124 DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS
"Nestas lamentaveis deformidades, nas tendencias subversivas, antes anachronicamente desordeiras que civilisadoras, e na penúria de educação civica das classes e individuos, temos outras tantas causas de dictaduras; são ellas tambem que explicam e desculpam os actos dictatoriaes de 1893, 1894 e 1895."
Na penuria é que eu divirjo um pouco o para mostrar essa divergencia preciso inverter de alguma fórma a ordem dos factores.
Que o povo, em geral, o grande publico a que me honro de pertencer, não tinha uma comprehensão nitida do parlamentarismo, isso acceito, talvez porque os proprios parlamentos tambem não a têem tido, ou, pelo menos, não a têem mostrado. Mas que em geral as classes tenham penúria de educação civica, isto 6, que não tenham a comprehensão dos seus direitos e dos seus deveres, isso é que eu não acceito; e não acceito, porque o paiz todo, especialmente a classe commercial e a classe agricola, que está brilhantemente representada nesta camara (Apoiados) têem cumprido pontualissimamente os seus deveres. (Apoiados.) Aggravados em geral os tributos e muito especialmente as contribuições lançadas sobre a classe commercial, o commercio - incluindo até os maiores adversários do governo - pagou pontualissimamente as suas contribuições. Como o sr. Marianno de Carvalho disse ha pouco, a lei é recente, mas este é o segundo anno do pagamento e o commercio pagou já, ou está pagando o referido anno, apesar de haver a promessa do chefe de um partido politico - de que no dia seguinte aquelle em que subisse ao poder o governo não cobraria essa contribuição.
Pois apesar d'isso, é tal a comprehensão que a classe commercial tem dos seus deveres, que até os proprios adversarios do governo pagaram as suas contribuições, e pagaram mesmo antecipadamente, como disseram os jornaes.
Que a referida classe tem, portanto, a perfeita comprehensão dos seus deveres, prova-o evidentemente o facto que ou acabo de apontar. Se por vezes não exerce por completo os seus direitos, é porque enferma da anemia geral, causada, devo dizel-o, sem com isto querer offender especialmente ninguem, pelas classes dirigentes. A errada comprehensão na forma de administrar e dirigir os negócios públicos é que concorreu para isso, aggravada ainda por uma orientação extraordinaria, que eu me absterei do classificar mais fortemente, no sentido de conspurcar todo o nome d'aquelle que se apresente com vontade de trabalhar, ou que por qualquer forma se torne mais saliente. Esta orientação faz com que a classe commercial fuja completamente de entrar na vida publica, porque está mais que nenhuma outra presa ao seu nome e não quer sujeitar-se a que todos os dias lhe dirijam graças ridiculas, que não incommodam muito, mas que enxovalham, sem haver meio de poder exigir a responsabilidade a quem tal escreve, porque a lei de imprensa, a que já só fez referencia n'esta casa, será muito rigorosa e até propria de um governo absoluto, mas a verdade é que quando um homem digno e serio quer pedir a responsabilidade do uma affronta, encontra um indivíduo encartado, que não responde cousa alguma e tem um ordenado para se sentar no banco dos, réus. (Apoiados.)
E isto o que se passa, como todos sabem. (Apoiados.)
Por isso concordo com o que disse ha duas sessões o illustre parlamentar o sr. Marianno de Carvalho, "em que deve ser concedida á imprensa toda a liberdade de analyse e de apreciação, mas que quando offenda haja meio de encontrar o offensor". (Apoiados.)
Posto isto, sr. presidente, desejo ainda referir-me, por incidente, á proposta apresentada pelo illustre deputado, o sr. conselheiro Marianno de Carvalho, proposta que estava naturalmente indicada.
E claro que não dou o meu voto no projecto se não acceitando, como não posso deixar de acceitar, como sincera, a declaração do governo, de que elle quer que só discutam, o mais rapidamente possivel, as suas providencias tomadas em dictadura, porque acceita todas as emendas, additamentos e substituições que se queiram apresentar; de outra forma não o podia eu acceitar.
Tive a honra de collaborar - collaboração aliás insignificante - na lei da contribuição industrial, mas sou o primeiro a reconhecer que em alguns pontos errei, e tomarei a Uberdade de propor emendas nos pontos em que entendi que errei.
Tambem acceito, por completo, as indicações que o sr. Marianno de Carvalho fez relativamente ao decreto dos passaportes e á questão da pena de morte, apesar da doutrina brilhantemente expendida pelo sr. relator do projecto, e de saber perfeitamente que a Suissa, paiz adiantado no estudo e apreciação de todas as questões, ainda assim, restabeleceu a pena de morte. Apesar de saber isso, nunca votarei a pena de morte.
(Interrupção do sr. Fratel.)
Não estou a criticar as palavras do s. exa., pelo contrario, acceito perfeitamente a doutrina exposta por s. exa., mas direi que não voto a pena de morte.
Não sei se deva continuar...
(S. exa. não reviu estas notas.)
O sr. Presidente : - Como não ha luz, não podemos continuar os nossos trabalhos, e parecia-mo conveniente que s. exa. ficasse com a palavra reservada para a sessão seguinte.
Amanhã não podo haver sessão, porque a mesa tem de ir primeiro às exéquias o depois ao paço.
A seguinte sessão é na sexta feira; sendo a ordem do dia a mesma que estava dada.
Está levantada a sessão.
Eram quasi seis horas da tarde.
Proposta de lei e documentos mandados para a mesa n'esta sessão
Proposta de lei n.° 3-D
Senhores.- Tem Portugal, paiz naturalmente agrícola, a sua cultura especialisada por condições geographicas o climatéricas, fundamentalmente diversas das que caracterisam as regiões do norte da Europa. D'esta primordial differenciação resulta verdadeira reciprocidade de interesses economicos, que muito convém consolidar o promover por via dos tratados de commercio.
Tal é, em geral, a indicação de conveniencia e opportunidade a que obedecem os convénios ultimamente por nós celebrados com os Paizes Baixos e a Rússia, os quaes já vos foram presentes, e o tratado com a Noruega, que hoje me cabe a honra de submetter á vossa esclarecida apreciação.
É francamente liberal a pauta noruegueza, como o attestam a isenção de direitos do importação do sal, da cortiça em bruto e da cortiça em rolhas, e as módicas taxas relativas a vinhos, as quaes correspondem, em moeda portuguesa, a 29 ou 90 réis, por kilogramma ou por litro, segundo a força alcoólica e conformo a
natureza do vasilhame.
Assegura-nos o tratado, não só que sejam mantidas aquellas isenções, e que não possam ser alteados aquelles direitos, mas tambem que se torne extensiva aos vinhos portuguezes de graduação até 23.° (o que, a bem dizer, comprehende todos, mesmo os generosos do Porto o da Madeira) qualquer reducção que do futuro for decretada na Noruega em favor dos de diversa procedência, embora de inferior alcoolisação; acrescendo a garantia do tratamento da nação mais favorecida, tanto em beneficio dos mencionados productos, que constituem o grosso da nossa exportação para aquelle paiz, como de outros, numerosos,