara vê que o presidente da assembléa confessa que o administrador se entremetteu no acto eleitoral sem reclamação sua, que reprehendeu asperamente o pobre continuo e que teve de o chamar á ordem!

Vejamos agora a declaração da infeliz viuva e filhos do continuo, isto é, das desditosas victimas da tyrannia do administrador Madail.

Chamo sobre ella a attenção dos meus collegas.

Declaração da viuva e filhos de José Ignacio Nunes sobre a causa, que originou a morte de seu marido e pae

«Os abaixo assignados, viuva e filhos do fallecido José Ignacio Nunes, ex-continuo da camara municipal do Barreiro, declaram debaixo da sua palavra de honra, e, se tanto for preciso, juram aos Santos Evangelhos, que o sr. dr. Manuel dos Santos Costa, facultativo n'esta localidade, a unica vez que foi chamado para tratar de seu marido e pae foi aquella de que falleceu no dia 25 de novembro proximo passado, victima de uma congestão cerebral, provocada pelos insultos que lhe dirigiu o administrador d’este concelho, João Cosme Leal Madail. Serve a presente declaração para affirmar que seu marido e pae nunca teve ataques ou ameaça alguma da molestia de que infelizmente foi victima, e por isso estranham que hoje, com fins, se diga o contrario.

«Barreiro, 20 de dezembro de 1877.

«A rogo da sr.ª Joaquina Ambrosia Ferreira Nunes, Au-

Sessão da 25 de janeiro da 1878