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266 DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS

ácerca d'este procedimento um juiz completo e exacto. (Apoiados)

Não succedeu porém assim. O illustre deputado o sr. Barros Gomes entendeu, sem duvida no pleno uso do seu direito, que podia antecipar-se a esse momento, que no meu conceito era o único opportuno, e trouxe desde já á camara, não toda, mas uma parte da questão do Zaire, a parte que se refere á negociação do tratado findo com a Inglaterra, parte todavia, que pela maneira porque s. exa. tratou este assumpto, foi acrescentada de varias considerações e addicionada de divagações, que embora revelem em s. exa. uma grande erudição diplomática, com o grave inconveniente de trazerem á discussão assumptos de que, n'este momento, não posso, não devo occupar-me.

Reconheceu s. exa. que a posição de deputado é diversa da posição de ministro quando se trata de assumptos internacionaes.

Reconheceu, nem podia deixar de reconhecer que a posição de deputado é mais livre nas suas apreciações, a de ministro sujeita às reservas diplomaticas. Daqui concluo que o illustre deputado não estranhará que eu não possa acompanhal-o em todo o desenvolvimento que elle quiz dar às suas apreciações.

Por deferencia, pois, para com s. exa. e para com a camara farei uma breve analyse, cingindo-me aos pontos mais essenciaes, do que s. exa. disse com respeito a um tratado findo, ao tratado de 20 de fevereiro, referindo-me ao que eu entendo que não pode prejudicar as relações internacionaes do nosso paiz.

O que é, porém, estranho á negociação do tratado de 26 de fevereiro, ficará para ser devidamente apreciado quando o governo poder apresentar á camara os documentos que servem de justificação e de elucidação ao seu procedimento, a fim de que a camara e o paiz o possa devidamente avaliar.

Considerou o illustre deputado, o sr. Barros Gomes, errada a apreciação que o governo fazia da situação, da Europa, ao encetar a negociação do tratado.

Parece, que desde o primeiro momento que se iniciaram as negociações, o illustre deputado considera errada a marcha adoptada pelo governo; mas está bem longe de o haver justificado.

Começa o illustre deputado por commetter uma notavel omissão, tomando por ponte de partida estas negociações, e deixando no escuro os antecedentes que as determinaram.

É preciso partir de mais longe; é preciso que se attenda á situação em que estava o nosso paiz para com a Inglaterra, em relação aos nossos territorios do Zaire; ahi está a explicação, a justificação do tratado.

O illustre deputado, assim como todos os membros d'esta camara, sabem quaes foram os motivos que determinaram o governo a encetar as negociações, e que são a mais cabal justificação do seu procedimento.

O governo tinha a peito por termo a uma situação que durava ha muito, e importava uma grave injustiça.

É esta a origem do tratado, a que o illustre deputado não parece ter dado o devido valor.

Todos sabem que os direitos de Portugal ao baixo Zaire nos territórios comprehendidos entre 8º 5'12" de latitude, andam contestados proximamente ha quarenta annos pela Inglaterra; e têem sido contestados de uma maneira decisiva e violenta, com expressa intimação a Portugal de não praticar acto de soberania n'aquelle territorio, sob pena de encontrar opposição armada da parte da Inglaterra.

Este foi o acto inicial, praticado ha quarenta annos.

Protestou então contra elle o governo portuguez, não ha duvida.

Contra tamanha injustiça reclamou energicamente um dos nossos representantes na curte da Gran-Bretanha, um dos nossos diplomatas mais distinctos, que não podemos esquecer, e devemos collocar com justiça pelos seus dotes de intelligencia e de acrysolado patriotismo ao lado de outro que citou com justo louvor o illustre deputado, o sr. Barros Gomes.

Refiro-me ao conde de Lavradio.

O sr. Barros Gomes: - Apoiado.

O Orador: - O conde de Lavradio reclamou energicamente contra essa injustiça, contra essa violência, sustentaram essas reclamações, no decurso dos tempos todos os governos: mas sustentaram-n'as apenas com o seu protesto, sem todavia quebrar as relações com o governo da Gran Bretanha, sem se apartarem da antiga alliança com aquela nação, que importantes interesses nacionaes nos aconselhavam a manter e sem que em tempo algum se pensasse em recorrer da Inglaterra para as outras potências, appellando para uma conferencia internacional ou para a decisão de um tribunal arbitral.

Na interpretação forçada e expressa dos direitos reservados, como se essa interpretação podesse significar direitos não admittidos em antigos tratados, fundara a Inglaterra a sua recusa a que nós occupassemos territórios que por direitos antigos e incontestáveis nos pertenciam; e a despeito d'essa injustiça conservou Portugal, e conservou bem, as suas relações com um paiz amigo.

Esta situação, repito, prolongou-se por um largo período durante o qual estiveram no poder differentes ministérios, occupando a pasta dos negócios estrangeiros homens eminentes, distinctos pela sua intelligencia e caracter e de um incontestável patriotismo.

Bastar-me ha citar o marquez de Sá e o duque de Loulé, duque d'Avilla e de Bolama, o sr. João de Andrade Corvo, e ainda citarei o nobre chefe do partido progressista o sr. Anselmo Braamcamp.

Todos esses distinctos estadistas como ministros dos negócios estrangeiros, ou de qualquer das outras pastas, sustentaram apenas o protesto contra a injustiça que nos era feita; mas nenhum pensou em solicitar uma conferencia, nem em sujeitar esta questão a uma arbitragem.

Todavia, creio tinha precedente:

De um lado estava Portugal que apresentava títulos incontestáveis em defeza dos seus direitos.

Do outro lado uma nação amiga e poderosa, que não discutia verdadeiramente a authenticidade dos direitos, mas se oppunha pela forca ao exercicio d'aquelles direitos.

Não procedia assim porque tivesse melhores direitos, ou porque os quizesse reconhecer a outrem; allegava outras razões que todos conhecem.

Durante esse largo período nenhuma outra nação procurou occupar aquelles territórios que ficaram jacentes.

Respeitaram todos os direitos do Portugal, mas não póde exercer-se ali de facto a nossa soberania.

Se em taes circumstancias nunca se appellou nem para uma arbitragem, nem para uma conferencia, é porque peza no animo dos nossos estadistas a consideração dos inconvenientes que resultariam de uma resistencia mais energica á nossa antiga alhada.

N'isto foram sempre conformes os governos, qualquer que fosse a sua procedência politica.

Achavamo-nos, pois, numa situação desagradavel com a Gran-Bretanha, situação de que outros governos haviam de balde procurado libertar-nos, mas de que todo o governo patriótico deveria empregar constantes esforços para fazer sair o nosso paiz, quando em fins do anno de 1882 o ministerio, de que eu agora tenho a honra de fazer parte, procurou pôr-lhe termo, e desta vez com mais feliz exito.

Começaram as negociações com a Inglaterra e com ella só; nem de outro modo se podia proceder.

A quem, senão á Inglaterra nos havíamos do dirigir, se ella era a única nação que nos impedia a occupação dos territórios do baixo Zaire?