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CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS

16.ª SESSÃO

EM 16 DE AGOSTO DE 1905

SUMMARIO. — Lida e approvada a acta dá-se conta do expediente que consta de officios de diversos ministerios acompanhando documentos, e de uma proposta de renovarão de iniciativa do Sr. Abel Andrade, em segunda leitura. Fui admittida.— Estando na mesa os accordãos validando as eleições dos Srs. João Augusto Pereira, Joaquim Hilario Pereira Alves, João Alberto Pereira de Azevedo Neves, João Christovão do Patrocinio S. Francisco Xavier Pinto, Joaquim Augusto Ferreira da Fonseca, Ernesto Julio de Carvalho e Vasconcellos, Abel da Cunha Abreu Brandão, foram estes senhores proclamados Deputados, o prestaram juramento. Tambem prestou juramento o Sr. Visconde da Torre. — O Sr. Presidente propõe um voto de sentimento pelos Deputados fallecidos - no interregno Parlamentar. Associam-se a esta proposta, que a Camara approva, os Srs. Ministros da Marinha (Moreira Junior), Antonio Cabral, Pereira dos Santos e João Franco. - Os Srs. Abel Andrade e Claro da Ricca mandam para a mesa duas propostas que são respectivamente enviadas ás commissões de administração publica e do bill.— O Sr. Presidente do Conselho (José Luciano de Castro) explica a crise ministerial e a sua solução.— O Sr. Presidente da Camara propõe e é approvado que se abra uma inscripção especial para esse assumpto.— O Sr. João Pinto dos Santos impugna as declarações do Sr. Presidente do Conselho MUC lhe responde em seguida. Entram depois na mesma discussão os Srs. Queiroz Ribeiro, Ministro da Fazenda (Manuel Affonso Espregueira) e Pereira dos Santos. — O Sr. Ministro da Justiça (Arthur Montenegro) apresenta uma proposta de accumulação de funcções, que foi approvada.

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2 DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS

Presidencia do Exmo. Sr. Libanio Antonio Fialho Gomes (Vice-Presidente)

Secretarios — os Exmos. Srs.:

Conde de Agueda
Gaspar de Abreu de Lima

Primeira chamada — Ás 2 horas da tarde.

Presentes — 11 Srs. Deputados.

Segunda chamada — Ás 2 e meia horas da tarde.

Abertura da sessão — Ás 3 horas da tarde.

Presentes — 92 Srs. Deputados.

São os seguintes: Abel Pereira de Andrade, Adriano Anthero de Sousa Pinto, Alberto de Castro Pereira de Almeida Navarro, Albino Augusto Pacheco, Alfredo Carlos Le Cocq, Alfredo Cesar Brandão, Antonio Caetano de Abreu Freire Egas Moniz, Antonio Cassiano Pereira do Sousa Neves, Antonio Ferreira Cabral Paes do Amaral, Antonio José Garcia Guerreiro, Antonio Maria de Carvalho de Almeida Serra, Antonio Maria Dias Pereira Chaves Mazziotti, Antonio de Mattos Magalhães, Antonio Rodrigues da Costa Silveira, Antonio Rodrigues Ribeiro, Antonio Tavares Festas, Arthur da Costa Sousa Pinto Basto, Augusto Cesar Claro da Ricca, Augusto Faustino dos Santos Crespo, Carlos Augusto Ferreira, Clemente Joaquim dos Santos Pinto, Conde de Agueda, Conde do Alto Mearira, Conde de Carcavellos, Conde de Penha Garcia, Cande da Ribeira Grande (D. Vicente), Conde de Sucena, Diogo Domingues Peres, Eduardo Frederico Schwalbach Lucci, Eduardo Valerio Augusto Villaça, Emygdio Lino da Silva, Fernando Augusto Miranda Martins de Carvalho, Fernando de Sousa Botelho e Mello (D.), Francisco Joaquim Fernandes, Francisco Miranda da Costa Lobo, Francisco Pessanha Vilhegas do Casal, Francisco Xavier Correia Mendes, Francisco Xavier da Silva Telles, Frederico Alexandrino Garcia Ramirez, Gaspar de Abreu de Lima, Gaspar de Queiroz Ribeiro de Almeida e Vasconcellos, Henrique Carlos de Carvalho Kendall, Henrique de Carvalho Nunes da Silva Anachoreta, João Baptista Ribeiro Coelho, João Catanho de Menezes, João da Custa Santiago de Carvalho e Sousa, João Ferreira Franco Pinto Castello Branco, João José Sinel de Cordes, João Maria Cerqueira Machado, João Pinto Rodrigues dos Santos, João Serras Conceição, João de Sousa Bandeira, João de Sousa Tavares, Joaquim José Cerqueira, Joaquim José Pimenta Tello, Joaquim Pedro Martins, Jorge Guedes Gavicho, José Affonso Baeta Neves, José Alberto da Costa Fortuna Rosado, José Cabral Correia do Amaral, José da Cruz Caldeira, José Ferreira de Sousa Junior, José Maria de Oliveira Mattos, José Maria Pereira de Lima, José Paulo Monteiro Cancella, José Simões de Oliveira Martins, José Vicente Madeira, José Vieira da Silva Guimarães, Julio Dantas, Libanio Antonio Fialho Gomes, Lourenço Caldeira da Gama Lobo Cayolla, Luciano Affonso da Silva Monteiro, Luiz Eugenio Leitão, Luiz Filippe de Castro (D.), Luiz José Dias, Luiz Maria de Sousa Horta e Costa, Manuel Antonio Moreira Junior, Manuel Joaquim Fratel, Miguel Antonio da Silveira, Miguel Pereira Coutinho (D.), Ovidio de Alpoim de Cerqueira Borges Cabral, Paulo de Barros Pinto Osorio, Pedro Doria Nazareth, Raul Correia de Bettencourt Furtado, Rodrigo Affonso Pequito, Sertorio do Monte Pereira, Visconde do Ameal, Visconde das Arcas, Visconde de Guilhomil Visconde de Pedralva, Visconde da Ribeira Brava, Zeferino Candido Falcão Pacheco.

Entraram durante a sessão os Srs.: Abel da Cunha Abreu Brandão, Alfredo Pereira, Alvaro da Silva Simões, Anselmo de Assis Andrade, Antonio Augusto Pereira Cardoso, Antonio Augusto Pires de Lima, Antonio Centeno, Antonio de Sousa Athayde Pavão, Arthur Pinto de Miranda Montenegro, Augusto de Castro Sampaio Côrte Real, Bernardo de Alpoim de Cerqueira Borges Cabral, Conde de Paçô-Vieira, Eduardo Burnay, Eduardo Fernandes de Oliveira, Ernesto Julio de Carvalho_e Vasconcellos, Francisco Limpo de Lacerda Ravasco, Francisco Xavier Cabral de Oliveira Mondada, João Alberto Pereira de Azevedo Neves, João Augusto Pereira, João Monteiro Vieira de Castro, Joaquim Augusto Ferreira da Fonseca, Joaquim Hilario Pereira Alves, José Christovão Patrocinio de S. Francisco Xavier Pinto, José Gonçalves Pereira dos Santos, José Joaquim de Sousa Cavalheiro. José Maria Queiroz Velloso, José Mathins Nunes, Julio Ernesto de Lima 1uuue, Luiz Pizarro da Cunha de Porto Carrero (D.), Luiz Vaz de Carvalho Crespo, Manuel Telles de Vasconcellos, Matheus Teixeira de Azevedo, Thomaz de Almeida Manuel de Vilhena (D.), Visconde da Torre.

Não compareceram á sessão os Srs.: Alexandre Proença de Almeida Garrett, Antonio Alberto Charula Pessanha Antonio Alves Pereira de Mattos, Antonio Homem de Gouveia, Antonio José Gomes Lima, Antonio Peixoto Correia, Antonio Rodrigues Nogueira, Antonio de Sousa Horta Sarmento Osorio, Augusto Guilherme Botelho de Sousa, Conde de Castro e Solla, Duarte Gustavo de Roboredo Sampaio e Mello, Eusebio David Nunes da Silva, Gil de MontAlverne de Sequeira, João Joaquim Isidro dos Reis, José Antonio Alves Ferreira de Lemos Junior, José Augusto de Lemos Peixoto, José Augusto Moreira de Almeida, José Coelho da Motta Prego, José Joaquim Mendes Leal, José Maria de Oliveira Simões, José Osorio da Gama e Castro, Manuel Francisco de Vargas, Marianno Cyrillo de Carvalho, Marianno José da Silva Prezado, Mario Augusto de Miranda Monteiro, Vicente Rodrigues Monteiro.

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SESSÃO N.° 16 DE 16 DE AGOSTO DE 1905 3

ABERTURA DA SESSÃO — Ás 3 horas da tarde

Acta — Approvada.

EXPEDIEME

Officios

Do Ministerio do Reino, remettendo, em satisfação ao requerimento do Sr. Deputado José Antonio Alves Ferreira de Lemos, as copias dos relatorios das syndicancias ás mesas das Misericordias de Villa do Conde de Santo Thyrso.

Para a secretaria.

Do mesmo Ministerio, enviando, em satisfação ao requerimento do Sr. Deputado Alfredo Brandão, uma nota do numero, movimento e promoções dos chefes de repartição, officiaes e amanuenses da Secretaria de Estado dos Negocios do Reino, nos ultimos vinte annos.

Para a secretaria.

Do mesmo Ministerio, enviando copia dos contratos celebrados entre a Camara Municipal de Lisboa e o actual fornecedor de carnes verdes para o abastecimento da cidade; satisfazendo assim o requerimento do Sr. Deputado Mario Augusto de Miranda Monteiro.

Para a secretaria.

Do Ministerio da Fazenda, remettendo copia do officio da Direcção Geral da Thesouraria, juntamente com os documentos no mesmo designados sobre a questão dos tabacos, incluindo a consulta da Procuradoria Geral da Coroa ácerca da capacidade juridica da Companhia dos Fhosphoros, em satisfação ao requerimento do Sr. Deputado Clemente Joaquim dos Santos Pinto.

Para a secretaria.

Do mesmo Ministerio, remettendo mais 80 exemplares do relatorio, proposta de lei, contrato e mais documentos relativos ao negocio dos tabacos, a fim de serem distribuidos pelos Srs. Deputados.

Para a secretaria.

Do mesmo Ministerio, remettendo, para serem distribuidos pelos Srs. Deputados, 170 exemplares da Emigração Portuguesa, anno de 1901.

Para a secretaria.

Do Ministerio da Guerra, enviando, para serem distribuidos pelos Srs. Deputados, 180 exemplares das contas d’aquelle Miuisterio.

Para a secretaria.

Do mesmo Ministerio, remettendo, em satisfação ao requerimento do Sr. Deputado José Maria de Oliveira Simões, uma lista dos officiaes de artilharia sem o curso desta arma, que fazem serviço no ultramar, nos termos do decreto de 14 de novembro de 1901.

Para a secretaria.

Do mesmo Ministerio, remettendo, em satisfação ao requerimento do Sr. Deputado Antonio de Mattos de Magalhães, copia do requerimento da Junta de Parochia de Alegrete, pedindo lhe sejam concedidas as muralhas d’esta antiga villa, a fim de poder realizar alguns melhoramentos de reconhecido interesse publico.

Para a secretaria.

Do Ministerio da Marinha, reraettendo, em satisfação ao requerimento do Sr. Deputado José Joaquim Mendes Leal, um mappa da força da columna que marchou do Humbe para a margem esquerda do rio Cunene, sob o commando do governador da Huilla, capitão de engenharia João Maria de Aguiar, e outros documentos.

Para a secretaria.

Do mesmo Ministerio, enviando nota dos commissarios do Governo junto das companhias coloniaes, com a indicação das leis que auctorizam as nomeações; datas d’essas nomeações, e nota dos abonos que lhes teem sido feitos; satisfazendo assim ao requerimento do Sr. Deputado Alberto de Castro Pereira de
Almeida Navarro.

Para a secretaria.

Do mesmo Ministerio,enviando nota dos abonos que são feitos aos commissarios do Governo junto das companhias coloniaes, das leis que os justificam, e datas d’essas nomeações; satisfazendo assim ao requerimento do Sr. Deputado José Maria de Queiroz Velioso.

Para a secretaria.

Do mesmo Ministerio, remettendo, em satisfação ao requerimento do Sr. Deputado Alfredo Cesar Brandão, uma nota indicando o numero de funccionarios de que se compõe o quadro da Direcção Geral do Ultramar e nota do numero de empregados que teem mais de dez annos na sua actual classe.

Para a secretaria.

Da Camara dos Deputados da Republica Francesa, enviando uma caixa, contendo projectos de lei, annaes parlamentares e outros documentos.
Para a secretaria.

Do Tribunal de Verificação de Poderes, remettendo os accordãos sobre os processos eleitoraes n.ºs 23, Funchal; 27, S. Tiago de Cabo Verde; 29, Angola; 30, Moçambique; 31, Margão; 32, Mapuçá; 33, Macau; definitivamente julgados por aquelle tribunal.

Para a secretaria.

Segunda leitura

Proposta de renovação de iniciativa

Renovo a iniciativa do projecto n.° 13-B, de-1904, que considera serviço publico para todos os effeitos, e especialmente para os da alinea b) do § 4.° do artigo 1.° da carta de lei de 12 de junho de 1901, todo o serviço militar prestado até a data da execução da lei de 26 de fevereiro de 1892. = O Deputado, Abel Andrade.

Admittida á discussão e enviada á commissão de guerra, ouvidas as commissões de instrucção prinaria e secundaria.

O projecto a que se refere esta proposta é o seguinte:

Projecto de lei n.° 13-8, de 1904

Senhores. — A desigual e incerta interpretação das leis desmoraliza os costumes e offende a justiça.

Sendo, como é, indubitavel que a questão de ensino depende essencialmente das condições do professorado, a quem o Estado não pode nem deve regatear os precisos meios de independencia; e tendo-se posto em duvida se o serviço militar, sem duvida o mais relevante e pesado que um cidadão pode prestar á sua pátria, devia ser considerado serviço publico para os effeitos da lei de 26 de fevereiro de 1892, julguei dever indeclinavel submetter á vossa apreciação o seguinte projecto de lei:

Artigo 1.° Todo o serviço militar prestado até a data

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da execução da lei de 26 de fevereiro de 1892 é considerado serviço publico para todos os effeitos, e especialmente para os da alinea b) do § 4.° do artigo 1.° da curta de lei de 12 de junho de 1901.

Art. 2.° Fica revogada toda a legislação em contrario. = O Deputado, Abel Andrade.

O Sr. Presidente: - Proclamo Deputados da nação portugueza os Srs.:

João Augusto Pereira.
Joaquim Hilario Pereira Alves.
João Alberto Pereira de Azevedo Neves.
José Christovam do Patrocinio de S. Francisco Xavier Pinto.
Joaquim Augusto Ferreira da Fonseca.
Ernesto Julio de Carvalho Vasconcellos.
Abel da Cunha Abreu Brandão.

Constando-me acharem-se noa corredores da Camara estes Srs. Deputados e o Sr. Visconde da Torre, que pretendem prestar juramento, convido os Srs. Augusto Crespo, Lima Duque, Queiroz Ribeiro o Conde de Paçô-Vieira a introduzirem-nos na sala.

Prestaram juramento e tomaram assento.

O Sr. Presidente: — Cumpre-me declarar á Camara que neste curto intervallo parlamentar, pouco mais de tres meses, falleceram alguns cidadãos que foram membros illustres d'esta assembleia.

Foram elles os Srs. Antonio Simões dos Reis, jurisconsulto eminente, modelo dos homens de bom; Antonio de Castro Pereira Côrte Real, grande proprietario e partidario dedicadissimo; Antonio Pedroso dos Santos, antigo Deputado e director geral das contribuições directas, logar que desempenhou com todo o zelo; Miguel Dantas Gonçalves Pereira, Par do Reino, antigo Deputado, que pelo seu trabalho soube criar uma alta posição social; Visconde de Chancelleiros, verdadeiro paladino da viticultura nacional, ardente lutador e tribuno fulgurantiasimo; Polycarpo Pecquet Ferreira dos Anjos, ura dos mais distinctos e brilhantes ornamentos do corpo commercial portuguez, e D. Jorge de Mello, general distincto e illustrado.

A Camara decerto quer que na acta das sessões se consigne um voto de sentimento pela perda de tão distinctos homens publicos. (Apoiados).

O Sr. Ministro da Marinha (Moreira Junior): — Ouvi, Sr. Presidente, as palavras compungidas que V. Exa. pronunciou em homenagem, justissima homenagem, para com a memoria d'aquelles que a morte impiedosa uma vez mais nos levou no intervallo parlamentar; palavras justissimas, porque todos elles são dignos do nosso maximo a preço, do nosso respeito e da nossa admiração. (Apoiados).

Pertenceram as individualidades que V. Exa. frisou a varias parcialidades politicas; pouco importa isso, Sr. Presidente, a todos a manifestação do meu respeito, a mesma homenagem pela sua memoria, porque todos são dignos d'essa manifestação pelos serviços que prestaram. (Apoiados).

Entre elles, entre essas individualidades distinctas, proferiu V. Exa., na lista negra que ha pouco acabou de ler, o nome do Visconde de Chancelleiros, personalidade verdadeiramente original no nosso meio, que se destacava pelas altas e poderosissimas faculdades que o distinguiam acima de tudo pelo seu altissimo valor parlamentar que se destacou no nosso meio por uma nota de originalidade verdadeiramente inexcedivel, cuja palavra eloquente e brilhante encantava, e que sabia elevar-se á maxima culminancia da eloquencia, que tão bem sabia frisar a nota da ironia mais fina e mais sangrenta com a nota sarcástica mais cruel e esmagadora.

O Visconde de Chancelleiros, cujas altas qualidades nunca é de mais valorizar e no qual, sobretudo, se destacava a sua brilhante phantasia, quer quando tratava as magnas questões de administração publica, quer ainda quando procurava realizar no campo pratico da agricultura as suas formosas aspirações, deixa uma saudade profunda em quantos o conheciam.

Citou tambem V. Exa. Polycarpo Anjos, individualidade igualmente notavel no nosso acanhado meio. Trabalhador infatigavel, verdadeiramente modelar fez consistir os seus pergaminhos num trabalho constante, valorizando a sua individualidade e tornando a o prototypo brilhantissimo d'essa bella corporação nacional — o commercio portuguez — que tem o seu nome honrosamente conhecido em todos os grandes centros do mundo.

Citou tambem Pedroso dos Santos, funccionario zeloso e distincto; Miguel Dantas, trabalhador indefectivel, que soube gastar parte da sua ardua juventude em preparar uma velhice suave e util; D. Jorge de Mello, general illustre; Antonio de Castro Côrte Real, admirado por todas as personalidades politicas e que sabia sempre pôr em evidencia as bellas e excellentes tradições da sua nobre familia; e finalmente Antonio Simões dos Heis, magistrado integerrimo, o politico que dignamente soube sempre defender os interesses dos circulos que o elegeram, o partidario dedicado que tanta falta fez ao partido progressista.

Por tudo isto, Sr. Presidente, em nome do Governo, não posso deixar de me associar commovido, com a mesma commoção que V. Exa. tinha ao pronunciar as palavras que ha pouco proferiu, não posso deixar, repito, de me associar á homenagem por V. Exa. prestada.

Tenho dito.— (Vozes: Muito bem).

O Sr. Antonio Cabral: — Sr. Presidente: duas palavras apenas, em nome da maioria relativamente, ao fallecimento dos illustres Deputados da nação cujos nomes V. Exa. ha pouco leu á Camara.

Fez V. Exa. Sr. Presidente, em palavras eloquentes, e o Sr. Ministro da Marinha acabou de o fazer em palavras, não menos formosas, o elogio de todos esses homens publicos, alguns dos quaes tivemos por companheiros nesta casa do Parlamento.

Portanto, pouco mais acrescentarei. só direi, em nome da maioria, que todos nos, sem fazermos excepção de nenhum dos nomes cujo desapparecimento neste momento commemoramos, lastimamos a perda d'esses infatigaveis trabalhadores, d'esses leaes servidores do seu paiz cuja morte tanto sentimos.

Mas entre esses permitta-me V. Exa. que eu destaque o nome do Dr. Antonio Simões dos Reis. Tive a honra de ser amigo particular do Dr. Antonio Simões dos Reis, e, portanto, pude avaliar, com o convivio que com elle tive, as nobres qualidades d'aquelle espirito e os attributos superiores d'aquelle esplendido caracter.

V. Exa., Sr. Presidente, que o conheceu, soube quanto elle era digno, quanto elle estimava o seu partido e quanto elle trabalhava infatigavelmente pelo progresso d'esta grande associação partidaria que se chama partido progressista. (Apoiados).

Até ha pouco tempo, antes de morrer, sustentava elle, á sua custa, no Porto, um jornal chamado A Provincia, que dava poucos proventos em virtude do limitado numero de assinantes que tinha, sem jamais pedir a ninguem nem remuneração nem compensação.

Foi um jurisconsulto distincto e um advogado que honrou a sua cadeira. (Apoiados).

Por varias vezes substituiu os juizes que não podiam por impedimento desempenhar as suas funcções.

Portanto, o com profundo pesar que me associo á commemoração que V. Exa. acaba de propor á Camara des-

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tacando o nome do Dr. Antonio Simões dos Reis, sem deixar, comtudo, no olvido os numes dos outros tambem fallecidos e que se chamaram: Visconde de Chancelleiros, Antonio de Castro Pereira Côrte Real, Antonio Pedroso dos Santos, Polycarpo Anjos, e Miguel Dantas Gonçalves Pereira, cuja perda todos deploramos. (Vozes: — Muito bem).

O Sr. Pereira dos Santos: — Em nome da minoria regeneradora associo-me ao voto de sentimento que V. Exa., Sr. Presidente, acaba de propor pela perda de alguns membros d'esta casa do Parlamento.

Todos militaram na politica e todos nella tiveram papel bem saliente, mas nem todos militaram sob a mesma bandeira.

Todavia, isso não influe para que o nosso pesar pela sua perda se não manifeste. Não ha dissidencias depois da morte. Todos procuraram servir o seu paiz, e portanto todos são dignos da consideração d'esta Camara. (Apoiados).

Destacarei em primeiro logar a figura verdadeiramente sympathica do Visconde de Chancelleiros.

Foi nobre pelo nascimento, pelo seu talento e pelos seus servidos; e foi o representante de uma familia que esta Camara por varias vezes já teve occasiao, em condolencias, de consagrar pelos serviços relevantes prestados á nação.

O Visconde de Chancelleiros era uma physionomia marcada e accentuada na politica portugueza, e principalmente na estancia parlamentar onde teve lugar.

Hão de lembrar por muito tempo os discursos, tão cheios de elevação, de elegancia e de cortesia com que elle honrou a tribuna parlamentar. (Apoiados).

Não havia orador mais original; mas a delicadeza com que tratava os adversarios deixava-os encantados, porque a fidalguia das suas maneiras contrastava com a sua forma oratoria, que era verdadeiramente inexcedivel, tanto no conceito elevado, como na ironia fina.

A rudeza da sua physionomia sobresaia na natural delicadeza com que tratava os seus adversarios.

A sua palavra encantava, por igual, amigos e adversarios, sondo sempre de uma galhardia inimitavel.

O Visconde de Chancelleiros foi um grande fidalgo: fidalgo pelo nascimento, pelos serviços e pelo talento.

O elogio do Visconde de Chancelleiros já foi feito pelo Sr. Ministro da Marinha, e em breve o será tambem na estancia parlamentar onde elle ultimamente tinha logar. Por isso, pela minha parte, nada mais acrescentarei.

Quanto a Miguel Dantas Gonçalves Pereira devo dizer que, quando da primeira vez entrei na Camara, travei com elle relações de amizade, e tive portanto occasião de conhecer as qualidades do seu bello caracter; mas, independentemente do sentimento pessoal, associo-me e rio-me do partido regenerador ao voto de sentimento proposito pela perda de um correligionario tão dedicado e valioso.

Miguel Dantas acompanhou sempre o partido regenerador e, pela sua actividade, grangeou uma fortuna, que empregou em beneficio da região, que durante tanto tempo representou em Côrtes, pelo que se tornou credor do reconhecimento d'esses povos.

Não posso tambem deixar de me referir ao cidadão que se chamou Polycarpo Anjos que, apesar doa commodos que lhe podia proporcionar a sua posição social, não duvidou applicar a sua actividade e o seu talento aos progressos de uma das mais caracteristicas e definidas manifestações do trabalho nacional, deixando um dos nomes mais respeitados na praça de Lisboa, e tendo usado sempre na politica da maxima lealdade. (Muitos apoiados).

Por ultimo, Sr. Presidente, referir-me-hei a Antonio de Castro Pereira Côrte Real. O partido regenerador perdeu com a sua morte, porque elle foi sempre um correligionario dedicadissimo, e de uma grande lealdade.

É pelo passamento d'estes illustres homens que o partido regenerador se curva reverente perante tal fatalidade. (Muitos apoiados. — Vozes: — Muito bem, muito bem).

O Sr. João Franco Castello Branco: — Pedi a palavra para me associar, em meu e em nome dos meus amigos, ao voto de sentimento que V. Exa. acaba de propor.

Permitta-me V. Exa. e a Camara que eu em primeiro logar me refira e destaque o nome do Visconde de Chancelleiros, aquelle caracter nobilissimo que tão grandes e especiaes serviços prestou ao paiz.

Sr. Presidente: são meia duzia de palavras apenas que eu desejo pronunciar, não por prurido de rhetorica nem de enaltecer a memoria d'esse homem que, possuindo talvez como nenhum, qualidades do orador, deixou o seu logar na Camara verdadeiramente insubstituivel e que a um caracter encantador, a uma convivencia inexcedivelmente agradavel, alliava condições de sociabilidade que nunca poderão esquecer áquelles que o estimaram (Apoiados).

Prestou serviços a este paiz fora da orbita relativamente estreita em que costumam prestá-los em geral os nossos homens politicos.

O Visconde de Chancelleiros era um grande viticultor; e, quando o phylloxera invadiu o nosso paiz, talando e destruindo os vinhedos, o Visconde de Chancelltjiros foi dos mais dedicados a combater o mal. Espirito emprehendedor, intelligencia clara e illustrada, com perfeito conhecimento de todos os processos de cultura que nos paizes mais adeantadus se empregavam para a replantação e renascimento dos vinhedos destruidos, e dispondo de alguns meios, (não tanto como á primeira vista podia parecer, porque o Visconde de Chancelleiros nunca foi tão rico como muitas vezes a imaginação portugueza o phantasiava), entendeu que devia desde logo travar combate tenaz e intenso contra o terrivel flagello e dar ao seu paiz a demonstração de que a primeira de todas as nossas producções agricolas e das nossas riquezas economicas não era perdida; que bastava um pouco de trabalho, de capital, attenção, cuidado, junto á intelligencia e illustração para refazer aquelle antigo manancial da riqueza publica.

O Visconde de Chancelleiros foi o primeiro lavrador portuguez que começou a fazer a replantação e restauração dos vinhedos nacionaes por meio da adaptação das castas americanas, e todos comprehendem que um emprehendimento d'esta natureza havia necessariamente de acarretar indecisões e prejuizos graves para quem assim se abalançava a ser o primeiro de todos os lavradores portuguezes que pretendia restaurar entre nós uma tão grande riqueza. (Apoiados).

Effectivamente não eram tão conhecidas como hoje são muitas das variedades americanas que não teem resistencia aquelle flagello.

Tudo isso, além de outras particularidades inherentes á cultura vinicola, era então por completo desconhecido e d'essa aprendizagem sorTreu grandemente a fortuna do Sr. Visconde de Chancelleiros, lucrando os seus vinhos com a causa que a elle fez soffrer. (Muitos apoiados). D'ahi saiu esse grande beneficio publico prestado pelo Visconde de Chancelleiros em cuja cabeça todos aprenderam e que morrendo deixa sua familia, sob o ponto de vista material, em circunstancias precarias.

Num paiz em que se não é escasso de gastar, em que se não é escasso de criar conesias para os vivos, bom é que se renda tambem aos mortos o preito que elles merecem, principalmente áquelles que prestaram verdadeiros serviços ao seu paiz quaes os que o Visconde de Chancelleiros prestou.

Todos os agricultores d'aquella região e todos os que a conhecem sabem que estou dizendo a verdade quando affirmo que com o que elle perdeu aprenderam muitos a restaurar a economia do paiz.

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Alguma cousa havia a propor a este respeito; não o faço eu, em primeiro logar, porque mal ficaria aqui; em segundo logar porque, tendo elle occupado logar tão brilhante e honroso na outra casa do Parlamento, é possivel que alguém se lembre ahi, e com mais direito, de propor aquillo que se deve fazer ao Visconde de Chancelleiros, o restaurador dos vinhos portuguezes.

Se ninguem o propuzer tambem eu o não farei, porque verei então na mudez com que são acolhidas as minhas palavras que sou eu que estou em erro e que não são os serviços que elle prestou os que merecem a attenção do Parlamento, mas são porventura outros que elle não sabia prestar. (Vozes: — Muito bem).

O Sr. Presidente: — Em vista da manifestação da Camara considero approvada a minha proposta.

Lançado na acta o voto de sentimento da Camara, serão feitas as devidas communicações ás familias dos illustres extinctos.

Vou agora inscrever os Srs. Deputados que queiram usar da palavra antes da ordem do dia.

O Sr. Ministro da Fazenda (Manoel Affonso de Espregueira): — Vae ler e mandar para a mesa diversas propostas de lei.

(Leu).

O Sr. Presidente: — Previno o Sr. Ministro que deu a hora de se passar á ordem do dia.

O Sr. Ministro da Fazenda (Manoel Affonso de Espregueira): — Eu peço para continuar a leitura. Resta-me ainda uma proposta.

O Sr. Presidente: — Consulto a Camara sobre se o Sr. Ministro pode continuar na leitura. Assim te

O Sr. Ministro da Fazenda (Manoel Affonso de Espregueira): - (Continua lendo).

Aproveito a occasião de mandar tambem para a mesa as modificações ao contrato dos tabacos de 4 de abril de 1905, que são as seguintes:

No preambulo:

Acrescentar a «Sanccionado pela lei de 23 de março de 1891» «e ratificado pela convenção de 13 de abril de 1891».

No artigo 1.°:

Acrescentar a «contrato de 26 de fevereiro de 1891» «ratificado pela convenção de 13 de abril do mesmo anno».

No artigo 2 °:

Alinea 2.ª Substituir «promulgação da lei que approvar o presente contrato» por: «data em que entrar em execução o presente contrato».

Alinea 4.ª Substituir «da promulgação da lei» por: «do começo de execução do contrato».

Alinea 6.ª Intercalar depois de «epoca» «no todo ou em parte».

Nos artigos 2.°, 3.°, 4.°,; e 5.° :

Substituir «1 de abril de 1900» por «1 de outubro de 1905» ; «1 de outubro de 1905» por «1 de abril de 1906»; «1 de abril de 1906» por «1 de outubro de 1906» ; «1 de outubro de 1915» por ai de abril de 1916».

No artigo 4.°:

Substituir «depois da promulgação da lei que approvar este contrato» por «a partir da data em que este contrato entrar era execução».

No artigo 5.°:

Substituir «a denuncia das obrigações de 4 1/4 por cento só tem logar depois de 1 de abril de 1900, de forma que o seu reembolso só pode vir a realizar-se depois de 1 de outubro de 1905» por «se o aviso para o reembolso das obrigações de 4 1/2 por cento for publicado depois de 1 de outubro de 1905 de forma que esse reembolso e o possa vir a realizar-se depois de 1 de abril de 1906».

No artigo 8.°:

Supprimir «na sua sede de Paris».

No artigo 9.°:

Substituir «da promulgação da lei que approvar o presente contrato» por «do começo da execução do presente contrato».

No artigo 10.°:

Substituir tudo o artigo pelo seguinte texto:

«A emissão do emprestimo de que trata o presente contrato deverá ter logar dentro dos trinta dias que se seguirem á data da promulgação da lei que approvar este contrato, o qual será considerado em execução logo que a data da emissão for fixada.

Se porem ao tempo da promulgação da lei houver nos mercados financeiros perturbação resultante de acontecimentos imprevistos ou se a cotação do consolidado inglês de 2 1/2 por cento da divida publica franceza de 3 por cento, ou da divida fundada portugueza de 3 por cento, externa, houver baixado, em Londres ou em Paris, 2 por cento em relação ás cotações medias respectivas de 4 de abril de 1905, os segundos e terceiros outorgantes poderão adiar a emissão, prevenindo o Governo Portuguez dentro do prazo de oito dias contados da promulgação da lei. Neste caso a execução do presente contrato ficara adiada até os ditos outorgantes fixarem a data da emissão, devendo-se nesta occasião modificar as datas a que se referem os artigos 2.°, 3.°, 4.° e 5.° d'este contrato, se for necessario para o effeito de as tornar concordantes com a data fixada para a emissão.

A fixação da data da emissão será em todos os casos reduzida a termo.

Se o Adiamento da emissão ultrapassar noventa dias contados da data da promulgação da lei, o Governo poderá declarar o presente contrato sem effeito em todas as suas partes».

No artigo 13.° (alinea 2.ª):

Substituir «1907 e por 1905, augmentados dos acrescimos verificados nos dois exercicios anteriores e considerando-se o excedente da venda que porventura houver no fim do exercicio de 1906 a 1907 como pertencente ao exercicio de 1907 a 1908».

No artigo 42.° (alinea 1.ª):

Substituir todo o periodo pelo seguinte texto:

«A partilha de lucros com o pessoal operario e não operario far-se.ha nos dois primeiros exercicios segundo o regime estabelecido no n.º 1.º do artigo 5.° das bases a que se refere o contrato de 20 de fevereiro de 1891, mas, em vez de deduzir do producto liquido de fabrico e venda o algarismo que deve comprehemler a renda e os dividendos estatuiu-mos, a companhia deduzirá apenas a renda fixa de 6.000:000$000 réis».

No artigo 14.° (alinea 6.ª):

Substituir «nos seus interesses» por: «na sua partilha de lucros».

No artigo 15.°:

Substituir todo o artigo pelo seguinte texto:

«Ao terminar a concessão, em 30 de abril de 1926, o Estado reassumirá a posse do exclusivo, se as obrigações do emprestimo, contraindo por effeito do artigo 20.° do presente contrato, tiverem sido integralmente reembolsadas.

As obrigações consideram-se integralmente reembolsadas logo que o Estado houver posto á disposição dos portadores nos estabelecimentos encarregados do serviço do empréstimo a importiincia necessaria para esse effeito.

Nenhuma modificação no regime dos tabacos estabelecido no presente contrato poderá vigorar emquanto o Estado não reassumir a posse do exclusivo.

Se, ao terminar a concessão, o reembolso das obriga-

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coes se não achar, nem effectuado nem devidamente assegurado, como acima fica dito, a Companhia dos Tabacos conservar provisoriamente a posse do exclusivo nas condições, a esse tempo em vigor, do presente contrato, e o Estado reassumirá a referida posse no fim do exercicio em que o reembolso das obrigações se effectuar.

Neste ultimo caso o disposto no n.° 15.° do artigo 5.º das bases a que se refere o contrato de 26 de fevereiro de 1891 é mantido, mas o aviso do Governo poderá ser feito com precedencia apenas de sois mezes.

Em tal circunstancia a companhia terá a faculdade de entregar ao Governo somente um fornecimento proporcional ao espaço de tempo de que o aviso lhe deixar dispor, devendo as quantidades respectivas a cada marca ser tambem proporcionaes em relação ás requisições feitas, mas vendo-se a companhia na impossibilidade de fornecer a quantidade de tabaco fixado no n.° 5.° do dito artigo supracitado, assim o declarar ao Governo dentro dos oito dias que se seguirem ao aviso.

Sn durante a situação transitoria, a que as ultimas disposições supra se referem, o producto liquido da exploração do exclusivo, abatidos os encargos e despesas, de conformidade com as disposições legaes vigentes e decisões dos tribunaes arbitraes, não facultar o juro estatutario de 6 por cento do capital realizado em acções da Companhia dos Tabacos, abater-se ha na renda fixa, a que esta é obrigada, a importancia necessaria para se poder completar aquelle juro.

No caso de duvida entre o Governo e a Companhia, será a questão resolvida pelo Tribunal Arbitral, constituido nos termos do artigo 12.º das bases supracitadas».

No artigo 16.°:

Acrescentar a «contrato de 26 de fevereiro de 1891»: «e da Convenção de 13 de abril do mesmo anno».

No artigo 18.°:

Substituir o 15 de julho de 1905» por: «31 de dezembro de 1905».

Acêrca da representação dos operarios dos tabacos declaro que o Governo não tomou deliberação alguma sobre ella e que resolveu enviá-la á commissão de fazenda para ali ser estudada, expondo, então, o Governo o que entende sobre o assumpto.

Foram remittidas á commissão de fazenda.

As propostas de lei vão publicadas no fim da sessão, a pag. 20.

O Sr. Presidente do Conselho de Ministros (José Luciano): — Peço a palavra.

O Sr. Presidente: — Como já deu a hora de se passar á ordem do dia, consulto a Camara sobre se devo conceder a palavra a V. Exa.

A Cantara resolveu adfirmativamente.

O Sr. Presidente do Conselho de Ministros (José Luciano de Castro): Sr. Presidente: o adiamento das Camaras, decretado era maio ultimo, não permittiu que eu expuzesse nas Camars, as razões que determinaram a modificação ministerial, a recomposição do Gabinete. É o que agora vou fazer.

A Camara sabe que, a proposito da discussão do contrato dos tabacos, houve, no seio da commissão de fazenda, uma grave divergencia entre o Governo e a maioria d’essa commissão.

Estavamos no segundo dia de discussão; e, quando já tinham sido approvados alguns artigos do contrato e examinavamos o artigo 13.° appareceu uma proposta, apresentada por um dos vogaes da mesma commissão, em que se propunha a separação da adjudicação do exclusivo dos tabacos, da conversão das obrigações dos tabacos.

O Governo declarou, desde logo, que não podia acceitar esta proposta.

E eram evidentes as razões por que o Governo a não podia acceitar.
Em primeiro logar, o Governo tinha negociado e firmado um contrato, que tinha por base fundamental a reunião das duas operações: a adjudicação do exclusivo e a conversão do emprestimo de 1891.

Ora, a proposta que tinha sido apresentada atacava fundamentalmente essa base, e, se ella fosse approvada, seria logo rejeitado todo o contrato.

O Governo tinha declarado que estava disposto a acceitar qualquer modificação, nos artigos do contrato, que tinham soffrido maior impugnação na imprensa; mas, é claro que não podia acceitar tima proposta que tendia a destruir o contrato. Repito: podia acceitar a modificação de alguns artigos; mas nunca poderia acceitar a que estava consignada na proposta apresentada.

E note a Camara quando entrei para o Governo, tive a ideia de separação das duas operações; mas mudei de ideia, porque, não podendo o Governo reembolsar os credores do empréstimo de 1891, havia o direito de propor o exclusivo, sem primeiro proceder aquelle reembolso?

Essa ideia que tive, confesso-o, procurou realizá-la o Governo regenerador como se prova pelos documentos juntos ao relatorio do Sr. Rodrigo Pequito.

Ao cabo de sinceras diligencias veio o convencimento de que a separação das duas operações só seria prejudicial aos interesses do Estado.

Mas o Governo progressista fez mais.

Abriu concurso entre duas companhias rivaes, entre a Companhia dos Phosphoros e a Companhia dos Tabacos.

A esse concurso admittia todas as propostas que porventura se apresentassem. Esse concurso provou contra a ideia da separação das duas operações, porque a Companhia dos Posphoros declarou que não podia otterecer nenhum preço para a conversão sem primeiramente saber qual a forma por que o Governo acceitava a adjudicarão do exclusivo.

A Companhia dos Tabacos offereceu effectivamente um preço superior ao contrato de 16 de julho, mas esse preço que era de 46 francos e 2õ centimos por obrigação não satisfez o Governo.

O Governo teve a fortuna de realizar um contrato em condições tão vantajosas como nenhum outro se celebrou ainda em Portugal. (Apoiados).

Se nós tinhamos conseguido, reunindo duas operações no mesmo contrato, assegurar e garantir interessou importantes para o Thesouro, como e por que nos haviamos de lançar em novas aventuras? Quem nos asseguraria que as duas companhias não acabariam por se entender e que, os interesses do Thesouro não soffreriam irreparavel golpe? Qual era o Ministro da Fazenda que queria tomar sobre si tal responsabilidade?

Estas e outras ponderações fiz perante os membros da commissão de fazenda; mas, por maiores que fossem os meus esforços, não tive a fortuna de dissuadir aquelles cavalheiras do seu proposito, e insistiram na sua proposta. Dada esta divergencia, reuniu o Conselho de Ministros em 8 de maio, e ahi, expondo lealmente, e francamente, tudo o que se tinha passado na commissão de fazenda, vi com surpresa, então, o meu antigo collega o Sr. Conselheiro Alpoim declarar que tinha sido ouvido e consultado pelos seus amigos da o.ommisfão de fazenda, e que perfilhava a proposta que elles tinham apresentado.

Comprehende V. Exa. que, depois d'esta declaração, o conflicto estava declarado e a crise aberta,

Por mais diligencias que empregasse, e melhores argumentos para dissuadir o meu antigo collega da sua opinião e proposito, não consegui o meu desejo.

Foi então que se declarou a crise, e tive que propor a El-Rei a sabida dos Conselhos da Coroa do Sr. Conselheiro José de Alpoim e a sua substituição, pelo Sr. Arthur Montenegro, que escuso de apresentar á Camara.

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O Sr. Montenegro pelas, suas brilhantes qualidades parlamentares e pela superior intelligencia e caracter, de ha muito que tinha conquistado a confiança da maioria da Camara, e tinha direito a ter um logar nos Conselhos da Corôa. (Apoiados).

Estou convencido de que S. Exa. saberá corresponder á esperança que nelle se deposita.

D'este acontecimento proveio naturalmente excitação no seio da maioria, excitação que podia e devia reflectir-se nos debates parlamentares, perturbando a sua serenidade com grave prejuizo para os interesses do Estado.

Por outro lado o Governo desejava aproveitar o intervallo parlamentar para obter modificações nas bases do contrato que maiores impugnações tinham soffrido na imprensa e então o Governo entendeu propor o adiamento das Côrtes.

Quanto á acalmação das paixões só o tempo poderá dizer se as previsões do Governo se realizaram.

Quanto ás modificuções no contrato dos tabacos, a Gamara resolverá se ellas merecem ou não a sua approvação e ver-se ha se ellas respondem ás criticas e ás duvidas que foram levantadas na imprensa a proposito de alguns dos artigos.

Expostos á Camara os factos taes como se passaram, a Camara em sua alta sabedoria julgara como entender.

Agora, só mais duas palavras.

O Governo, persuadido corno está de que o contrato de 4 de abril é o mais vantajoso que se tem celebrado em Portugal, não hesita todavia em o entregar ao patriotismo e á consciencia da Camara, esperando e desejando sinceramente que a maioria, compenetrada das suas grandes responsabilidades, possa e queira collaborar com elle, no estudo de uma conveniente resolução não só d'este, mas de todos os grandes assumptos, uns que já estão, e outros que vão ser sujeitos ao seu exame. (Vozes: — Muito bem).

O Sr. Presidente: — Peço a attenção da Camara.

Quando falava o Sr. Presidente do Conselho pediram a palavra sobre o mesmo assumpto os seguintes Srs.: João Pinto dos Santos, Queiroz Ribeiro, Pereira dos Jáantos, e Pereira- de Lima.

O regimento no artigo 60.° diz o seguinte:

«Se antes da ordem do dia se tiver levantado discussão sobre qualquer assumpto de interesse publico geral, e for requerido que sobre elle se abra inscripção especial, o requerimento será submettido pela mesa á deliberação da Camara, a qual poderá nesse caso, se deferir, resolver que o assumpto se considere de ordem, seguindo-se discussão nestes termos até final liquidação».

Não ha nenhum requerimento n'este sentido mas eu entendo dever consultar a Camara sobre se deseja que se abra uma inscripção especial sobre o assumpto, em harmonia com o artigo 60.°, para assim se dar maior amplitude á discussão. (Apoiados).

A Camara resolveu affirmativamente.

O Sr. Presidente: — O Sr. João Pinto dos Santos fala a favor ou contra?

O Sr. João Pinto dos Santos: — Apenas pretendo responder ao Sr. Presidente do Conselho.

O Sr. Presidente: — Tem V. Exa. a palavra.

O. Sr. João Pinto dos Santos: — Sr. Presidente: o illustre Presidente do Conselho explicou a crise dada ultimamente e em virtude da qual sahiu do Ministerio o Sr. Alpoim, entrando o Sr. Montenegro.

Não me vou referir propriamente á crise, porque eu pedi a palavra para explicar a situação melindrosa em que me encontro como membro da commissão de fazenda.

Disse o nobre Presidente do Conselho que em virtude de dissidencias havidas na commissào de fazenda é que se tinha dado a crise.

Ora como tem sido de diversos modos interpretados os actos da commissão de fazenda, sendo até apreciados como actos de revolta, eu, Sr. Presidente, sou muito franco, em todos os actos da minha vida prezo-me de proceder sempre com dignidade, não me importando que me digam que não tenho intelligencia; é por isso que eu não podia deixar passar a primeira sessão, sem levantar a minha voz para destruir as accusações que me foram feitas.

A Camara e o paiz apreciarão e farão a devida justiça.

Eu não quero entrar na apreciação economica, juridica ou financeira do contrato dos tabacos.

Não me importa absolutamente nada com isso, porque elle ha de ser discutido largamente quando for apresentado. Por agora, repito, não quero senão frisar bem a attitude que a commissão de fazenda tomou. Não dou mais explicações, porque as não devo dar; agora entendo que devo justificaras meus actos e os dos meus collegas que collaboraram commigo na commissão de fazenda.

Tambem não me quero referir ás minuciosidades que se deram antes da primeira reunião da commissão, nem ás difficuldades que se apresentaram na primeira reunião para a nomeação do respectivo relator, tendo-se recusado diversos Deputados a acceitar esse cargo. Começarei por isso pela primeira sessão da commissão de fazenda, que foi presidida pelo Sr. Marianno de Carvalho. Nós tinhamos lido o contrato dos tabacos publicado no Diario do Governo e nos jornaes, mas não tinhamos recebido os documentos que o deviam acompanhar.

Comprehende-se portanto que, não se tendo recebido esses documentos, não constando que elles fossem publicados no Diario do Governo nem em outra parte, não podiamos apreciar o contrato sem elles; haviamos apenas de confiar naquillo que se dizia no relatorio ministerial ? (Apoiados).

Efectivamente, o illustre Deputado Sr. Antonio Centeno, que era quem, entre nós, mais conhecia o assumpto, porque nos não tinhamos competencia especial, começando por discutir o contrato, lembrou-se de apresentar uma proposta, que se nos afigurou muitissimo sensata.

O contrato dos tabacos tinha varios accessorios, como, por exemplo,
os estatutos: tinha accordãos de varias deliberações sobre interpretação da lei de 1891 e, em consequencia d'isto, o Sr. Antonio Centeno fez uma proposta para que, em vez de ficarem naquelle documento disposições sujeitas a varias interpretações, era melhor fazer um unico diploma, do qual constasse tudo quanto dizia respeito aos tabacos, e ficassem aquelles artigos interpretados em harmonia com esses accordãos.

Parecia-me a proposta mais justa e sensata, desde que se tratava de um assumpto importante como aquelle e do qual havia documentos importantes sobre que a companhia já tinha levantado quatro ou cinco questões igualmente importantes.

Ora, sobre a interpretação d'esses artigos, deviamos procurar no novo contrato acrescentar tudo, por forma a não dar margem a novas discussões. (Apoiados).

Pois esta proposta que era tão sensata, foi logo considerada como obstruccionista, chegando-se até a dizer que, para a sua discussão, não chegariam muitos dias e até semanas.

A isto respondi eu que, sendo relator da proposta o Sr. Oliveira Mattos, que era pessoa muito dedicada ao Governo, a questão não levaria evidentemente muito tempo a discutir.

Mas não terminou aqui o assumpto. Começaram a apparecer varios epigrammas á proposta apresentada pelo Sr. Antonio Centeno, considerando-a como rol, como um papel, não consentindo que figurasse no contrato, ou em

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qualquer outra parte; quer dizer tinhamos apresentado nina proposta, que era de tal maneira desarrasoada, que não podia ser encarada a serio.

Portanto, já V. Exa. vê, Sr. Presidente, que quem argumentava com seriedade e queria tratar o assumpto com a mesma seriedade, não podia concordar em que o assumpto fosse assim tratado, não direi á ponta da espada mas ironicamente, com ares galhofeiros, perguntando-se se queriamos o rol no contrato ou no artigo 1.° da proposta.

O Sr. Oliveira Mattos: — Peço a palavra.

O Orador: — Começámos depois a discutir o ponto fundamental, a que o Sr. Presidente do Conselho, já fez referencia, dizendo que nos approvámos tudo na primeira sessão e que, nas seguintes, modificámos completamente o nosso modo de pensar.

Não é assim; peço desculpa e licença para explicar o nosso procedimento.

O Sr. Centeno fez uma proposta para que a discussão se dividisse em duas partes, uma com respeito á conversão das obrigações e outra ao exclusivo.

D'esta forma havia de discutir-se em primeiro logar o artigo 1.º
passando-se depois aos artigos 11.°, 12.° e 13.° Ora o artigo 1.° dizia:

(Leu).

Como o Governo nos dizia no seu relatorio que não era possivel fazer a divisão das duas operações, nos approvámos este artigo, mas ficando dependente de condições que haviamos de apreciar. Nos dissemos effectivamente que o contrato havia de ser feito com a Companhia dos Tabacos nestas condições, mas tinha-se accordado porventura nas condições que constavam do artigo seguinte? Não, era preciso discutir.

Já vêem que quando eu digo que não tinhamos approvado definitivamente digo a verdade; tinhamo-lo approvado dependente de condições.

Passou-se depois ao artigo 11.°, que estava nas mesmas condições. Não tinhamos nada que discutir porque dizia respeito ao artigo anterior.

Vinha depois o artigo 13.° que diz:

(Leu).

Sobre este artigo levantou-se grave discussão e o Sr. Centeno apresentou uma proposta.

Neste artigo não se discutiu nada, davam-se como approvadas as modificações que no presente contraio são estipuladas.

Mas quando se começou a tratar de uma das condições do contrato, nos divergimos do que estava neste artigo e apresentámos uma proposta modificando-o.

Não se pode dizer que a approvação dos artigos 10.°, 11.° e 13.° fora definitiva e que nos pensavamos de uma forma e modificámos o nosso modo de pensar. Devo dizer que o Sr. Presidente do Conselho antes de se entrar nessa discussão fez a declaração peremptoria que o artigo 8.° d'este contrato tinha sido mal traduzido e que nunca houve intenção que a séde da companhia fosse em Paris, e que isso se modificava; e devo dizer mais que S. Exa. fez também a declaração de que este contrato não era uma questão politica, que nos podiamos apresentar as ideias que quizessemos, que d'ahi não havia de resultar crise alguma.

No segundo dia reuniu-se a commissão em casa do illustre Presidente do Conselho, e o Sr. Marianno de Carvalho, que era o Presidente d'ella, não esteve presente.

Note V. Exa. que eu, na sessão anterior, tinha feito a accusação á companhia de que ella, segundo uma estatistica que consultei, tinha importado 4.000:000 kilogrammas de tabaco e que dos seus respectivos livros apenas constava ter importado 2 milhões e tanto.

Aberta essa sessão p Sr. Presidente do Conselho apresentava como esclarecimento uma estatistica que lhe havia sido mandada pelo Sr. Burnay, e, coinquanto não fosse possivel por uma leitura rapida comprehender o valor d'essa estatistica, fiz ainda assim notar que ella deveria ter sido enviada antes do contrato, porque quando se fazem contratos e principalmente d'esta ordem reunem-se primeiro todas as estatisticas.

Além d'isso não só ella vinha tarde como não respondia a todas as duvidas apresentadas. Então o Sr. Centeno mandou para a mesa uma proposta assinada por mais quatro vogaes da commissão, e nella dizia que, tendo-se reconhecido a impossibilidade da juncção das duas operações, entendia que estas deviam ser separadas.

O Sr. Presidente do Conselho respondeu que havia reconhecido a completa impossibilidade de isso se fazer, e que em virtude d'isso é que se haviam juntado as duas operações insistindo o Sr. Centeno na sua opinião e mostrando as difficuldades que essa junção trazia.

Disse ha pouco o Sr. Presidente do Conselho que nós haviamos mudado de opinião mas tambem S. Exa. mudou porque quando o partido progressista fez a campanha contra o partido regenerador affirmou solemnemente na sua imprensa que devia fazer-se a separação das duas operações. Evidentemente o Sr. Presidente não consentiria nem produziria uma affirmação d'esta ordem sem ter estudado primeiramente o assumpto.

Se nesse documento já constava a impossibilidade de fazer essa separação, por que devia ser acceite o contrato?

Não trago isto para aggravar ninguem.

Dizem que eu sou incohcrente, que approvei uma parte e depois mudei de opinião.

Devo dizer que os actos da coinmissão de fazenda não foram secretos, estão publicados na imprensa.

Nunca foi meu intento desvendar o que se passou na commissão de fazenda. Mas o que é certo é que, tendo-se combinado guardar segredo sobre os assumptos que ali foram debatidos, no dia seguinte um jornal publicava a descrição de tudo.

Sempre me impressionou a maneira ligeira como o contrato estava estudado, a avaliar até por declarações do Sr. Espregueira.

É bom que o paiz saiba que o contrato dos tabacos envolvia o pagamento da divida ao Reilhae!

Vozes: — Ouçam, ouçam.

O Orador: — Pagava-se a Reilhae, como por outras vezes se tinha pago já!

Comprehendia-se que se acceitasse o contrato, se estivéssemos com a corda na garganta. Mas agora não temos corda na garganta. (Apoiados).
As circuntancias do thesouro são diversas, havendo até um superavit de alguns contos de réis.

Desde que vi a maneira como o contrato estava estudado mais se arraigou no meu espirito a convicção de que não devia votar o contrato de 4 de abril.

Sr. Presidente: a nossa proposta era assinada por quatro membros da commissão, e os Srs. Queiroz Ribeiro e Cerqueira associaram-se a essa proposta mediante uma modificação que acceitámos.

Discutiu-se largamente o assumpto.

Não quero tomar muito tempo á Camara, mas ha dois pontos a que não posso deixar de fazer referencia, pontos capitaes: um é a incoherencia de que S. Exa. falou, outro é a indisciplina.

A incoherencia onde está? Os Deputados votaram primeiro fiados nas informações do Governo, mas depois reconheceram o erro pelos documentos que então o Governo não apresentara. (Apoiados).

Parece-me portanto que não houve incoherencia. (Apoiados).

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A incoherencia está nos membros do Governo que fizeram uma campanha na opposição contra o partido regenerador porque não separava as duas operações, e mudaram de opinião logo que subiram aos Conselhos da Coroa. Quando essa campanha se fez já estava publicado o relatorio do Sr. Pequito, que o Sr. Presidente do Conselho agora invoca para nos mostrar a impossibilidade de se separarem as duas operações. Era bom que essa lição tivesse aproveitado. O Sr. Presidente do Conselho, que é um homem de larga experiencia governativa, devia estudar o assumpto com todo o cuidado para não envolver o seu partido nessa lucta, em nome de certos principios, tendo depois de os renegar logo que subiu ao poder. (Apoiados).

Agora, Sr. Presidente, quanto á indisciplina permitta-me S. Exa. que eu diga que não sei bem o que é disciplina partidaria, e até que ponto ella vae, e em que codigos está estabelecida. (Apoiados).

O que sei é que os partidos não são massas homogeneas, onde todos os homens pensam da mesma maneira

O que é impossivel é que todos tenham a mesma ideia. Em todos os partidos do mundo ha a direita, a esquerda, o centro, a extrema esquerda, e extrema direita, para designar as diversas modalidades de opinião dentro dos principios geraes a que obedecem os seus credos politicos.

Então, Sr. Presidente, porventura terá o partido progressista como bandeira e lei o contrato dos tabacos? (Apoiados).

Tal não creio para honra d'esse partido, e para honra do Governo.

O partido progressista não pode morrer amarrado ao contrato dos tabacos. (Apoiados).

Então as commissões parlamentares não são mais que uma chancella do Governo? Não ha o direito de divergir quanto a um determinado ponto? (Apoiados).

Votar como o Governo quer, nunca o farei.

Lá fora os Governos harmonizam-se com as Camaras, aqui são as Camaras que se harmonizam com os Governos. (Apoiados).

E por isso que nos estamos na triste situação das Camaras não serem mais do que uma chancella dos actos dos Governos. Se continuarmos a proceder assim, vamos parar á bancarrota e caminharemos para o absolutismo. Mais ainda, para o despotismo.

O Parlamento collabora com o Governo, mas este não tem o direito de o obrigar a votar isto ou aquillo. Ate o proprio regimento da Gamara no artigo 96.º prevê a hypothese, pois diz que a commissão á qual for commettido o exame de alguma proposta de lei, apresentada pelo Governo, convertê-la-ha em projecto de lei, se julgar conveniente a sua adopção.

Portanto até o regimento prevê a hypothese das commissões entenderem não dever votar os projectos submettios pelo Governo á sua apreciação.

Já se não tom o direito de divergir num contrato com uma companhia sem se correr o risco de ser appellidado de conspirador.

Prezo-me de ser esse um titulo de gloria na minha vida, isto oé, ter sido sempre um conspirador no sentido em que agora me chamam.

Estou prompto a servir o partido com lealdade, mas hei de sempre expor com desassombro a minha opinião.

Filiei-me no partido progressista sem ter interesse nenhum. Estava ligado ao Sr. Vaz Preto e por sua morte filiei me no partido progressista, porque era aquelle com que mais sympathizava; mas tambem nunca suppuz que não teria o direito de divergir de opinião em qualquer projecto ou contrato.

Não comprehendo os partidos em que os chefes teem um poder discrecionario, em que os partidarios não representam o cerebro, mas uma obediencia passiva.

Se me chegasse a convencer de que os partidos se norteavam por n m tal principio, preferia ir para a tranquillidade da minha casa, abandonando de vez a vida publica.

Vozes: — Muito bem, muito bem.

(O orador não reviu).

O Sr. Presidente: - Segue-se na ordem da inscrição o Sr. Queiroz Ribeiro, mas em virtude do artigo 108.° do nosso regimento tenho que perguntar a V. Exa. se fala contra ou a favor.

O Sr. Queiroz Ribeiro: — Desejo falar no mesmo sentido em que talou o Sr. Pinto dos Santos.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Presidente do Conselho.

O Sr. Presidente do Conselho de Ministros (José Luciano de Castro): —Serei placido e sereno na resposta a dar ao illustre Deputado Sr. Pinto dos Santos.

Ao tomar a palavra para responder ao illustre Deputado a minha primeira impressão é que, se o verdade tudo quanto S. Exa. acabou de dizei1, se o Governo tem tanta culpa quanta S. Exa. acaba de lhe attribuir, não comprehende que um Deputado, com o caracter e iutelligencia do Sr. Pinto dos Santos, ao mesmo tempo que vem dizer a esta Camara que a bandeira do partido progressista vae ser maculada com a approvação do contrato dos tabacos, ainda se conserve sob essa bandeira.

Se o Governo vae incorrer nesse crime, como o que S. Exa. e os seus collegas dissidentes do partido progressista podem ainda dizer-se progressistas?

Nada de imposturas. Deponham-se as mascaras, tenha-se a coragem das opiniões.

Deseja muito não fazer no partido progressista qualquer scisão; não afastar d'elle ninguem.

No seio do Governo, na commissão, e invoco o testemunho do Sr. Pinto dos Santos, empenhei os meus melhores argumentos, esforcei-me tanto quanto prrmittia a minha intelligencia, para que S. Exas. não enveredassem pelo caminho que iam seguindo, para que retirassem a proposta que tinham feito, e declarei logo que vinha levantar a questão politica.

Que o digam S. Exa. e todos os membros da commissão, se eu não tiz tanto quanto humanamente era possivel fazer-se, se não cheguei a humilhar-me, quasi que me puz de joelhos deante d'elles, como noutro dia me dizia o digno Presidente da Camara, a' supplicar para que não abrissem uma crise no seio do partido, crise que não podia deixar de ter consequencias graves.

Não foi só na commissão. No seio do Governo, no primeiro Conselho de Ministros que reuniu no dia 8 de maio, eu, junto do meu antigo collega o Sr. Alpoim, fiz tudo quanto me era possivel para que S. Exa. desistisse do seu proposito e não acompanhasse a commissão na dissidencia.

Houve um momento em que cheguei a ter a esperança de que S. Exa. se rendia ao poder da minha argumentação, e que S. Exa. reflectindo e pensando nas consequencias do acto que ia praticar não acompanhava os dissidentes da commissão; mas S. Exa. nessa mesma occasião declarou-se compromettido porque tinha sido ouvido e consultado e não podia abandonar os seus amigos; por isso podia licança para responder no dia seguinte.

No dia immediato S. Exa. escreveu-me uma carta em que aconselhava o Governo a que seguisse a marcha da commissão de fazenda e que acceitasse a proposta que ella tinha feito.

Nessa occasião respondi que o Sr. Alpoim, como todos nos, estava compromettido na questão dos tabacos, e que era absolutamente impossivel acceitar a proposta da com-

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missão de fazenda, que atacava fundamentalmente o contrato.

Sr. Presidente: suspeitos de macular a dignidade e honra do partido! Mas temos muitos companheiros. Antes de nós o Governo regenerador tinha um contrato com a mesma Companhia dos Tabacos e nas mesmas bases das duas operações. (Apoiados).

Então tambem era suspeito aquelle Governo de macular a bandeira do partido regenerador?

Inutilizaram se para a vida publica os homens que assignaram aquelle contrato?

Mas temos uma autoridade mais insuspeita, o Sr. Alpoim, que acompanhou as deliberações do Conselho de Ministros desde o principio até o fim.

Numa reunião da maioria, o Sr. Pereira de Miranda declarou que todas as deliberações do Conselho de Ministros tinham sido approvadas unanimemente por todos os Ministros, e o Sr. Alpoim estava presente e não protestou.

Quando se tem tão boas autoridades como nós temos, o partido regenerador que nos antecedeu e o proprio Sr. Alpoim que nos acompanhou até o fira, parece-me que não podemos nem sequer admittir a mais pequena suspeita de macula e que a nossa dignidade está perfeitamente limpa e segura.

Pois então é crivel que o Sr. Alpoim, se taes delicies nos commettessemos, nos tivesse acompanhado sempre e só muito depois do contrato assignado — porque o contrato é de 4 de abril e a crise deu-se a 4 de maio — tivesse seguido outro caminho?

Pois o crivel que tambem o partido regenerador defendendo a junção das duas operações tivesse procedido mal e tivesse feito do contrato dos tabacos a sua bandeira?

Não é crivel, Sr. Presidente, e quando se está em tão boa companhia podem-se ouvir serenamente estas duas accusações que se dirigem aos Ministros e sobretudo a mim.

Eu não tenho nada com o que se passou na commissão de fazenda, nem venho aqui contar as scenas mais ou menos curiosas que ali se passaram; não accusei, mesmo, a commissão de contraditoria. Disse como os factos se passaram.

É verdade que apresentei á commissão no segundo dia do reunião uma estatistica que o Sr. Eduardo Burnay me tinha entregado sobre o consumo e venda dos tabacos desde a fundação da companhia, e apresentei-a porque essa estatistica me pareceu curiosa e entendi que a commissão aproveitaria em a conhecer.

Entretanto a estatistica não vinha nada para a questão da separação das duas operações; era um subsidio para estudo e nada mais. Era um mappa referente aos tabacos manifestados e vendidos desde o principio da fundação da companhia, e por aqui vê V. Exa. que não foi para influir sobre a commissão que a apresentei.

O Sr. João Pinto referiu-se tambem á questão Reilhac e para dar a entender se são exactos os extractos que me chegaram aos ouvidos, porque é má a acustica da sala, e eu peço aos meus amigos que me repitam o que posso ter difficuldade em ouvir, eu vou repetir o que me parece que S. Exa. disse.

Devo comtudo dizer que me parece esta questão bastante melindrosa para ser trazida á Camara, mas como S. Exa. a trouxe direi que em parte nenhuma se diz que do contrato saia qualquer quantia para pagar a Reilhac.

O que eu disse foi uma cousa muito diversa. No contrato não ha nada secreto, não se diz que d'elle saia qualquer quantia para pagar a Reilhac.

Se ha promessa de dar qualquer cousa a Reilhac, posso assegurar á Gamara que não é paga pelo Governo, nem dos cofres publicos sae um real para pagar qualquer indemnização.

Portanto, isso nada tem com a questão.

Em occasião opportuna não terei duvida em explicar á Camara qual foi o procedimento do Governo e qual foi o procedimento da opposição.

Não accusei a commissão de fazenda de incoherente.

Foi na segunda sessão da commissão de fazenda que o Sr. Antonio Centeno, ao discutir-se o artigo 13.º, apresentou a sua proposta. Essa proposta não foi acceite porque atacava o contrato.

Disse o Sr. João Pinto dos Santos que o contrato dos tabacos não pode ser bandeira de um partido. Nem é. Porventura tambem o monopolio dos phosphoros, que foi decretado em dictadura, o bandeira do partido regenerador?

O proprio partido progressista tem pensado de differentes modos sobre o contrato dos tabacos.

Não foi o partido progressista que depois decretou a liberdade?

Não foi o mesmo partido progressista que novamente criou o monopolio dando-o a uma companhia, e por fim formou o monopolio do Estado?

Nestas condições o contrato dos tabacos é a bandeira do partido progressista?

Não é a primeira vez que o partido progressista liga a sua responsabilidade á questão dos tabacos. Como é, pois, que se vem dizer que a questão dos tabacos é a bandeira do partido?

Se o é, não o de agora. Em 1806 já se fez.

Se uma questão de simples administração se transformou numa questão politica, foi porque os illustres Deputados a quiseram transformar, porque o Governo nunca fez d'ella questão politica.

Disse o illustre Deputado que o Governo quer impor a sua opinião e protesta contra essa disciplina. Perfeitamente de acordo.

Se o illustre Deputado me tivesse dito que tinha quaesquer duvidas a respeito do contrato dos tabacos, eu aconselhava-o a que não votasse esse contrato.

Eu fui sempre a este respeito de uma grande tolerancia, dizendo aos meus amigos que nunca votassem contra a sua consciencia.

Se o Sr. João Pinto dos Santos, tendo votado em 1891 contra o monopolio dos tabacos, tinha agora repugnancia em votar a favor, não é estranhavel o seu procedimento. O que eu estranho é que no seio da commissão apparecesse de improviso uma proposta apresentada por um Sr. Deputado a que se associaram depois mais dois Srs. Deputados, sem que eu fosse prevenido, colhendo-me assim de surpresa.

Estranhei profundamente o procedimento dos meus amigos que estavam nas melhores relações commigo, que não tivessem para mim uma palavra de prevenção e que não se lembrassem que eu, velho e doente, estava fazendo um sacrificio para o paiz, e que ao menos merecia a contemplação de me dizerem o que tencionavam fazer, porque, se o tivessem dito, a surpresa não seria tão dolorosa.

Estava destinado a ter no ultimo quartel da vida mais este desgosto, que tem sido doloroso.

Nunca impuz aos meus amigos que votassem o contrato dos tabacos. Para votar esse contrato tenho amigos, que sei perfeitamente que não me faltarão com o seu voto.

Portanto, Sr. Presidente, para que havia eu de impor ao Sr. João Pinto dos Santos, e aos seus amigos, a violencia de votarem o contrato dos tabacos.

Eu não quero que os meus amigos votem contra a sua consciencia.

Se votarem contra, estão no seu direito, e eu não me afasto d'elles, nem fico maguado; maguado fiquei pela maneira como me trataram amigos sempre leaes e dedicados. No ultimo quartel da vida não merecia que me tratassem assim.

Tenho cartas de alguns amigos meus, em que juram que nunca na sua vida me haviam de dar um desgosto, mas deram-o, e todavia servi-os sempre, ajudando-os a

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subir, e dei-lhes sempre a mão valedora. Se assim não fosse talvez não tivessem medrado tanto.

Tenho sempre dado a correligionarios e amigos as maiores provas de dedicação, estima e affecto.

Nunca recorreram para mim no dia em que careciam do meu auxilio que eu o negasse, nunca nas horas de afflicção deixaram de encontrar junto de mim protecção. Nestas condições diga toda a Camara, seja juiz, não merecia eu que ao menos os meus amigos me tivessem prevenido?

E diziam-se meus amigos, meus leaes correligionarios! Vêem agora aqui para o Parlamento zelar o pundonor do meu partido, como se eu não estivesse aqui com cincoenta annos de serviço ao meu partido para o defender. (Muitos apoiados).

Eu não estou aqui para servir interesses mais ou menos occultos; eu estou aqui exclusivamente para servir o meu paiz, o meu partido e a Coroa, a quem devo affectos de lealdade e de dedicação. (Apoiados).

Pois então, Sr. Presidente, se o contrato é tão escandaloso, se a honra do partido corria perigo, se os meus amigos que tinham estudado o assumpto e sabiam que na verdade havia uma conspiração contra o partido e interesses do Estado, porque não me preveniram, porque é que não discutiram commigo?... Deixemos este assumpto que é triste.

Desculpe-me a Camara este desafogo, mas peço a todos, amigos e adversarios, que sejam juizes da situação era que me encontro.

O que não preciso, repito, é que alguem venha defender a obra do meu partido.

Um partido que tem vinculada a honra e a responsabilidade de homens, como Pereira de Miranda e Alpoim, pode levantar a cabeça e afrontar qualquer arguição venha ella de onde vier. Quem não deve não teme, e eu não devo, por isso não temo.

Venham as accusações de onde vierem que eu hei de estar aqui prompto a dar explicações tanto da minha vida publica como particular.

Eu, como homem publico, entendo que tenho obrigação de dar conta ao paiz de todos os meus actos, não só da vida publica, mas até da particular. Tudo quanto possuo está á disposição de quem quizer ver a sua proveniencia. Eu quero luz, muita luz, não receio accusações, e tenho profundo desprezo por todas as suspeições que se levantem.

Meus senhores, eu tenho dito o bastante para mostrar que o Sr. João Pinto dos Santos foi profundamente injusto nas arguições que fez ao Governo. (Apoiados). Eu não sirvo nem o Sr. Burnay, nem a Companhia dos Tabacos, nem os financeiros francezes ou inglezes que aqui vieram, nem os phosphoros, nem ninguém. (Apoiados). Se alguem levantar suspeições a esse respeito, pedirei as provas e hão de ser amplas e completas, porque falo de cabeça levantada, e não receio aggressões de ninguem. (Apoiados).

Torno a dizer á Camara que eu não quero descer ás minucias do que se passou na commissão de fazenda; isso não me parece que me pertença; eu não accuso a commissão de ter num dia votado contra a separação das duas operações e no dia seguinte votar essa separação; não sei quaes foram os motivos que allegou o Sr. João Pinto dos Santos para determinar esse modo de pensar,- mas, fossem quaes fossem, a verdade é que a commissão votou num dia a reunião das duas operações e no immediato o contrario.

Eu não pronunciei uma palavra só contra o procedimento do Sr. Alpoim, rapidamente expuz os motivos da crise e disse que a crise tinha sido determinada pela resolução que o Sr. Alpoim tomou de não acceitar as deliberações dos seus collegas e de se conformar com a proposta da commissão de fazenda. Dada esta crise não podia deixar de resolvê-la, Não disse mais nada, não acrescentei uma palavra sequer a respeito d’este assumpto; não censurei o Sr. Alpoim. Os factos falam mais alto, os factos ahi estão; por ora não preciso dizer mais nada. (Apoiados).

O Sr. Presidente: — Não só para regularidade do debate, mas para harmonizar a inscripção, como preceitua o artigo 108.° do regimento, sobre qualquer assumpto que se discuta, eu declaro á camara que os Srs. Deputados que se não se conformam com as declarações Sr. Presidente do Conselho, inscrevem-se contra, e os que se conformam, inscrevem-se a favor.

Dada esta explicação, vou dirigir-me directamente aos Srs. Deputados que pediram a palavra.

O Sr. Queiroz Ribeiro?

O Sr. Queiroz Ribeiro: — Não me conformo com as explicações do Sr. Presidente do Conselho.

O Sr. Presidente: — O Sr. Pereira dos Santos?

O Sr. Pereira dos Santos: — Contra.

O Sr. Presidente: — O Sr. Pereira de Lima?

O Sr. Pereira de Lima: — Contra.

O Sr. Presidente: — O Sr. Oliveira Mattos?

O Sr. Oliveira Mattos: — A favor.

O Sr. Presidente: — O Sr. Antonio Centeno?

O Sr. Antonio Centeno: — Contra.

O Sr. Presidente: — O Sr. Antonio Cabral?

O Sr. Antonio Cabral: — A favor.

O Sr. Presidente: — O Sr. João Franco?

O Sr. João Franco: — Contra as declarações do Governo.

O Sr Presidente: — O Sr. Egas Moniz?

O Sr. Egas Moniz: — Contra.

O Sr. Presidente: — O Sr. Abel Andrade?

O Sr. Abel Andrade: — Contra.

O Sr. Presidente: — O Sr. Moreira de Almeida?

O Sr. Moreira de Almeida: — Contra.

O Sr. Presidente: — O Sr. Visconde da Ribeira Brava?

O Sr. Visconde da Ribeira Brava: — Contra.

O Sr. Presidente: — O Sr. Joaquim Cerqueira?

O Sr. Joaquim Cerqueira: — Contra.

O Sr. Presidente: —O Sr. Luciano Monteiro?

O Sr. Luciano Monteiro: — Nem pró nem contra e antes pelo contrario.

O Sr. Presidente: — Não posso inscrever assim. S. Exa. tem de declarar, nos termos do regimento, se se inscreve a favor ou contra,

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O Sr. Luciano Monteiro: — O Sr. Presidente do Conselho veio explicar a crise, e explicou-a. Eu desejo usar da palavra, mas corno quer V. Exa. que eu declare se sou contra ou a favor? Vou falar sobre as explicações do Sr. Presidente do Conselho.

O Sr. Presidente: — Nesse caso inscrevel-o-hei para falar em ultimo logar, porque tenho de cumprir as disposições do regimento.

Procurei dar a maior latitude á discussão, mas não posso deixar de cumprir o que preceitua o regimento.

O Sr. Luciano Monteiro: — Inscreva-me então V. Exa. contra. Vencido, mas não convencido.

O Sr. Presidente: — O Sr. Alfredo Brandão?

O Sr. Alfredo Brandão: — Contra as explicações do Sr. Presidente do Conselho e contra as explicações do Sr. João Pinto. Contra tudo.

O Sr. Presidente: — Segue-se no uso da palavra o Sr. Deputado Fratel.

O Sr. Fratel: — Peço a V. Exa. que me inscreva contra.

O Sr. Presidente: — Tem depois a palavra o Sr. Claro da Ricca.

O Sr. Claro da Ricca: - Peço a V. Exa. que tambem me inscreva contra.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Queiroz Ribeiro.

O Sr. Queiroz Ribeiro: — Sr. Presidente, felicito o nobre Presidente do Conselho, e felicito-me, porque o discurso de S. Exa. e a sua attitude mostram que, felizmente, o estado de sua saude é notavelmente melhor.

Ditas estas palavras, Sr. Presidente, deixe-me S. Exa., antes de iniciar o meu discurso, lembrar que, alguem, que não tem voz nesta Gamara, alguem a cujo talento e altissimo valor o proprio Presidente do Conselho, foi o primeiro a prestar homenagem, o Sr. Conselheiro José de Alpoim, foi por S. Exa. visado, em termos que não desejo repetir, porque o Sr. Alpoim saberá, no logar onde tem voz, na outra casa do Parlamento, responder ás accusações do nobre Presidente do Conselho.

Por agora, basta-me consignar, apenas, que S. Exa., no intuito de collocar o Sr. José de Alpoim na situação em que julgou devia fazê-lo, se referiu a uma carta e a factos passados em Conselho de Ministros, mostrando assim que abria um precedente do qual, d'ora avante, todos se podem valer.

Perguntou o nobre Presidente do Conselho como é que, discordando nos da importante questão administrativa do contrato dos tabacos, nos sustentamos ainda no partido progressista?

É porque não pudemos esquecer, nós, membros da commissão de fazenda, a declaração de S. Exa., de que podiamos discutir como entendêssemos, e votar a favor ou contra, que d'ahi nunca adviria crise politica.

Pode alguem por um instante sequer contestar a verdade d'esta affirmação? Ninguem.

Como muito bem accentuou o Sr. João Pinto dos Santos, os que hoje divergem, não deixaram de ser progressitas, porque o partido progressista não é o contrato dos tabacos.

Nós somos progressistas porque o partido progressista, no qual me honro de militar, não pode nem deve confinar-se numa questão d'esta ordem.

S. Exa. disse que fizera grandes esforços, para a proposta apresentada por um dos membros da commissão fosse posta de parte. Pois d'isso, exactamente, nos queixamos nós.

Lamentou S. Exa. não ter sido prevenido da. apresentação d'essa proposta, mas como queria S. Exa. ser prevenido, pelo Sr. Cerqueira ou por mim, se ignoravamos por completo que tal proposta havia de apparecer, e se essa proposta nasceu do estudo dos documentos que só tarde e á ultima hora, foram apresentados á commissão!?!

Como queria S. Exa. ser prevenido do que se passava, se S. Exa. tinha declarado que se tratava de uma questão aberta, quer dizer, que podiamos fazer um estudo livre, votar como entendêssemos?!

S. Exa. reproduziu aqui o argumento que já apresentara na Commissão. Disse S. Exa. á Camara e ao paiz que nos escuta, que a conjugação das duas operações se impunha; e tanto que já o partido regenerador se vira obrigado a acceitá-la, estando no poder.

Mas então para que se fez essa campanha de opposição e por que principio foi o partido progressista ao poder, accentuando-se que a situação do Thesouro era tão difficil, que o contrato dos tabacos merecia uma tal importancia, que, justamente, o partido progressista devia ir ao poder para resolvê-la?

Mais ainda. Se, porventura, na questão dos tabacos, era impossivel separar as duas operações, por que e com que motivo o Sr. Presidente do Conselho reconhecia ter inspirado, lido e, até, emendado alguns artigos dos jornaes que sustentavam a separação?

Num ponto do seu discurso disse S. Exa. nada ter com o que se passou na eommissão de fazenda; referiu-se, porém, a factos succedidos no seio d'essa commissão e, portanto, não estranhe que eu, em nome d'ella e no meu, individualmente, levante algumas palavras do nobre Presidente do Conselho.

Com grande assombro e magua ouvi S. Exa. sustentar que era verdade ter affirmado que, em virtude do contrato dos tabacos, saia dinheiro para Reilhac. Todos o ouviram; ninguém pode contestá-lo. (Apoiados).

Já o affirmou o Sr. João Pinto dos Santos.

A este respeito travou-se uma larga discussão entre o Sr. Antonio Centeno e o Sr. Presidente do Conselho, que visou unica e exclusivamente a questão do pagamento a Reilhac.

O Sr. Antonio Centeno apontou os perigos que podiam advir d'esse facto, porque já de outras vezes se tinham estipulado, em questões d'esta natureza, quantias para aquelle homem que nunca ficara satisfeito.

Disse o nobre Presidente do Conselho: «Isso affirmou-se particularmente».

Particularmente!

Oh! nobre Presidente do Conselho! V. Exa. que é o primeiro homem da politica portugueza, quer hoje ensinar-nos a doutrina de que não se pode referir na Camara tudo quanto se diz na commissão de fazenda, delegada da mesma Camara? Sou apenas um aprendiz, mas protesto contra essa doutrina!

Disse o nobre Presidente do Conselho: «Eu não disse de onde saia o dinheiro». Mas diga-o S. Exa., declare quem o dá a Reilhac, como é que o contrato dos tabacos se liga á questão Reilhac, como nasceu o facto de Reilhac receber dinheiro sem ser o Governo Portuguez que o dê, sem que do contrato conste quem o dá. Parece-me uma questão capitalissima. (Apoiados).

Vou dizer a V. Exa. com sinceridade que tive esperança de que quando o Sr. Conselheiro José Luciano de Castro se levantou pela segunda vez, para responder ao Sr. João Pinto dos Santos, S. Exa., ouvindo as suas nobres e leaes explicações, poria um traço sobre todos os insultos, isobrc todas as palavras injuriosas, sobre todas as accusações tão injustas que nus teem sido dirigidas.

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Tive esperança de que S. Exa. viesse a esta Camara dizer que tudo isso elle reprovava; que visto que sete homens tinham lealmente manifestado a sua opinião, em termos que não são muito usuaes, porque trocaram o caminho do seu interesse pelo da sua consciência, tive esperança, digo, que S. Exa. fosse o primeiro a apoiar esses homens e a estender-lhes a mão, dizendo-lhes: «Muito bem! Cumpriram o seu dever!»

Era isso o que eu esperava, mas foi o que não succedeu; de forma que ficam de pé todas essas offensas todas essas accusações, que partiram precisamente de alguns jornaes que nós liamos com carinho de partidarios, que nos liamos com amor.

Fica de pé a accusação de que fomos uns revoltosos, quando é certo que o nobre Presidente do Conselho nos declarou que esta questão era uma questão aberta. (Apoiados).

Fica de pé a accusação de rebellião, quando todos se recordam de que, quando V. Exa., Sr. Presidente, nos fez saber que os desejos do nobre Presidente do Conselho eram que, caso o meu illustre amigo o Sr. Conde de Penha Garcia não pudesse ser o relator, o fosse o Sr. Oliveira Mattos, todos annuimos a esse desejo, empregando os nossos esforços para S. Exa. acceitar o encargo, porque não queriamos criar difficuldades ao Governo. E então, «somos accusados de conspiradores e de incoherentes?!

Incoherentes seriamos nós, se procedêssemos de outra maneira. Pois, porventura, não era já uma prova de sincera dedicação partidaria acreditar piamente no relatorio do Governo e approvar o contrato dos tabacos, sem ter deante dos olhos documento algum que nos esclarecesse? Mas vieram os documentos; provaram-nos a triste inexactidão do relatorio e das affirmações do Governo...

A Camara comprehende que nestas circumstancias não podiamos deixar de proceder, como procedemos, sob pena de não continuarmos a ser homens de bem.

Sr. Presidente: nós tinhamos acreditado que se tratava de um concurso impecavel e vimos, com pasmo, nos documentos, que a casa Hambro vinha pedir ao Governo que lhe garantisse, ao menos, perfeita igualdade de circumstancias, e que nem essa promessa foi feita! Pergunto: não seriamos incoherentes se continuássemos a approvar o contrato?

Todos, opposição e Governo, até no proprio relatorio, sustentavam que é preferivel a separação das duas operações. Pois bem: os documentos da casa Hambro demonstram á evidencia que ella não se fez, unicamente por que não quizeram fazê-la.

Nestas condições, repito, seriamos ou não incoherentes approvando o contrato dos tabacos?

Nos suppunhamos que o dinheiro resultante dos tabacos, por qualquer processo, teria uma applicação legal, e todavia, o Sr. Presidente do Conselho foi o primeiro a explicar — pelo menos assim se deduziu da discussão — que uma quantia, aliás importante, ia bater ás mãos de Reilhac!

Eu tenho o mais alto respeito pelo Sr. Presidente do Conselho, mas parece-me que S. Exa. não pode condemnar a nossa incoherencia, porque incoberencia e grande foi a de S. Exa.

S. Exa. como argumenta? Com um facto: o do partido regenerador não ter conseguido a separação das duas operações; mas querer d'ahi deduzir, precisamente, que tambem o partido progressista não a podia conseguir, é- que não posso comprehender, porque justamente por não poder consegui-la é que o partido progressista levantara a sua campanha contra aquelle partido.

Mas ha mais e peor. Com respeito á Companhia Arrendataria dos Tabacos de Espanha, affirmou o Sr. Presidente do Conselho á commissão de fazenda um facto tão grave, que eu não me atrevo a referi-lo agora, sem autorização expressa de S. Exa. Pois bem.

Aproveitando a minha estada em Madrid, entrevistei uma das primeiras capacidades hespanholas, e soube d'ella, da maneira mais positiva:
1.º que a companhia arrendataria dos tabacos desejava concorrer á operação do exclusivo em Portugal; 2.° que via com sympathia esse concurso; 3.° que n'elle podia dar e receber, em igualdade de circumstancias, maiores vantagens que outro concorrente qualquer, não podendo, todavia, apparecer, desde que houvesse conjuncção de operações.

Mas demasiado tenho abusado da benevolência da Camara e ainda não conclui.

O motivo principal que me forçou a levantar a voz foi a necessidade de liquidar uma situação pessoal, da qual devo uma explicação que procurarei fazer o mais resumida e breve possivel.

Eu tinha a honra de ser chefe do gabinete do Sr. Ministro da Fazenda e, comparecendo na ultima sessão a que HOS estamos referindo, ali tive a honra de votar contra uma proposta apoiada pelo Sr.

Conselheiro Espregueira. Creio que não haverá ninguem que admitia, por instantes sequer, a hypothese de que eu fui para aquella reunião votar contra o meu Ministro, sem ter tido a lealdade de lhe fazer
saber que assim procederia.

Ninguem que me conhece pode attribuir-me a imbecilidade e immoralidade injustificaveis de ir á commissão de fazenda votar contra o meu Ministro, sem que elle soubesse por mim quaes as minhas ideias e opiniões.

A verdade dos factos, que ninguem pode desmentir, é esta.

Quando adheri á proposta apresentada na commissão de fiizenda, era eu ainda o chefe do Gabinete do Sr. Ministro da Fazenda.

Alguem propalou que eu procedi com deslealdade. Dirigi-me então por escrito a S. Exa., perguntando-lhe se por qualquer maneira auctorizava aquella versão. S. Exa. não me deu resposta. Procurei-o mais tarde para esse fim, e o Sr. Ministro da Fazenda limitou-se a dizer que já tinha dado ordem aos seus amigos para se calarem. Essa resposta não me satisfez.

Sr. Presidente, outros factos ha, mas eu quero restringir-me ao que constitue a materia da minha defesa.

O Sr. Conselheiro Espregueira deve lembrar-se que apenas li os documentos relativos ao contrato, logo que foram distribuidos, corri a sua casa, eram dez horas da manhã.

Tenho que dizer isto porque dirigi a S. Exa. uma carta com toda a lealdade, dizendo o que pensava.

Como S. Exa. não respondeu a essa carta, fui pessoalmente a casa de S. Exa.

Eu preciso fazer esta declaração formal e de todo o ponto verdadeira. Juro o pela minha honra e pula felicidade de meus filhos.

Fui a casa de S. Exa., S. Exa. estava á mesa do seu escriptorio. Disse-lhe que acabava de, durante todava madrugada, ler os documentos e que, em vista d'elles, a minha opinião era contraria ao contrato.

S. Exa., tirando de uma pasta uns papeis, disse-me: «Vê estes documentos?»

E mostrando-me uns papeis, S. Exa. significou-me que o contrato se fizera para agradar á Companhia dos Tabacos.

Vozes: — Ouçam! Ouçam!

S. Exa. pensava como eu.

Não se fez a separação das operações porque não quizeram.

S. Exa. sabe bem que isto é verdade, e sabe perfeitamente o que me disse...

O Sr. Espregueira sabe que estou falando a verdade,

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sabe qual tem sido a minha abnegação, sabe como eu era seu amigo, mas não posso estar debaixo do taes accusações, nem consentir que S. Exa. se queixe iniquamente da minha lealdade.

Eu, como homem de bem, affirmo a V. Exa. ser verdade tudo quanto acabo de dizer.

Nada mais accresceutarei, a não ser que a conjuntura a isso me obrigue.

Tenho dito.

Vozes: — Muito bem, muito bem.

(O orador não reviu).

O Sr. Ministro da Fazenda (Manoel Affonso Espregueira): — Disse o illustre Deputado que eu conhecia S. Exa. muito bem ha muitos annos. Não é assim; não o conhecia, porque de contrario não se tinham dado os factos que acabam de dar-se. Se o conhecesse bem, S. Exa. não teria sido chefe do meu gabinete até ha pouco.

Pela minha parte sinto profundissimo desgosto em falar perante a Gamara, neste momento, não pelo que S. Exa. disse, mas por ter de falar d'este modo, uma questão puramente pessoal.

Se S. Exa. foi chefe do meu gabinete, foi porque o pediu; de resto, ha muito tempo que eu o não occupava em cousa alguma.

Uma vez, disse-me S. Exa. que lhe repugnava o contrato dos tabacos, mas eu respondi-lhe o seguinte: «O senhor, como secretario do Ministro, não pode votar contra um projecto d’esse proprio Ministro». Foi isto unicamente o que se passou.

Disse S. Exa. que ignorava a proposta que ia ser votada, ruas S. Exa. sabia muito bem que os maiores esforços tinham sido empregados para que se fizesse a separação, no caso de ella ser vantajosa para o Estado. S. Exa. sabia muito bem que a idéa primitiva do Governo era procurar realizar a separação das duas operações, dando, é claro, o máximo resultado para o Estado. E sabe tambem a razão por que o Governo desistiu.

A proposta actual, como S. Exa. e a Camara sabem, foi considerada por todos os que conhecem os negocios financeiros como vantajosa para o Governo Portuguez.

Eu devo dizer que recebi em minha casa alguem que me veio perguntar se me seria agradavel que interviesse como delegado da companhia arrendataria dos tabacus de Hespanha, para apresentar uma proposta ao Governo. Não sabendo a situação em que estavamos, nem os com promissos que tinhamos, vinha perguntar-me se a intervenção d'elle seria proficua.

Respondi-lhe que nos o que desejavamos era a concorrencia, a fim de se fazer o contrato, que mais vantagens trouxesse para o Thesouro.

Devo por ultimo referir-me á questão Reilhac e á qual o illustre Deputado deu mais valor. Assegura que no contrato assignado pelo Governo não ha nada que diga respeito a Reilhac.

Devo tambem dizer ao meu amigo o Sr. João Pinto dos Santos porque tenho por S. Exa. a maior estima, que tive um grande desgosto ao ouvir pronunciar a palavra Reilhac, ao relatar o que se passou na commissão de fazenda.

Posso assegurar ao illustre Deputado, sem receio de ser desmentido, que nem eu nem nenhum dos representantes estrangeiros com quem tive demoradissimas conferencias sobre o assumpto, pronunciámos o nome de Reilhac nem lhe fizemos qualquer allusão. Por conseguinte são descabidas as palavras do illustre Deputado, quando diz, que no contrato está o pagamento a Reilhac.

Não pagamos nada, nem lhe devemos nada.

Podia haver, como ha, um processo entre um dos estabelecimentos signatarios do contrato, por causa de antigos pagamentos, a que, aliás, o Governo Portuguez, é estranho.

Podia haver o desejo de querer liquidar assim essa questão mas que isso fosse de qualquer forma considerado no contrato com a Companhia dos Tabacos é absolutamente falso.

Respondo assim a este ponto negando que o motivo por que se fazia o contrato fosse a questão Reilhac.

Nunca tive isso em vista. As minhas declarações a esse respeito foram sempre positivas. Nunca ninguem me falou nessa questão nem eu o admittiria.

Ora tendo procedido d'esta forma ha 4 ou 5 annos, é absolutamente um erro imaginar-se que o Governo tem em vista encaminhar as negociações de modo a fazer votar o contrato dos tabacos, no intuito de dar quaesquer satisfações a Reilhac.

E mais uma opinião errada, absolutamente falsa, que se pode espalhar, mas que não tem fundamento algum.

Tudo isso não prova senão a favor do contrato dos tabacos, porque é levantar suspeitas sobre um facto completamente alheio a elle.

Peço desculpa á Camara se tomei algum calor nas minhas palavras, mas não podia deixar de ser assim, ao ver tão mal recompensada a minha amisade.

(O orador não reviu).

O Sr. Queiroz Ribeiro (para um requerimento): — Tenho a honra de mandar para a mesa o seguinte

Requerimento

Requeiro a V. Exa. se digne consultar a Camara sobre se me permitte responder ao Sr. Ministro da Fazenda, com prejuizo da inscrição. = Queiroz Ribeiro.

Lê-se na mesa.

Posto á votação foi rejeitado.

O Sr. Queiroz Ribeiro: — Peço a palavra para explicações antes de se encerrar a sessão.

O Sr. Pereira dos Santos: — Nunca na minha vida parlamentar, que já é longa, me vi tão assombrado como hoje com o extraordinario do que se passa nesta Camara. (Apoiados).

Disse o Sr. Ministre da Fazenda que se tinha levantado uma questão pessoal; certamente que em parte assim é; mas não pode ficar assim porque, entendendo que de uma questão pessoal se tratava, pedi aos meus amigas da minoria que rejeita sem commigo o requerimento do Sr. Queiroz Ribeiro; mas não ha duvida tambem de que se trata de affirmações da mais alta gravidade.

Trata-se, Sr. Presidente, de uma questão pessoal entre um membro de um Governo e um membro da maioria ou, talvez mais propriamente, da minoria, porque o Sr. Presidente do Conselho encarregou-se, ha pouco, de collocar na opposição todos os membros da commissão de fazenda.

Sr. Presidente: ha uma questão pessoal, mas nessa não entrarei eu; só direi que pedi aos meus amigos politicos que rejeitassem o requerimento do Sr. Queiroz Ribeiro, porque quero sempre pugnar pelo prestigio do Parlamento, e não é dentro d'este augusto santuario das leis que as questões pessoaes se dirimem.

O voto da minoria regeneradora representa o respeito pelo prestigio parlamentar.

Julga o Sr. Ministro da Fazenda que basta a questão pessoal?

Pois levantasse no Parlamento o chefe do gabinete de um Ministro da Fazenda, faz affirmações de tal mudo extraordinarias, que indicam que um membro do Governo atraiçoou os proprios collegas, e pode, depois d'isto, subsistir mais o Ministro Hccuaado, sem que dê explicações claras, precisas e categoricas?!

Que prestigio fica tendo o Governo perante a nação, se essas explicações não forem dadas claramente?

Sou alguma cousa lido na historia parlamentar do meu

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paiz; conheço as invectivas extraordinarias com que na Gamara se aggrcdiram vultos parlamentares eminentes em periodos notaveis, mas não me lembro de, dentro do Parlamento, se terem passado factos como estes a que assistimos ha pouco. (Apoiados).

A proposito de um contrato de tabacos dos mais extraordinarios, que tem levantado tanta discussão em todo o paiz. vem um amigo do Sr. Ministro da Fazenda, o seu primeiro homem de confiança, fazer insinuações e accusações d'esta natureza tão grave, e S. Exa. julga que por uma simples questão pessoal se resolve a questão? (Apoiados).

O paiz que trabalha, que conceito ha de fazer do Governo emquanto continuar a trabalhar na sombra, emquanto esta questão não for aclarada? (Apoiados).

Como pode um povo, cheio de dignidade, sor governado por um Governo onde a intriga é que manda? (Apoiados).

Não basta a questão pessoal. A primeira cousa que o Governo tem a fazer é liquidar publicamente este acontecimento.

Apresentou-se hoje o Sr. Presidente do Conselho, mais uma vez, a pretender explicar dois favores constitucionaes. Mas se, como tanto se tem alardeado, o partido progressista tem tanta força, se é um partido todo de Hercules, como é que precisa, para cumprir a sua missão, o seu fim, de estar, quasi dia a dia, supplicando favores da Coroa?

Como é que pede uma dissolução do Parlamento exactamente no dia em que obtém uma recomposição?

Dentro de um curto periodo de cinco ou seis meses o Governo, que é ura apostolo da constituição e dos principios, pediu a dissolução do Parlamento exactamente no dia cm que elle havia de reunir; lembro-me mais que o Governo já fez uma recomposição,- e passados quinze dias, se tanto, fez nova recomposição ministerial, lembro-me emfim de que, sem ter decorrido mais de um mês de funccionamento das Côrtes, pediu mais um adiamento.

Estas cousas parecem-me verdadeiramente extraordinarias porque eu imaginava, pelas declarações repetidas que tinham sido feitas nesta Gamara pelo partido progressista quando era opposição, que não havia partido mais solidario, mais rigoroso, que pudesse seguir sem attritos e difficuldades uma marcha governativa para beneficio do paiz, sem estar constante e successivamente a pedir o amparo da Coroa.

Para corroborar quanto a força, quanta a solidariedade do partido progressista se annunciava nesta sala eu vou ler perante a Camara trechos de um discurso dos oradores mais distinctos, e illustre tia opposição parlamentar, um dos mais conceituados, e no nosso tempo um dos que mais calorosamente o defendiam e que hoje occupa o distincto logar de Ministro dos Negocios Estrangeiros.

Dizia este cavalheiro, o Sr. Villaça, não ha muito tempo, na sessão de 5 de outubro de 1904, o seguinte:

(Leu).

Quando se annunciam tanta coragem, tanta valentia, quando um partido é um partido de força, precisa para cumprir a sua missão, o seu fim, de estar todos os dias, quasi dia a dia, a pedir e a supplicar os favores da Coroa?

Se a alguem, conhecedor da politica portuguesa, lhe viesse dizer que ha cerca de um anno, nem tanto, o partido progressista tinha successivamente pedido nesto curto intervallo duas recomposições e um adiamento, diria immediatamente que não podia ser. só se o partido progressista está animado da monomania das recomposições.

Pois o partido progressista, que se apresenta como um Hercules, é na pratica o que se vê, e quando digo o partido progressista refiro-me ao Governo que é um tropego cambaleaste, que para dar um passo precisa de estar amparado pela Coroa. (Apoiados).

Era esta a impressão que eu já tinha antes da sessão de hoje, mas agora a minha opinião não é de que o Governo é um tropego que precisa de ser amparado pela Coroa, o de que o Governo que se senta naquellas cadeiras é um Governo morto.(Apoiados).

Havemos de discutir isto demoradamente.

As minhas considerações hão de ser tendentes a demonstrar esta these: o Governo está morto.

Bastam os factos e as proprias declarações do Governo para que todos se convençam sem grandes demonstrações.

O Sr. Presidente do Conselho pretendeu justificar os motivos que o levaram a sulicitar a aquiescencia da Coroa: crise ministerial e o adiamento.

S. Exa. pediu o adiamento para dois fins: primeiro para ver se conseguia a homogeneidade e cohesão da então maioria parlamentar, o que S. Exa. reputava indispensavel para a approvação do contrato dos tabacos, segundo, para introduzir nesse contrato algumas modificações que se harmonisassem com os protestos da opinião publica.

Como é que o Governo honrou a acquiescencia de El Rei? Isto em primeiro logar.

Em segundo logar, se por acaso o Governo não pode conseguir o que disse a El-Rei ser indispensavel para abrir o Parlamento, como é que se conserva ainda no poder?

Esta é que é a questão.

O Sr. Presidente do Conselho pediu a El-Rei o adiamento das Camaras para desfazer attritos que se levantaram na commissão de fazenda e para fazer alterações no contrato dos tabacos. Conseguiu o Sr. José Luciano esse desideratum? Não.

As modificações que queria fazer a commissão de fazenda eram de natureza tal que anniquilavam completamente o contrato.

Se o Governo conseguiu o seu intento viu a Camara.

As modificações que agora apresenta tratam de satisfa-zer todas as exigencias e as diligencias feitas conseguiram desfazer os attritos da commissão de fazenda? Não. (Apoiados).

Portanto o Governo nada obteve do que julgava necessario.

Nestas circumstancias como é que neste momento se apresenta no Parlamento para continuar a governar? Que mais razão tem agora do que tinha então? (Apoiados).

Não me envolverei nunca na questão das divergencias politicas que houve no. partido progressista, porque julgo que a cohesão dos partidos monaivhicos c uma condição indispensavel ao prestigio das instituições. Portanto o nosso desejo ardente é que o Sr. Presidente do Conselho conseguisse realmente aplanar as divergencias que se suscitaram homens do seu partido.

Mas o que é indispensavel saber-se, primeiro do que tudo, é como o Governo honrou a acquiescencia de El-Kei aos seus pedidos.

S. Exa. vem dizer ao Parlamento que não conseguiu nada. Então faltou S. Exa. ao que promettera.

Tinha ainda muitas considerações a fazer, mas a hora vae tão adeantada que tenho de as reservar. Entretanto referir-me-hei a um facto apresentado pelo Sr. Presidente do Conselho relativamente ao que se passou no seio da commissão de fazenda.

Estranhou S. Exa. que se não fizesse silencio com o que se passou no seio da commissão de fazenda.

Para que foi que o Sr. Presidente do Conselho autorizou que a sua imprensa empregasse este estilo de insidia nesta questão? Não se lembra S. Exa. que d'esta maneira fez escola perante alguns dos seus correligionarios?

Tinha largas considerações ainda a fazer mas sinto me extenuado, e por isso sou forçado a concluir por aqui as minhas considerações.

Tenho dito. (Vozes: — Muito bem, muito bem).

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SESSÃO N.° 16 DE 16 DE AGOSTO DE 1905 17

O Sr. Ministro da Justiça (Arthur Moritenegro): — Mando para a mesa a seguinte

Proposta de accumulação

Em conformidade com o disposto no artigo 3.° do Primeiro Acto Addicional á Carta Constitucional da Monarchia, pede o Governo á Camara dos Senhores Deputados da Nação Portuguesa a necessaria licença para que possa acxumular, querendo, as funcções legislativas com o seu logar na capital, dependente do Ministerio dos Negocios Ecclesiasticos e de Justiça, o Sr. Deputado Joaquim Hilario Pereira Alves.

Secretaria de Estado dos Negocios Ecclesiasticos e de Justiça, em 16 de agosto de 1905. = Arthur Pinto de Miranda Montenegro.

Lê-se na mesa e é approvada.

O Sr. Presidente: — Como faltam 5 minutos para se encerrar a sessão e como o Sr. Queiroz Ribeiro pediu a palavra para explicações, consulto a Camara.

Vozes: — Fale, fale.

Consultada a Camara resolve affirmativamente.

O Sr. Presidente: — Tem V. Exa. a palavra.

O Sr. Queiroz Ribeiro: — O Sr. Minirtro da Fazenda exaltou-se, eu serei sereno e abusarei o menos possivel da benevolencia da Camara, benevolencia que muito agradeço.

Eu ha pouco falei exclusivamente em minha defeza, e falei porque ha factos publicos, porque, como chefe do Gabinete do Sr. Ministro da Fazenda, tomei parte numa votação contraria ao seu projecto.

Falei, repito, em minha defeza, porque tendo-me dirigido a diversos amigos e correligionarios meus do districto onde tenho uma insignificante e S. Exa. uma grande influencia politica, ahi me foi asseverado que de S. Exa. partira em telegramma e carta, a accusação, profundamente inexacta, de que eu tinha sido desleal, e a Camara foi testemunha de que entre tantos factos, eu fui buscar o menos grave, precisamente para argumentar em defeza do meu nome e dignidade o dever que tenho de não preterir, e fil-o com reticencias que a Camara comprehendeu e que as galerias não podiam deixar de comprehender tambem.

Fui atacado, e quando falava em nome da verdade e quando invocava a felicidade dos meus filhos alguem, que se dizia meu amigo, alguem que em publico e em documento publicado, confessou um acto da minha desinteressada lealdade, volta a atacar-me e accusar-me com violencia!

Ha factos que continuam no escuro, porque eu quero, porque eu tenho força de vontade bastante para os calar.

Mas então eu appello para esse homem, e pergunto se não foi verdade que n'esse dia, supponho que uma sexta feira, elle concordou com as duas accusaçõcs capitães que eu fazia áquelle projecto em face dos documentos, e que S. Exa. se ergueu e dirigindo-se a uma mesa que tem no seu gabinete á esquerda d'aquella em que estava sentado, me mostrou n'uma pasta preta documentos de cujo texto me não recordo, e que provavam que o Sr. Presidente do Conselho tinha chamado a si o assumpto, que os francezes se correspondiam com elle, pondo de parte o Ministro da Fazenda?

Oh! Sr. Presidente, do Conselho, não se ria, porque eu juro que digo a verdade. V. Exa. está decerto irritado com o meu procedimento, julga-me talvez um indisciplinado, mas eu seria o maior bandido se viesse fazer uma accusação d'esta ordem a um homem que tem serviços ao sou paiz e se houvesse nas minhas palavras uma sombra de inexactidão!

Disse me então o Sr. Ministro da Fazenda: «Tudo isso o assim, tudo é verdade, mas que quer que lhe faça?»

«Peça a sua demissão!» respondi, «Não é general, não foi duas vezes Ministro, não é já Par do Reino?!»

Respondeu-me: «Que quer? Todos teem a mesma culpa, todos concordaram. Aqui estão os documentos».

Esta é a verdade! V. Exa., Sr. Presidente do Conselho, que pela sua vida politica tão longa, tem um grande e profundo conhecimento das cousas e dos homens, que tem lido muitas vezes nas palavras e na physionomia os pensamentos que occultam, olhe bem para mim e veja se estou mentindo. Um mentiroso não fala d'esta forma!

A verdade, nua e crua, é que o Sr. Ministro da Fazenda me manifestou que estava de absoluto acordo comigo, embora pela sua situação não pudesse manifestal-o.

Esta é a verdade, c se o digo, o só para me defender e para que dos labios de S. Exa. não possa sair a affirmação de que o chefe do seu gabinete o atraiçoou.

Não sou um desleal, sou ura homem sincero e ao mesmo tempo um homem que esperava que o Sr. Ministro da Fazenda, por um outro facto que não quero revelar, lhe faria justiça.

Disse S. Exa. que não me conhecia, e disse o talvez por uma forma offensiva. Disse-o; mas a nossa differença de idades dá-me o direito de ser generoso, só replicarei que respondo sempre e em toda a parte pela verdade pura das minhas palavras. Se ha n'ellas uma sombra qualquer inexactidão, que todos me desprezem c me não apertem mais a mão!

Isto digo a toda a Camara, perante o paiz, e ao Sr. Presidente do Conselho peço de joelhos, se tanto é preciso, que me negue a sua mão se pensa que um homem que fala assim é capaz de mentir!

(O orador não reviu).

O Sr. Ministro da Fazenda (Manoel Affonso de Espergueia): — Referiu-se o Sr. Queiroz Ribeiro a um documento que eu tinha no meu gabinete numa pasta preta, e que dizia respeito á questão dos tabacos.

Devo dizer ao illustre Deputado que esse documento era uma carta, em francez, de um amigo meu, em que me divida que as cousas em Paris estavam de tal forma que, sem acordo com a companhia dos tabacos, seria impossivel qualquer operação. Essa carta salientava bem que seria impossivel separar as duas operações.

Disse mais S. Exa. que lhe tinha escrito uma carta pedindo-lhe que respondesse.

Já não era a primeira vez que S. Exa. me escrevia. Já num momento de exaltação me escrevera uma carta dizendo-me que saia de chefe do meu gabinete.

Quanto á separação das duas operações, desde que não era possivel consegui-la, desde o momento em que todos se convenceram de que não havia possibilidade de se obter outra cousa e que o que se podia conseguir, dava resultado excessivamente vantajoso, desde esse momento não dei mais um passo sobre essa questão sem que o Sr. Presidente do Conselho d'isso tivesse conhecimento.

O Sr. Queiroz Ribeiro:—V. Exa. sabe perfeitamente que está a dizer inexactidões.

O Orador: — O illustre Deputado disse que tinham sido sonegados documentos.

Nenhum documento foi sonegado; todos foram mandados imprimir e. distribuir na Camara. Se houve demora foi na distribuição. (Risos).

O Orador: — Quem se ri do que eu digo?

Uma voz: — Todos!

O Orador: — Todos são muitos! Quero um!

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18 DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS

O Sr. Visconde da Ribeira Brava: — Eu sou esse um!

(Cruzam-se vivos apartes de que se não poude tomar nota).

O Orador: — Todos os documentos provam claramente o procedimento do Governo e as providencias que elle tomou.

Por ultimo, direi que sinto ter tido de falar nesta Camara numa questão d'esta ordem que não provoquei. Peço desculpa ao partido o ter involuntariamente sido arrastado para esta discussão pelo illustre Deputado, a quem prestei sempre auxilio, dando-lhe o primeiro logar nas minhas commissões, dando-lhe todos os auxilios e conselhos que podia dar, e que, afinal, veio á Camara provocar um conflicto d'esta ordem!

E, ao mesmo tempo peço ao meu partido que me desculpe o ter entrado nesta questão.

Tenho dito.

Vozes: — Muito bem, muito bem.

(O orador não reviu).

O Sr. Presidente: — Amanha ha sessão. A ordem do dia é a mesma que vinha dada para hoje. Está levantada a sessão.

Eram 7 horas e 20 minutos da tarde.

Documentos enviados para a mesa nesta sessão

Autos eleitoraes do circulo n.° 27 — S. Tiago da Cabo Verde

Accordam os do Tribunal de Verificação de Poderes: Mostra o processo que, tendo-se procedido á eleição de deputado pelo circulo n.° 27 em todas as assembleia primarias dos districtos da Guiné e Cabo Verde de que se compõe este circulo o acto eleitoral, se realizou sem irregularidade ou falta digna de notar-se, e apenas na assembleia da Ilha da Santo Antão e freguesia de Santo Antonio o cidadão Fernando Wahon protestou pelo motivo de ter sido admittido a votar e formar parte da mesa eleitoral o cidadão Abraham Azaguray, que era subdito inglês.

Mostra-se que nas assembleias de apuramento parcial o acto eleitoral seguiu com a devida legalidade segundo consta das respectivas actas sem que se apresentasse o menor protesto.

Mostra-se que na assembleia de apuramento geral realizada no dia 25 de março na Cidade da Praia, tambem o acto de apuramento se completou sem o menor protesto, verificando-se que o numero dos votantes nas differentes assembleias foi o de 6:621 obtendo os seguintes votos o cidadão João Alberto Pereira de Azevedo Neves, medico 6:290; Christiano José de Sousa Barcellos, official da armada, 260; Dr. Bernardino Machado, Ministro de Estado honorario, 35; Dr. Antonio Vicente Chantre, 15; Dr. Antonio Nobre Mello, 12; Eduardo Augusto de Sá, 5; Dr. José Augusto Feio, J; Guilherme B. Morboy, D. Miguel Lopes da Silva, 1; Julio José Maria Feijo, 1.

O que tudo visto e relatado e considerado.

Que os actos eleitoraes correram com toda a legalidade em todas as assembleias primarias, e apenas houve o protesto acima referido que não tem a menor importancia, já porque o eleitor contra quem se protestou por ser admittido a votar se achava inscrito nos cadernos eleitoraes e não se lhe podia negar o exercicio do direito uma vez que não fossem demonstradas causas supervenientes para dever ser excluido, e alem d’isso porque o seu voto singular em coisa alguma influiu no resultado geral.

Por isso julgam valida a eleição, e candidato mais votado o cidadão João Alberto Pereira de Azevedo Neves, medico.

Lisboa, 27 de maio de 1905.= Visconde do Ervedal da Beira = Silva = Azevedo = J. Pereira = Serra e Moura = Serpa.

Circulo n.º 30 — Moçambique

Accordam os do Tribunal de Verificação do Poderes:

Que em vista do processo eleitoral para a eleição de una Deputado pelo circulo n.° 30 — Moçambique — mostra-se da acta da assembleia de apuramento geral ter sido de 2:112 o numero de votantes, apurando-se que foram votados os seguintes:

Joaquim Augusto Ferreira da Fonseca, medico, com 1:911 votos; Carlos Marianno de Carvalho, official da armada, com 3 votos; Conselheiro João Ferreira Franco Pinto Castello Branco, com 1 voto; Baltazar Farinha, com 1 voto; Eduardo de Almeida Saldanha, com 108 votos; Antonio José de Almeida, com 81 votos; Manoel Pereira da Costa Barbas, com 1 voto; João Albarine, com 1 voto; Ernesto Augusto Domingos, com 1 voto.

Contra o acto eleitoral na assembleia primaria de Lourenço Marques apresentaram-se tres protestos por se admittirem listas transparentes, em contrario do disposto no artigo 62.°, § unico do decreto eleitoral e por se não ter observado o artigo 69.°, § 3.°, quanto á publicação por edital do numero das listas entradas na urna. Estes protestos foram contraprotestados e ainda que se tivessem provado os factos allegados, visto que sendo o numero dos votantes em todo o circulo de 2:112, dos quaes obteve Joaquim Augusto Ferreira da Fonseca 1:911, quando lhe fossem descontados as 385 listas, que se dizem transparentes, ainda assim ficava com 1:526 votos, excedendo em 1:418 o seu immediato na votação, que só obteve 108 votos.

Portanto, em vista do exposto, e porque se não deram actos alguns de violencia ou corrupção, nem as irregularidades a que se referem os protestos, podem influir no resultado geral da eleição em todo o circulo, como exigem o artigo 89.°, §§ 2.° e 3.°, do decreto de 8 de agosto de 1901, para se repetirem os actos eleitoraes, julgam, improcedentes os protestos e declaram valida a eleiçSo de Joaquim Augusto Ferreira da Fonseca, medico, para Deputado pelo circulo de Moçambique.

Lisboa, 18 de julho de 1905.= J. Pereira = Serra e Moura = F. Azevedo = V. Erwdal da Beira = Silva.

Circulo n.° 23 — Funchal

Accordam os do Tribunal de Verificação de Poderes:

Mostra-se que, tendo-se procedido em 7 de maio ultimo á eleição de um Deputado ás Côrtes pelo circulo eleitoral do Funchal, em cumprimento do disposto no decreto de 4 de abril do corrente anno, foram votados nas assembleias primarias do mesmo circulo diversos cidadãos que os eleitores consideravam eligiveis, sendo a votação de todos e de cada um d'elles liquidada na assembleia de apuramento que se reuniu na sede do districto em 18 de maio.

Mostra-se que pelo apuramento geral se verificou que foram votados os cidadãos cujos nomes constam das respectivas actas, a saber: o capitão João Augusto Pereira, com 6:100 votos; o Dr. João Francisco de Almeida, com 1:582 votos; 1 major Alexandre José Sarsfield, com 1:148 votos; o Padre Manoel de Abreu Macedo, com 90 votos; o Dr. Manoel de Arriaga, com 3 votos; o Dr. Affonso Costa, com 2 votos; o major Sarsfield, com 1 voto; o tenente João Nfpomuceno de Freitas, com 1 voto; e João da Silva Ignacio, com 1 voto.

Mostra-se que o presidente da assembleia de apuramento proclamou Deputado ás Côrtes o capitão João Augusto Pereira, por ter sido o candidato mais votado, outorgando-lhe, em nome dos eleitores, os poderes mencionados no n.° 5.° do artigo 77.° do decreto de 8 de agosto de 1901.

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SESSÃO N.° 16 DE 16 DE AGOSTO DE 1905 10

Mostra-se que o eleitor Arthur Rego Leite Monteiro reclamou, em tempo competente, perante este tribunal, contra a validade da eleição do candidato João Augusto Pereira, com o fundamento de ser elle inelegivel, quando se procedeu á eleição, parque, tendo sido inspector do material de guerra na Ilha da Madeira, foi exonerado e deixou de exercer as funcções d'este cargo em 31 de março do corrente anno, e era portanto inelegivel na data da eleição, por não terem ainda decorrido sessenta dias desde a exoneração, na conformidade do disposto no artigo 5.°, § 1.°, do decreto de 8 de agosto de 1901.

Attendendo a que se mostra, dos documentos de fl. e fl., que o candidato João Augusto Pereira era inspector interino do material de guerra na Ilha da Madeira, e foi exonerado d'este cargo no dia 31 de março do corrente anno, deixando logo de exercer as respectivas funcções de inspecção.

Attendendo a que, na qualidade de inspector interino do material de guerra, lhe era, applicavel o disposto nos §§ 2.° e 3.° do artigo 5.° do citado decreto, e assim seria inelegivel se exercesse em todo, ou em parto do tempo da eleição, as funcções de inspector, isto é, desde a publicação do decreto que designou o dia da eleição até n conclusão do apuramento.

Attendendo a que, sendo elle exonerado em 31 de março, deixou logo o serviço de inspecção, e portanto não exerceu funcções de auctoridade militar durante o tempo da eleição, a qual decorreu desde 8 de abril, data da publicação do decreto que mandou proceder a ella, até o apuramento em 18 de maio de 1900.

Attendendo a que, perante as assembleias primarias e de apuramento, se não apresentaram protestos ou reclamações que devam ser attendidas.

Por tudo isto julgam valida a eleição do capitão João Augusto Pereira, como Deputado ás Côrtes pelo circulo eleitoral do Funchal.

Lisboa, 12 de junho de 1905. — Silva = Azevedo = J. Pereira == Serra e Muura = Serpa = V. Ervedal da Beira.

Circulo n.° 32 — Mapuçá

Accordam em conferencia no Tribunal de Verificação de Poderes:

Mostra-se dos autos que no dia 2 do preterito mês de abril teve logar nos Paços do Concelho de Bardez a reunião da assembleia final de apuramento de votos que obtiveram na eleição para Deputados, que se effectuou no dia 19 de março ultimo no circulo de Mapuçá, os differentes candidatos a Deputados por este circulo.

Mostra-se que na referida assembleia se apurou que apenas furam votados o cidadão Joaquim Hilario Pereira Alves com 4:453 votos, e o cidadão Alfredo Augusto José de Albuquerque, tenente-coronel de cavallaria, com 211 votos, tendo sido por isso proclamado Deputado pelo circulo de Mapuçá o primeiro candidato Joaquim Hilario Pereira Alves, advogado, residente nesta cidade de Lisboa.

Mostra-se que, perante este tribunal, foi junto em 3 do corrente mês de maio um requerimento, pelo candidato Alfredo José de Albuquerque, pedindo que se suste o julgamento da eleição pelo referido circulo de Mapuçá, porque tendo havido protesto pela falsidade das actas das assembleias primarias de Colvalle, Paira, Mapuçá, Calangute e Sanquelira, e tendo sido instaurado nas respectivas comarcas os competentes processos crimes contra os autores de taes falsificações, se devia sobreestar no julgamento da eleição d'este circulo, até se verificar ser ou não procedente a arguição das referidas falsidades.

Do appenso junto ao processo mostra-se que o cidadão Amaral da Conceição Pinto veio protestar contra a validade das eleições das assembleias de Paira, Tivim, Calangute, que tiverem sido presididas pelos cidadãos nomeados presidentes pelo conselho da provincia, por serem falsas as referidas actas.

Mostra-se que protestos de igual natureza foram apresentados pelo cidadão Caetano Antonio Castellino contra a eleição de Paira, por Clarimundo Heitor do Carmo Sousa contra a eleição da assembleia de Salim e Mapuçá, e por Joaquim Geraldes Marcos Wenceslau do Rosario contra a eleição da assembleia dos Reis Magos e Colvalle, e por Caetano Antonio Clariano Castellino contra a eleição da assembleia do Calangute, e por Clarimundo Heitor do Carmo e Sousa contra a eleição de Tivim.

Em todos estes protestos se allegam que nas mencionadas assembleias, a que presidiram os cidadãos nomeados pelo conselho da provincia, não houve eleição verdadeira. Mostra-se que os differentes protestantes procuraram demonstrar a verdade das suas arguições com os attestados dos regedores de parochia das freguesias das assembleias eleitoraes em que houve protesto.

Mostra-se que os attestados dos regedores foram todos contraproducentes, pois estes funccionarios affirmaram categoricamente que as eleições nas mencionadas assembleias correram todas com a maior regularidade, sem impedimento algum e sem que os respectivos regedores tivessem noticia de que houvessem outras eleições alem das que foram presididas pelos cidadãos nomeados pelo conselho da provincia.

Considerando que, em vista do exposto, não pode deixar de concluir-se pelo processo eleitoral do circulo de Mapuçá, se dá uma mistificação por tal forma que não deve ficar impune, pois que importa um ludibrio aos juizes que hão de julgar este processo, sem que os impossibilite de formarem um juizo seguro e consciencioso sobre o assumpto que teem a resolver.

Considerando que, tratando-se de uma eleição realizada no ultramar, não pode este tribunal mandar proceder a inqueritos, nem pode ordenar a juncção aos autos de qualquer documento elucidativo da verdade dos factos, porque não podia apresentar-se neste tribunal dentro do prazo determinado na lei para o julgamento da eleição pelo circulo de Mapuçá.

Considerando que, por esta forma, o Tribunal, para resolver o ponto controvertido, deve restringir-se á fiel observancia das disposições da lei de 8 de agosto de 1901.

Considerando que, se consultarmos o § 1.° do artigo 5.° da citada lei, nelle se estabelece a presumpção legal da validade da eleição realizada no local competente, isto é, no que foi previamente indicado pelas autoridades legitimas, e sob a presidencia do cidadão que tiver sido nomeado pelo conselho da provincia, seguindo-se de tudo isto dever reputar-se eleito o candidato Joaquim Hilario Pereira Alves, porque, segundo o disposto no artigo 2507.°, quem tiver a presumpção legal escusa provar o facto que nella se funda.

Considerando que, para se utilizar a prova resultante d'esta presumpção, era indispensavel mostrar terem sido legalmente constituidas as assembleias eleitoraes onde se realizaram as eleições sob presidencia de individuos que não foram nomeados pelo conselho da provincia.

Considerando que, para a legalidade de taes assembleias era indispensavel que se tivesse demonstrado a existencia de tumultos e violencias que impedisse a regular constituição das mesas e se tolhesse o livre accesso á urna.

Considerando que os protestantes não apresentaram prova alguma das suas affirmativas, ou para melhor dizer, as provas por elles dadas foram contraproducentes, pois consistiam nos attestados de regedores (das repectivas freguesias) em que se affirmava que as eleições das assembleias contestadas se fizeram com a maxima regularidade e sem ter havido o menor impedimento, não constando aos mesmos regedores que no dia das eleições tivessem havido outras alem das que foram presididas pelos individuos nomeados pelo conselho da provincia.

Considerando que os reclamantes não mostraram que tivessem dado
cumprimento ao § 2.° do artigo 50.º da ci-

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20 DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS

tada lei de 8 de agosto, antes pelo contrario, dos attestados dos regedores se vê que os presidentes das assembleias constituidas fora do local competente não enviaram as participações indicadas no citado § 2.°, o que importa uma manifesta illegalidade para a sua constituição.

Considerando que o facto de se ter participado á competente auctoridade judicial a existencia de um crime não constitue presumpção e muito menos prova da existencia d'esse crime.

Considerando em tudo isto, no mais que dos autos consta, julgam valida a eleição do candidato Joaquim Hilario Pereira Alves, para Deputado pelo circulo de Mapuçá e um procedente o pedido constante feito pelo candidato Albuquerque, e eleito Deputado o candidato Pereira Alves; e mandam que os autos vão com vista ao Ministerio Publico para proceder como for de justiça.

Lisboa, 27 de maio de 1905.= Azevedo = V. do Ervedal da Beira = SiLa—J. Pereira — Serra e Moura = Serpa.

Circulo n.° 33 — Macau

Accordam no Tribunal de Verificação de Poderes:

Mostra-se que tendo-se procedido á eleição de Deputa dos pelo circulo n.° 33 — Macau—se realizou este acto nas assembleias de que este circulo se compõe, correndo os actos eleitoraes com a devida legalidade e sem que houvesse o menor protesto ou reclamação.

Da mesma forma na assembleia de apuramento geral tambem não se deu alguma irregularidade, resultando e verificando se que o numero das listas entradas na urna foi 2:443, obtendo o cidadão Abel da Cunha Abreu Brandão, advogado, 2:437 votos, e o cidadão Annibal Cesar Xavier Henriques, 3 votos, havendo 3 listas em branco.

O que tudo visto, e mostrando-se, como se mostra, que os actos eleitoraes correram com toda a legalidade, por isso julgam valida a eleição para Deputado do cidadão Abel da Cunha Abreu Brandão.

Lisboa, 12 de junho de 190o. = V. Ervedal da Beira — Silva = Azevedo = J. Pereira = Serra e Moura = Serpa.

Circulo n.º 29 — Angola

Accordam os do Tribunal do Verificação de Poderes: Visto este processo eleitoral do circulo n.° 29 — Angola — mostra-se das actas das differentes assembleias que não houve protesto ou reclamação alguma, e passando a conhecer do resultado da votação, verificou-se que o numero de votantes em todas as assembleias eleitoraes dos districtos, foi de 10:867 votos: obtendo o candidato Ernesto Julio de Carvalho Vasconccllos, 10:37G; Fernão Bottn Machado, 220; Fernando Reis, 70; Conselheiro Antonio Duarte Ramada Curto, 54; Conselheiro Candido Joaquim de Macedo Baptista, 40; Eduardo Augusto Ferreira da Costa, 35; Lino Maria, de Sousa Araujo, 33; Conselheiro José de Brito Freire e Vasconcellos, 14; Visconde do Alto Dande; 12; David Lopes da Silva, 1; Dr. Antonio José de Almeida, 1; Dr. Antonio Fernandes de Oliveira Monteiro, 1.

Em vista d'este apuramento, o presidente proclamou era voz alta eleito Deputado da Nação, pelo circulo eleitoral da provincia de Angola, o candidato Ernesto Julio de Carvalho e Vasconcellos, circulo n.° 29. Por estes motivos declaram valida a eleição do referido Deputado.

Lisboa, 18 de julho de 1900. = F. Azevedo = V. Ervedal da Beira = Silia = J. Pereira = Serra e Moura.

Circulo n.° 31 — Margão

Accordam os do Tribunal de Verificação de Poderes: Que mostrando-se d'este processo da eleição de um Deputado pelo circulo n.° 31, Margão, lerem-se observado no acto eleitoral as disposições logaes, sem se ter apresentado protesto ou reclamação e da acta da assembleia do apuramento geral que foram votados os seguintes cidadãos: Christovam Patrocinio de S. Francisco Xavier Pinto, funccionario publico, residente em Lisboa, com 5:106 votos; capitão Alfredo Antonio da Rocha Vieira, presidente em Lisboa, com õ votos: Joaquim Filippe Nery Soares Rebello, residende em Margão, com 5 votos; capitão Fernando Augusto Nogueira Velho de Chaby, residente em Goa, com 4 votos; e Ignacio Marianno Soares, residente em Loutolim, com 2 votos.

Sendo nesse acto, em observancia do § 2.° do artigo 93.° do decreto de 8 de agosto de 1901, proclamado Deputado eleito o cidadão que obteve o maior numero de votos.

Em vista do exposto declaram valida a eleição do Deputado eleito, Christovam Patrocinio de S. Francisco Xavier Pinto, funccionario publico, residente em Lisboa, que foi proclamado nu assembleia de apuramento geral.

Lisboa, 27 de maio de 1905. = J. Pereira = Serra e Moura = Serpa = V. Ervedal da Beira = Silva — Azevedo.

Relatorio e propostas de lei apresentadas nesta sessão pelo Sr. Ministro da Fazenda

Relatorio

Senhores: — Desde outubro do ultimo anno, em que assumi a pasta da Fazenda; tem-se accentuado a melhoria da nossa situação financeira, que já se vinha manifestando, subindo de cotação, os fundos publicos, e diminuindo consideravelmente o prejuizo do ouro nas transacções internacionaes, como beneficio geral do commercio e do Thesouro. Em 20 de outubro de 1904 os titulos da divida do Estado tinham as seguintes cotações: divida interna 3 por cento, 38,67 1/2; 4 por cento, 48,000; 4 1/2 por cento, 56.400; divida externa 3 por cento 1.ª serie em Londres 64 1/2, e de 63,90 a 65 em Paris, conforme as series. Em 10 cio mês actual tinham os mesmos fundos respectivamente os preços de 42,30, 52,800 61,500 pura a divida interna, e de 69 para a externa em Londres e de 68,95 a 69,20 em Paris.

Identica melhoria deu se tambem em muitos dos papeis de sociedades e empresas particulares, embora cm menor grau para algumas d'ellas.

D'este facto resultou um acrescimo notavel da nossa riqueza mobiliaria, alem da que proveio da diminuição do premio do ouro, que equivale ao aumento em igual proporção do valor da moeda nacional. E importantisima tem sido a diminuição da perda nos cambios, pois que em 20 de outubro de 1904 cota-se o cheque sobre Londres a 44 11/16, e sobre Paris a 641, emquanto que actualmente a cotação é respectivamente do 50 1/16 e 567, o que representa uma, diminuição no premio do ouro de 12,80 por cento.

A importancia dos depositos nos bancos de Lisboa e Porto, Montepio Geral e Caixa Enomica Portuguesa tem aumentado de modo a mostrar bem claramente que a situação geral do país se acha sensivelmente melhorada, crescendo as disponibilidades em numerario. Referindo-me unicamente aos dois ultimos estabelecimentos notarei que havendo emfins de setembro de 1904 em deposito a somma de 20.793:000$000 réis, em 30 de junho ultimo se elevava já a 21.980:000$000reis, pertencendo 14.727:000$000 réis ao Montepio Geral e 7.253:000$000 á Caixa Economica, com o acréscimo no total de 1.187:000$000 réis em nove meses somente. Em 30 de junho de 1900 a somrna dos depositos era de 15.090:000$000 réis, sendo no Montepio Geral 11.309:000$000 réis o na Caixa Economica 3.781:000$000 réis. Depois d'essa epoca estas disponibilidades teem aumentado, mas mais no ultimo estabelecimento do que no primeiro.

Durante a gerencia actual entre as diversas providen-

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cias decretadas pelo Ministerio da Fazenda enumerarei as seguintes:

Despesas das cxtinctas juntas geraes de districto

Por decreto de 14 de janeiro de 1905 determinou-se que o producto das percentagcns sobre as contribuições do Estado fosse escriturado a começar de 1 do mesmo mês, como receita effectiva do Thosouro, dando-se-lhe a applicação legal em capitulo addicional aos «Encargos Geraes», como despesa propria do Ministerio da Fazenda. Pelo artigo 4.° do mesmo decreto as despesas não poderão exceder as que foram pagas em relação a cada applicação legal no anno de 1892, salvos os aumentos já justificadas ou a justificar perante as instancias superiores, dentro dos preceitos estabelecidos nas instrucções approvadas por decreto de 24 de dezembro do mesmo anno, e quando taes aumentos caibam no producto do imposto, em cada districto, entrando no computo os encargos da divida do mesmo districto.

Teve-se principalmente em vista com esse decreto incluir no Orçamento Geral do Estado todas as receitas e despesas especiaes dos districtos que até aquella data figuravam em contas de thesouraria, por ser este um preceito de boa contabilidade, e impedir que as receitas proprias de um districto possam ser applicadas em outros, visto que são diversas as percentagens que se cobram por meio de addicionaes ás contribuições directas do Estado.

Acresce a circunstancia de que são muito variados os serviços districtaes e encargos dos emprestimos contrahidos pelas extinctas juntas geraes, devendo portanto dar-se applicação, nos proprios districtos, aos saldos que provierem da extincção d’esses emprestimos ou serviços, no caso de não serem reduzidos aquelles addicionaes ao que for precisamente indispensavel. Conservando porem, como parece melhor, os actuaes impostos, convem que o seu producto seja gasto somente, no respectivo districto, no aumento e mais cabal organização da policia, ou em serviços locaes de reconhecida utilidade.

Conventos de religiosas supprimidos

Em virtude da carta de lei de 29 de julho de 1899 os fundos ou valores que de futuro se realizassem pelos pagamentos, direitos e inversão do preço de remissão de foros ou da venda d'elles, e de quaesquer bens e direitos pertencentes aos mencionados conventos, tinham applicação especial á compra de fundos externos do Governo Português, depois de satisfeitas todas as despesas legues a que estavam sujeitos esses rendimentos. Nessa conformidade foi empregada na acquisição d'aquelles fundos, desde 1 de setembro de 1899 até 31 de julho de 1903, a quantia de 322:4516990 réis, possuindo o Thesouro naquella data 2:902 obrigações de 4 por cento e 3:864 obrigações de 4 1/2 por cento.

Estes titulos foram vendidos em Paris em 1903 para acudir ás urgencias de pagamento no estrangeiro, produzindo 295:001 £955 réis em ouro.

Por decreto de 4 de janeiro d'este anno determinou-se que fosse esse rendimento escriturado como receita no Orçamento Geral do Estado, inscrevendo-se pela mesma forma, no orçamento Hás despesas, as importancias a pagar por esse fundo. Outras providencias mais furam adoptarias no intuito de reduzir as despesas que se faziam por conta dos conventos de religiosas supprimidos, sem d'ellas se dar conhecimento ás Côrtes.

Os titulos adquiridos com os excedentes d’aquelles rendimentos sobre as despesas a que por lei estão adstrictas continuam formando um verdadeiro fundo especial de amortização da divida externa, sob a denominado de «Fundo especial de conventos de religiosas supprimidos», e está a cargo da Junta do Credito Publico, conforme se estipula no decreto de 24 de dezembro de 1904.

Por este meio completaram se as disposições da lei de 29 de julho do 1899, garantindo-se a applicação legal dos rendimentos dos conventos supprimidos, depois da lei de l de abril de 1861.

Desde l de agosto de 1903 até 30 de junho de 1905 arrecadou-se d'aquella proveniencia a quantia de réis 102:273$455, que teve a seguinte applicação em fundos externos de 3 por cento do Governo Português:

31 Obrigações — 1.ª serie.

192 Obrigações — 2.ª serie.

1:158 Obrigações — 3.ª serie.

330 Obrigações — 3.ª serie (sem juros).

Existiam naquella data na Junta do Credito Publico as mesmas obrigações acima referidas, e mais 25 da 3.ª serie, adquiridas com juros cobrados na importancia de réis 1:864$350 réis.

Emprestimos de divida publica fundada Interna

Em virtude de autorizações legaes contrahiu o Governo, por concurso limitado a bancos nacionaes e outros estabelecimentos financeiros, dois emprestimos: sendo o primeiro destinado aos caminhos de ferro do Estado na importancia de 1.500:000$000 réis — contrato de 19 de dezembro de 1904, em 18:175 obrigações de 4 1/2 por cento de nominal de 90$000 réis, amortizaveis em sessenta annos com a annuidade de 79:085$400 reis; — e o segundo de 2.000:000$000 réis com applicação ao caminho de ferro da Swazilandia — contrato de 10 de março de 1905, representado por 270:000 obrigações de 3 por cento do nominal de 10.3000 réis, amortizaveis em setenta e cinco annos com a annuidade de 100:897$294 réis.

Os encargos e o juro real, em relação ao producto liquido d'estes emprestimos, foram:

Caminhos de ferro do Estado:

Encargos .... 5,272 por cento
Juro real .... 5 »

Caminho de ferro da Swazilandia:

Encargos .... 5,044 por cento
Juro real .... 4,354 »

No contrato celebrado em 12 de outubro de 1903 para 19:444 obrigações de 4 1/2 por cento, cujo producto teve applicação aos caminhos de ferro do Estado, o encargo foi de 5,640 por cento, e o juro real de 5,404 por cento, sobre o capital effectivamente realizado. Vê-se que a melhoria da nossa situação financeira permittiu as duas ultimas operações em circunstancias muito mais favoraveis para o Thesouro.

Em todos estes emprestimos o Estado reservou-se a faculdade de antecipar a amortização.

Contratos para o serviço de thesouraria no estrangeiro

Havia para as operações do Thesouro no estrangeiro dois: um com a casa Baring Hrothers, com um credito de £ 100:000, pagando o Thesouro a commisião trimestral de 1/2 por cento sobre a reforma das letras representativas d'aquelle credito, e outro com o Credit Lyonnais, com o credito de 5.000:000 francos, pagando o Thesouro igual commI5M:io trimestral de 1/2 por cento.

Na actual gerencia os eruditos foram elevados em Londres a £200:000 e em Paris a 10.000:000 francos, reduzindo-se em ambos a commissão trimestral a 1/2 por cento c acabando a da reforma das letras em Londres.

Alem d'estes creditos modificados o Governo obteve os seguintes:

Um de 5.000:000 frncos em Bruxellas com a Caisse Générale de Reports et de Dépôts para o serviço financeiro na Belgica;

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Um de 2.000:000 francos na Suissa com o Bankverein Suisse para o serviço financeiro nesse país;

Um de 5.000:000 marcos em Berlim com o Bank fur Handel & Industrie para o serviço financeiro na Allemanha.

Estes preditos estão abertos por contrato nas condições do que se modificou com a casa Baring em Londres, com a obrigação porem para o Governo, em relação ao de Berlim, de ter lá um deposito de 1.000:000 marcos, que aliás vence o juro de 2 por cento ao anno a favor do Governo.

Está pendente de negociações um contrato para o serviço na Hollanda.

Foi incumbido das negociações que se entabolaram com aquelles estabelecimentos o agente financeiro do Governo Português em Londres e Paris, Bartholomeu Perestrello, que se houve neste serviço com muito zelo e dedicação.

A garantia destes contratos foi ajustada com titulos da divida, interna, com excepção de Londres, em que parte da garantia é em titulos externos, como anteriormente.

Alem dos contratos supra obteve o Governo a cotação do fundo interno português nas praças de Bruxellas e Anvers, e obtê-la-ha na Hollanda e mesmo na Allemanha quando o julgue opportuno.

A cotação obtida obedece á condição do pagamento em réis, com a deducção do imposto de rendimento de 30 por cento como em Portugal.

Divida fluctuante

A divida fluctuante, que em 20 de outubro de 1904 sommava 67.831:733$110 réis, sendo 59 114:460$515 réis no país e 8.717:272$595 réis no estrangeiro, comquanto se elevasse a 68.720:596$955 réis em 31 de dezembro de 1904, achava-se reduzida em 30 de junho ultimo a 65.756:270$444 réis, sendo 58.283:581$059 réis no país e 7.472:689$385 réis no estrangeiro, devendo notar-se, em relação a esta, que não só diminuiu o encargo do cambio, como foi reduzido a 5 1/2 por cento o encargo superior das operações em andamento, em 20 de outubro, havendo o Governo realizado posteriormente outros a 5 por cento sem penhor, e retirado o penhor dos que o tinham.

Na divida, em 30 de junho ultimo, figura a Caixa Geral de Depositos por 7.708:460$145 réis; esta cifra está sujeita a rectificações.

Tomando em consideração os saldos em cofre em 30 de junho de 1904 e igual dia d’este anno, que eram respectivamente de 2.820:0480113 réis e 4.135:672$126 réis, a divida fluctuante ficará reduzida, naquellas datas, a 62.632:908$464 réis e 61.620:598$318 réis, ou seja, menos 1.012:310$146 réis no anno actual.

As receitas publicas teem progredido nos ultimos annos, assim como se tem desenvolvido o nosso movimento commercial. No exercicio de 1899-1900 a cobrança dos rendimentos do Thesouro foi de 54.808:383$650 réis, incluindo empréstimos na importancia de 903:500$000 réis, e para o de 1905-1906 estão computadas todas as receitas do Thesouro em 61.341:121$887 réis comprehendendo a importancia de 1:200 contos, tambem de emprestimos.

A importancia do commercio geral, que era em 1895 de 88.994:000$000 réis, passou em 1904 a 130.012:000$000 réis. O movimento commercial entre a metropole e as pro-vincias portuguesns ultramarinas, avaliado em 1888 na totalidade em 6.481:000$000 réis, subiu em 1904 a réis 19.100:000$000.

Occupar-me-hei mais especialmente d’estes assuntos no seguimento d’este relatorio, mas o que fica dito explica já de per si a melhoria da nossa situação financeira e economica.

Serviço do cadastro predial

Avallação dos predios urbanos

A lei de 29 de julho de 1899 dividiu a contribuição predial em urbana e rustica, mandando applicar á predial urbana o systema de quota fixa, nos termos e verificadas as hypotheses da lei de 17 de maio de 1880 e mantendo para ^predial rustica o systema de quotas ou contingentes.

Para execução desta lei, na parte relativa á contribuição predial urbana, foi publicado o regulamento de 10 de agosto de 1903, em seguida á promulgação do qual foi installado o Concelho Superior do Cadastro e nomeadas pelo Governo as commissões technicas de avaliação dos prédios urbanos, criadas pelo artigo 6.° da mesma lei.

Teem sido nomeadas cincoenta e sete commissões; dissolvidas tres por haverem terminado os seus trabalhos; e estavam em exercicio cincoenta e quatro no dia 31 de julho de 1905.

Este numero será consideravelmente reduzido brevemente, por estarem muito adeantados alguns trabalhos.

O resultado das avaliações effectuadas até 31 dê julho de 1905 é o seguinte:

[Ver tabela na imagem]

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[Ver tabela na imagem]

A despesa total com este serviço nos annos de 1903, 1904 e 1905 (até 31 de junho) foi de 174:387$666 réis.

Situação financeira

Exercicios

A conta do ultimo exercício, 1903-1904, segundo os documentos escriturados na Direcção Geral da Contabilidade Publica, mostra os seguintes resultados:

Receitas

[Ver tabela na imagem]

Despesas

[Ver tabela na imagem]

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O saldo positivo de 37:086$572 réis é apenas o resultado do balanço das contas, visto que sob a denominação de — receitas extraordinárias—se comprehende o producto de emprestimos, de venda de titulos e de outras origens identicas.

Abatendo a importancia correspondente a esses recursos chega-se ao deficit de 4.226:479$286 réis, que attingirá a cifra de 6.312:032$154 réis logo que nas contas d’este exercício forem escrituradas as seguintes despesas, em harmonia com a proposta de lei já submettida ao exame das Côrtes:

Em divida .... 596:496$491
Pagas e ainda cão legalizadas .... 1.489:056$377

O emprestimo com applicação á compra de armamento para o exercito, autorizado pela lei de 30 de junho de 1904, não foi ainda emittido, mas fez-se face a essa despesa — 371:467$893 réis — com o producto da venda de titulos.

Para estradas, segundo as autorizações concedidas pelas cartas de lei de 14 de maio de 1902, artigo 20.°, alinea d) e 27 de junho de 1903, artigo 53.°, foram emittidos, por portaria de li de julho de 1903, títulos de divida consolidada interna no valor nominal de 4.100:000$000 réis, para realização de 1.600:000$000 réis em effectivo.

D’esta importancia pertencia ao exercicio de 1902-1903 a de 1.200:000$000 réis, sendo porem incluida na tabella da despesa extraordinaria de 1903-1904 do respectivo Ministerio.

D’este modo, na despesa d’este exercício figura, em relação aos referidos 1.200:000$000 réis, o que, em conta de thesouraria, havia sido despendido em 1902-1903, ou 1.198:895$900 réis.

Mencionem-se ainda os seguintes encargos que pesam sobre o exercicio de 1903-1904 e que pelo seu caracter especial não podem entrar no computo dos que teem de ser satisfeitos pelos recursos normaes do Thesouro: despesas do convenio na importancia de 526:480$503 réis e despesa com a recepção de Sua Majestade o Rei de Espanha na de 119:600$000 réis.

Se diminuirmos, pois, nos resultados encontrados estas importancias na somma de 2.216:444$296 réis, o deficit ficará sendo de 4.095:587$858 réis.

Comparação dos resultados effectivos do exercício de 1903-1901 com as previsões orçamentaes

Receitas

O seguinte quadro mostra as differenças que para mais e para menos houve nas receitas, entre as verbas calculadas e as importancias cobradas:

[Ver quadro na imagem]

(a) O prnducto da «receita por meio de estampilhas» que ainda se cobrou no 1.º trimestre de 1903-1904, bem como o que foi fixado na lei de 27 de junho de 1903, foi distribuido pelos impostos a que pertence.

Registam se aumentos em todos os impostos o contribuições com excepção unica do sêllo e registo, em que ha a diminuição de 204:914$102 réis nas receitas ordinarias e de 10:400$301 réis no addicional extraordinario de 5 por cento. Attendendo áquella diminuição, para a qual concorreram circunstancias especiaes, o acrescimo nas demais receitas ordinarias foi de 3.148:613$854 réis, resultado que deveria considerar extremamente lisonjeiro, se a analyse minuciosa da proveniencia d’esses aumentos o não viesse attenuar em grande parte.

Com effeito, do aumento de 445:506$911 réis nos impostos directos ha que deduzira importancia de 211:474$589 réis correspondente ao imposto de rendimento dos juros de parte dos titulos de divida publica criados durante o exercício para cauções de empréstimos, e a de 150:016$106 réis de atrasados do mesmo imposto relativos a juros de titulos em circulação, restando para as outras verbas da classe A e para todas as da classe B o aumento de réis 62:298$680. No conjunto o acrescimo real da cobrança fica reduzido, excluído o imposto de rendimento, a réis 21:717$536, havendo differenças que se balancearam para mais e para menos, nos diversos rendimentos que formam este grupo.

Foi maior o producto, excluido o do imposto de rendimento, nos seguintes:

[Ver tabela na imagem]

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No relatorio que precede o Orçamento Geral do Estado apresentado ás Cõrtes em 12 de abril d’este anno explica-se a causa da diminuição da contribuição sumptuaria por motivo da publicação do decreto de 27 de junho de 1903.

Na contribuição de registo honve a diminuição de réis 219:813$602, e no sêllo a de 53:244$782 réis. O sêllo nas lotarias teve um aumento de 68:144$282 réis, de que resulta que neste grupo de receitas a differença para menos ficou reduzida a 204:9140102 réis.

Nos impostos indirectos a cobrança foi superior em réis 1.263:956$056 á fixada na lei orçamental. O aumento mais notavel encontra se na verba dos direitos de importação de varios generos e mercadorias que sobe a 1.098:923$323 réis. A esta succedem-se a do imposto de producção de alcooes e aguardentes, em que a importancia a maior é de 270:415$328 réis; a dos direitos de consumo, a que já me referi no relatorio que precede o orçamento e que se eleva a 156:795$459 réis, e as do imposto de fabricação e consumo e direito de carga, cujos acrescimos são respectivamente de 70:012$663 réis e 37:684$800 réis. Especializaremos ainda os direitos de exportação de varios generos e mercadorias e os do vinho saído pela Alfandega do Porto, em que ha para os primeiros o aumento de réis 26:517$963 e para os segundos o de 23:880$893 réis, sendo os aumentos em outras receitas de 44:459$338 réis. Nas diminuições figuram: o imposto do real de agua com a importancia a menos de 385:986$800 réis, que igualmente se explica no relatorio do orçamento; o imposto especial do vinho entrado no Porto e em Villa Nova de Gaia com a de 28:436$756 réis, e o imposto de transito nos caminhos de ferro e os direitos de cereaes, que mostram as differenças para menos de 19:290$924 réis e 16:376$630 réis, havendo ainda em outras verbas a diminuição de 14:642$101 réis.

Recopilando estas differenças, teremos:

[Ver tabela na imagem]

Nos bens nacionaes e rendimentos diversos as importancias orçamentaes foram excedidas: pela maior participação nos lucros da Companhia dos Tabacos, de 321:435$131 réis, e na do Banco de Portugal de 103:296$602 réis, figurando alem disso pela primeira vez a Empresa da Exploração do Porto de Lisboa com a de 52:436$341 réis.

Nas receitas dos correios e telegraphos regista-se o aumento de 212:323$915 réis e o de 70:942$171 réis no producto da venda de bens nacionaes.

As receitas das circunscrições hydraulicas, que não eram inscritas no orçamento, figuram com a importancia de réis 77:300$140, e as do recrutamento, que só se escrituram em correspondencia com a despesa, inscrevem-se com a importancia de 105:148$125 réis.

O aumento é, pois, de 942:882$425 réis, que, addicionado de 30:712$575 réis, importancias a maior em outras receitas, perfaz o total de 973:595$000 réis, em parte attenuado com a importancia de 225:016$537 réis, que houve de diminuições em diversas verbas, das quaes mencionaremos 50:599$828 réis nas receitas do Arsenal do Exercito e a de 33:183$663 réis nos impostos extinctos.

Em resumo:

[Ver tabela na imagem]

Os aumentos nas compensações de despesa teem a seguinte explicação: 96:000$000 réis, importancia correspondente ao encargo do emprestimo para estradas nos termos da lei de 14 de maio de 1902, que não foi inscrita no orçamento por ter sido feita posteriormente á emissão; réis 493:440$707 de juros liquidos de imposto de rendimento de parte dos titulos criados no exercicio de 1903-1904; 29:247$105 réis, cobrança effectuada nos termos do artigo 3.° da lei de 14 de maio de 1902 para indemnização das importancias despendidas com o fundo geral de quotas; 84:607$080 réis, pelos encargos do empréstimo para caminhos de ferro do Estado, tambem posterior á organização e approvação do orçamento; 21:576$492 réis, nos rendimentos dos conventos de religiosas supprimidos, e réis 14:622$284 em diversas outras rubricas, tudo na somma de 739:493$668 réis.

As diminuições na importancia de 49:668$537 réis notam-se nas verbas seguintes: impostos addicionaes ás contribuições do Estado, 36:042$644 réis, Caixa Geral de Depositos 5:663$311 réis e 7:962$582 réis em outras receitas.

As principaes differenças neste grupo são pois:

[Ver tabela na imagem]

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[Ver tabela na imagem]

Deduzindo do computo das receitas ordinarias do Thesouro no exercicio de 1903-1904, que resulta do apuramento das contas, as verbas respectivas ao imposto de rendimento de novos titulos de divida publica e igualmente as que por igual proveniencia se escrituraram como compensação de despesa e tambem as dos encargos dos emprestimos para estradas e caminhos de ferro, que realmente constituem despesas novas, o aumento real ficará reduzido a 2.058:177$376 réis, de que deverá ainda abater-se a quantia de 100:148$125 réis, receitas do recrutamento não inscritas no orçamento.

As participações nos lucros da Companhia dos Tabacos, do Banco de Portugal e Empresa do Porto de Lisboa entram naquelle computo pela verba de 477:168$074 réis.

Resulta assim que o acrescimo na cobrança dos impostos e rendimentos ordinarios proprios do Thesouro, em comparação das previsões orçamentaes, se reduz a réis, 1.475:861$177 entrando nessa importancia a de réis 1.098:923$323, que corresponde ao aumento nos direitos de importação de varios generos e mercadorias. Vê-se, pois, que de facto foram os impostos indirectos que mais contribuiram para o maior producto das receitas publicas no ultimo exercicio.

Despesas

A comparação das que foram autorizadas e as effectuadas encontra-se no seguinte quadro:

[Ver quadro na imagem]

É nas despesas que se manifesta maior desacordo entre as previsões orçamentaes e as importancias liquidadas. O aumento, tendo em consideração as despesas em divida, e as que foram pagas mas não estão ainda legalizadas, absorvem não só todo o acrescimo de receitas na importancia de2.938:635$607 réis, excluindo emprestimos e venda de titulos, como o excedem em 3.909:018$904 réis. A despesa pois foi superior á prevista no orçamento

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em 6.847:604$511 réis e o deficit que se calculara era 803:013$250 réis, foi aggravado da importancia de réis 3.909:018$904, diminuida da de 616:444$296 réis, differença entre a somma de 2.216:444$296 réis de varias verbas que se abatem na despesa e a de 1.600:000$000 réis do emprestimo para estradas, que não entrou no computo para determinação do deficit que no principio encontrámos.

A classificação dos Ministerios pela ordem de excesso de despesa é a seguinte:

[Ver quadro na imagem]

Para apreciarmos a verdadeira despesa de cada um dos Ministerios carecia aquelle quadro de diversas rectificações. Importantes quantias andam fora do orçamento, em consequencia dos regimens autonomos estabelecidos para diversos serviços.

Não figuram por isso nas contas do Estado todas as despesas publicas, algumas, aliás, de grande vulto.

As importancias, por exemplo, designadas no mappa anterior para o Ministerio das Obras Publicas, não comprehendem as despesas com caminhos de ferro, pinhaes e matas, mercado central de productos agricolas, etc., e não obstante a despesa com o primeiro dos indicados serviços deve ser superior a 1.700:000$000 réis e a do segundo a 60:000$000 réis por anno.

Addicionadas portanto só estas duas despesas ás que, em conta do Estado, foram escrituradas, a despesa do referido Ministerio em 1903-1904 será de 6.366:000$000 réis, mais 1.624:000$000 réis de despesa extraordinaria, mais 1.700:000$000 réis e mais 60:000$000 réis, ou de 9.750:000$000 réis.

E sendo a importancia das receitas, como já vimos, ordinarias 57.114:000$000 réis e extraordinarias réis 1.979:000$000, comprehendidos 1.199:000$000 réis do emprestimo para estradas, pertencente á despesa de 1902-1903, mas incluida na conta de 1903-1904, ou no total de 59.093:000$000 réis, se d’este numero abatermos as despesas da divida publica, de encargos geraes de differenças de cambio o da Caixa Geral de Depositos, na somma de 32.611:000$000 réis, ficará a importancia de 26.482:000$000 réis que, addicionada de 1.760:000$000 réis que incluimos para despesas de caminhos de ferro e de pinhaes e matas, e mais a de 371:000$000 réis, encargo descrito para armamento, que não tem nos rendimentos importancia correspondente, dará, receita, disponivel para despesas do serviço proprio dos Ministerios, no exercicio de 1903-1904, a importancia de 28.613:000$000 réis, da qual o das Obras Publicas absorve 34,07 por cento.

E como a despesa do Ministerio da Guerra, no indicado exercicio, foi de 8.533:000$000 réis ou 29,82 por cento, para despesas do Ministerio da Fazenda, incluindo guarda fiscal, Ministerios do Reino, Justiça, Marinha e Ultramar e Estrangeiros, restará apenas a percentagem de 36,11 por cento.

Considerando os três exercicios anteriores ao de 1903-1904 sob o mesmo ponto de vista, chega-se a resultados identicos.

As contas d’esses exercicios, segundo a escrituração existente na Direcção Geral da Contabilidade Publica, mostram o seguinte:

[Ver tabela na imagem]

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[Ver tabela na imagem]

Ponderando, porem, que nas receitas extraordinarias se comprehendem não só os productos dos empréstimos que teem encargos correspondentes em despesa, mas as importancias de 2.705:495$900 réis de venda de titulos no exercicio de 1902-1903, e a de 323$430 réis no exercicio de 1900-1901, producto da venda de propriedades pertencentes ás praças de guerra, e que, segundo a proposta de lei d’esta data, em relação aos referidos exercicios, ha ainda que incluir:

Por despesas liquidadas e em divida:

[Ver mapa na imagem]

Se nesta conformidade rectificarmos o mappa anterior, e compararmos os resultados com as importancias fixadas nas respectivas leis, obteremos o quadro seguinte:

[Ver quadro na imagem]

(a) Comprehende 450:000$000 réis do emprestimo para as classes inactivas.

(b) Comprehende 50:000$000 réis de receita para as obras da Academia Polytechnica do Porto.

(c) Comprehende 140:000$000 réis de receita para as obras da Academia Polytechnica do Porto, e da prestação com que a camara municipal da mesma cidade tinha de contribuir para a mudança das barreiras para a nova linha fiscal.

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[Ver tabela na imagem]

A simples inspecção d’estes numeros confirma o que disse. As receitas, com excepção das relativas ao exercicio de 1901-1902, excedem em quantias avultadas as respectivas avaliações. As despesas foram tambem superiores, mas muito mais de que o aumento das receitas, resultando assim um desequilibrio maior de que o previsto.

Devemos todavia notar que se não realizou a cobrança de 50:000$000 réis no exercicio de 1901-1902 para as obras da Academia Polytechnica do Porto, e no de 1902-1903 a de 140:000$000 réis de subsidio a pagar pela camara municipal da mesma cidade, para as novas barreiras. Houve por esse motivo uma diminuição igual nas receitas extraordinarias previstas para aquelles exercicios.

A diminuição nas receitas ordinarias do exercicio de 1901-1902 explica-se pela dos rendimentos dos direitos de importação de cereaes e pela do imposto de producção de alcooes e aguardentes. O primeiro d’estes rendimentos fora computado em 2.050:000$000 réis, servindo de base á sua avaliação a cobrança de 1899-1900, com o abatimento de 15 por cento; o segundo em 576:700$000 réis, segundo a cobrança do mesmo anno. A colheita excepcional de 1901-1902 quasi que supprimiu a importação do trigo e outros cereaes, reduzindo os respectivos direitos a 18S:445$425 réis; a escassez de productos para destillação nas ilhas e outras causas fizeram tambem descer o imposto de producção de alcooes e aguardentes a réis 106:683$522. A perda pois, só nestas duas receitas, determinada por factos anormaes, foi de 2.331:571$053 réis, havendo portanto um excesso de cobrança nas demais receitas, sobre as avaliações, de 2.201:892$664 réis.

Gerencia de 1904-1005

A gerencia de 1904—1905, formulada a respectiva conta de despesa pelas importancias dos pagamentos em relação ao exercicio de 1903-1904 (parte complementar) e pela dos fundos saídos em relação ao exercicio de 1904—1905, por não haver ainda elementos para conhecer da totalidade dos pagamentos effectuados por despesas proprias deste ultimo anno, apresenta os seguintes resultados:

[Ver tabela na imagem]

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Da analyse d’esta conta vê-se que o deficit é de réis 1.810:732$659, se excluirmos das receitas as importancias dos emprestimos ou de venda de titulos. Tomando porem em consideração que para armamento do exercito está comprehendida na despesa extraordinaria d’esta gerencia a importancia de 930:841$046 réis, sem que na receita tenha sido incluida importancia correspondente, por ainda não ter sido emittido, como já tivemos occasião de mencionar, o emprestimo de 4.500.000$000 réis autorizado para tal fim por carta de lei de 30 de junho de 1902, aquelle deficit ficou reduzido a 879:891$613 réis.

Para a apreciação das receitas em separado necessario se torna tambem fazer algumas correcções para conhecermos da sua importancia effectiva, visto nellas figurarem per jogo de contas o imposto de rendimento de titulos na posse da Fazenda e os juros liquidos d’esses titulos, sendo assim affectadas com as respectivas importancias as classes de impostos directos e compensações de despesa.

Segundo os documentos existentes na Direcção Geral da Contabilidade Publica a importancia escriturada por imposto de rendimento de juros de titulos na posse da Fazenda foi de 1.942:216$267 réis, á qual corresponde de juros liquidos a de 4.531:837$956 réis, importancias que abatidas nas duas referidas classes farão baixar os seus rendimentos respectivamente a 11:430:313$286 réis e a 1.399:975$600 réis, ou a somma das receitas ordinarias a 52.891:787$456 réis.

Feitas identicas correcções nas despesas os encargos da divida publica fundada ficam em 16.108:250$779 réis, reduzindo a somma da despesa ordinaria a 52:160$670$258 réis.

O seguinte quadro dá a conta da gerencia modificada nos termos indicados, abatida tambem na despesa a importancia de 930:841$046 réis de armamento, por não ser esta quantia, pelas razões expostas, balanceada em receita:

Gerencia de 1904-1905

[Ver tabela na imagem]

Devemos agora notar que quasi 10 por cento da despesa total foi autorizada por creditos especiaes, cuja importancia por Ministerios é a seguinte:

[Ver tabela na imagem]

com que são aggravadas as respectivas autorizações parlamentares.

Os resultados a que se chega pelo exame sincero das contas do Thesouro demonstra a perfeita exactidão do que disse no relatorio que precede o orçamento para 1905—1906 e evidencia da maneira mais positiva a necessidade absoluta e indispensavel de acabar com os creditos especiaes e mais ainda de não permittir que as estações publicas contraiam obrigações que, não podendo ser solvidas pelas verbas ordinarias, teem por isso de ser pagas por supprimentos ou ficar em divida até que uma autorização parlamentar as legalize.

Se o nosso estado actual é relativamente livre de embaraços, essa feliz circunstancia deve ser mais um incentivo para que sejamos rigorosos nos processos de administração, fazendo tudo que estiver ao nosso alcance e o permittam os nossos esforços, firmeza e dedicação, para manter e consolidar esse estado, que é mester assegurar por todos os modos e defender a todo o transe. só assim poderemos caminhar e progredir e será perseverando nestes principios que conquistaremos o nosso futuro. De contrario cairemos nos erros do passado e a breve trecho encontrar-nos-hemos assoberbados com difficuldades cuja solução poderá exigir enormes sacrificios.

Para apreciar o desenvolvimento, desde 1852-1853, das nossas principaes receitas ordinarias, formularam-se mappas, annexos ao relatorio, que mostram de exercicio para exercicio e de gerencia para gerencia, as importancias cobradas em relação aos impostos directos, sêllo e registo, indirectos, addicional e complementar de 6 por cento e extraordinario de 5 por cento.

Para facilitar o seu estudo outros se organizaram por

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grupos de cinco exercicios, não só relativamente á totalidade dos impostos ali englobados mas tambem com relação ao imposto de rendimento, aos impostos addicionaes para serviços agricolas e tribunaes administrativos, e ao addicional e complementar de 6 por cento, com discriminação do que d’estes recaiu sobre os impostos directos e sobre os indirectos.

Dão estes mappas a conhecer as importancias cobradas em cada um dos indicados periodos, as differenças e percentagens em relação ao periodo anterior, a differença media annual dentro de cada grupo e a respectiva percentagem, que é igual á desse grupo referida ao anterior.

Seguem os mappas indicados:

Impostos directos

[Ver mapa na imagem]

Imposto de rendimento

[Ver mapa na imagem]

Impostos directos excluido o imposto de rendimento

[Ver mapa na imagem]

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Sêllo e registo

[Ver mapa na imagem]

Impostos indirectos

[Ver mapa na imagem]

Impostos addiccionaes de 6 por cento sobre os impostos directos

[Ver mapa na imagem]

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Impostos addicionaes de 6 por cento sobre os impostos indirectos

[Ver mapa na imagem]

Impostos addicionaes ás contribuições do Estado

(Para serviços agricolas e tribunaes administrativos)

[Ver mapa na imagem]

Imposto extraordinario de 5 por cento

[Ver mapa na imagem]

Do exame d’estes mappas resulta, para os impostos directos, que foi no grupo de 1394-1895 a 1898-1899 que houve a maior differenca para mais em relação aos cinco exercicios anteriores, pois elevou se a 10.267:000$000 réis; isto é, o aumento foi nesse periodo quasi igual ao que produziram na totalidade os mesmos impostos nos annos de 1854 a 1859.

Não se julgue porem que este aumento resultado desenvolvimento das contribuições de repartição e lançamento, que constituem, por assim dizer, a parte essencial dos impostos d’esta classe e que dão a medida da evolução da riqueza publica.

0 acrescimo apontado provém, na sua maxima parte, ou de receitas novas ou da ampliação e desenvolvimento

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34 DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS

de outras que não estão comprehendidas naquella categoria.

O imposto de rendimento, por exemplo, criado pela lei de 18 de junho de 1880 e ampliado pela de 26 de fevereiro de 1892, incidindo na sua quasi totalidade sobre os juros de titulos da divida publica e vencimentos de funccionarios publicos, accusa no ultimo grupo de cinco exercicios, que termina em 1903-1904, a importancia de 27.667:640$270 réis.

Se a este numero juntássemos a somma dos rendimentos por emolumentos judiciaes que, desde 1890, constituem como que uma compensação de despesas, a dos emolumentos das Secretarias de Estado, a dos consulados, a do imposto de licença para venda de tabacos, sem contar com outros de somenos importancia, obteriamos numeros valiosos que, sob o ponto de vista por que consideramos esta classe de impostos, muito viria attenuar o seu aumento.

Fazendo somente a correcção do imposto de rendimento, isto é, subtrahindo da totalidade dos impostos directos a importancia d’elle, os aumentos nestes, que eram a partir de 1889-1890 de 10.979:000$000, 10.267:000$000 e 8.252:000$000 réis, ficam reduzidos, como se vê no respectivo mappa, a 1.923:000$000, 2.905:000$000 e 4.131:000$000 réis, e as percentagens do 33,7, 35,1 e 14 a 6,3, 9 e 11,6.

D’esse mesmo mappa se vê que em relação aos impostos directos, excluindo o de rendimento, o maior aumento se deu de 1864 a 1869, pois foi de 6.640:000$000 réis em relação ao grupo anterior, e que de 1899 a 1904 o aumento foi de 4.131:000$000 réis, superior á differença que houvera para mais no producto dos cinco exercicios anteriores, pois não excedeu a 2.905:000$000 réis, ou menos de 600:000$000 réis por anno.

O sêllo e registo teve o maior acrescimo de 1874 a 1879, chegando na media 1.400:000$000 réis por anno. De 1894 a 1899 elevou-se a cobrança de 6.049:000$000 réis sobre a do grupo anterior, tendo diminuido de 1899 a 1904 a progressão que este imposto tivera no anterior periodo, porque houve somente o aumento de réis 3.990:000$000:

Os impostos indirectos tiveram o maior acrescimo de 1884 a 1889, sobre o periodo anterior em que como que estiveram estacionarios, sendo aquelle aumento de réis 24.384:000$000, a que corresponde quasi 5.000:000$000 réis por anno.

Sem entrar em mais minuciosas designações a este respeito, o que alongaria em demasia este trabalho, bastará notar que os impostos directos renderam na sua totalidade, de 1854 a 1859, 15.506:000$000 réis, e de 1899a 1904 67.064:000$000 réis. Ora sendo a media annual do primeiro d’estes periodos de 3.101:000$000 réis e a do segundo de 13.412:000$000 réis, fica para o cômputo do aumento medio annual, no periodo de 50 exercicios, a importancia de 10.311:000$000 réis ou pouco mais de 210:000$000 réis por anno.

Chega-se a este mesmo resultado se tomarmos para base o exercicio de 1854-1855, em que começa o primeiro grupo, cujo rendimento foi de 2.963:000$000 réis e o de 1903-1904, em que termina o ultimo, que produziu réis 13.552:000$000. Comparados estes numeros encontra-se a differença 10.589:000$000 réis, que divididos por 49 dá para media 216:000$000 réis por anno, importancia aproximada ao numero acima obtido.

Os impostos indirectos passaram no mesmo prazo de tempo de 31.609:000$000 réis para 125.296:000$000 réis. Calculando como acima, reconhece-se que o aumento medio annual para cada um dos 49 annos do periodo é de cerca de 400:000$000 réis.

Os addicionaes que se cobram sobre ambos os impostos não alteram sensivelmente estas proporções.

Reconhece-se facilmente que é para as contribuições directas que deve dirigir-se a attenção dos poderes publicos, visto que o aumento da riqueza nacional é manifestamente superior ao que resultaria do simples exame dos rendimentos dos impostos.

Conversão da divida externa

A importancia dos titulos convertidos, em virtude da carta de lei de 14 de maio de 1902, e decreto de 9 de agosto do mesmo anno, nas praças abaixo indicadas, até 30 de junho de 1905, consta do seguinte mappa:

[Ver mapa na imagem]

(a) Nesta importancia está concluida a dos titulos convertidos na Belgica.

Situação commercial economica

Dos mappas estatisticos, numerosos e muito minuciosos, que encontreis annexos a este relatorio, deduz-se com toda a clareza e evidencia que tem sido nos ultimos trinta e cinco annos o desenvolvimento economico do país. Comparando-se os resultados do anno de 1904 com os dos annos anteriores, conhece-se o seguinte:

Movimento maritimo

No primeiro periodo de dez annos, a começar em 1875, foi pequeno o aumento da navegação nos portos do continente e ilhas, pois que, de 6.733:588 toneladas de arqueação naquelle anno, subiu apenas a 9.092$532, diminuindo o numero de embarcações. A media da tonelagem nesse periodo foi de 7.516:125.

De 1855 a 1894 pouco variou o numero de embarcações, aumentando, porem, a tonelagem a 14.371:917, e sendo a media d’esse periodo de 11.588:406. Na media houve assim um acrescimo de 4.472:281 toneladas. É desde 1887 que se nota progressivo aumento, havendo no anno immediato mais 2.132:473 do que naquelle.

O movimento foi quasi sempre acrescentado, por forma que em 1904 os nossos portos foram demandados por 21:368 embaecações medindo 27.841:517 toneladas de arqueação, elevando-se a media neste ultimo periodo a 21.807:291

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toneladas. Desde 1875 até o ultimo anno cresceu a tonelagem das embarcações de 7.110:125 a 27.841:517, o que corresponde a 291 por cento no total ou 9,7 por cento por anno, e baixou o sen numero de 23:614 para 21:368. A tonelagem media, que em 1870 foi de 285, subiu assim em 1904 para 1:303.

Nos ultimos dez annos os navios de vela tiveram a diminuição de 1:481 no numero, e de 158:014 na arqueação, emquanto que as embarcações a vapor aumentaram durante o mesmo periodo de 2:235 no numero e de 13.240:825 na tonelagem.

É principalmente nas embarcações a vapor de longo curso e de grande cabotagem que se manifestou o progresso, pois de 8:354 subiu o numero a 11:057, havendo o aumento de tonelagem de 11.793:696 para 24.924:041, isto é, mais que duplicou.

A comparação do movimento que houve em 1904 com as medias dos quatro annos anteriores dá o seguinte resultado.

No total houve em 1904 uma differença de menos 129 embarcações entradas, mas houve o aumento de 49 nas de vapor, e a diminuição de 178 nas de vela. No longo curso e grande cabotagem, porem, houve mais 36 embarcações, tendo havido aumento de 147 nas de vapor e diminuição de 111 nas de vela.

Na pequena cabotagem houve reducção de 98 nas embarcações de vapor e do 67 nas de vela.

Examinando agora especialmente o movimento de entrada no porto de Lisboa, barra do Douro e porto de Leixões, reconhece-se que, nos ultimos dez annos, o numero de embarcações entradas no porto de Lisboa se manteve quasi estacionario, 2:978 em 1895 e 2:955 em 1904, emquanto que a tonelagem passou de 3.454:749 para 5.003:419, dando-se este aumento de arqueação, quasi na totalidade, nas embarcações a vapor.

Na barra do Douro e porto de Leixões houve acrescimo de 1:399 para 1:524 no numero, e de 769:954 para 1.306:873 na tonelagem. Igualmente foi na navegação de longo curso e grande, cabotagem que houve a quasi totalidade de acrescimo que se nota na arqueação dos navios que demandaram em 1904 aquelles dois portos do norte. E reconhece-se tambem que este se deveu á acção que vae exercendo no nosso commercio maritimo o porto de Leixões, por isso que, tendo entrado ali, em 1895, 290 embarcações a vapor com a arqueação de 351:356 toneladas, em 1904 o seu numero se elevou a 437 e a tonelagem a 805:091, isto é, o acrescimo neste movimento foi de cêrca de 130 por cento.

Para o nosso commercio maritimo com o estrangeiro contribuiu o porto de Lisboa com 1.025:713 toneladas descarregadas e 329:181 toneladas carregadas, na quasi totalidade em navios a vapor, e a barra do Douro e Leixões com 409:220 toneladas descarregadas e 208:457 toneladas carregadas, sendo este movimento, quasi na totalidade, por navios de vapor.

O commercio ultramarino é representado por 48:503 toneladas descarregadas em Lisboa e 55:804 carregadas, e no Douro e Leixões ha 539 toneladas de mercadorias descarregadas e 5:149 carregadas, sendo em Leixões respectivamente 230 e 3:802.

O movimento de pequena cabotagem fez-se em 1904 por 7:884 embarcações, medindo 2.520:852 toneladas de arqueação, com uma ligeira diminuição no numero desde 1895 e pequeno aumento na arqueação, descarregando-se 42:260 toneladas em Lisboa e 34:649 no Douro e em Leixões e carregando-se 78:840 no primeiro porto e 16:185 nos ultimos.

Este movimento effectuou-se na maior parte por navios de vela.

A estatistica das mercadorias carregadas e descarregadas fez-se pela primeira vez em relação a 1904, não tendo sido possivel formá-la nos annos anteriores, o que se deve ao aperfeiçoamento que vão tendo os nossos serviços de estatisticas aduaneiras. Conhece-se assim como é inferior o movimento effectivo nos nossos portos, em comparação da tonelagem dos navios que os demandam.

No seguinte quadro resumimos o que diz respeito aos portos de Lisboa, Porto e Leixões, comparando a tonelagem das embarcações entradas e saidas com o peso das mercadorias descarregadas e saídas:

[Ver tabela na imagem]

Commercio geral

O valor total d’este commercio, com exclusão do ouro e prata, passou de 65.922:000$000 réis em 1875 para 130.512:000$000 réis em 1904, subindo a importação de 37.561:000$000 réis para 80.966:000$000 réis; e a exportação de 28.361:000$000 réis para 49.546:000$000 réis. As medias por periodos de dez annos foram as seguintes:

[Ver tabela na imagem]

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36 DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS

Vê-se que no primeiro periodo a media foi inferior ao movimento commercial do começo d'esse periodo. Nos annos de 1878 e de 1876 foi respectivamente de réis 55.101:000$000 e de 58.912:000$000 réis, tendo sido de 65.922:000$000 réis em 1870, o que reduziu muito a media dos dez annos.

De 1885 a 1894 o movimento foi quasi superior em cada anno ao do anterior, e a media subiu de 64.213:000$000 réis, movimento do commercio geral em 1885, a 78.625:000$000 réis.. No periodo immediato succedeu o mesmo facto, e de 88.994:000$000 réis em 1895 attingiu a media de 109.111:000$000 réis, sendo o valor em 1904 de réis 130.512:000$000. Na importação nota-se que a media do valor do primeiro periodo é quasi igual ao valor do primeiro anno d'esse periodo.

Se descermos á analyse do commercio especial, vê-se que, tanto no total como na importação e exportação, o valor do movimento em 1875 o superior á media dos dez annos, dando-se a maior differença na exportação, cm que a media do valor foi de 21.665:0003000 réis, tendo sido de 24.265:000$000 réis em 1875.

E nos productos ultramarinos reexportados que se nota maior irregularidade, havendo, porem, no geral aumento consideravel nos ultimos vinte annos. Em 1880 o valor da reexportação ultramarina era de 1.578:000$000 réis. Subiu a 7.417:000$000 réis em 1894, e no anno passado foi de 11.176:000$000 réis, a maior que tem havido. Nesse commercio o notavel o progresso realizado.

Comparando o anno de 1904 com a media dos quatro anteriores, vê-se que o movimento d'aquelle anno foi bastante superior, quer se considere o commercio geral ou especial, e a reexportação, baldeação ou transito internacional.

No quadro respectivo se encontra a demonstração.

Na importação para consumo o aumento é sensivel, principalmente pelo que respeita ás substancias alimenticias, em que foi de 2.398:000$000 réis, havendo para esses generos diminuição de 1.054:000$000 réis na exportação. Na introducção de materias primas para a industria o aumento foi de 364:000$000 réis, e de 599:000$000 réis nos apparelhos, instrumentos e machinas. O aumento na importação de substancias alimenticias em 1904 proveio de que em 1902, por motivo da boa colheita de cereaes no pais, o valor da importação de trigo ficou reduzido a 417:000$000 réis, tendo sido de 4.973:000$000 réis em 1900, de 3.145:000$000 réis em 1901, e subindo logo para 3.042:000$000 réis em 1903.

A media da importação para consumo de substancias alimenticias de 1900 a 1903 foi de 13.059:0003000 réis e em 1904 elevou-se aquella importação a 15.457:0003000. réis, com o aumento de 2.398:0003000 réis, como acima já notei.

Os géneros que mais avultaram na importação do ultimo anno, pela ordem de importancia, foram: trigo réis 3.715:000$000, bacalhau 3.262:000$000 réis, assucar réis 2.571:000$000, arroz i;624:000$000 réis.

A exportação das substancias alimenticias em 1904 foi inferior á do anno anterior em 1.207:000$000 réis, recaindo uma grande parte d'essa diminuição na exportação de vinhos, que de 10.137:000$000 réis em 1903, já um pouco inferior á do anno anterior, baixou para 9.431:000$000 réis, isto é, menos 706:000$000 réis, e inferior á de todos os annos anteriores.

O peixe cm conserva teve ligeira reducção, passando de 1.692:0003000 réis para 1.537:000$000 réis, ou menos 155:000$000 réis, mas ficando ainda a exportação superior á de todos os annos anteriores.

Na totalidade a exportação d'estes géneros em 1904 foi inferior em 438:000$000 réis á importação, emquanto que em 1903 tinha excedido esta em 2.849:000$000 réis.

Deverá notar-se tambem que tem crescido o valor d'esta importação, e que pelo contrario a exportação parece conservar-se estacionaria, por isso que, sendo de 15.671:000$000 réis em 1895, foi de 15.019:000$000 réis em 1904.

Na importação influe muito, como já disse, a falta de boas colheitas no pais. Em 1 865 a importação do trigo em grão teve o valor de 1.525:000$000 réis, elevando-se quasi que successivamente, de modo que em 1904 foi de róis 3.715.000$000, _ tendo sido no anno anterior de réis 3.042:0003000. É em 1893 que só nota a maior importação, chegando a 5.405:000$000 réis, e depois em 1897, em que se elevou a 5.368:000$000 réis.

A importação do milho tem em geral menos importancia. Nos annos de 1899 e 1900 houve necessidade de recorrer em maior escala á compra d'esse cereal no estrangeiro, para abastecer especialmente os mercados do norte do reino. O valor do milho importado foi de 2.172:000$000 réis no primeiro e de 1.743:000$000 réis no segundo anno, sendo de pouco valor a importação até 1883, em que houve escassez, recebendo-se dos países estrangeiros, 1.081:000$000 réis.

Como se vê, é muito regular entre nos a colheita do milho, quasi que bastando para a alimentação publica da parte do pais em que esse cereal se consome, emquanto que o contrario se dá com o trigo, cujo consumo o sempre muito superior á producção nacional, não obstante o acréscimo que tem havido na producção d'este genero, não só pela applicação mais apropriada de adubos chimicos, mas tambem pelo aperfeiçoamento da cultura, para que muito contribuiram as medias promulgadas modermente em differentes épocas.

Considerando unicamente o periodo dos ultimos dez annos, vê-se que a importação de cereaes em grão, de farinha e de pão para consumo, foi:

[Ver tabela na imagem]

Não é de agora que a producção de cereaes no país é insufficiente para a alimentação publica. O decreto de 16 de abril de 1757 mostra que não estava em uso naquella epoca cobrar-se direito em algumas das alfandegas pela entrada de trigos, cevadas e centeios provenientes dos reinos de Castella, e, ampliando-se esse principio, mandaram-se abolir os direitos naquellas em que se praticava a cobrança, ficando desde então inteiramente livre este commercio em todas as alfandegas para os cereaes provenientes de Espanha, parecendo que se applicava mais especialmente esta providencia aos postos fiscaes da fronteira.

O assucar entrou por 2.571:000$000 réis no valor da importação para consumo no anno de 1904. É o maior valor a que tem chegado. Naquelle anno importaram-se 32:881 toneladas, produzindo de direitos 3.663:000$000 réis, e em 1865 15:933 toneladas, com o valor de réis 2.092:000$000, pagando de direitos 1.206:000$000 réis. Vê-se que aumentou consideravelmente o consumo, não crescendo na mesma proporção o seu valor. A importação da nossa Africa oriental começou em 1893 com 22 tone-

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ladas, valendo 19:000$000 réis, e foi em 1904 de 5:302 toneladas cora o valor de 513:000$000 réis.

Esta introducção de assucar nacional no consumo interno não tem diminuido a importação de assucar estrangeiro, nem reduzido a importancia dos direitos que este genero paga, devendo deduzir-se que a barateza que d'ahi resultou para o mercado promoveu maior consumo. No anno de 1904 a importação foi a maior que tem havido em Portugal, produzindo para o Thesouro quantia superior á que se cobrou em qualquer dos annos anteriores, não obstando a esse progresso a introducção de assucar das nossas colonias, que entrou por mais de 16 por cento no consumo do país no ultimo anno.

Com o bacalhau, genero de principal consumo de muitas classes sociaes, deu-se um facto contrario. Reduziu-se a quantidade, o seu valor, e a importancia dos direitos, apesar de não haver notavel progresso na pesca nacional. A importação passou de 26:116 toneladas em 1903 para 24:133 toneladas, e os direitos baixaram de 947:000$000 réis para 862:000$000 réis. Sobre a pesca nacional cobraram-se apenas 24:000$000 réis.

Em relação ao petroleo, que avulta na importação para consumo desde 1888 principalmente, dá-se a circunstancia de que desde 1899, em que começou a introducção d'este genero de proveniencia da Russia, ha differenças de anno para anno nos direitos pagos, attingindo em 1903 a cifra maxima de 967:000$000 réis, superior ao maior rendimento nos annos anteriores. Não se produziu, portanto, o abaixamento que se receava da introducção d'aquclle petroleo por motivo do tratado do commercio realizado.

Movimento do ouro e prata

Desde 1891, em que o excesso da exportação sobre a importação foi de 21.535:000$000 réis, não cessou, com unica excepção de 1898, de nos ser desfavoravel este commercio. O movimento fora-nos favoravel durante os trinta annos antecedentes, e especialmente de 1880 a 1890, com excepção somente de sete annos cm todo aquelle periodo, e a balança accusava em fins de 1890 um excesso a nosso favor de 60.891:000$000 réis, e no começo d'este anno, apesar do grande exodo de ouro desde 1891, ha ainda a nosso favor 21.919:000$000 réis, O movimento de saída vae afrouxando de anno para anno e em 1904 foi somente de 284:000.3000 réis.

Também por este lado as estatisticas aduaneiras nos dão resultados que devemos considerar satisfatorios.

Em 1865 importavamos 24.416:000$000 réis e exportavamos 16.221:000$000 réis, havendo uma differença para mais na importação de 8.195:000$000 réis. Em 1904 subiu a importação a 62.131:000$000 réis e a exportação a 41.887:000$000 réis, havendo a differença de réis 20.244:000$000 amais na importação, sendo esta a maior differença que tem havido até agora.

No movimento dos metaes preciosos vê-se tambem que, embora tenha sido nos ultimos annos contra nos a balança d'esse commercio, ha ainda no país um grande excedente da importação sobre a exportação. Foi no anno de 1892 que houve o menor desvio entre o valor das importações e o das exportações, com exclusão do ouro e prata, pois chegou apenas a 365:000$000 réis, mas no anno anterior haviamos exportado metaes preciosos em valor superior em 21.530:000$000 réis ao da importação dos mesmos generos, e esse movimento de saída continuou de forma que o excesso da exportação foi ainda de 5.585:000$000 réis. Nesses dois annos a balança geral dá no total as differenças, a favor das exportações, de 7.356:000$000 réis e de 5.220:0003000 réis, o que não prova que economicamente nos fossem favoraveis esses dois annos. Ao contrario, em 1904 houve a maior differença entre as importações e exportações, o que não obstou a que já nesse anno se manifestasse a melhoria da nossa situação, quer economica, quer financeira.

Movimento commercial com as provincias ultramarinas

Examinando cora especial attenção este commercio reconhece-se que é notavel o desenvolvimento que tem tido nos ultimos annos, porque em dezaseis quasi que triplicou de valor, passando de 6.481:000$000 réis em 1888 para 19.160:000$000 réis em 1903, tendo já sido de réis 19.194:000$000 em 1899. A importação, para consumo na metropole, de generos produzidos nas nossas colonias subiu no mesmo pcriodo de 792:000$000 réis parareis 1.718:000$000, e a reexportação, baldeação c transito reunidos subiram de 2.769:000$000 para 10.867:000$000 réis. Este progresso deu-se principalmente nos productos de S. Thomé e Principe, e em seguida nos de Angola, passando o valor dos generos d'aquella provincia reexportados de 400:000$000 para 6.219:000$000 réis, e da ultima de 2.294:000$000 para 4.628:000$000 réis.

Em relação aos differentes generos reexportados vê-se que é o cacau o que mais avulta, seguindo-se logo a borracha, e vindo em terceiro logar o cafe. A exportação durante o anno de 1904 excedeu bastante a media dos annos anteriores, como em seguida se mostra:

[Ver tabela na imagem]

A importação nas colonias de productos nacionaes ou nacionalizados passou de 907:000$00 réis em 1888 para 4.899:000$00 réis em 1903, e a reexportação, baldeação e transito internacional de productos do estrangeiro para as nossas provincias ultramarinas baixou de 2.014:000$00 para 1.677:000$00 réis no mesmo periodo.

Estes resultados são extremamente favoraveis e mostrara que se accentua dia a dia o desenvolvimento das nossas provincias ultramarinas.

Reunindo todos os elementos do nosso commercio internacional vê-se que a importação para consumo, com exclusão do ouro e prata, tem aumentado quasi, constantemente, sendo em 1904 maior que em qualquer dos annos anteriores. O mesmo se deu com a exportação nacional e nacionalizada e dos productos das provincias ultramarinas.

Rendimento das alfandegas do continente do reino e ilhas

Foi superior em 1904 ao de todos os annos anteriores. Os direitos cobrados produziram 21.699:0003000 réis nesse anno, emquanto que no anno anterior houve a arrecadação de 20.375:000$000 réis, isto é, menos 1.324:000$000 réis. Para isso contribuiram principalmente: os direitos geraes com 577:000$000 réis, os cereaes com 407:000$000 réis, e o imposto de barreiras com 212:000$000 réis.

Em 1900 o rendimento total foi de 20.055:000$000 réis, mas para isso concorreram os cereaes com 2.657:000$000 réis. Excluido este rendimento, vê-se que em 1904 a arrecadação das demais proveniencias foi superior á de 1903 em 917:000$000 réis, e á de 1900, anno de maior rendimento depois d'este, em 2.493:000$000 réis.

Situação cambial

A depressão cambial no nosso país começou a manifestar-se com muita intensidade em 1891, abaixando o cambio sobre Londres de 529/32, cotação media do mês de junho, para 433/4 em julho. No fim do anno descera de novo a 41 1/16. Manteve-se com pequenas variações entre

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42 5/16 e 40 até outubro de 1896, em que começou a accentuar-se uma nova baixa, chegando em maio de 1898 ao mínimo de 28. Foi depois melhorando esta situação de modo que em dezembro d'esse anno se obteve já 37 3/4 maximo d'esse anno. Conservou-se nos annos immediatos entre 36 e 39 1/8 maximo de julho de 1900. Teve no anno seguinte uma pequena depressão, e só no começo de 1901 é que excedeu aquella cotação, conservando-se entre 40 e 42 até dezembro de 1903.

Foi em 1904, e principalmente desde setembro, que o mercado cambial mostrou tendencia accentuada para melhoria.

Referindo-nos muito especialmente aos ultimos annos vê-se que desde julho de 1900 o cambio medio sobre Londres subiu de 38 5/8, media naquelle mês, para 51 a que já chegou neste mês. A subida nos ultimos tempos foi gradual e em geral sem graves perturbações, o que denota que a melhoria obedece a causas reaes e não a especulações ou manejos de Bolsa. De que provém esse melhoramento, e que meios devemos empregar para que se mantenha e progrida, embora lentamente e por forma que cheguemos a annullar a depreciação do nosso meio circulante, de que resultaram grandes prejuízos para o Thesouro desde 1892?

O phenomeno da depreciação dos cambios internacionaes, estudado muito detidamente por economistas de todos os países em que elle se deu, procurando conhecer-lhe as causas a tem de empregar os remedios adequados ao restabelecimento do regimen anormal da circulação monetaria, é excessivamente complicado e depende de elementos em extremo variaveis de país para país, e de circunstancias locaes que os estranhos não podem cabalmente apreciar. Por isso não deve estranhar-se que ás theorias apresentadas e aos meios propostos não correspondam sempre os resultados práticos que se esperavam. Isto provém tambem de se pretender por vezes applicar os mesmos processos a todos os países, embora as circunstancias sejam muito diversas, devendo portanto ser differentes tambem os resultados a esperar.

Nos ultimos annos tem merecido especial attenção de muitos economistas a depressão persistente dos cambios internacionaes em algumas das republicas sul-americanas, e muito particularmente nos Estados Unidos do Brasil e na Argentina, em vista dos grandes interesses ligados a esses países pelos consideraveis emprestimos realizados nas praças europeias. O que se passa em Espanha a este respeito merece quasi diariamente a attenção dos jornaes financeiros, sendo variadas as opiniões e multiplicadissimos os alvitres propostos. Succedeu o mesmo em relação ao nosso país cmquanto o cambio se manteve muito baixo; e, não se tendo empregado entre nos os remrdios com que se pretendia, com muita insistencia, combater esse mal, é licito deduzir que os expedientes propostos não eram os absolutamente indispensaveis, e que sem elles se obteve o melhoramento desejado.

Não posso alargar-me em demasia sobre este assunto, mas a lição parece-me proveitosa e por isso julgo muito conveniente occupar-me d'elle.

O excesso da circulação fiduciaria não sufficientemente garantida com ouro ou valores internacionaes, era, na opinião, de muitos, a causa, se não unica, pelo menos principal da baixa dos cambios, e propondo-se a sua restricção ou reducção suppunha-se que se obteria por esse meio, desde logo, um melhoramento apreciavel. Esse processo applicado aos Estados Unidos do Brasil deu no começo resultados muito satisfatorios, e d'ahi se concluiu que do mesmo principio ampliado a outros países proviriam necessariamente iguaes vantagens.

Para o conseguir tornava-se preciso que nos orçamentos dos Estados em que havia esse excesso de. circulação pudessem introduzir-se as verbas necessarias para tirar o papel moeda do Estado ou as notas dos bancos emissores com curso forçado, que correspondiam a emprestimos feitos aos Governos por esses estabelecimentos em epocas calamitosas. Se os orçamentos ordinarios não comportavam esse dispendio propunha-se o levantamento de novos emprestimos, embora onerosos, porque cegamente se contava que a diminuição das despesas com o premio do ouro, que os Governos e particulares obteriam da reducção dos cambios, compensaria de sobra os novos encargos.

Assim se procedeu em alguns países, e instantemente era lembrado como remedio efficaz para regularizar a nossa situação. Um emprestimo em ouro destinado a parar os debitos ao Banco de Portugal, e a aumentar a sua reserva nessa especie, foi julgado em tempo operação indispensavel.

O pagamento em ouro, de parte ou de todos os direitos pautaes, deu, segundo ainda se affirma, bom resultado em todos os países onde se empregou, e tambem se considerava esse meio indispensavel entre nós. Outras disposições mais se propunham ainda, conforme se julgava preponderar mais ou menos este ou aquelle facto no regimen desfavoravel dos cambios, o que demonstra o que acima disse, que as circunstancias especiaes a cada país o que devem determinar as providencias a adoptar para combater esse mal, ou impedir que volte quando tenha desapparecido, como succedeu entre nós, sem se terem promulgado providencias especiaes a esse respeito.

A nossa circulação fiduciaria compõe-se exclusivamente do notas de ouro e prata do Banco de Portugal, a que se deu o curso forçado em 1892. Ha portanto treze annos que estamos neste regimen excepcional. O maximo da circulação foi de 70.297:000$000 réis em novembro de 1898, sendo a reserva ouro de 4.830:000$000 réis, e em prata de 8.426:000$000 réis.

O cambio sobre Londres manteve-se, na media nesse mês, a 30 3/4, e em dezembro subiu a 36 9/16. A circulação no momento da maior depressão cambial foi de réis 36.235:000$000 réis, havendo uma reserva de réis 4.818:000$000 em ouro e 8.038:000$000 réis em prata. Pela baixa de valor que teve a prata, a moeda nessa especie deve considerar-se como a circulação fiduciaria em papel, e assim teremos que a circulação em maio era inferior de 3.674:000$000 réis á de novembro. Não foi, portanto, este o motivo absoluto da grande depressão cambial que houve em 1898.

Nenhuma alteração se deu desde aquella epoca no limite fixado para a circulação das notas, que é de réis 72.000:000$000, mas é facto que posteriormente a circulação effectiva em notas se tem mantido bastante inferior, aumentando, porem, a moeda de prata em giro, o que equivale ao acrescimo d'aquella.

Parece, pois, deduzir-se do exposto que a circulação das notas inconvertiveis do Banco de Portugal, e o aumento de moeda de prata nos usos commerciaes não teve entre nós, pelo menos ultimamente, os efFeitos perniciosos sobre os cambios que se deram noutros países, e isso deve provir somente de que a situação economica do país exige agora maior abundancia do meio circulante para as transacções commerciaes. É certo tambem que uma parte da prata lançada no mercado do continente e das ilhas adjacentes é levada para as nossas possessões ultramarinas, onde vae penetrando pelas permutas que se fazem para o interior, e para outros usos. Assim tudo concorre para que hoje não seja excessiva a nossa circulação fiduciaria, como se presumia ser, e de facto pode ter sido ha annos, quando havia menor movimento commercial, e menores necessidades a satisfazer.

Ha tambem um ponto de vista a considerar. A depreciação da nota provém igualmente da pouca garantia que tem. Consiste esta tanto na reserva do ouro como nos papeis da carteira do Banco de valores internacionaes. A esse respeito é certo que não houve aumento na reserva ouro do Banco, nem no seu activo que representa ouro ha

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modificações sensiveis. Tem comtudo diminuido o debito do Thesouro, e está hoje mais garantido do que era em 1898.

A que attribuir pois o nosso melhoramento cambial? No meu entender são causas principaes: ser mais desafogada a nossa situação financeira pelo progresso geral do país; desenvolvimento de muitas das nossas colonias, permittindo a exportação de valiosos productos; melhoria cambial do Brasil, de que resultaram remessas de cambiaes mais avultadas, representativas de valores pertencentes a nacionaes, retidos ali esperando opportunidade.

Ha igualmente no estrangeiro, hoje, o convencimento de que temos recursos proprios susceptiveis de efficaz aproveitamento, o que ha annos, nos era absolutamente negado.

Deve porem concluir-se do que digo que são inuteis quuesquer medidas, e que melhor é deixar continuar a operar-se a acção natural dos elementos de que o país dispõe? Não é esse o meu pensamento, e antes pelo contrario proporei medidas tendentes a melhorar ainda a nossa situação economica e cambial, que resumidamente consistirão em promover a restricção da circulação fiduciaria aos seus limites legaes, para se poder entrar no regimen normal de que saímos por motivos e circunstancias extraordinarias e especiaes.

Em relação ao regimen monetario entende o Governo que se deve conservar a legislação vigente, não diminuindo o toque actual das moedas de ouro e prata, e nesta principalmente por causa da grande depreciação que teve este metal nos ultimos annos; e restringindo-se a circulação da prata á que existe, aproveitando-nos da sua penetração nos sertões de África, para a absorpção da que possa haver em excesso.

Pelo que respeita á moeda de nickel, opportunamente apresentarei uma proposta tendente a melhorar os typos d’essa moeda, de acordo com o que se pratica em muitos outros países.

Uma das causas a que se attribue em algum paises, e especialmente em Itália e na Suissa, a boa situação cambial e financeira, com as correspondentes vantagens, é a visita e permanencia dos estrangeiros nesses países, de que vivem muitas, industrias, proporcionando o trabalho a milhares de operarios. Para isso é necessario facilitar por todos os meios a circulação nas vias ferreas e nas estradas ordinarias, e criar estabelecimentos com o conforto e disposições indispensaveis para que se torne agradavel a visita dos sitios mais pittorescos do país. Infelizmente faltam entre nos esses estabelecimentos, e sem elles inutil é querer attrahir os estrangeiros, confiando só no bom clima de que disfrutamos e na belleza de alguns sitios das nossas provincias. Na proposta respectiva vereis como o Governo entende se poderá conseguir este fim.

Dos tratados e convenções commerciaes, e do estreitamento das nossas relações com a Republica dos Estados Unidos do Brasil, e com as nossas colonias, resultara necessariamente facilitar-se a exportação dos productos do nosso solo, e aumentar o valor das permutas internacionaes, o que concorrerá tambem muito efficazmente para completo melhoramento da nossa situação cambial.

População

O movimento da população de um país tem relação estreita com o seu estado economico, reflectindo os grandes factos economicos e influindo nelles. O estudo das respectivas estatiscas annuaes e dos resultados dos recenseamentos ministra dados que não podem deixar de considerar-se uma apreciação das condições economicas do reino.

Tres factos determinam o movimento da população: a natalidade, a mortalidade e os deslocamentos da população, isto é, a emigração e a immigração. São conhecidos os numeros relativos aos primeiros dois factos até o anno de 1901, não sendo ainda conhecidos os dos annos seguintes, que estão sendo elaborados pela Inspecção Geral dos Serviços Sanitarios; conhecem-se os dados da emigração ato ao anno passado. Possuimos, pois, os elementos precisos para apreciar o movimento da população do país no periodo comprehendido entre os dois ultimos recenseamentos, 1890 a 1900.

O numero de casamentos, que nos annos de 1891 a 1893 foi superior a 34:000, baixou, depois, descendo em 1896 a cêrca de 33:000; e aumentou, em geral, a partir d'aquelle anno A media dos dez annos de 1890 a 1900 o de 34:761 e a proporção media por 1:000 habitantes é 6,63. Em 1901 houve 37:865 casamentos, o que dá a proporção de 6,97.

O numero de nascimentos accusado pelas estatisticas nos tres primeiros annos do mesmo periodo decennal é de 162:051, 159:205 e 164:141; em 1894 apenas se encontram registados 153:971, aumentando depois o numero a 160:971 em 1897. Não experimentou alteração sensivel em 1898; baixou a 160:569 em 1899, subindo a 165:245 em 1900 e a 170:773 em 1901. A media no decennio de 1891 a 1900 foi de 160:103 e a proporção media por 1:000 habitantes 30,56. Em 1901 aquella proporção foi de 31,47.

O numero de obitos apresenta-se irregularmente variavel, tendo sido o menor numero registado de 104:487, em 1892, e o maximo o de 119:508, em 1896. A media do decennio de 1891 a 1900 foi de 11:571 e a proporção media por 1:000 habitantes 21,29. Em 1901 houve 114:130 obitos, sendo a proporção por 1:000 habitantes 21,03.

O excesso do nascimento sobre os obitos, que em 1891 fora de 45:387, elevou-se nos dois annos seguintes a 54:718 e 53:323; baixou em 1894 e 1895 a 46:521 e 47:960 e no desfavoravel anno de 1896 a 38:038; subiu, porem, logo no immediato a 45:060 e depois foi sempre crescendo até attingir em 1901 o numero de 56:643. A media correspondente ao decennio é de 48:532. O excesso por 1:000 habitantes foi de cêrca de 9 em 1891, superior a 10 em
1892 e 1893, voltou a 9 em 1894, foi superior a 9 em 1895, baixou em 1896 ao minimo de 7,26 e subiu no anno seguinte a 8,53, 8,86, 9,77, 10,19 e 10,44, valor do anno de 1901. Nos annos de 1891 a 1900 o excesso medio por 1:000 habitantes foi de 9,3. Nesse periodo a Hollanda e a Noruega apresentam respectivamente 14,2 e 14,1, a Allemanha 13,9, a Dinamarca 12,7, a Romania 11,5, o Reino Unido 10,9, a Suecia e a Italia, 10,8 a Hungria 10,7, a Austria 10,5, a Belgica, 9,8, a Suissa 9,04, a Espanha 5,2 e a França 0,7.

A influencia d'este excesso no aumento da população acha-se, porem, reduzida pela emigração, ao passo que a immigração só compensou uma parte d'esta. Fazendo-se a emigração geralmente por mar, acha-se muito aproximadamente representada pelo numero de individuos que tiraram passaporte. Abatendo-se estes numeros dos excessos indicados, reconhece-se que o excesso liquido de emigrações, que fora apenas de 11:800 em 1891, subiu no anno immediato a 33:544; baixou, porem, em 1893 e 1894 a 22:940 e 17:528, reduzindo-se em 1895, anno em que a emigração attingiu o extraordinario numero de 44:350 pessoas, a 3:620, e em 1096 foi apenas de 10:358; subiu, porem, logo no anno seguinte a 23:716 e chegou em 1901 a 35:997. No decennio de 1891 a 1900 o excesso liquido medio foi de 21:529 e a proporção media por 1:000 habitantes de 4,11.

A emigração foi de 33:585 pessoas em 1891, desceu a 21:074 em 1892, subiu a 30:383 e 28:993 nos dois annos seguintes e attingiu, como dissemos, em 1895 o numero de 44:350 e teve em 1896 o de 27:680, que foi o maior dos annos seguintes, com excepção do anno passado. No periodo de 1897 a 1903 deu-se o minimo no anno de 1899, em que houve 17:774 emigrantes, e o maximo no de 1902, em que houve 24:170. Em 1903 emigraram 21:611 pessoas, porem já em 1904 subiu este numero a 28:298. A

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media no decennio foi de 27:002 e a proporção media por 1:000 habitantes de 5,15. Nos annos de 1901 a 1904 foi aquella proporção de 4,30.

O acrescimo da população no periodo de 1890 a 1900, accusado pela comparação dos respectivos censos, foi de 373:403 habitantes, superior em 158:109 pessoas ao acrescimo natural liquido de emigrações, calculado com os dados existentes a que nos referimos, isto é, houve um acrescimo annual medio de 15:811 pessoas, proveniente da immigração, abstrahindo de quaesquer deficiencias ou erros que haja nos outros dados.

Houve, pois, entre os dois censos um acrescimo total de 73,94 por 1:000 habitantes da população de 1890, e um acrescimo medio annual por 1:000 habitantes de 7,39.

Comparando este numero com os que apresentam os outros países da Europa que effectuaram recenseamentos, ou nas mesmas apocas que nós, ou em epocas proximas, reconhece-se que o numero de 7,4 é sensivelmente igual ao que se observa na Suecia, 7,3, e pouco superior ao da Italia, 7,1, ficando inferiores apenas a Espanha com 4,4 e a França com 1,2, alem da Irlanda, cuja população diminuiu.

A Romania apresenta uma media de 17,4, a Bosnia-Herzegovina e a Bulgaria 16,4, a Servia 15,3, a Polonia 15,1, a Grecia 15,0, a Allemanha e a Finlandia 14,0, a Hollanda 13,1, a Inglaterra e país de Galles 12,2, a Russia Europeia 12,0, a Dinamarca 11,6, a Noruega, Escocia e Suissa 11,1, a Russia 10,6 e a Austria-Hungria 9,8.

Portugal occupa nesta serie o decimo oitavo logar, havendo cinco paises que apresentam media inferior.

Nos tres periodos comprehendidos entre os nossos recenseamentos, os quaes se effectuaram em 1864, 1878, 1890 e 1900, o acrescimo medio annual da população do reino por 1:000 habitantes existentes no principio decada periodo foi respectivamente de 6,2, 8,5 e 7,4 portanto inferior no ultimo periodo ao que tinha sido no segundo.

Os dados que acabamos de citar, não sendo desanimadores, mostram comtudo que os factos do movimento da população do reino merecem toda a attenção. Que ha perturbações reconhece-se também claramente se se descer da comparação dos resultados geraes dos recenseamentos á dos numeros que representam a população dos concelhos e freguesias. São muito numerosos os concelhos em que o aumento proporcional differe consideravelmente do numero medio, para mais ou para menos, sem que taes contrastes correspondam a differenças nas condições naturaes do territorio: até em concelhos da mesma região, com terrenos das mesmas aptidões, se encontram differenças muito grandes. Devem ser, portanto, motivadas por causas especiaes, variaveis com as localidades, mas de natureza modificavel. Em presença dos grandes desvios de que falamos não se pode ficar indifferente: nas localidades onde o acrescimo é muito diminuto ha evidente mal-estar e cumpre aos poderes publicos averiguar da natureza d'essa perturbação e das suas causas, a fim de remover estas, remediando o atraso que se manifesta, quer seja devido a más condições hygienicas locaes, quer resulte de má organização economica.

Movimento nas estradas

A nossa viação ordinaria, em face da dos outros países, vae, embora lentamente, occupando posição muito lisonjeira, apesar da sua conservação custar sommas avultadas.

Passado o periodo mais agudo da nossa crise financeira, bastantes kilometros se teem construido. Basta dizer-se que do anno economico de 1893-1894 ao de 1903-1904 1 foram construidos no continente do reino 1.638,205 kilometros, que addicionados aos que já existiam dá o numero de 11.097,658 kilometros. Assim, tende a nossa rede "de estradas a aproximar-se do seu termo, pois muito mais de metade já se acha construida.

Analysando a despesa feita pelo Estado com as estradas do continente e ilhas nas gerencias de 1900-1901 a 1903-1904 temos a quantia de 4.826:484$976 réis, sendo réis 1.897:359$659 de despesa ordinaria e 2.929:125$317 réis de despesa extraordinaria.

Mais, porem, na via accelerada que na via ordinaria, se accentua o nosso desenvolvimento economico, como em seguida se demonstra.

Movimento nos caminhos de ferro

Pelos respectivos quadros estatisticos que figuram no volume II se vê o desenvolvimento das nossas linhas ferreas.

Em 15 de janeiro de 1904 foi inaugurada a linha do Setil a Vendas Novas, num percurso de 70 kilometros. Desde 28 de outubro de 1856, em que se abriu á exploração o primeiro troço de caminho de ferro entre Lisboa e Carregado, na extensão de 36 kilometros, até a inauguração da linha de Setil, 2:483 kilometros de linhas de ferro se encontram em exploração.

É importante o crescimento progressivo das receitas das linhas ferreas, sobretudo passado o periodo da maior crise (1691 a 1896), tendo subido o rendimento do trafego, liquido de impostos, de todos os caminhos de ferro de interesse geral, em exploração no continente do reino, de 6.224:687$803 réis em 1897, a 8.805:470$232 réis em 1904. No mesmo periodo de 1897 a 1904, o rendimento dos caminhos de ferro do Estado (Sul e Sueste, Minho e Douro) elevou-se de 1.856:736$461 réis a 2.493:704$924 réis.

Estes simples numeros representam com evidencia a vitalidade propria d'este povo, cujas forças actuam poderosamente para uma prosperidade duradoura.

Movimento nos correios e telegraphos

Este serviço publico toma parte importante no concerto do progressivo desenvolvimento economico do país.

O percurso kilometrico total da rede postal elevou-se de 8.070:305k 350 em 1897 a 16.856:l79k,796 em 1904.

As estações postaes, que eram já 1273 em 1897, subiram a 1432 no anno de 1904.

A correspondencia permutada no interior do país elevou-se de 51.891:823 a 67.625:523 em 1903.

A correspondencia com o estrangeiro foi em 1897: a recebida 5.608:672, e a expedida 4.812:495; em 1903, a recebida 9.332:221 e a expedida 10.988:800.

O numero de estações autorizadas para a recepção de encommendas postaes, que era de 444 em 1897, ascendeu a 582 em 1904.

Os vales postaes nacionaes foram em numero de 216:250 em 1897, e attingiram o numero de 407:108 em 1904. O seu valor foi de 3.201:026$665 réis em 1897, e subiu a 7.418:689$337 em 1904.

Os vales internacionaes emittidos em 1897 foram 768, no valor de 11:787$700, elevando-se a 19:797 em 1904, no valor de 186:539$351 réis.

Os vales ultramarinos que se emittiram no continente e ilhas em 1897 foram 102, no valor de 2.357$430, sendo de 598:115^552 a importancia dos que no reino se pagaram; e era 1904 foram 335, no valor de 6.651$337 réis, sendo a importancia dos que se pagaram de 336:257$888 réis.

A rede telegraphica, no continente e ilhas, com a extensão de 7:381 kilometros em 1897, tem se desenvolvido por modo que em 1903 attingiu o numero de 8:554. Nos mesmos annos a extensão kilometrica dos fios foi 15:257 e 19:372.

No mesmo periodo as estações acresceram no continente de 422 a 472, e os telegrammas sujeitos a taxas no continente e ilhas, de:

Transmissão .... 985:573 a 1.286:697
Recepção .... 1.145:021 a 1.466:947
Transito .... 1.448:759 a 2.606:973

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O rendimento nacional, incluindo a parte pertencente á administração portuguesa dos telegrammas internacionaes, prosperou no mesmo lapso de tempo de 306:7540702,18 réis a 530:8280715,29 réis.

Em 1897 o numero de telegrammas foi de 3.115:507, e sempre ascendendo subiu a 5.360:617 em 1903.

Propostas de lei

Banco de Portugal

Por decreto ditatorial de 22 de novembro de 1901, foi o Governo autorizado a modificar os contratos existentes com o Banco de Portugal, nas condições expressas no mesmo decreto, que se podem resumir da seguinte forma: O capital social do Banco ficaria definitivamente fixado em 13.500:000$000 réis, e a conta corrente gratuita do Thesouro seria elevada a 41.000:000$000 réis, encorporando-se nessa conta os debitos do Estado por contrato de 4 de dezembro de 1891 e de 14 de janeiro de 1893.

Autorizava-se a reducção da reserva metallica em ouro até 3.000:000$000 réis, invertendo-se o excedente em titulos de 1.ª ordem representativos de ouro, e empregando alem d'isso o Banco anuualmente 100:000$000 réis, tirados do seu activo, para reforçar o fundo de garantia da emissão fiduciaria em titulos da mesma natureza.

O Banco poderia empregar a parte que possuia, quer nas suas transacções ordinarias, quer na compra de titulos, ou representá-la por notas sempre convertiveis até a importancia de 6.000:000$000 réis. As de 500 réis, 1$000 réis e de 2$500 réis eram retiradas da circulação, sendo pagas em prata.

A participação do Governo nos lucros do Banco só começava depois de distribuido um dividendo de 8 por cento aos accionistas, e as despesas com o fabrico das notas seria rateada entre o Governo e o Banco pela maneira estabelecida no artigo 13.°

Eram estas as condições essenciaes, havendo outras de menor importancia, que é inutil enumerar aqui.

Deu-se começo de execução a este decreto, reunindo a assembleia geral do Banco de Portugal por diversas vezes, sem ter, todavia, chegado a uma resolução legal sobre a acceitação ou rejeição das bases do contrato que lhe foi proposto, levantando-se mesmo duvidas sobre qual das assembleias, ordinaria ou extraordinaria, tinha competencia para approvar o contrato.

Na sessão de 4 de janeiro de 1904, foi apresentado á Camara dos Senhores Deputados o novo projecto de contrato, que teve larga discussão, sendo afinal approvado pelas duas casas do Parlamento, e convertido na lei de 24 de novembro de 1904.

Ficou o Governo autorizado, em virtude d'essa lei, a pagar ao Banco de Portugal o saldo do empréstimo de 4 de dezembro de 1891, entregando tantas obrigações de 3 por cento do 1.° grau da Companhia Real dos Caminhos Ferro Portugueses quantas fossem necessarias para integral pagamento do referido saldo á cotação e cambio do dia, reservando-se o Governo a faculdade de readquirir essas obrigações pagando ao Banco, em ouro, a importancia correspondente, calculada pela mesma cotação por que lhe tivessem sido entregues, e ficando igualmente o Governo com o direito exclusivo de representar as mencionadas obrigações nas respectivas assembleias geraes.

Estas, obrigações eram destinadas a reforçar as reservas do Banco, e os titulos de credito realizaveis em ouro, constantes do balanço do Banco, referido a 31 de dezembro de 1902, teriam igual destino, devendo todos ser conservados nessa situação e bem assim o ouro e prata, em moeda e em barra, que figurava no mesmo balanço. Reduzir-se hia annualmente, nos primeiros cinco annos a começar em 1 de julho de 1904, a circulação fiduciaria do Banco, de 3.000:000$000 réis, podendo esta importancia ser elevada no primeiro anne até 4.500:000$000 réis, se o Governo assim o resolvesse.

Em cada cinco annos, a começar de 1 de julho de 1905, poderia o Banco vender titulos internos de 3 por cento, que caucionassem os débitos do Thesouro pelo emprestimo de 14 de janeiro de 1893 e pela conta corrente, até realizar a importancia correspondente á reducção da circulação das notas, sendo comtudo autorizado o Banco a ançar em circulação 1.200:000$000 réis em moeda de prata, para fazer face á primeira reducção de réis 3.000:000$000 na circulação das notas.

No intuito de permittir que o Governo effectuasse o pagamento em numerario das quantias necessarias para a educação da circulação das notas acima determinada, autorizava-se a criação dos titulos de divida publica, amortizaveis ou não, e de juro effectivo não excedente a 5 1/2 por cento ao anno, necessario para produzirem em 1904-1905 1.800:000$000 réis, e 3.000:000$000 réis nos tres annos immediatos.

O saldo em divida do emprestimo de 4.500:000$000 réis, realizado em 14 de dezembro de 1897, venceria juro de 5 1/2 por cento e seria amortizado em 46 prestações iguaes, tendo o Banco de Portugal a faculdade de fazer representar esse saldo por obrigações do valor nominal de 90$000 réis e de 5 e meio por cento de juro ao anno.

O Governo reservava-se o direito de pagar ao Banco em qualquer occasião a parte em divida d'esse emprestimo.

Mantinha-se, como no projecto anterior, o capital do Banco em 13.500:000$000 réis, e os juros dos titulos de redito, realizaveis em ouro, que deviam reforças as reservas do Banco, entravam no cômputo dos ganhos e perdas.

Taes são em resumo as principaes disposições com que por lei está autorizada a renovação dos contratos com o Banco de Portugal. Tendo-se, porem, modificado sensivelmente nos ultimos tempos as circunstancias do nosso mercado cambial, sem a applicação de quasi todas as providencias que eram instantemente reclamadas como indispensaveis, parece ao Governo que as relações com o Banco de Portugal devem obedecer a outra ordem de ideias e principios mais apropriados ás condições actuaes, embora se tenda ao mesmo fim de reduzir o debito do Governo ao Banco, e simultaneamente como corollario a circulação das notas, cujo alargamento foi especialmente determinado na máxima parte pelas necessidades do Thesouro Publico. A situação actual do Banco é anormal e por isso convém empregar todos os esforços para voltar ao regime regular, de que saiu por circunstancias absolutamente excepcionaes.

A inconvertibilidade das notas do Banco de Portugal data da crise de maio de 1891, sendo a consequencia da moratoria geral decretada nessa occasiito. No fim d'aquelle mês o debito da conta corrente gratuita do Governo elevava-se já a 2.827:642$620 réis; e era setembro a circulação fiduciaria attingia 26.156:000$000 réis, sendo o debito da conta corrente do Thosouro de 9.017:000$000 réis. No mês immediato já chegava a circulação das notas a 27.653:000$000 réis, e em 4 de abril de 1892 foi autorizada a circulação de notas até á importancia de réis 54.000:000$000. De 6 de maio até 31 de dezembro de 1891 houve o aumento de 14.534:345$915 réis no debito de Governo ao Banco, e em 1892 deu-se novo aumento de 10 534:345$915 réis. A circulação das notas foi:

Em 31 de dezembro de 1891 .... 34.760:637$750
Era 31 de dezembro de 1892 .... 50.217:740$250
Em 31 de dezembro de 1893 .... 52.252:695$250
Em 31 de dezembro de 1894 .... 53.131:944$750

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Por contrato de 9 de fevereiro de 1895 foi permittida a circulação de notas até 63.000:000$000 réis, e por decreto de 30 de junho de 1898 foi elevada ao maximo de 72.000:000$000 réis, sendo o debito do Governo na conta corrente gratuita igualmente elevado a 27.000:000$000 réis.

Esta situação tem-se mantido até agora, não obstante se ter pedido por vezes ao Governo, com diversos pretextos, o aumento da circulação fiduciaria.

Vê-se assim que o acrescimo da circulação de notas não convertidas em moeda, e do debito da conta gratuita do Governo, embora este fosse em menor progressão, se deram ao mesmo tempo, sendo portanto as urgencias do Thesouro Publico que principalmente determinaram o alargamento da circulação.

Alem da divida pela conta corrente gratuita, outros e valiosos emprestimos proporcionou ao Governo o Banco de Portugal. A situação d'esses diversos emprestimos em 31 de dezembro d'este anno elevar-se-ha a 22.890:614$867 réis, sendo:

Classes inactivas — contrato de 1891 .... 5.580:873$485
Classes inactivas — contrato de 1897 .... 3.585:729$364
Diversos contratos .... 224:012$018
Emprestimo de 4 de dezembro de 1891 .... 8.000:000$000
Emprestimo de 14 de janeiro de 1893 .... 5.500:000$000

Encorporando na conta corrente gratuita os dois ultimos emprestimos, cujo saldo em divida é de 13.500:000$000 réis, como se determinou nas bases do decreto dictatorial de novembro de 1901, ficara reduzido a 9.390:614$867 réis o debito do Governo, que vence juro.

Existe mais por liquidar com o Banco de Portugal, em conta do emprestimo de 3 por cento de 1880, a importancia de 18:444$081 réis, e para amortizar completamente as responsabilidades dos Bancos Lusitano e do Povo restara ainda, em 31 de dezembro d'este anno, uma sotnma igual a 388:964$921 réis. Reunindo num emprestimo unico todas estas parcelas, addicionadas do juro a liquidar do contrato de 1897 para simplificar as relações entre o Banco e o Governo, e estabelecendo-se o juro medio de 5 1/2 por cento para esse emprestimo global, com a amortização em noventa semestres, teremos o encargo annual, durante aquelle periodo, do 593:498$637 réis, sendo o capital a reembolsar de 9.851:809$809 réis.

Dos lucros liquidos do Banco são actualmente retirados 15 por cento para os fundos de reserva estatutarios, e 5 por cento para saldar as responsabilidades dos Bancos Lusitano e do Povo.

Para o fundo de reserva permanente retiram-se 5 por cento, e os 10 por cento restantes para o fundo variavel. O primeiro está já elevado a 2.393:640$462 réis, faltando portanto somente a quantia de 306:359$538 réis para ficar completo. O variavel, que deve ser de metade d'aquelle, é actualmente de 570:902$436 réis.

A parte d'estes fundos reservada para liquidação das responsabilidades dos Bancos Lusitano e do Povo foi no ultimo anno de 99:977$046 réis, faltando ainda para saldar todas aquellas responsabilidades a quantia de réis 388:964$911, como acima disse.

Nilo ha pois inconveniente era que se limite a 10 por cento a percentagem a retirar dos lucros liquidos do Banco para os fundos de reserva, como fora previsto nos estatutos, e que se appliquem os 5 por cento restantes á reducção da circulação das notas de prata até ao valor da moeda de prata em caixa, como se propõe na proposta de lei, ficando livres para distribuir aos accionistas os 5 por cento que eram destinados á extincção das responsabilidades dos Banco Lusitano e do Povo.

O fundo de reserva permanente será completado muito brevemente, e poderá então aumentar-se a reserva variavel, ou dar-se outra applicação á quantia que era destinada ao fundo permanente.

A partilha dos lucros com o Governo só começara depois da distribuição de um dividendo de 8 por cento aos accionistas, no intuito de não prejudicar os seus interesses. Esta disposição, e a que se refere ás responsabilidades dos Bancos Lusitano e do Povo, que o Governo toma a seu cargo para amortizar juntamente com os outros debitos no prazo de quarenta e cinco annos, permittem dar ao Banco uma compensação por serem englobados na conta gratuita do Thesouro os dois emprestimos de 4 de dezembro de 1891 e de 14 de janeiro de 1893.

O encargo actual do Governo para juro e amortização de emprestimos realizados com o Banco de Portugal eleva-se á quantia de 1.618:368$936 réis, sem incluir a amortização de 800:000$000 réis do emprestimo de 1903, que de commum acordo tem estado suspensa até agora, mas que o Banco poderá exigir.

O encargo annual do novo emprestimo será de réis 593:498$637, havendo portanto por esse motivo uma reducção das despesas orçamentaes em importancia superior a 1.000:000$000 réis. Se destinarmos, como se propõe, 500:000$000 para annualmente se reduzir o debito do Governo em conta gratuita, e de igual quantia a circulação das notas de ouro, ficara ainda o Thesouro alliviado da despesa de 524:870$299 réis em comparação dos encargos actuaes para com o Banco. Haverá, porem, que attender á diminuição na partilha de lucros, mas considerando que o novo contrato permittirá o emprego das quantias correspondentes aos saldos nas differentes recebedorias, que hoje são improductivos, e o alargamento de diversas operações, por emquanto muito restrictas para a importancia do Banco emissor, é de prever que muito brevemente se recuperem as anteriores participações.

Segundo as disposições dos contratos vigentes deverá o Banco receber no actual anno economico a importancia de 1.082:002$586 réis somente pelos juros dos emprestimos feitos ao Governo, sem incluir as diversas amortizações, que se elevam a 536:366$350 réis, excluindo a quantia de 800:000$000 réis, que é todavia exigivel pelo emprestimo de 1893. Os lucros totaes do Banco em 1904 elevaram-se a 2.646:676$808 réis, sendo distribuidos aos accionistas, como dividendo, 1.282:500$000 réis. A participação do Governo nos lucros foi de 327:236$374 réis. Vê se, pois, que o Estado contribue numa grande parte, somente pelos juros que paga, sem falar nas amortizações dos emprestimos, para o dividendo distribuido aos accionistas. E certo é tambem que desde que se decretou a inconvertibilidade das notas, e se alargou a circulação, o Banco não teve prejuizos pelas differentes operações realizadas com o Governo, e pelos serviços que lhe tem prestado, antes pelo contrario, os beneficios são manifestos. Isto deve-se, sem duvida, á acceitação das notas de Banco, que hoje facilmente são recebidas em todo o pais, sem que d'ahi provenha obstaculo á diminuição do premio do ouro, para o que certamente tem contribuido o bom credito do Banco.

A circulação fiduciaria não é hoje menor, nem é mais avultada a reserva em ouro nas caixas do Banco; pode até considerar-se maior o valor da circulação, sem mesmo se attender á differença dos cambios, visto ser menor a existencia da moeda de prata em reserva nas caixas do Banco, do que era em 1897 e 1898. A situação cambial melhorou consideravelmente, não obstante não ter havido, na circulação fiduciaria, a reducção que para isso se julgava indispensavel, o que demonstra que, no momento actual, o meio circulante não é excessivo para as necessidades do commercio e da industria. Procurar diminuir a circulação das notas pelo pagamento em ouro ao Banco de uma parte importante dos débitos do Estado seria actualmente um sacrificio quasi inutil que o Governo não podia aconselhar. É necessario, sem duvida, reduzir esses debitos, e

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diminuir a importancia das notas em circulação, ou aumentar-lhes a garantia em valores representativos de ouro, mais em previsão do futuro do que para attender a necessidades urgentes do presente. Isso consegue-se gradualmente pela forma que proponho, com vantagem para o Estado e sem prejuizo para o Banco.

Pela proposta de lei que submetto á vossa illustrada apreciação aumenta-se a conta corrente gratuita do Governo, destinando-se uma parte dos juros dos dois emprestimos nella encorporados para reduzir progressivamente a importancia da circulação que lhe corresponde, garantindo se á medida que for possivel com titulos de valor internacional o debito d'essa conta. A circulação das notas é fixada no maximo agora estabelecido, sendo porem distincta a das notas de ouro da restante em representação da moeda de prata em caixa, como se preceituava na base 15.ª do contrato celebrado com o Banco em 10 de dezembro de 1887. A circulação do ouro não poderá exceder o que o Governo dever na sua conta corrente, acrescido do triplo da importancia do ouro em moeda ou em barras existentes nas caixas do Banco ; e a circulação de notas de prata não excederá nunca o que resultar da applicação d'aquella disposição quando se realizar o novo contrato. Deverá esta diminuir pelas condições estabelecidas, sem nunca exceder o limite indicado. Na totalidade a circulação não passara alem de 72.000:060$000 réis, ainda que o Banco aumente a sua reserva em ouro.

O Governo poderá apressar a reducção na circulação fiduciaria, quando e como o julgar opportuno, diminuindo o seu debito na conta corrente; e a circulação das notas de prata poderá igualmente ser mais rapidamente reduzida, se o Banco comprar ouro em vez de retirar da circulação a importancia em notas igual á parte proporcional dos lucros do Banco destinada para esse fim.

Permitte-se tambem que a reserva de ouro baixe até 3.000:000$000 réis, empregando-se o excedente em titulos internacionaes, mas reduzindo-se ao mesmo tempo a circulação correspondente em notas de ouro. O Banco usara livremente d'essas faculdades como as circunstancias lh'o aconselharem.

Pela situação do Banco em 31 de dezembro de 1904 haveria uma circulação limitada em ouro a 55.012:500$364 réis, e em prata 16.987:497$654 réis. O excesso d'esta sobre a moeda da mesma especie em caixa era de réis 10.467:653$954.

O emprestimo novo, em que ficam reunidqs todos aquelles que vencerão juro, será representado por titulos de divida publica, que o Banco poderá facilmente collocar, não carecendo por isso de outras garantias em titulos do Estado alem das que são fixadas nas bases do projecto de contrato.

Taes são em resumo as bases essenciaes da proposta de lei tendente a modificar os convenios vigentes com o Banco de Portugal, na parte respeitante á circulação fiduciaria e aos debitos do Estado ao Banco. Pareceu-me porem opportuno acrescentar algumas disposições relativas aos novos serviços que o Banco poderá prestar, encarregando se da cobrança dos rendimentos do Thesouro e do pagamento das despesas publicas. Completar-se-ha assim a organização do Banco emissor autorizada pela lei de 29 de julho de 1887, preenchendo mais cabalmente as suas funcções de caixa do Thesouro Publico.

O serviço das recebedorias dos bairros de Lisboa e Porto e concelhos capitães dos districtos administrativos poderá passar em curto prazo para o Banco, e num periodo não muito longo o das demais recebedorias do reino. Modificando-se a organização actual d'essas repartições haverá, pela simplificação na escrituração, mais rapida fiscalização por parte dos agentes do Thesouro, e cessarão os alcances, cujas responsabilidades nem sempre se podem apurar, do que teem resultado consideraveis prejuizos para a Fazenda Publica. Por todos estes motivos ganhará muito o serviço das repartições superiores do Thesouro e melhorara a arrecadação das receitas publicas.

Direitos de consumo e circumvallação em Lisboa

Por decreto de 21 de novembro de 1903 foi ampliada, a começar em l do mês seguinte, até a nova estrada de circunvallação, a area fiscal para a applicação da pauta do consumo de Lisboa aos generos comprehendidos na mesma pauta, de acordo com a autorização concedida ao Governo dos decretos de 22 de julho de 1886. Logo depois da posta em vigor a nova linha de barreiras, reclamaram muitas das povoações que nella vieram a ser incluidas, e numerosas representações foram apresentadas ao Governo e ao Parlamento sobre essa providencia. Para conhecer da justiça das reclamações apresentadas foi nomeada por portaria de 15 de janeiro de 1905 uma commissão composta de pessoas competentissimas, para formular um relatorio que auxiliasse o Governo na resolução d'esta importante questão, conforme fosse mais justo e equitativo.

A commissão não pôde chegar a acordo sobre a resolução que mais convinha adoptar, e d'ahi resultou serem apresentados dois pareceres, sem nenhum d'ellcs obter o assentimento, não digo já unanime, mas pelo menos da maioria dos membros da commissão. As duas opiniões apresentadas são inconciliaveis, por isso que num dos pareceres se propõe uma nova linha fiscal subordinada, na sua maior extensão, á via ferrea de cintura, e no outro se entende conveniente aos interesses do Thesouro a conservação do statu quo, principalmente pelo aumento de receitas que tem provindo da nova linha fiscal.

Os dois relatorios vão juntos á proposta que apresentamos, e por isso torna-se inutil reproduzir aqui as considerações em que ambos se baseiam para opiniões tão op-postas.

O Governo entendeu, porem, dever encarar esta grave questão sob um aspecto mais geral, examinando os effeitos que os direitos fiscaes da pauta actual de consumo podem exercer sobre o viver de muitas familias novamente abrangidas em tão extensa area, porque a saude e a hygiene das grandes povoações interessa tanto ao desenvolvimento da riqueza publica, como as condições em que vive a população rural. E por mais forte razão quando esse facto se dá na propria capital do reino.

Aos direitos, por vezes elevados, que se cobram pelo consumo dos generos mais necessarios á existencia dentro dos limites das povoações agglomeradas, deve corresponder maior facilidade da vida pelos commodos e vantagens que a troco d'esses impostos obteem os seus habitantes. Vias de communicação mais aperfeiçoadas e bem conservadas, boa illuminação de todas as ruas e praças, abundancia de agua para os usos domesticos, rega e lavagem das ruas, postos de soccorro para incendios, e postos medicos para acudir a desastres ou doenças repentinas, jardins e parques bem arborizados e delineados de modo que nos differentes bairros os habitantes possam disfrutar de bom ar e de recreio modesto, taes são os serviços a que deve corresponder o aggravamento de taxas de consumo sobre os géneros de primeira necessidade nas cidades ou grandes povoações sujeitas a esse regimen especial.

Dão-se porventura todas ou muitas d'essas circustancias em toda a area limitada pela nova linha de Barreiras de Lisboa? Pode o Estado ou a Camara Municipal de Lisboa abrir novas ruas, ou alargar as existentes e acanhadas azinhagas, levando a illuminação, a boa agua, e os embellezamentos a todas as povoações novamente annexadas a Lisboa, ou foi unicamente para o pagamento do imposto de consumo que isso se fez? Permittirão, tanto os recursos do Estado, como os do Municipio, transformar rapidamente tão vasta zona por forma que as condições de vida sejam em toda a parte iguaes ás que desfrutam

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os que habitam nas melhores e mais frequentadas ruas da cidade, acrescendo este trabalho ao que ainda o preciso, em alguns bairros da capital, para commodidade dos seus moradores, sujeitos todavia ha muitos annos ao pesado imposto de consumo como os demais? Se mesmo no antigo recinto ha deficiencia de muitas cousas necessarias para a belleza da cidade, o conforto e facilidade da vida, será porventura prudente aumentar os encargos futuros da municipalidade, e ao mesmo tempo obrigar desde já todos os habitantes da nova e grandissima zona annexada, antes de possuirem esses melhoramentos, commodidades e beneficios, e sem esperança de os alcançarem num prazo mesmo largo, ao pagamento de taxas sobre o consumo iguaes ás que pagam os moradores do centro da capital, que já se encontram em condições mais favoraveis?

É certo que o alargamento das barreiras, não obstante o acrescimo das despesas de fiscalização, produziu aumento na cobrança do imposto do consumo; nem outra cousa era de esparar. Mas tambem é evidente que o Estado não pode, com justiça, apropriar-se de todo esse aumento de receitas, e que deverá partilhá-lo com a camara municipal, elevando a sua dotação, para que se possam realizar as obras e melhoramentos indispensaveis; a fim de que progressivamente se vão igualando, em gozos e regalias, os habitantes d'aquella zona aos demais da cidade, a não ser que o Estado tome sobre si o encargo d'esses trabalhos. E a esta circunstancia se deve attender, visto que a camara municipal teve diminuição no producto das taxas que cobrava sobre o real de agua.

Quem percorre todo o territorio novamente annexado, formado em grandissima parte de campos de culturas pouco remuneradoras, sendo as construcções em muitos pontos de mediocre valor, sem estradas e vias de communicação sufficientes, e as que existem estreitas, acanhadas, mal delineadas e em mau estado de conservação, reconhece desde logo que será enorme a despesa a fazer com a abertura de boas ruas e avenidas, e mais, talvez, a inutilidade de uma grande parte d'essa despesa, attendendo á falta, em muitos sitios, de população que realmente careça para já d'esses melhoramentos. E não obstante o aggravamento do imposto do consumo foi immediato, parecendo que se teve principalmente em vista o crescimento das receitas, não se pensando em melhorar ao mesmo tempo as condições dos bairros suburbanos annexados a Lisboa.

No quadro annexo a este relatorio encontra-se o aumento que houve na tributação, comparando os direitos da pauta de consumo de Lisboa com os do real de agua, e taxas para o municipio que se cobravam na area fora das antigas barreiras. Muitos generos são agora tributados, não o sendo antes, e para outros o acrescimo do imposto foi consideravel. Citarei apenas o que se dá em relação ás carnes. Na de gado bovino, abatido fora das barreiras, pagava-se por kilogramma 46,35 réis, e agora o imposto é de 73,78 réis, do que resultou um acréscimo de 27,43 réis por kilogramma.

A primeira vista parecerá que era muito elevada a taxa imposta pelo Municipio sobre as carnes na zona annexada, mas attendendo ao modo como era effectuada a cobrança, geralmente por avença, o que não succede agora, é facil de reconhecer que na realidade a taxa que se pagava era muito inferior á maxima legal.

Ninguem por certo deixara de reconhecer que as populações situadas fora das antigas barreiras soffreram um aggravamento consideravel nas suas despesas diarias de alimentação, visto que os generos de primeira necessidade, como a carne, o vinho, o azeite, e outros mais, passaram a ser mais fortemente tributados do que eram anteriormente. Foram tambem muitos generos tributados, não o sendo antes, como os ovos, as frutas, a manteiga, queijos, carvão, etc. E para os que vivem do seu quotidiano trabalho — em grande parte na area annexada — a existencia tornou-se precaria e quasi insupportavel, porque os salarios não seguem sempre a progressão das despesas necessarias á vida, quando ha aggravamento de taxas tributarias.

Os impostos de consumo exagerados são um obstaculo ao bem estar e ao desenvolvimento moral e economico das classes menos favorecidas da fortuna, porque em vez de recaírem sobre a fortuna adquirida, ou sobre beneficios realizados, incidem no que é mais indispensavel á existencia, levando os que teem pequenos recursos a apoucar a sua alimentação, e a usar, por serem mais baratos, de generos de inferior qualidade, menos sadios e menos nutritivos. O operario paga esses impostos com uma importante parte do seu, ás vezes, pequeno, salario, não lhe restando o bastante para um viver tranquillo e modesto com familia, e nada para se precaver contra os maus effeitos de enfermidades e preparar um descanso, todavia bem merecido pelo seu constante labutar, para os ultimos annos da existencia.

Dadas estas circunstancias, em subido grau, numa parte da população da nova zona fiscal, parece de primeira intuição que é dever do Governo propor-vos uma solução que reduza a area actual sujeita ao imposto do consumo de Lisboa, embora para isso seja necessario recorrer a despesas novas, que serão compensadas com uma diminuição importante dos gastos de fiscalização.

Assim o entendeu o meu illustre antecessor, mandando por despacho de 1 de janeiro de 1904 elaborar o estudo de uma nova estrada de circunvallação que reduzisse consideravelmente a area abrangida pela linha actual de barreiras. Reconheciam-se por este modo os inconvenientes do excessivo alargamento dado á area fiscal de Liiboa, e procurava-se louvavelmente o meio de os remediar. O traçado da nova linha foi marcado na planta que acompanhou o citado despacho, como indicação geral a seguir para a directriz da nova estrada de circunvallação, podendo ser alterado conforme o aconselhasse a disposição do terreno. No projecto que foi apresentado ao meu illustre antecessor aproveitou-se a estrada existente desde Algés até um ponto ao norte do quartel do posto fiscal da Pontinha, indo d'ahi em leito novo em direcção á estrada do Paço do Lumiar, que atravessava nas proximidades da Quinta da Horta Nova. Seguia depois até a estrada de Carriche ao Campo Grande cortando-a, e continuava em direcção á de Lisboa a Sacavem, entrando na antiga circunvallação nas proximidades da Cruz da Pedra. Para o aquartelamento da guarda fiscal deviam construir-se nove quartéis, situados na Quinta da Horta Nova, Telheiros, Campo Grande, Quinta da Trindade, estrada da Portela, quintas da Bella Vista e do Amador, Chellas e Quinta de João Baptista, proximo da antiga circunvallação; para o despacho dos generos sujeitos aos direitos de consumo seriam construidos quatro edificios na Horta Nova, Campo Grande, Portela e Chellas.

A despesa total foi orçada em .... 255:120$000
sendo para a estrada e respectiva vedação .... 134:120$000
e para novas edificações .... 121:000$000

Não se incluiram neste orçamento as despesas a fazer com a apropriação do quartel e delegação da Cruz da Pedra, mudança da linha telephonica, installação da illuminação a luz electrica, e outras despesas menos importantes.

O comprimento da nova estrada a construir seria de 10:976m,628, e o seu custo de 12:218$274 réis por kilometro.

O Governo actual entendeu que se devia restringir a area comprehendida dentro das barreiras ainda mais do que se fazia no projecto mandado estudar por despacho de 1 de julho de 1904, a que me tenho referido; e nesse

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intuito ordenou novos estudos, tomando-se por base quanto possivel a linha ferrea de cintura, que de per si já offerece um serio obstáculo ao transito fora dos locaes em que é atravessada pelas estradas ordinarias. O que se pretende de facto é limitar a entrada dos generos, sujeitos a direitos de consumo, unicamente aos locaes convenientemente dispostos para esse serviço, interceptando a passagem por quaesquer outros pontos, por meio de sentinelas e guardas, ou por obras estabelecidas para aquelle fim. Não se torna, pois, indispensavel construir uma larga estrada de circunvallação, com os seus custosos accessorios, bastando que obstaculos naturaes ou criados artificialmente conduzam ao mesmo fira, que consiste em conseguir-se que a introducção para dentro da cidade de quaesquer generos, pessoas ou mercadorias se faça forçosamente por pontos de antemão estabelecidos, para ahi serem pagos os direitos que forem devidos. É só isso o que se pretende.

Pela nova linha de barreiras proposta reduz-se muito a area em que são applicaveis os impostos de consumo; e não hesitou o Governo em o fazer, embora fiquem da parte externa d'essa linha algumas localidades, como o Campo Grande, em que parece se poderiam cobrar sem graves inconvenientes, aquelles impostos. É sempre util conservar fora dos recintos das grandes cidades, onde são elevados os encargos para habitação e alimentos que resultam dos direitos elevados de consumo, alguns sitios, bem dispostos e saudaveis, em que se possam construir casas em boas condições de preço e de accomodação, que permittam a residencia ahi de familias numerosas, dispondo de medianos recursos. O Campo Grande acha-se nestas circunstancias, e por isso é conveniente e util ao interesse geral que para aquelle fim fique tambem fora das barreiras.

Antes, porem, de proseguir na indicação da nova linha fiscal, convém examinar os direitos que se cobram pela pauta de consumo em Lisboa, comparando-os com os impostos identicos que se pagam nos outros concelhos do pais, tanto pelo que respeita ao real de agua como em relação ás taxas e impostos municipaes. Nos quadros annexos a este relatorio ha elementos bastantes para se apreciar a differença que existe entre o que se paga actualmente pelo consumo dentro da linha da circunvallação de Lisboa e no resto do país. Tomando como exemplo a carne de gado bovino vê-se o seguinte:

A importancia maxima que se paga sobre esse genero fora de Lisboa é de 41,35 réis por kilogramma, mas isto dá-se unicamente no concelho da Covilhã, sendo 11,35 réis para o Estado e 30 réis para a camara municipal. Nos demais concelhos do país a taxa total é pouco superior em media a 20 réis por kilogramma, de modo que em Lisboa paga-se sobre as carnes mais do triplo d'aquelle imposto, como é facil de ver. O direito sobre as reses vivas abatidas no matadouro publico é de 28,66 réis por kilogramma, que corresponde era carne limpa, suppondo um aproveitamento na media de 53 por cento, a 54,07 por kilogramma; cobram-se mais, para differentes gastos e serviços da camara municipal, 9,81 réis. O total é pois de 63,88 réis por kilogramma, sem contar outras despesas meudas. A carne de reses bovinas abatidas fora da cidade é tributada em Lisboa com 73,78 réis por kilogramma, sem incluir outras pequenas despesas. D'este modo parece haver vantagem em fazer vir para Lisboa as reses vivas, porque se pode ainda obter alguma economia elevando o aproveitamento em carne limpa a mais de 53 por cento do peso vivo, dando-se já a circunstancia, de que no gado de raça arouquesa se retiram 70 por cento, o que dá muito maior lucro.

Nas outras carnes, e em outros generos, a differença é consideravel, tributando se alem d'isso diversos objectos que nada pagam pelo imposto do real de agua no resto do país. O direito sobre o vinho é, incluindo os addicionaes, de 7,9 réis por litro, qualquer que seja a qualidade, e em Lisboa de 35,61 réis por kilogramma até 12 graus, e mais 4 réis por grau até 23 graus. D'ahi para cima a taxa é de 400 réis por litro. Ao azeite compete pelo real do agua o direito de 11,30 réis por litro, e pela pauta de Lisboa paga 05,04 réis por kilogramma. Nas bebidas alcoolicas as differenças são muito maiores. As frutas, batatas, ovos, manteiga, queijo, carvão vegetal e de coke, etc., nada pagam como imposto de real de agua, e estão sujeitos a fortes taxas pela pauta de consumo de Lisboa.

O imposto de consumo na zona interior era, em 1898, de 7$583 réis por habitante e por anno; e na zona exterior pelo real de agua, era, igualmente por habitante, somente de 694 réis.

Isto justifica e explica as reclamações apresentadas ás Camaras e ao Governo sobre o alargamento das barreiras de Lisboa, e mostra tambem a necessidade de se attender ás circunstancias em que ficara a cidade de Lisboa se for conservada a pauta actual de consumo. Referindo-nos mais especialmente ás carnes, viu-se já que o habitante da capital paga de imposto sobre esse genero mais do triplo de que em media se paga nos outros concelhos do reino. D'ahi deve provir necessariamente maior custo em Lisboa do objecto mais indispensavel para a alimentação, principalmente das classes trabalhadoras, a fim de evitar o depanperamento e a inutilização de muitas existencias roubadas em precoces idades ao desenvolvimento da população, e ao progresso social e economico do país.

Sobre este ponto de vista devemos porem desde já fazer sentir que não o só do gravame do imposto do consumo que provém o elevado preço da carne bovina em Lisboa: outras causas influem nesse preço, que muito convirá remover, ao mesmo tempo que se realizar o abaixamento dos direitos de consumo que o Governo propõe. A demonstração do que digo o facil.

Segundo a tabella de 21 de janeiro de 1903, publicada por edital de 21 de abril do mesmo anno, ha em Lisboa quatro categorias de carne, variando para a primeira os preços por kilogramma de 800 a 420 réis; para a segunda, terceira e quarta são uniformes os preços, e respectivamente de 380, 320 e 260 réis. No resto do país o preço medio oscilla entre 180 e 260 réis, de carne de muito melhor qualidade do que a maior parte da que se vende em Lisboa como de primeira categoria, segundo as informações colhidas. Na Covilhã, onde pelas taxas cobradas para o Estado e para o municipio o imposto se eleva a 41,35 réis por kilogramma, como acima disse, o preço da carne á venda o de 225 réis por kilogramma.

Suppondo que o publico deva supportar na capital a differença nos direitos de consumo d’esse genero, e sendo aqui o imposto, nas reses vivas, de 63,88 réis, e a media das taxas de consumo no resto do país igual, ou antes inferior, a 22 réis, o preço da carne em Lisboa não deveria na media custar mais de 42 réis por kilogramma do que fora da capital, no caso de que a sua qualidade fosse igual, e não peor como quasi sempre succede. Resultaria assim o preço medio aproximado de 260 réis, que é o da ultima categoria em Lisboa. Para se obter boa carne precisa-se pois, em Lisboa, pagá-la muito mais cara do que em qualquer outro ponto do país, tendo-se mesmo em vista o aumento do imposto, e outras despesas proprias das circunstancias em que se acha a capital.

Não bastará, portanto, reduzir o imposto de consumo para que o commercio das carnes em Lisboa entre em condições normaes, e conformes aos preços d'esse genero nos mercados reguladores. Mais ha que fazer ainda, como consequencia da diminuição dos direitos de consumo em Lisboa, que o Governo propõe a começar da publicação da respectiva lei. Isso não deve, porem, obstar a que se adopte desde já essa benefica medida, que ha muito tempo

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é instantemente pedida aos poderes publicos, e é hoje mais do que nunca aconselhada pelas condições em que vivern muitas classes da sociedade em Lisboa. Comparando o que só paga por imposto de consumo na capital com o que, por igual tributação, se cobra nas provincias, é tal e tão consideravel, como se viu, a differença, que o Governo entendeu não adiar por mais tempo a reducção proposta por não ser justo que continue um tão consideravel aggravamento de impostos que especialmente pesa sobre os habitantes da primeira cidade do reino.

Do excessivo preço e má qualidade das carnes em Lisboa resulta que o seu consumo pouco excede a 37 kilogrammas por habitante e por anno, emquanto que esse consumo é de 63 em Berlim, de 68 em Vienna de Austria, de 84 em Paris, de 86 em New-York e de 107 em Londres. Vê-se bem a inferioridade da nossa capital em relação a todas essas cidades. Da diminuição do imposto e da melhoria da qualidade provirá, por certo, grande aumento no consumo, de que advirão innumeras vantagens, e será menor desde logo o prejuizo para o Thesouro, devendo contar-se com aumento progressivo no consumo.

Lisboa pagava em 1898 a media por habitante de réis 7$583: na cidade do Porto o real de agua e imposto especial de consumo correspondiam, igualmente por anno e por habitante, a 2$775 réis. Estas medias baixaram em 1904 para 6$729 réis em Lisboa, e 2$055 réis, por motivo da annexação das novas areas.

A media em todo o resto do país para o imposto do real de agua foi de 180 réis por habitante em 1904.

O imposto sobre as carnes foi em 1904 em Lisboa de l$844 réis em media por habitante, o que mostra que esse género entra por pequena parte na alimentação da capital.

Parece-nos que sobejamente se justifica, por tudo que dissemos, a reducção proposta na pauta geral de consumo, a qual abrange toda a 1.ª classe relativa ás carnes, e é proximamente de 40 por cento sobre as taxas da pauta actual.

Nos liquides conviria talvez diminuir os direitos sobre o alcool e a aguardente, no intuito de combater a fraude impossivel de completamente se evitar com direitos excessivos. Em compensação haveria licenças especiaes para a venda do alcool, aguardente e seus derivados, qualquer que fosse a forma por que se effectuasse essa venda, e a categoria dos locaes em que de facto se realizasse pelo consumo ahi permittido.

Carecendo porem esse assunto de um inquerito muito minucioso, conserva-se na nova pauta o que está em vigor.

Para os vinhos mantém-se o que ultimamente foi determinado, por ser mais vantajoso do que o que dispunha a pauta anterior. Na 3.ª classe isentam-se os ovos, alimento hoje muito recommendado para a alimentação, e as batatas por serem de uso geral e indispensavel em certas classes. Os ovos produzidos dentro das barreiras nada pagam actualmente.

Na zona que deixa de ser abrangida na nova linha fiscal cobrar-se-hão os direitos do real de agua para o Estado e as taxas municipaes correspondentes, sem que a totalidade possa ser superior á importancia dos direitos fixados na pauta de consumo.

Por ultimo vou occupar-me mais especialmente da nova linha fiscal que o Governo propõe em substituição da que foi estabelecida pelo decreto de 21 de novembro de 1903. Como disse, o meu illustre antecessor julgava inconveniente a conservação d'aquella linha, e para esse fim mandou formular o projecto de que dei conhecimento. Examinando detidamente esse projecto, e o terreno que medeia entre elle e as antigas barreiras, facil foi conhecer que

essa solução intermedia era cara e não satisfaria tanto como é para desejar os interesses dos povos suburbanos. Já que o hoje impossivel reconstituir as antigas barreiras, porque a cidade com novos bairros as ultrapassou em varias partes, pode effectivamente tomar-se a linha ferrea de cintura, como propuseram alguns membros da commissão nomeada em 15 de janeiro de 1905, para a base das novas barreiras; e foi essa solução que aproximadamente se adoptou, por parecer a mais conveniente.

De facto o caminho de ferro com as suas altas trincheiras e aterros offerece já, na maior parte do percurso, uma verdadeira barreira ao transito, e nelle estão perfeitamente definidos e guardados os pontos onde a linha ferrea pode ser atravessada. Entre esses pontos bastará completar com pequenas obras os obstaculos que existem ao livre transito, e estabelecer postos de vigilancia ligados por um simples caminho ao longo da via ferrea, vedado era absoluto ao transito publico, por ser destinado unicamente ao serviço da fiscalização.

Em vez de se construir uma nova estrada, ou aproveitar-se o antigo caminho fiscal que da Ponte Nova seguia pela Cruz da Oliveira ale a estrada de Alges, como indica a commissão, parece-me melhor utilizar o caminho de ferro, para o lado de Cintra, até as proximidades da estrada de circunvallação, para se utilizar o melhor quartel da guarda fiscal que existe em todo o percurso das barreiras actuaes, e ser mais economica esta solução.

Partindo d'aquelle ponto segue a nova linha junto á via ferrea de Cintra, que deixa fora da zona fiscal, até encontrar a linha de cintura, a qual acompanha até a passagem de nivel da quinta das Olaias em Chellas. D'esse ponto continua por terrenos particulares, ou caminhos de pequena importancia, até a antiga estrada da circunvallação, que se aproveita até as antigas portas da Cruz da Pedra.

O comprimento d'esta nova linha fiscal será de 10:820 metros, e o seu custo, comprehendendo todas as despesas, não excederá a quantia de 173:420$000 réis.

Deduzindo d'esta somma algumas verbas, como mudança da linha telephonica, illuminação electrica, etc., que não foram incluidas no orçamento dá variante mandada estudar por despacho de 1 de julho de 1904, do meu illustre antecessor, o qual, como já disse, se eleva a réis 255:120$000, sem comprehender todas as despesas necessarias, encontra-se a differença. para menos, no traçado que proponho, de 118:650$000 réis.

Deverão construir-se quartéis para os postos fiscaes em Bemfica, S. Domingos, Cruz da Pedra, Sete Rios, Rego. Entre-Campos, Areeiro, Chellas, e Alto de S. João. Todos estes edificios foram orçados em 106:955$000 réis.

A linha, fiscal, propriamente dita, custará apenas a quantia de 28:715$000 réis, emquanto que na primeira variante, estudada por motivo do despacho de 1 de julho de 1904, a construcção da estrada projectada foi orçada em 134:120$000 réis, e dos edificios em 121:000$000 réis. Pelo que respeita ás despesas de fiscalização haverá a economia de 55:677$000 réis, que resulta do seguinte:

Vencimento do pessoal a diminuir á guarda

[Ver tabela na imagem]

A despesa animal com o pessoal da guarda fiscal em serviço na actual linha da circunvallação é de 160:402$200 réis. A illuminação a luz electrica custa 12:565$000 réis por anno, havendo 500 lampadas a 20$000 réis, o 135 a 193000 réis.

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Antes do estabelecimento d'essa linha despendia-se com o serviço da guarda fiscal a quantia de 71:649$100 réis.

Vê-se, pois, que da nova linha que proponho se obterá uma economia importante nas despesas de fiscalização, que maior poderá ser ainda se na construcção das obras de attender a que a interposição do caminho de ferro alem das barreiras permittirá mais facil vigilancia aos guardas. Devo comtudo notar que acrescerá a despesa com o pessoal de fiscalização do real de agua na zona que deixar de pertencer á area fiscal de Lisboa; mas a cobrança d'este imposto compensará de sobejo essa despesa.

Nos termos propostos entende o Governo que se dá satisfação condigna aos interesses dos habitantes da zona que ficará dentro da linha da barreira, pela reducção importante do imposto de consumo nos generos de primeira necessidade; e aos povos agora abrangidos na linha de circunvallação libertando os dos encargos pesadissimos a que estão sujeitos. Limitada a area da cidade em que se cobrará o imposto de consumo, mais facil será completar ahi os melhoramentos indispensaveis para que a capital do reino possa ser equiparada a muitas outras que se lhe avantajam hoje nas commodidades e conforto que offerecem aos estrangeiros. Com isto ganhará tambem o país, pelo aumento geral do consumo, e o desenvolvimento de muitas industrias, que prosperam nos grandes centros visitados por muitos nacionaes e estranhos.

Nos arredores de Lisboa, que ficarem isentos do imposto de consumo, poderão utilizar-se as condições locaes, de posição e de salubridade para edificações mais baratas do que na cidade, com boas apropriações para as classes medias, e ainda para os operarios que se empreguem nos trabalhos da capital. Promover-se-ha tambem o desenvolvimento industrial nos arredores de Lisboa, sem os estorvos e embaraços que resultam sempre da acção fiscal.

Por todos estes motivos julgo que a proposta que apresentamos merecerá a vossa approvação.

Conversão da divida interna

Diversas foram as propostas apresentadas ao Parlamento depois da lei de 26 de fevereiro de 1892, que aumentou até 30 por cento o imposto de rendimento sobre os titulos de divida publica interna, com o fim de converter essa divida por forma a diminuir a differença entre o valor nominal e a sua cotação nas nossas bolsas.

Pela proposta de 16 de março de 1896 as inscrições de 3 por cento e as obrigações de 4 e 4 1/2 por cento eram convertidas em obrigações do valor nominal de 90$000 réis do juro de 4 por cento e amortizaveis em setenta e cinco annos. Fazia se a conversão ao par, feita a deducção nos titulos actuaes da parte do capital nominal correspondente aos 30 por cento do imposto de rendimento, desdobrando-se as compensações estabelecidas por lei para os estabelecimentos pios e passaes dos parochos. As mesmas condições se propunham para a divida externa, sem que os respectivos titulos perdessem o seu caracter especial, havendo assim immediata e absoluta equiparação de todos os credores do Estado.

D'esta proposta resultaria a diminuição de réis 212.243:706$805 nominal de divida publica em circulação, segundo o orçamento de 1896-1897, pertencente á divida interna 117.124:168$483 réis. Em relação aos encargos annuaes do Thcsouro haveria o aumento de réis 288:043$001 para a divida interna, e de 1.505:726,5410 rois para a divida externa. O aggravamento da despesa orçamental elevar-se-hia pois a 1.793:769$911 réis, sem contar, a differença do cambios.

Como se vê, esta proposta de conversão abrangia a divida interna e externa, e por isso convém tomar nota, apenas, do que diz respeito áquella, visto estar regulado por convénio especial o serviço da divida externa.

A proposta de 17 de fevereiro de 1903 refere-se unicamente á divida interna. Suppunha-se indispensavel não diminuir o rendimento effectivamente cobrado pelos portadores dos titulos, nem os prejudicar no capital realizado; e não acrescerem sensivelmente os encargos para o thesouro. Foi escolhida a taxa de juro de 4 1/2 por cento, reduzindo-se o capital de 28/43 para e 3 por cento, de 28/75 para o 4 por cento, e de 7/10 para o 4 1/2 por cento.

A reducção na totalidade seria de 52,23 por cento de capital primitivo, que assim ficaria diminuido de 492 334,6 contos de réis. Os titulos de 4 por cento com premios ficavam excluidos da conversão.

A amortização dos novos titulos seria em 99 annos, e para manter a amortização ao par a que teem direito os titulos actuaes de 4 e 4 % por cento, e como em relação aos titulos de 3 por cento havia um beneficio de cêrca de 6$660 réis na amortização por titulo, compensação equivalente se faria em relação ao 4 e 4 1/2 por cento.
Ficaria assim elevado o novo capital a 244.285,5 contos de réis, ou seja 49,62 por cento do capital em circulação naquella epoca.

O encargo a mais na divida interna seria de 94:540$000 réis. As instituições mencionadas no artigo 7.º da lei de 26 de fevereiro de 1892 receberiam um numero sufficiente dos novos titulos para completar o rendimento que lhes foi garantido pela mesma lei.

Na proposta para a conversão da divida interna que apresento, adoptou-se o principio de sujeitar esses titulos ao mesmo imposto de rendimento que recae sobre todos os demais papeis de credito, elevado por áquella lei a 10 por cento, mas por forma que os actuaes portadores não sejam prejudicados no juro que effectivamente recebem.
Ha mesmo alguma differença contra o Thesouro, a qual será sobejamente compensada pelas vantagens inherentes á reducção do nominal da divida em circulação, ficando subsistindo dois typos de juro para a nossa divida interna, com a excepção dos emprestimos de 3 e 4 por cento com premios de 1888 e 1905, e bem assim as duas series de 4 1/2 por cento, cujo producto o destinado á construcção de caminhos de ferro, e teem por isso dotação especial.

Ás corporações e instituições que se acharem nas condições expressas do artigo 7.° da lei de 26 de fevereiro de 1892 serão entregues certificados nominativos da divida publica fundada, garantindo-lhes o pagamento integral do que recebiam anteriormente á promulgação d'aquella lei, sem d'ahi resultar prejuizo para o Thesouro, visto ter sido sempre restituida a essas corporações e instituições, pelo orçamento do Ministerio da Fazenda, a deducção que fora imposta em geral nos juros de titulos de divida publica, pela mencionada lei, com o aumento na taxa do respectivo imposto de rendimento.

Supprimir-se-ha o serviço que esse pagamento exige hoje das repartições publicas, e simplificar-se ha nessa parte o Orçamento Geral do Estado, não se inscrevendo como receita do imposto do rendimento o que nas despesas se consigna, por somma igual, para indemnização dos prejuizos a que ficaram sujeitas as corporações e instituições de beneficencia, em relação aos titulos que lhes pertenciam, e muitos parochos, pelos, bens dos passaes desamortizados anteriormente a 26 de fevereiro de 1892.

Igualando-se a taxa do imposto de rendimento sobre os titulos de divida publica interna á que se cobra sobre todos os papeis de credito, deixará de ser incluida no computo das receitas do Estado uma verba importantissima relativa á deducção realmente imposta, para attender ás necessidades impreteriveis do Thesouro Publico, sobre os juros da divida publica interna, cora a designação de aumento na taxa do imposto do rendimento, ao mesmo tempo que se inscrevia na despesa a verba total correspondente aos juros por inteiro de toda essa divida.

Parece, á primeira vista, consultando-se as estatisticas dos impostos, que os rendimentos do Estado cresceram por aquelle motivo, quando na realidade se operou, nos encargos da divida interna fundada, uma importante de-

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ducção determinada pela imperiosa necessidade de reduzir as despesas do Estado perante a gravissima crise financeira por que passava o país.

A conversão que proponho será facultativa e far-se-ha nos seguintes termos:

Inscrições de 3 por cento: — Por tres titulos antigos receberá o portador dois titulos novos de divida consolidada de nominal de 90$000 réis, vencendo o juro de 4 por cento ao anno, sujeitos ao mesmo imposto de rendimento que recae sobre os outros papeis de credito;

Obrigações de 4 por cento dos emprestimos de 1890 — Por cinco obrigações actuaes receberá o portador quatro obrigações do mesmo nominal de 90$000 réis e juro de 4 por cento, amortizaveis ao par, comais uma obrigação sem juro mas amortizavel igualmente ao par.

Sobre os novos titulos com juro recae o imposto de rendimento sobre os papeis de credito.

Obrigações de 4 1/2 por cento de 1888 e 1889—Por cinco obrigações actuaes d'este typo receberá o portador quatro obrigações do nominal de 90$000 réis e do juro de 4 1/2 por cento, e mais uma obrigação do mesmo valor nominal sem juro e amortizavel ao par.

Sobre estes novos titulos recairá, como nos outros, o imposto de rendimento.

Para os titulos que representaram as antigas obrigações de 4 e 4 1/2 por cento conservar-se-ha a tabella da amortização actual, conforme foi estipulado na emissão dos emprestimos correspondentes a esses titulos.

Os novos titulos de 4 por cento em que forem convertidos, os actuaes de 3 por cento, serão de divida consolidada, mas para a sua extincção criar-se-hão na Junta de Credito Predial um fundo especial constituido;

1.° Pelas receitas do actual fundo de amortização a cargo da mesma Junta;

2.° Pela economia que resultar da amortização por compra dos titulos de 1.ª, e 2.ª serie da divida externa;

3.º Pelos lucros da Caixa Geral de Depositos;

4.° Por uma verba variavel como as circunstancias permittirem, que será inscrita nos futuros orçamentos com applicação especial a este fundo.

Os titulos comprados com o producto d'estas receitas serão averbados ao fundo de amortização da divida interna, sendo os seus juros capitalizados para aumento do mesmo fundo.

Os resultados da conversão proposta podem resumir-se da seguinte maneira:

O capital nominal da divida consolidada de 3 por cento, que é actualmente de .... 514:401 contos de réis
Ficará reduzido, a .... 308:641 »
Havendo portanto a reducção de .... 200:760 contos de réis

O capital da divida amortizavel de 4 e de 4 1/2 por cento não soffre reducção alguma.

Haverá o aumento effectivo nos juros a pagar pelo Thesouro na importancia de 199:248$256 réis.

Parece-me util para o Estado, por muitas razões, a conversão a que se refere a proposta de lei que submetto ao vosso esclarecido exame, e que mio é obrigatoria para os actuaes possuidores da nossa divida interna. Offerece-lhes vantagens que eu julgo facilitará a conversão em curto prazo.

Applicação dos fundos externos para immobilização perpetua

É facto reconhecido por todos os economistas que os titulos de divida publica emittidos no estrangeiro, quando as circunstancias aconselham a collocar por esse meio os emprestimos com applicação a obras destinadas ao desenvolvimento da riqueza publica, teem manifesta tendencia para regressar ao país emissor, logo que as condições dos mercados internos o permutam e á medida que aumentam os recursos nacionaes. Succede o mesmo com os titulos de sociedades ou empresas mercantis criadas com capitães estrangeiros, quando ellas teem por fim a explorarão de serviços publicos, ou de industrias que promovam e fomentem o progresso da riqueza nacional.

Entre nós deu-se semelhante facto em diversas epocas, comprovando-se assim a regra geral. Uma grande parte dos emprestimos contrahidos no estrangeiro foi convertida em inscrições de divida interna quando essa inversão era permittida. Posteriormente sendo novamente autorizada a troca de titulos externos por internos pelo decreto de 13 de junho de 1892, e leis de 20 de maio de 1893, e 20 de junho de 1898, o resultado correspondeu ao que se esperava, e maior teria sido a inversão se fossem estabelecidos prazos mais largos para aquelle fim.

Da totalidade da divida externa emittida desde 1853 até hoje está convertida em interna a importancia de £ 21.656:740 de 3 por cento, e consideravel é o valor que ainda possuem os nacionaes, embora a cobrança dos juros se faça somente no estrangeiro, por motivo do imposto de rendimento a que estão sujeitos os pagamentos em Portugal.
Em todos os países se auxilia a immigração dos titulos de divida externa por serem bem conhecidas as vantagens que d'ahi resultam.

Com effeito os titulos de divida externa adquiridos pelos nacionaes nas epocas de prosperidade, em que as circunstancias são favoraveis, e ha disponibilidades nos mercados internos, concorrem depois efficazmente para attenuar as crises financeiras e as depressões cambiaes, quando ellas venham a dar-se por quaesquer motivos de ordem interna ou externa.

A lei de 29 de julho de 1899 procurava facilitar por conveniencia publica esse movimento, para o nosso pais, dos titulos do Estado e de companhias que se achavam em circunstancias especiaes.

A proposta que apresento tem por fim completar, no que hoje é possivel, as disposições d'aquella lei. Julgo por isso que merecerá a vossa approvação.

Imposto de mercês

É tão evidente a necessidade de reduzir a uma taxa uuica os direitos de mercê e correspondentes emolumentos de Secretarias de Estado, englobando-se na percentagem os impostos addicionaes e o sêllo dos conhecimentos, que tem este assunto merecido as attenções e o estudo dos Governos nos ultimos annos.

Resulta d'este plano a vantagem da simplificação dos serviços, e, sendo a presente proposta acompanhada de preceitos sobre a rigorosa cobrança e cautelas que previnam demoras na arrecadação, ou diificuldades de esta se realizar, o resultado do imposto tornar se-ha bem mais productivo.

Na proposta, attende-se a esses pontos capitães de regular tributação e de mais simples forma de assegurar, sem violencias, nem vexames, os rendimentos d'esta proveniencia.

As modificações á legislação vigente obedecem ao principio da mais equitativa distribuição do imposto, e é nesta razão que se fundamenta a modificação de percentagem, a vantagem concedida aos empregados de menores vencimentos, e as isenções que, por motivo de equiparação, se harmonizam com outras identicas a respeito do imposto do sêllo.

Nesta ordem de ideias altera a proposta algumas disposições da legislação actual, tornando o imposto menos oneroso, conforme as seguintes providencias;

A fixação de uma taxa de 70 por cento sobre os vencimentos certos de um anno;

A isenção do imposto pelos vencimentos inferiores a 150$000 réis;

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A liquidação proporcional aos vencimentos de um, dois ou tres annos;

Algumas isenções, de harmonia com outras leis tributarias, que, pelos mesmos factos, dispensam os agraciados do imposto, no todo ou em parte; e

A revisão das lotações de empregos civis ou ecclesiasticos que não sejam de vencimento certo.

Se esta proposta merecer, como espera o Governo, a vossa approvação, a nova lei ficará harmonica com outras de indole tributaria, será mais equitativa e ha de produzir maior receita, sem aggravamento, que não tem, somente pela liquidação e pronta cobrança do que deva pagar-se, conforme a importancia dos proventos dos agraciados,

Construcção de hoteis

A industria de hoteis e casas destinadas a dar hospedagem permanente ou temporaria acha-se entre nos em circunstancias muito inferiores ás de quasi todos os países da Europa. É insufficiente o numero, e são, em geral, muito modestas as installações d’estes estabelecimentos, não só para os nacionaes que d'elles queiram utilizar-se, mas principalmente para receber estrangeiros em condições mesmo medianamente regulares.

Fora de Lisboa e Porto, e poucas cidades mais, não se encontram casas destinadas áquelle fim, bem providas do que hoje se exige em toda a parte, faltando as cornmodidades consideradas corno indispensaveis noutros países.

Mandei proceder a um rapido inquerito sobre este assunto em todos os concelhos do continente do reino, e d'elle resultou o seguinte:

Ha no continente 1:337 hoteis, sendo 1:208 permanentes e 129 temporarios. É na cidade de Lisboa que existe maior numero de hoteis, pois elevam se a 240 estas casas. No resto do districto encontram-se apenas-98 permanentes e 13 em serviço temporario.

Segue-se o districto do Porto, havendo 90 permanentes na cidade e 54 permanentes e 6 temporarios no resto do districto. No districto de Vianna ha somente 16 permanentes e 4 temporarios.

Em todos os 1:337 hoteis do continente o numero de quartos utilizaveis é de 11:873, sendo a população media mensal de hospedes de 173:181, e o pessoal empregado em todas essas casas de 3:263 individuos. Em media ha 8,8 quartos utilizaveis por hotel, e a população media mensal de hospedes no conjunto não chega a 130 individuos. O numero de serviçaes é pouco superior a 2 por hotel. Era relação ao numero de andares vê-se que para 1:337 casas ha somente 2:116 andares destinados ao serviço dos hospedes.

A renda annual de todas as casas foi avaliada em réis 197:470$100, mas a contribuição predial para o Estado, paga pelos donos dos hoteis, não excedeu em 1904 a importancia de 6:6l9$õ65 réis, por pertencerem muitos d'esses estabelecimentos a, iudividuos estranhos á sua exploração. Como imposto industrial cobrou-se naquelle anno a quantia de 35:887$894 réis, e a contribuição de renda de casas foi de 2:353$108 réis. Na totalidade o Estado recebeu cm 1904 a quantia de 44:904$487 réis. As contribuições lançadas em 1904, cuja cobrança se deverá realizar neste anno, elevam se respectivamente a 40:133$915 réis, 6:619$666 réis e 2:205$603 réis, ou no total a réis 48:959$184.

Nos países em que ha já permanencia de muitos estrangeiros, ou são frequentados em certas epocas do anno por visitantes que ali se demoram mais ou menos tempo, procura-se por todos os meios facilitar o accesso a maior numero, dando-lhe todas as commodidades para que seja agradavel a residencia de estranhos, que vem aumentar o consumo dos generos de producção propria, valorizando muitas industrias, e permittindo emprego remunerador a muitos braços, quer no serviço dos hoteis e respectivas dependencias, e outras casas para hospedes, quer nas empresas de transportes. O melhoramento financeiro e cambial que a Italia teve nos ultimos annos attribue-se em parte á permanencia ali de muitos estrangeiros, que levaram ouro para aumentar a existencia nacional; e ninguem duvida de que é aos estrangeiros, que visitam a Suissa em consideravel numero, que se deve em grandissima parte a situação prospera d'aquelle país.

Não possuimos, é certo, os monumentos grandiosos nem as curiosidades e bellezas artisticas que leva tanta gente, vinda de toda a parte, a visitar a Italia, nem temos todas as condições especiaes de clima que attraem tantas pessoas á Suissa. Ha, porem, em Portugal muitos monumentos antigos dignos de ser visitados, e o nosso clima offerece vantagens, sob muitos aspectos, que devemos por todos os modos fazer apreciar por nacionaes e estranhos. No norte do país, e nas encostas da serra da Estrella encontram-se sitios cuja belleza iguala a de muitos dos mais afamados locaes do estrangeiro escolhidos para villegiatura de pessoas abastadas; e não nos faltam nascentes de aguas, de variadas especies apropriadas ás doenças que levam muitos nacionaes a procurar nos estabelecimentos estrangeiros a cura e allivio, que não podem obter no país. Creio mesmo que algumas ha entre nós que brotando aqui em abundancia são todavia raras noutros países. Estancias de aguas thermaes semelhantes ás mais concorridas do estrangeiro possuimos bastantes, que infelizmente são pouco utilizadas por falta das mais rudimentares commodidades. Aproveitar as condições naturaes do nosso solo, e do clima variado que temos desde o Algarve, que se presta admiravelmente em alguns sitios a residencias de inverno, como as melhores da costa do Mediterraneo, até o Minho, que pela abundancia de aguas e variada cultura dos seus valles e campos offerece pontos de belleza e pittoresco incomparaveis, parece ser um objectivo digno de merecer a attenção dos poderes publicos. Seguiremos nesta parte o que se vem praticando com vantagem noutros países.

Alem de bem conservadas estradas ordinarias, e do caminhos de ferro que facilitem o transito em todas as direcções, indispensavel é que os nacionaes e estranhos encontrem por toda a parte bom alojamento e os commodos hoje de primeira necessidade, sem o que não se conseguirá que o país possa ser visitado. Obsta em grande parte ao progresso da industria de casas para hospedagem o receio, para o capital estrangeiro principalmente, de que os impostos arbitrariamente lançados, ou distribuidos com desigualdade pelos interessados nos grémios das respectivas classes, venham aggravar os novos estabelecimentos, beneficiando os já existentes, que temem os effeitos da concorrencia. Ha factos que effectivamente comprovam a plausibilidade d'estes receios; e, examinando em relação aos differentes hoteis as contribuições totaes que respectivamente pagam, encontra-se a demonstração da parcialidade com que em alguns concelhos foi lançado o imposto. Alem d'isto, sendo o juro do dinheiro mais elevado, em media, em Portugal do que em outros países, o de vantagem attrahir os capitães estrangeiros, que podem aspirar a menor remuneração, havendo ainda a conveniencia de que virá com elle pessoal já conhecedor dos pormenores d'esta industria, pela maior pratica e experiencia que possuem. Os nossos industriaes terão assim exemplos a imitar, e com isso lucrarão.

Não deve recear-se tão pouco que a concorrencia dos novos e grandes estabelecimentos a que se refere a proposta de lei arruine as casas que existem destinadas a hospedagem, porque crescerá o movimento geral com elementos que hoje não frequentam o país, ou o abandonam para ir procurar fora o conforto e commodidades que aqui faltam. Será, no meu entender, antes occasião para progresso e melhoria de lucros para as casas que actualmente dão hospedagem, succedendo com ellas o mesmo que succedeu depois da construcção dos caminhos de ferro, que

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muitos temiam anniquilasse todos os outros meios de transporte anteriormente usados.

As bases principaes da proposta que apresentamos consistem em exigir condições sufficientes para a commodidade dos hospedes, á semelhança do que se pratica no estrangeiro; quartos em numero não inferior a 100 nos concelhos de Lisboa e Porto, e a 50 nos demais, todos com ar e luz directa, illuminação electrica, ascensores para todos os andares, casas de banho em numero proporcional ao dos hospedes, salas de leitura e de recreio com capacidade correspondente ao edificio, e finalmente todas as condições de hygiene, salubridade e limpeza aconselhadas pela sciencia.

Os edificios deverão ser isolados, tendo contigua uma superficie arborizada ou ajardinada pelo menos igual a tres vezes o espaço occupado pela construcção do hotel e dependencias ou annexos. Os projectos serão submettidos á approvação do Governo, que ouvirá sobre elles as estações competentes:

As vantagens a conceder deverão ser temporarias mas perfeitamente definidas para não haver no futuro duvida alguma. No nosso entender parece serem sufficientes as seguintes:

1.ª Isenção do pagamento da contribuição de registo para a acquisição dos edificios e terrenos destinados aos novos hotéis.

2.ª Isenção da contribuição predial durante dez annos, a contar do anno em que o estabelecimento for aberto ao publico.

3.ª Isenção da contribuição industrial durante quinze annos, a contar do mesmo anno.

4.ª Isenção do imposto de sêllo nas acções das sociedades que se constituirem para este fim exclusivo, e nos annuncios e reclamos até tres annos depois de aberto o estabelecimento ao publico.

Não se concede isenção de direitos pela importação de materiaes ou objectos necessarios á construcção e exploração d'estes edificios, para que as empresas que se formarem tenham necessidade de se utilizar da industria nacional, promovendo o aperfeiçoamento e a fabricação de muitos objectos, e especialmente da mobilia e utensilios indispensaveis ao estabelecimento e bom funccionamento dos hoteis.

Os interesses do Estado serão devidamente acautelados, para o caso de que os concessionarios deixem de cumprir as condições que lhes forem impostas, ou não completem as installações e não façam funccionar os estabelecimentos nos prazos fixados.

A proposta que apresentamos não diminue as receitas actuaes do Thesouro, nem traz encargo algum. Pelo contrario permittirá a criação de novas fontes de receita, attrahindo ao país muitos estrangeiros que contribuirão pela sua permanencia para o aumento da nossa reserva nacional de ouro.

Todos os países do centro da Europa procuram por todos os modos ganhar para as suas linhas ferreas o transito dos individuos que, vindos em grande numero do norte e da America, visitam a Suissa, a Italia e o Mediterraneo, pelas vantagens bem conhecidas que d'ahi resultam; e maiores esforços fazem para que ali estacionem ou se demorem. A nossa situação pode permittir-nos as mesmas vantagens, mas é para isso essencial que os estrangeiros encontrem facilmente onde se alojem com commodidade o conforto. A experiencia mostra de sobejo que a industria nacional não dispõe, por emquanto, de recursos bastantes para se conseguirem, em curto prazo, aquelles fins.

Inquerito sobre as causas de maior indice de mortalidade em differentes povoações do reino

As causas que me determinaram a propor em 14 de março de 1900 este inquerito subsistem ainda, por ser muito variavel de concelho para concelho do mesmo districto, e ainda entre freguesias do mesmo concelho, o movimento da população. Este trabalho revestirá uma forma essencialmente local, e pratica, para se apreciarem as causas que realmente obstam nos differentes pontos ao desenvolvimento regular da população, e permittirá que se promulguem as providencias reconhecidamente precisas para destruir os obstáculos que impedem que a população tenha em Portugal o mesmo crescimento que se dá em outros países em circunstancias identicas.

Reforma da pauta geral das alfandegas

A actual pauta das alfandegas vigora desde 17 de junho de 1892, tendo-se introduzido posteriormente algumas modificações, que todavia lhe não alteraram a sua especial feição.

Ha muito que se reconhece a necessidade de uma revisão geral dos direitos estabelecidos naquella pauta, nomeando-se para esse fim diversas commissões, que funccionaram, tendo apresentado trabalhos muito minuciosos e elucidativos. Já em 20 de outubro de 1894 foi submettido á apreciação das Camaras um novo projecto de pauta elaborado pela commissão que fora nomeada, pouco tempo depois de promulgada a mesma pauta, para examiniir as reclamações que haviam sido apresentadas. Esta commissão terminou o seu trabalho em 19 de junho d'aquelle anno, o qual serviu de base á proposta de lei de 20 de outubro de 1894, a que acima me referi.

Posteriormente foram submettidas á apreciação do Parlamento diversas propostas de lei, e eu mesmo, em 14 de março de 1900, tive a honra de pedir essa reforma, segundo as bases indicadas na respectiva proposta.

Em todos os annos subsequentes foi reconhecida pelos meus illustres antecessores a necessidade da reforma dos direitos da pauta das alfandegas vigente, o que demonstra a impreterivel urgencia de se modificar profundamente a pauta actual, visto que mudaram sensivelmente para muitas industrias as circunstancias que se davam
em 1892, e que determinaram as disposições adoptadas naquelle anno.

A commissão nomeada por portaria de 8 de julho de 1903, para tomar conhecimento e apreciar os fundamentos das reclamações acêrca da proposta da pauta geral das alfandegas apresentada ao Parlamento, concluiu o seu trabalho, formulando o projecto da nova pauta geral, que eu submetto á vossa illustrada apreciação e exame.

Conclusão

Pelas explicações que se encontram nas differentes partes d'este relatorio vê-se que é manifesto o melhoramento financeiro e economico do país, e que para este resultado muito contribuiram as provincias ultramarinas. Todos os dias se evidenciam mais os valiosos recursos que d'ali nos podem provir, e que muito convém aproveitar. Ainda ha poucos annos era insignificante, ou quasi nullo, o movimento commercial entre a metropole e as nossas colonias. Em 1843 esse movimento era representado por 795:000$000 réis, e em 1903, como se viu, elevou-se á importante cifra de 19.160:000$000 réis, devendo prever-se constante e seguro progresso.

Se examinarmos as circunstancias em que se encontrava o país em 1852, e olharmos para a situação presente, com facilidade se reconhecerá a enorme distancia a que nos achamos d'aquella epoca. As receitas ordinarias do Thesouro foram em 1852-1853 de 13.463:089$398 réis.

Em 1904-1905 cobraram-se 59.365:841$679 réis, alem de mais 746:054$150 réis de receitas extraordinarias, excluidos os empréstimos.

O movimento maritimo dos nossos portos era de tonelladas 1.216:815 de arqueação em 1851, e subiu no ultimo anno a 27.841:516 toneladas.

A importancia do commercio geral não passava de réis

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13.012:000$000 em 1843, e em 1904 attingiu a cifra de 130.5l2:000$000 réis.

Não tinhamos estradas nem caminhos de ferro, nem telegraphos, e o correio só chegava em prazos muito largos ás differentes terras da provincia.

Para se attender todos esses melhoramentos contrahimos avultada divida tanto no país como no estrangeiro, e hoje, apesar de ser em absoluto consideravel o aumento dos encargos d'ahi resultantes, é certo que o país pode supportar mais facilmente esse peso, e que para a amortizar temos disposto de avultadas quantias nos ultimos annos. No orçamento que propus para 1905-1906 prevê-se para esse fim a despesa de 2.083:124$112 réis, sem que isso altere o equilibrio orçamental. Continuando pela mesma forma e empregando os meios que proponho para as amortizações especiaes da nossa divida externa, podemos esperar que os seus encargos irão diminuindo sensivelmente. Como se vê das propostas que apresento, procuro facilitar a immigração para o país da nossa divida externa, e esse movimento contribuirá tambem para a consolidação do nosso credito no estrangeiro.

Devemos todavia considerar que, embora seja grande o desenvolvimento que o país teve nos ultimos cincoenta annos, muitissimo ha ainda que fazer, por estarmos muito distanciados de outros países, em circunstancias talvez inferiores ás nossas, em todos os progressos da civilização moderna. Se tomarmos, por exemplo, a Belgica para comparação, ver-se-ha que lá o caminho seguido denota maior aproveitamento das condições locaes e dos recursos proprios.

Assim a população, que era em 1831 de 3.921:964 habitantes, eleva-se hoje a cêrca de 7.000:000; os impostos produziram naquelle anno 71:637 milhões de francos, e em 1904 a receita cobrada attingiu a 526:150 milhões; o commercio geral, que era para importações de 98.013:079 francos, e para as exportações de 104.579:786 francos, subiu em 1903 a 4.447.938:421 francos de importação, e de 3.889.851:898 francos para a exportação.

Temos ainda muito que trabalhar para seguir as demais nações da Europa nos progressos da civilização, e terminarei repetindo o que disse no meu relatorio de 16 de março de 1900:

«Confiança nos proprios recursos, que são muitos, e decidido empenho de os aproveitar e aumentar para attender ás necessidades sempre crescentes e inadiaveis do desenvolvimento economico e social do país, bastarão para restabelecer por completo a situação financeira, e preparar um futuro isento de perigos, em que a nossa nacionalidade se robustecerá, permittindo lhe manter o logar a que as tradições, e os nossos recursos e vastos dominios, dão incontestavel direito».

Secretaria de Estado dos Negocios da Fazenda, aos 16 de agosto de 1905. = Manoel Affonso de Espregueira.

Proposta de lei n.° 10-E

Banco de Portugal

Artigo 1.° É o Governo autorizado a reformar os contratos com o Banco de Portugal, segundo as bases seguintes, que ficam fazendo parte integrante da presente lei.

§ unico. Para o caso, previsto na base 2.ª, do Governo embolsar directamente o Banco de parte do seu debito, é autorizada a criação dos titulos de divida publica necessarios, do typo que mais convier, não podendo porem o encargo ser superior ao que está fixado na mesma base.

Art. 2.º Fica revogada a legislação em contrario.

Secretaria de Estado dos Negooios da Fazenda, em 16 de agosto de 1905. = Manoel Affonso de Espregueira.

Bases para a reforma dos contratos com o Banco de Portugal

Base 1.ª

A conta corrente gratuita do Thesouro será elevada, a começar em l de janeiro de 1906, a 40.500:000$000 réis, ficando encorporados nesta conta os débitos do Governo pelos contratos de 14 de janeiro de 1893, e de 4 de dezembro de 1891, e cessando naquella data a contagem dos juros e a amortização dos referidos emprestimos.

Base 2.ª

As importancias, em divida em 31 de dezembro de 1905 dos emprestimos autorizados para pagamento das classes inactivas pelas leis de 29 de julho de 1887, e de 18 de setembro de 1897, e bem assim dos relativos ao Museu de Bellas Artes, Escola Polytechnica e Posto de Desinfecção de Lisboa, por contratos de 3 de agosto, 6 de setembro e 18 de novembro de 1901, 7 de julho de 1902, e 7 de novembro de 1903; os juros desde 1 de outubro a 31 de dezembro de 1905 do emprestimo para as classes, inactivas de 1897; e os saldos do emprestimo de 3 por cento de 1880, por liquidar, e das responsabilidades do Banco Lusitano e do Povo; serão reunidos num emprestimo unico da importancia total de 9.851:809$809 réis, o qual vencerá o juro de 5 1/2 por cento ao anno desde 1 de janeiro de 1906, sendo amortizado em noventa prestações iguaes semestraes, se o Governo não preferir embolsar directamente o Banco d'aquella importancia.

§ 1.° Em representação d'este emprestimo criar-se-hão titulos de divida publica do typo e condições que o Banco propuser, e o Governo deliberar acceitar, podendo o Banco acrescentar á garantia geral do Estado a sua propria e especial garantia, se assim o entender conveniente.

§ 2.° O pagamento do juro e amortização d'este emprestimo realizar-se-ha nos dias 2 de janeiro e 1 de julho de cada anno, sendo o primeiro pagamento em 1 de julho de 1906.

§ 3.° Estes titules serão isentos de qualquer imposto ou deducção, tanto geral como especial, e gozarão das demais regalias dos fundos de divida publica do Governo Português.

§ 4.° Poderão continuar na circulação, se ao banco convier, os titulos que ainda existirem dos que foram emittidos em virtude do contrato de 16 de dezembro de 1897, sendo prorogado o prazo para a amortização, o qual será igual ao do novo empréstimo, e deduzindo-se do valor dos titulos a criar a importancia d'aquelles que ficarem na circulação, sem que por este facto seja excedida, no total, a annuidade a pagar pelo Estado em conformidade do disposto no começo d'esta base.

§ 5.° O Governo poderá em qualquer epoca, com previo aviso de seis meses, mas nunca antes de 1915, antecipar a amortização d'este emprestimo, no todo ou em parte, sendo porem obrigatorio o reembolso do que for devido, quando cessarem os privilegios do banco, se esse facto se der antes da amortização completa do mesmo emprestimo.

§ 6.° Para assegurar o pagamento dos juros e amortização d'este emprestimo entregará o Governo mensalmente á Junta do Credito Publico o duodecimo da somma correspondente á annuidade acima fixada.

Base 3.ª

Os titulos de divida publica, ou documentos que caucionam os emprestimos mencionados na base antecedente, serão entregues ao Governo, que os fará cancellar na Junta do Credito Publico, ficando somente na posse do banco aquelles que corresponderem á conta gratuita actual, e aos emprestimos que nella serão encorporados, em conformidade do disposto na base 1.ª O Governo substituirá as ins-

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crições de divida interna que caucionam essa conta por titules internacionaes cotados nos principaes mercados financeiros, representativos de ouro, á medida que puder dispor de alguns d'esses titulos.

Base 4.ª

A circulação de notas de ouro e prata do Banco de Portugal não poderá exceder o limite maximo de 72.000:000$000 réis fixado no decreto de 30 de junho de 1898.

§ 1.° As notas de ouro serão de 10$000 réis, 20$000 réis, 50$000 réis e 100$000 réis, mas não poderão entrar na circulação por importancia superior á conta gratuita do Governo, acrescida do triplo da reserva do banco, em moedas ou barras de ouro.

§ 2.° As notas lê prata serão dos typos de 2$500 réis e 5$000 réis, e a sua importancia em tempo algum poderá exceder a differença entre o valor das notas de ouro, calculado na occasião de se realizar o contrato, em conformidade do disposto no § 1.°, e o limite maximo fixado na base 4.a para a circulação fiduciaria, ainda que a importancia das notas de ouro venha a ser em qualquer occasião inferior áquelle valor.

Base 5.ª

O Governo applicará annualmente, pelo menos, a quantia de 500:000$000 réis para serem retiradas da circulação notas de ouro correspondentes a essa importancia, reduzindo-se de igual quantia o debito e o limite da conta corrente gratuita do Governo, e o maximo da circulação fiduciaria.

Base 6.ª

Para amortização do excesso que houver de notas de prata, alem da importancia era moedas d'essa especie que existir em caixa, applicará o Banco a terça parte da quantia destinada, em conformidade do disposto no § 4.° do artigo 5.° do contrato de 9 de fevereiro de 1895, para os fundos de reserva, retirando da circulação importancia igual de notas de prata ou adquirindo o mesmo valor em moedas ou barras de ouro, para aumento da sua circulação representativa de ouro, mas neste caso deverá o Banco reduzir ao mesmo tempo as notas de prata em circulação de quantia igual áquelle aumento.

Logo que não houver excesso de notas de prata sobre a moeda d'essa especie em caixa, cessará a inconvertibilidade d'essas notas, e a parte da quantia destinada aos fundos de reserva, que ficará por esse motivo disponivel, será applicada á acquisição de titulos internacionaes pagaveis em ouro e de fácil realização nas principaes praças estrangeiras, ou de ouro em moeda ou barra, conforme mais convier ao Banco.

Base 7.ª

Metade, pelo menos, da parte dos lucros, destinada annualmente ao aumento do fundo de reserva permanente do Banco, será empregada a começar de 1906, em titulos de divida externa portuguesa, sendo levado á conta de ganhos e perdas o rendimento d'esses titulos, assim como d'aquelles a que se refere a base antecedente.

§ unico. A reserva em ouro nunca poderá ser inferior a 3.000:000$000 réis, podendo o Banco empregar a importancia que actualmente excede essa cifra em titulos ou valores internacionaes realizaves facilmente em ouro nas praças estrangeiras. Neste caso será reduzida conformemente ao disposto na base 5.ª a circulação de notas de ouro.

Base 8.ª

O Banco ficará incumbido, como banqueiro do Estado e caixa geral- do Thesouro na metropole, dos serviços de cobrança e pagamento, actualmente a cargo das recebedorias, mediante as seguintes condições:

As recebedorias dos bairros de Lisboa e Porto e das capitaes dos districtos cessarão de funccionar como repartições dependentes do Thesouro, dentro do prazo de um anno a contar da data da assinatura do novo contrato.

Nos demais concelhos do reino far-se-ha a transferencia successivamente, de acordo entre o Governo e o Banco, por forma que no prazo de cinco annos, a contar da mesma data, todo o serviço do Thesouro, tanto de cobrança de receitas como de pagamento de despesas, fique a cargo do Banco.

Aos actuaes empregados são garantidos os vencimentos fixados na legislação vigente, ficando igualmente de conta do Governo as reformas que porventura lhes competirem.

Estes empregados continuarão sujeitos- ás disposições penaes e disciplinares vigentes, e terão de subordinar aos regulamentos do Banco.

Os delegados do Thesouro nas capitães dos districtos e os escrivães de fazenda nos outros concelhos fiscalizarão as agencias ou correspondencias do Banco na parte relativa ás operações do Estado.

Á medida que forem vagando os logares dos empregados que passarem para o serviço do Banco, a retribuição d'este pelo novo serviço de cobrança e de pagamentos do Thesouro, que estava a cargo das recebedorias, será fixada de acordo com o Governo, por forma que a despesa actual com esses serviços seja reduzida quanto possivel á percentagem que, independentemente dos vencimentos fixos for abonada aos recebedores pela cobrança que effectuarem.

Serão introduzidas nos actuaes regulamentos de Fazenda as modificações necessarias para facilitar e simplificar os serviços de cobrança e arrecadação dos rendimentos do Estado, e de pagamento das despesas publicas, podendo o Banco nomear para áquelle fim cobradores particulares de sua confiança. O Governo poderá igualmente encarregar de pagamentos especiaes agentes seus privativos, sem responsabilidade para o Banco.

Base 9.ª

As notas do Banco de Portugal continuam a ser isentas do imposto do sêllo, ficando tambem isento o Banco da contribuição de juros pelas suas operações.

Base 10.ª

As modificações na taxa do juro, acima ou abaixo de 5 1/2 por cento, dependerão de expressa autorização do Governo, sob proposta do conselho geral do Banco.

Base 11.ª

Durante a vigencia do presente contrato o capital do Banco de Portugal manter-se-ha em 13.500:000$000 réis, salvo se a assembleia geral deliberar o aumento d'esse capital, e o Governo o approvar.

Base 12.ª

Alem do governador será de livre nomeação do Governo um vogal effectivo do conselho fiscal, e de um substituto para este vogal. O governador juntamente com o vogal do conselho fiscal nomeado pelo Governo e um outro vogal designado pelo mesmo conselho constituirão uma commissão que se denominará — commissão fiscal da emissão fiduciaria, — e será exclusivamente encarregada de fiscalizar a circulação das notas do Banco de Portugal, por forma que sejam mantidos rigorosamente os limites fixados nestas bases, procedendo-se em tempo competente á amortização das notas que devam ser retiradas da circulação.

Junto d'esta commissão funecionará como secretario o secretario geral do Banco.

Base 13.ª

O Governo decretará, de acordo com o Banco, todas as disposições relativas aos serviços de Estado incumbidos ao mesmo Banco, e ao exercicio das funcções do governador e da commissão fiscal da emissão.

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SESSÃO N.° 16 DE 16 DE AGOSTO DE 1905 53

Base 14.º

Adoptar-se-hão na organização do Banco de Portugal todas as disposições que permitiam obter, sem prejuizo do Estado e dos accionistas, economia na administração dos serviços confiados ao Banco, procurando ao mesmo tempo facilitar ao commercio os depositos em conta corrente por meio de entradas e saídas nas differentes agencias, sem despesas para os depositantes pela transferencia de fundos.

Base 15.°

A participação do Governo nos lucros do Banco começará depois da distribuição de um dividendo de 8 por cento aos accionistas.

Base 16.ª

Ficam subsistindo todas as condições dos contratos anteriores, entre o Governo e o Banco, que não sejam expressamente modificadas por estas bases.

Secretaria de Estado dos Negocios da Fazenda, aos 16 de agosto de 1905.= Manoel Affonso de Espregueira.

Proposta de lei n.º 10-F

Direitos de consumo em Lisboa

Artigo 1.° É o Governo autorizado a construir com urgência todas as obras e edificios necessarios para que a area sujeita ao imposto de consumo em Lisboa seja limitada, do lado do norte, por um caminho fiscal estabelecido proximamente ao longo das vias férreas de cintura, e de Cintra, ligando-se nas proximidades da Buraca com a actual estrada de circunvallação, que se aproveitará até Algés, e seguindo de cêrca de Chellas a encontrar a antiga estrada de barreiras, e d’ahi pela mesma estrada até as antigas portas da Cruz da Pedra.

O Governo poderá despender com esses trabalhos até a quantia de 173:430$000 réis, inscrevendo-se essa despesa em capitulo especial do orçamento extraordinário do Ministério da Fazenda.

Art. 2.° A pauta actual de direitos de consumo de Lisboa é substituida, desde a publicação da presente lei, pela que vae annexa, e d’ella faz parte integrante.

Logo que funccionar a nova linha de barreiras, cessará a applicação d’esta pauta na parte que ficar comprehendida entre essa linha e a estrada actual, que deixar de ser limite da area fiscal de Lisboa, adoptando-se ahi em substituição a tabella do imposto do real de agua em vigor, e as taxas municipaes anteriormente estabelecidas, sendo diminuidas do que for preciso para que d’ellas não resultem direitos superiores aos fixados na mencionada pauta.

§ unico. A fiscalização do imposto do real de agua na area acima indicada competirá á Administração Geral das Alfandegas.

Art. 3.° Fica revogada a legislação em contrario.

Secretaria de Estado dos Negocios da Fazenda, aos 16 de agosto de 1905. = Manoel Affonso de Espregueira.

Tabella dos direitos de consumo em Lisboa a que se refere a proposta de lei d’esta data

CLASSE 1.ª

Carnes (a)

[Ver tabela na imagem]

(a) As linguas frescas, secas, salgadas ou fumadas pagam direito igual ao da carne da especie a que pertencem.

(b) No peso das reses vivas não se faz deducção alguma.

(c) Do peso das reses bovinas mortas deduz-se o das meudezas quando acompanham as reses correspondentes.

(d) Os leitões são livres de direitos, não pesando mais de 5 kilogrammas.

(e) Este artigo comprehende chispes, cabeças fressuras e toda a entranha, com excepção das tripas.

CLASSE 2.ª

Liquidos

[Ver tabela na imagem]

(a) Classificam-se bebidas alcoolicas não especificadas todas as aguardentes preparadas não incluidas nos generos que teem as annotações (1) (2) e (3).

(b) Este artigo comprehende as borras de azeite. Quando, porem, forem utilizadas em lexivia de soda, são livres.

(c) O oleo de mendobi, o de purgueira e quaesquer oleos applicaveis á illuminação, quando fabricados no concelho de Lisboa, estão sujeitos às taxas que respectivamente ficam designadas.

CLASSE 3.ª

Varios generos

[Ver tabela na imagem]

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54 DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS

[Ver tabela na imagem]

Sobre a importancia d’estes direitos não incidirá, addicional algum.

As manteigas e queijos fabricados dentro das barreiras da cidade não pagam direito algum.

(a) Neste artigo estão incluidas nozes, amendoas, avelãs e frutas análogas verdes, sendo excluidas as uvas.

(b) Neste artigo está comprehendida a alfarroba em farinha.

(c) Neste artigo está incluido o meolo de amendoa, com tenue capa de farinha ou açucar.

(d) Neste artigo está incluida a amendoa em casca, mollar e côca.

(e) Neste artigo não está comprehendida a manteiga que tiver pago o imposto de producção a que se refere o artigo 2.º da lei de 12 de abril de 1892.

(f) Este artigo é applcavel aos denominados queijos saloios quando não sejam curados

Secretaria de Estado dos Negocios da Fazenda, aos 16 de agosto de 1905. = Manoel Affonso de Espregueira.

Nota dos generos sobre que incidem os impostos de consumo, real de agua e camararios no concelho com designação das respectivas taxas de Lisboa

CLASSE 1.ª

Carnes (a)

[Ver tabela na imagem]

(a) As linguas frescas, secas, salgadas ou fumadas pagam direito igual ao da cama da especie a que pertencem.

(b) No peso das reses vivas não se faz deducção alguma.

(c) Do peso das reses bovinas mortas deduz-se o das meudezas, quando acompanham as reses correspondentes.

(d) Os leitões são livres de direitos, não pesando mais de 5 kilogrammas.

(e) Este artigo comprehende chispes, cabeças, fressuras e toda a entranha, com excepção de tripas.

CLASSE 2.ª

Liquidos

[Ver tabela na imagem]

(a) Classificam-se bebidas alcoolicas não especificadas todas as aguardentes preparadas não comprehendidas nas tres primeiras especies d’esta classe.

(b) Este artigo comprehende a agua-pé e a chamada mistura. Veja-se regulamento de 20 de outubro de 1886.

(c) O oleo de mendobi, o de purgueira e quaesquer oleos applicaveis á illuminação, quando fabricados no concelho de Lisboa, estão sujeitos ás taxas que respectivamente ficam designadas. Veja-se o regulamento de 20 de outubro de 1886.

(d) Este artigo comprehende as borras de azeite. Quando porem forem inutilizadas com lexivia de soda, são livres.

(e) Alteradas estas taxas pelo decreto de 14 de janeiro de 1905, pela forma seguinte: Vinhos communs até 12° centesimaes volumetricos de força alcoolica, os vinhos engarrafados de producção nacional e vinhos do

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SESSÃO N.° 16 DE 16 DE AGOSTO DE 1905 55

Douro e da Madeira em quaesquer vasilhas por 100 kilogrammas — 3$561 réis.

Outros de mais de 12° até 23° pagarão alem do direito a que se refere o numero antecedente mais 4 réis por grau a mais e por litro. Vinhos de mais de 23°, litro — 420 réis.

(f) 100 litros.

CLASSE 3.ª

Varios generos

[Ver tabela na imagem]

(a) Neste artigo estão incluidas nozes, amendoas, avellas e frutas analogas, verdes.

(b) Neste artigo está comprehendida alfarroba em farinha.

(c) Neste artigo está incluido o meolo de amendoa com tenue capa de farinha ou açucar.

(d) Neste artigo está incluida a amendoa em casca, mollar e coca.

(e) Neste artigo estão incluidas as geminas e claras de ovo separadas da casca.

(f) Neste artigo não está comprehendida a manteiga que tiver pago o imposto de producção, a que se refere o artigo 2.° da lei de 12 de abril de 1892.

(g) Este artigo o applicavel aos denominados queijos saloios quando não sejam curados.

(h) Sobre a importancia do despacho, paga 5 por cento do imposto extraordinario.

Secretaria de Estado dos Negocios da Fazenda, aos 16 de agosto de 1900. = Manoel Afonso de Espregueira.

Proposta de lei n.° 10-G

Conversão da divida interna

Artigo 1.° É o Governo autorizado a converter a actual divida interna consolidada de 3 por cento e a amortizavel de 4 e 4 1/2 por cento de 1888 e 1889 pela forma seguinte:

§ 1.° Os portadores dos titulos de 3 por cento receberão em troca de tres inscrições actuaes de 100$000 réis dois novos titulos de divida consolidada de 90$000 réis, vencendo juro de 4 por cento.

§ 2.° Por cinco obrigações de 4 por cento de 1890, do valor nominal de 90$000 réis, serão entregues quatro novas obrigações do mesmo nominal, vencendo o juro de 4 por cento, e mais um titulo sem juro, mas amortizavel ao par juntamente com as quatro que vencem juro.

§ 3.° As obrigações de 4 1/2 por cento de 1888 e 1889 conservarão igualmente na mesma proporção de cinco para quatro o juro actual e entregar-se-ha um quinto titulo do valor nominal de 90$000 réis, que será amortizado ao par juntamente com as primeiras quatro obrigações.

§ 4.° A amortização dos titulos representativos das actuaes obrigações de 4 e 4 1/2 por cento de 1888, 1889 e 1890 regular-se-ha pelas respectivas tabellas actualmente em vigor.

Art. 2.° Os novos titulos de 4 por cento destinados á conversão das inscrições de 3 por cento serão de divida consolidada, mas para a sua gradual extincção é criado na Junta do Credito Publico um fundo especial constituido:

1.° Pelas receitas que formam o fundo de amortização actual a cargo da mesma junta, as quaes serão exclusivamente applicadas á compra de titulos da nova divida consolidada de 4 por cento;

2.° Pela economia proveniente da amortização dos titulos da 1.ª e 2.ª serie de 3 por cento da divida externa por compra de titulos no mercado;

3.° Pelos lucros da Caixa Geral de Depositos;

4.° Por uma verba que para esse fundo será inscrita annualmente no Orçamento Geral do Estado, conforme as circunstancias do Thesouro o permittirem.

§ 4.º Os titulos que forem adquiridos com estes recursos serão averbados ao fundo de amortização da divida publica, e os seus juros capitalizados para aumento do mesmo fundo.

Art. 3.° A conversão o facultativa, mas os novos titulos gozarão das seguintes vantagens:

1.ª O pagamento dos juros da divida interna começará em cada semestre pelos novos titulos;

2.ª A isenção de penhora dos titulos de divida publica será applicavel unicamente aos novos titulos, depois de terminado o prazo que for fixado pelo Governo para a conversão;

3.ª O pagamento dos juros e da amortização dos novos titulos poderá ser feito no estrangeiro quando o Governo obtiver para esses titulos a cotação nas praças onde se effectuar o pagamento;

4.ª só os novos titulos poderão de futuro ser averbados em condições de immobilidade perpetua ou temporaria, e servir para cauções ou depositos de garantia em todos os casos em que por disposição legal sejam admissiveis os titulos da divida publica interna.

Art. 4.° Sobre os novos titulos não poderão recair impostos superiores áquelles a que estiverem sujeitos os outros valores mobiliarios.

Art. 5.° Aos institutos e corporações de beneficencia e parochos nas condições expressas no artigo 7.º da lei de 26 de fevereiro de 1892, a que teem sido feitas as restituições pelo aumento na taxa do imposto de rendimento sobre os titulos que possuiam anteriormente áquella lei, serão averbados novos titulos ou certificados de divida consolidada em numero e valor sufficiente para produzirem somma igual ás restituições que lhes teem sido abonadas.

Art. 6.° O Governo decretará, ouvida a Junta do Credito Publico, as providencias necessarias para a execução d'esta lei, podendo alterar as disposições em vigor para o pagamento dos juros da divida publica, no intuito de simplificar e melhorar esse serviço.

Art. 7.° Fica revogada a legislação em contrario. Secretaria de Estado dos Negocios da Fazenda, aos 16 de agosto de 1900.= Manoel Affonso de Espregueira.

Proposta de lei n.° 10-H

Applicação dos fundos externos para imobilização perpetua

Artigo 1.° O producto dos bens desamortizados que, nos termos da legislação em vigor, tiver de ser empre-

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56 DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS

gado em titulos de divida publica, poderá ser applicado á compra de titulos externos do Governo Português que forem cotados nas principaes praças estrangeiras.

§ unico. Estes titulos serão trocados na Junta do Credito Publico por certificados de divida inscrita, averbados a favor das entidades a que pertencerem os bens desamortizados, ficando isentos de qualquer imposto ou deducção.

Art. 2.° As disposições do artigo antecedente serão applicaveis ao fundo permanente da Caixa de Aposentações e do Montepio Official.

Art. 3.° Fica revogada a legislação em contrario.

Secretaria de Estado dos Negocios da Fazenda, aos 16 de agosto de 1905. = Manoel Afonso de Espregueira.

Proposta de lei n.° 10-I

Imposto de mercês

Artigo 1.° Os direitos de mercê e emolumentos de secretarias de Estado, de que tratam respectivamente o decreto de 16 do agosto de 1898 e a carta de lei de 16 de abril de 1867, são substituidos por um imposto unico, que se denomina: «Imposto de mercês».

§ unico. Os impostos addicionaes de 6 por cento por lei de 27 de abril de 1882, de 5 por cento por lei de 18 de julho de 1885, de 6 por cento por lei de 30 de julho de 1890, de 5 por cento por lei de 25 de junho de 1898, de 2,5 e 5 por cento por decreto de 24 de dezembro de 1901 e o sêllo dos conhecimentos serão englobados nas verbas ou percentagens do imposto de mercês a que este artigo se refere.

Art. 2.° A taxa do imposto de mercês pelo provimento em empregos do Estado, de corpos e corporações administrativas e de quaesquer estabelecimentos subsidiados pelo Governo, com serventia vitalicia, temporaria ou provisoria, e cujo ordenado ou lotação seja superior a 150$000 réis, é fixada, incluidos os addicionaes e sêllo referidos no
§ unico da artigo 1.°, em 70 porcento sobre a importancia total dos vencimentos de um anno, fixos ou lotados, comprehendendo as gratificações certas de exercicio, e quaesquer proventos de caracter permanente.

§ 1.° O provimento por um, dois ou mais annos, contando-se por um anno depois do primeiro ou segundo, qualquer periodo de tempo, obriga ao pagamento, respectivamente de duas, trws ou quatro quintas partes da referida percentagem, e sendo por menos de um anno, duas quintas partes, mas nesta hypothese, somente sobre a importancia dos proventos correspondentes ao tempo da serventia. Prolongando-se, porem, os provimentos temporarios, proceder-se-ha successivamente ás devidas liquidações nos termos d'esta lei, não sendo devido mais imposto por novo provimento logo que a quantia já liquidada attinja o resultante do maximo da percentagem.

§ 2.° Aos provimentos definitivos ou provisorios, e cujas funcções por qualquer motivo attendivel não forem exercidas, por mais de três annos, será igualmente applicavel o disposto no paragrapho antecedente, devendo proceder-se a nova liquidação para ajustamento da conta do responsavel. Se já tiver pago toda a importancia do primeiro debito, ser-lhe-ha restituida a differença.

§ 3.° Nos casos de melhoria de vencimentos do empregado, por aumento de proventos no mesmo logar, ou noutro qualquer, incluindo a reintegração no serviço publico, levar-se-ha sempre em conta o que tiver sido pago, ou já estiver liquidado por anteriores provimentos definitivos, provisorios ou temporarios.

§ 4.° Sendo provido em emprego publico de ordem civil qualquer official do exercito ou da armada, o imposto de mercês será calculado somente sobre a importancia excedente á do soldo da patente e gratificação da arma a que pertencer, se se confundirem na totalidade dos proventos do logar civil, mas quando venha a perder a qualidade de militar, e continue no desempenho do logar, será feita liquidação relativa á importancia que deixou de entrar no cômputo dos vencimentos.

Art. 3.° A liquidação do imposto de mercês o da exclusiva competencia da Direcção Geral das Contribuições Directas, bem como a fixação das respectivas lotações dos empregos publicos, cumprindo a todas as autoridades dar conhecimento á mesma Direcção Geral das mercês concedidas, excepto das que forem publicas no Diario do Governo.

§ unico. A liquidação do imposto de mercês deve ser feita dentro do prazo de tres meses a contar da data da publicação do despacho no Diario do Governo ou da communicação official feita á Direcção Geral das Contribuições Directas.

Art. 4.° O imposto de mercês honorificas e lucrativas pode ser pago por uma só vez dentro do prazo de dois meses, contados da data do despacho, com o abatimento de 10 por cento da respectiva importancia, ou em prestações mensaes.

§ 1.° As prestações nunca excederão o numero de quarenta, nem a importancia de cada uma poderá, em caso algum, ser inferior a 1$000 réis, excepto nas mercês lucrativas, com ordenado ou lotação não superior a 300$000 réis, que poderão ser em numero de oitenta, mas cada uma tambem nunca inferior a 500 réis.

§ 2.° Não é permittido de futuro o pagamento do imposto de mercês honorificas pela sexta parte do vencimento, nem por qualquer outra forma contraria ao disposto neste artigo.

§ 3.° O prazo estabelecido neste mesmo artigo para o pagamento de pronto, com abatimento, será de seis meses para os agraciados que residirem nas provincias de Africa e Estado da India, ou em país estrangeiro do territorio da Europa, de oito meses para os que residirem na provincia de Macau e Timor, e de um anno para os que residirem em país estrangeiro fora da Europa.

Art. 5.° O pagamento em prestações do imposto de mercês, tanto honorificas como lucrativas, devidas por agraciados com ordenado certo, pago pelos cofres do Estado, será feito por descontos nas folhas ou recibos dos respectivos vencimentos, de modo que esses descontos sejam feitos em tantos vencimentos successivos quantas forem as prestações a pagar, ficando individualmente responsaveis pelas importancias não descontadas os chefes das repartições de contabilidade por onde forem processadas as folhas de vencimento.

§ unico. A cobrança das prestações do referido imposto devidas por funccionarios que não tenham vencimento certo, ou por quaesquer agraciados que não sejam empregados do Estado, será feita por meio de conhecimentos nas respectivas recebedorias, em tantos meses successivos, quantos forem os mesmos conhecimentos, ficando os escrivães de fazenda obrigados a debitar os recebedores individualmente quando os conhecimentos á responsabilidade d'estes não forem pagos no dia do vencimento e não tenham procedido ao competente relaxe, podendo os recebedores haver livremente dos contribuintes as importancias que por estes tenham pago.

Art. 6.° Ficando isentos do imposto de mercês, nos termos do artigo 2.°, os vencimentos dos empregados, não superiores a 150$000 réis, pela repartição competente se mandará suspender a cobrança dos direitos de mercê e dos emolumentos das Secretarias de Estado, já liquidados e respeitantes a empregos nas mesmas circunstancias, mas sem direito á restituição das quantias já pagas. Os conhecimentos ainda existentes nas recebedorias, e tornados incobraveis por virtude da mencionada isenção, ficam assim annullados para todos os effeitos.

Art. 7.° Os agraciados com mercês honorificas ou lucrativas que pagarem o imposto de mercês em presta-

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coes são obrigados a solicitar a competente quitação, apresentando para esse fim na Direcção Geral das Contribuições Directas o respectivo diploma dentro do prazo de trinta dias a contar da data do pagamento do ultimo conhecimento, e bem assim o diploma e a certidão passada pela Repartição de Contabilidade, quando o pagamento tiver sido feito por desconto nas folhas dos vencimentos mensaes.

§ 1.º Os agraciados que não cumprirem as disposições d'este artigo, se forem empregados publicos, serão suspensos de exercicio e vencimento durante o tempo da omissão, e se não forem empregados publicos incorrem na multa de 20$000 réis.

§ 2.° Aos agraciados que residirem fora do continente do reino e ilhas adjacentes é-lhes applicavel o disposto no § 3.° do artigo 4.°

Art. 8.° O imposto do sêllo de diplomas, tanto de mercês honorificas como lucrativas, segundo a legislação vigente, será liquidado na mesma occasião em que se liquidar o imposto de mercês, e pode ser pago de pronto sem desconto algum, ou em prestações mensaes, com juro de mora, não podendo as prestações exceder o numero de dez, nem cada uma ser de quantia inferior a 500 réis.

§ unico. O imposto do sêllo dos diplomas recairá sobre os vencimentos ou lotações que servirem de base á liquidação do imposto de mercês, e é applicavel á sua cobrança em prestações o disposto no artigo 5.° e seu paragrapho.

Art. 9.° Os chefes de repartição, e bem assim quaesquer autoridades sob cujas ordens servirem empregados publicos, sujeitos a impostos de mercês e do sêllo, sito obrigados, sob sua responsabilidade, a verificar se os seus subordinados se acham devidamente encartados, dando parte, em caso negativo, á Direcção Geral das Contribuições Directas, dos empregados omissos.

Art. 10.° São isentos de imposto de mercês pelos proventos dos seus empregos:

1.° Os governadores civis;

2.° O patriarcha, bispos e arcebispos;

3.° Os professores de instrucção primaria.

São tambem isentos:

4.° As encomrnendações ou provimentos temporarios do parochias, coadjutorias e thesourarias;

5.° Os abonos feitos, para despesas de representação;

6.° As gratificações abonadas extraordinariamente por desempenho de commissões temporarias de serviço, quando não digam respeito ao serviço interino de um empregado permanente;

7.° As tenças, ordinarias e pensões que teem a natureza de esmola ou que são comprehendidas nas disposições do decreto de 18 de outubro de 1836:

8.° As decorações das ordens militares de S. Bento de Avis e da Torre e Espada;

9.° As decorações conferidas a estrangeiros;

10.° As portarias das licenças aos Ministros de Estado effectivos, pelas mercês estrangeiras que lhes foram concedidas;

11.° As mercês concedidas a praças de pret do exercito e da armada;

12.° As decorações conferidas a operarios pela sua applicação ao trabalho;

13.° As decorações dos graus de official e cavalleiro da ordem do Merito Agricola e Industrial conferidas a mestres, contra-mestres, feitores, regentes agricolas e operarios;

14.° Os foros que pertencerem por successão, ou que por lei ou estilo competirem a empregos publicos;

15.° Os diplomas de grandeza que se expedirem aos Pares do Reino, as cartas de conselho, brasão de armas, tratamento ou distincções que por lei ou estão competirem a empregos publicos ou forem annexos a outro titulo ou dignidade;

16.° Os diplomas de approvação de estatutos de associações de classe;

17.° Quaesquer outras mercês expressamente isentas por lei.

§ unico. O Governo poderá reduzir a uma terça parte o imposto de mercês honorificas conferidas a officiaes do exercito e da armada, ou a empregados publicos, por serviços distinctos no exercicio das suas funcções e bem assim poderá dispensar o pagamento de toda a importancia do mesmo imposto aos agraciados por serviços relevantes prestados em combate contra o inimigo, por distincto é provado merito literario, scientifico ou artistico, ou por acto singular e publico de devoção civica.

Art. 11.° É o Governo autorizado a codificar num só diploma todas as disposições em vigor acêrca dos direitos de mercê e emolumentos das Secretarias de Estado, a reorganizar a tabeliã do imposto de mercês de conformidade com a presente lei, e a fazer o necessario regulamento para assegurar a cobrança do mesmo imposto e simplificar os serviços, com tanto que não aumente as taxas ou percentagens estabelecidas, nem altere as penas comminadas nas respectivas leis ou regulamentos.

Art. 12.° E o Governo autorizado a mandar proceder a novas lotações de logares civis e ecclesiasticos que não tenham vencimento certo, publicando-se para esse fim um decreto fundamentado.

§ unico. Qualquer alteração futura ou lotação de novo emprego tem de ser motivada em decreto fundamentado, e só começará a vigorar depois de publicado no Diario ao Governo.

Art. 13.° Fica revogada a legislação em contrario.

Secretaria de Estado dos Negocios da Fazenda, aos 16 de agosto de 1905. = Manoel Affonso de Espregueira.

Proposta de lei n.° 10-J

Construcção de hoteis

Artigo 1.° É o Governo autorizado a conceder aos individuos, empresas ou sociedades que construirem no continente do reino e ilhas adjacentes edificios proprios para a installação de hotéis ou casas destinadas ao serviço de hospedes, nas condições enumeradas no artigo 2.°, as seguintes vantagens:

1.ª Isenção do pagamento da contribuição de registo pela acquisição dos terrenos e edificios necessarios para a construcção dos novos hoteis ou casas para hospedes;

2.ª Isenção da contribuição predial durante dez annos a contar do primeiro anno em que o estabelecimento for aberto ao publico;

3.ª Isenção da contribuição industrial e de renda de casas durante quinze annos a contar do mesmo anno;

4.ª Isenção do imposto do sêllo nas acções das sociedades que se constituirem para esse fim exclusivo, e nos annuncios e reclamos até tres annos depois de aberto ao publico o estabelecimento.

§ unico. Nenhuma contribuição especial poderá ser lançada pelas corporações municipaes sobre a exploração d'estes estabelecimentos, qualquer que seja o motivo ou fundamento, exceptuando-se em todo o caso os impostos geraes de consumo que forem cobrados por conta do Estado e dos municipios, e os demais não expressamente designados nos n.ºs 1.°, 2.°, 3.° e 4.° d'este artigo.

Art. 2.° Para serem concedidas as isenções mencionadas no artigo antecedente deverão ser satisfeitas as seguintes condições:

1.º O projecto para a construcção dos edificios, com todos os esclarecimentos necessarios, será apresentado ao Governo, que, ouvidas as estações competentes, poderá introduzir todas as modificações tendentes a melhorar as

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condições de salubridade e do apropriação aos fins a que as differentes edificações forem destinadas;

2.ª Os edificios ficarão completamente isolados por todos os lados, e de modo que não possam executar-se quaesquer outras construcções a distancia inferior a quinze metros das suas faces exteriores, com excepção unica das dependencias proprias dos hoteis;

3.ª Haverá contiguo aos hoteis um espaço livre de construcção, tendo pelo menos uma superficie igual ao triplo da que for occupada pelos hoteis e dependencias, o qual será arborizado ou ajardinado, e conservado sempre em bom estado, ficando reservado para uso dos hospedes;

4.ª Nenhum hotel poderá conter menos de cem quartos nos concelhos de Lisboa e Porto, e de cincocnta nos demais concelhos, recebendo todos directamente ar e luz da parte exterior. Haverá casas para banhos, salas de recepção, de leitura e de recreio proporcionadas á grandeza do edificio. Serão illuminados a luz eléctrica com os apparelhos mais aperfeiçoados, e haverá até o ultimo andar elevadores para o serviço e para os hospedes;

5.ª Na approvação dos projectos fixar-se-ha o prazo para a completa execução dos trabalhos e começo da exploração, não podendo aquelle prazo ser superior a tres annos, a contar da data da approvação dos projectos.

Art. 3.° Em decreto especial, ouvidas as estações competentes dos Ministerios do Reino, Fazenda e Obras Publicas, estabelecerá o Governo o programma para a organização dos projectos e construcções dos edificios, com todos os promenores necessarios para se fixar a capacidade minima e a disposição das differentes partes dos hoteis, á semelhança do que se pratica nos países em que ha melhores construcções d’este genero, acautelando-se os interesses do Estado para o caso de não se concluirem os edificios no prazo que for fixado, ou de se lhes dar durante o prazo da concessão outro destino.

Art. 4.° As vantagens mencionadas no artigo 1.° poderão ser concedidas aos donos dos hoteis que actualmente existem, uma vez que executem nelles as obras de reconstrucção, ampliação e de melhoramento indispensaveis para que esses estabelecimentos satisfaçam completamente a todas as condições exigidas para as novas edificações.

Art. 5.° Fica revogada a legislação em contrario.

Secretarias de Estado dos Negocios do Reino, Fazenda e Obras Publicas, aos 16 de agosto de 1905. = Eduardo José Coelho = Manoel Affonso de Espregueira = D. João de Alarcão Velasques Sarmento Osorio.

Proposta de lei n.° 7

Inquerito sobre as causas de maior indico de mortalidade em differentes povoações do reino

Artigo 1.° O Governo mandará proceder no continente do reino e ilhas adjacentes a inquerito local sobre as causas determinantes da existencia de indice de mortalidade superior á media normal no respectivo districto, a fim de serem tomadas as providencias precisas para o desapparecimento ou attenuação d’essas causas.

§ 1.° Para esse fim serão nomeadas commissões compostas do director de obras publicas ou de um engenheiro de obras publicas ou de minas e do secretario geral do governo civil do respectivo disiricto, devendo em cada concelho esta commissão funccionar mais com o delegado ou sub-delegado de saude, um vogal nomeado pela respectiva camara municipal, o medico de partido e ouvindo sempre o parocho da freguesia respectiva.

§ 2.° A centralização e a direcção dos trabalhos do inquerito será feita pela Direcção Geral da Estatistica e dos Proprios Nacionaes.

§ 3.° Para as despesas de expediente e de deslocação dos membros das commissões é autorizada a despesa extraordinaria de 6:000$000 réis para o actual anno economico.

Art. 2.° Fica revogada a legislação em contrario.

Secretaria de Estado dos Negocios do Reino, da Fazenda, e das Obras Publicas, aos 16 de agosto de 1905. = Eduardo José Coelho = Manoel Affonso de Espregueira = D. João de Alarcão Velasques Sarmento Osorio.

Proposta de lei n° 10-L

Reforma da pauta geral das alfandegas

Artigo 1.° São approvadas para o continente do reino e ilhas adjacentes as pautas dos direitos de importação e exportação annexas á presente lei e que d’ella fazem parte integrante, as quaes começarão a vigorar no mesmo dia, que o Governo posteriormente designar, em todas as alfandegas do continente do reino e ilhas adjacentes.

§ 1.° O Governo, ouvidas as estações competentes, publicará juntamente com a pauta geral as necessarias instrucções preliminares e o indice remissivo.

§ 2.° Continuarão subsistindo os regimes especiaes em vigor na data da publicação da nova pauta.

Art. 2.° Fica revogada a legislação em contrario.

Secretaria de Estado dos Negocios da Fazenda, aos 16 de agosto de 1905. = Manoel Affonso de Espregueira.

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PAUTA DOS DIREITOS DE IMPORTAÇÃO

CLASSE 1.ª

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CLASSE 3.º

Fios tecidos, feltros e respectivas obras

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(a) Estão comprehendidos neste artigo os lençod em peça e os chales.

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CLASSE 4.ª

Substancias alimenticias

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CLASSE 5.ª

Apparelhos, instrumentos, machinas e utensilios empregados na sciencia, nas artes, na industria e na agricultura; armas, embarcações e vehiculo s

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CLASSE 6.ª

Manufacturas diversas

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PAUTA DOS DIREITOS DE EXPORTAÇÃO

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PAUTA DE REEXPORTAÇÃO E BALDEAÇÃO

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Proposta de lei n.° 10-M

Senhores.— Convindo regularizar a situação da contabilidade de diversos Ministerios, em relação aos exercicios, de 1900—1901 e anteriores até o autual, para que possam ser satisfeitas as despesas que se achara em divida, e legalizadas outras que, não obstante estarem pagas, não foram ainda incluidas nas respectivas contas por falta de verba, ampliando-se ao mesmo tempo, para o exercicio corrente, alguns capitulos da despesa de differentes Ministerios, por serem reconhecidamente insuficientes as verbas autorizadas, tenho a honra de submetter á vossa apreciação a proposta de lei, de que em seguida tereis conhecimento.

Segundo os apuramentos feitos a situação dos diversos Ministerios em relação a 31 de outubro de 1904, era a seguinte, dividida em quatro grupos:

[Ver quadro na imagem]

O desdobramento d’estas importancias por exercicios e ministerios é a seguinte:

Anteriores ao exercicio de 1900-1901

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Exercicio de 1900-1901

[Ver tabela na imagem]

Exercicio de 1901-1902

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e mais detalhadamente se encontram ainda no seguinte mappa, em relação a cada um dos quatro grupos em que acima

Mappa por ministerios, das importancias liquidadas e em divida, e das liquidadas e pagas por supprimentos mas Dão legalizadas dos exerci

mas são encargo; do corrente exercido de 1904-1905 em virtude de contratos, e bem as

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em divididas:

900-1901 a 1904-1905 e anteriores a 1 de julho de 1900, com referencia a 31 de outubro de 1901; das que ainda não foram liquidadas nellas com que, alem das anteriores, se torna necessario reforçar as tabellas do mesmo exercicio

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Proposta de lei

Artigo 1.° É o Governo autorizado a abrir no Ministerio dos Negocios da Fazenda creditos especiaes a favor dos diversos ministerios, conforme o mappa junto a esta lei e que della faz parte, para pagamento das despesas liquidadas e em divida, das que estão pagas mas não legalizadas e das que se julga haverá que liquidar até ao fim do corrente exercicio de 1904-1900, por importancias superiores ás verbas das respectivas tabellas.

Art. 2.° As despesas de exercicios anteriores ao de 1900-1901 serão escrituradas, de conformidade com os preceitos do regulamento de contabilidade publica e nos termos desta lei, no exercicio de 1904-1905, designadamente como despesas de exercicios findos anteriores áquelle, devidamente classificadas, e com indicação dos exercicios a que pertencerem. As despesas dos exercicios de 1900-1901 até ao de 1903-1904, devidamente classificadas nos termos estabelecidos, serão incluidas nas contas dos respectivos exercicios, que, sem embargo do preceituado no regulamento de Contabilidade Publica serão abertos para cumprimento d’esta disposição e novamente encerrados.

Art. 3.° Fica revogada a legislação era contrario.

Secretaria de Estado dos Negocios da Fazenda, aos 16 de agosto de 1900. = Manoel Affonso de Espregueira.

Mappa a que se refere a lei datada de hoje, das importancias dos creditos a abrir para despesas ordinarias e extraordinarias, a favor dos ministerios nelle indicados.

[Ver mapa na imagem]

Secretaria de Estado dos Negocios da Fazenda, aos 16 de agosto de 1905. = Manoel Affonso de Espregueira.

Foram enviadas á commissão de fazenda.

Representação

Da classe operaria de Abrantes, pedindo que não seja approvada a lei de 13 de fevereiro de 1896. Enviada á commissão de legislação criminal.

O REDACTOR = Luiz de Moraes Carvalho.

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