SESSÃO DE 27 DE JANEIRO DE 1886 221
fluiram ou não nas occorrencias lamentaveis que se deram ultimamente.
Com relação á phrase do sr. Eduardo Coelho a que os meus amigos alteraram, por meio de uma emboscada, a divisão das assembléas eleitoraes, devo dizer que essa alteração não foi feita por emboscada; foi feita com conhecimento de todos e tanto que se deram na camara municipal os acontecimentos a que me referi, não se tendo ainda procedido, por signal, como s. exa. sabe, contra quem os promoveu.
Não quero occupar a attenção da camara com um assumpto que não é de interesse geral. Limito-me a pedir agora aos srs. ministros do reino e da justiça, ao governo emfim, que, já que por meras affirmações do sr. Eduardo Coelho se deu pressa em syndicar dos actos do digno administrador, e suspendel-o por lhe parecerem irregulares os factos que se deram na eleição, leve adiante o seu sentimento de justiça até averiguar quaes as responsabilidades dos magistrados judiciaes d'aquella comarca. (Apoiados.) É isto só o que eu desejo.
O sr. Barros Gomes: - Queria chamar a attenção do sr. ministro do reino, mas pedia a v. exa. que alterasse a inscripção e que em seguida ao orador que acaba de fallar, concedesse a palavra ao sr. Eduardo Coelho.
O sr. Eduardo Coelho: - Pedindo novamente a palavra para responder ao deputado, o sr. Castello Branco, disse que não queria alongar o debato, visto que o poder judicial, representado por um digno magistrado na comarca de Valle Passos, não está em discussão. Disse que ao exposto acrescia que o illustre representante do circulo de Valle Passos tinha sido muito moderado e circumspecto nas suas apreciações, dizendo que não punha em duvida a integridade de qualquer magistrado. Disse que neste estado da questão, e limitando-se o seu amigo e collega a pedir ao ministro da justiça, que inquirisse ácerca da administração da justiça n'aquella comarca, não tinha que oppor. Que lhe parecia haver equivoco, mas emfim que o governo inquirisse o que julgasse conveniente aos interesses da causa publica. Ponderou, que não havendo accusações contra o poder judicial, como o sr. ministro da justiça afirmou comprehendia o que se queria indicar como irregularidades na administração da justiça.
Declarou que, a haver as indagações pedidas, tinha a firme convicção, de que tudo viria confirmar o que elle, orador, já tinha dito e agora repete: que o poder judicial está isento de todas as responsabilidades nos acontecimentos alludidos, e até na agitação que desde certo tempo se manifesta n'aquelles povos. Mostrou o orador, que o juiz Albano Rodrigues Coelho exerceu ali jurisdicção por espaço de seis annos, e este magistrado, alem de integro, era de um génio conciliador, incapaz de incitar, ou dar forca a quaesquer paixões, das quaes esteve sempre isento. Demonstrou que, depois de terminado ali o sextennio, este magistrado se aposentara, seguindo-se uma longa interinidade, a qual era imputável ao governo. Disse que o juiz substituto era um cavalheiro digno e serio, mas filiado na política governamental, e que ainda por este lado não podia o partido governamental queixar-se do poder judicial.
Disse que o actual juiz de direito ha pouco mais de um mez exerce jurisdicção na comarca de Valle Passos, e por isso não parece a elle, orador, que possam observar-se os seus actos, como tendo influencia nos acontecimentos ; alem de que, como elle, orador, já disse, aquelle magistrado não é capaz de faltar á dignidade do cargo e do poder que representa. O orador fez ainda outras considerações sobre este assumpto, terminando por dizer, que a resposta do sr. ministro da justiça a uma pergunta, que lhe fizera, dizendo que nada havia contra o judicial, não o auctorisava a proseguir neste incidente.
O sr. Ministro da Justiça (Manuel d'Assumpção): - Acho justíssimo o pedido que fez o illustre deputado e meu amigo, o ar. Azevedo Castello Branco, de indagar do modo por que é administrada a justiça na comarca de Valle Passos; é um dever do governo e o governo vae cumprir, disse hontem; não disse, que ia mandar proceder a syndicancias contra o juiz da comarca de Valle Passos; disse que ia inquirir do que lá se passava e depois de informado proceder segundo as leis me auctorisavam.
Até hontem, não havia no ministerio queixa alguma contra os magistrados ou funccionarios d'aquella comarca, que me auctorisasse a proceder.
Hontem, porém, o illustre deputado chamou a minha attenção e fez accusações contra funccionarios e magistrados, e eu disse que ia tratar de inquirir.
Hoje entraram no ministerio da justiça documentos que que levam a proceder com toda a energia, e para não fatigar a camara lerei apenas uns períodos de um officio do ajudante do procurador régio do Porto, que me parece dão graves indicações.
Este officio, dirigido ao delegado da comarca de Valle Passos, diz o seguinte:
(Leu.}
É assignado pelo sr. Augusto Maria de Castro e traz a data de 26.
(Leu.)
O sr. Azevedo Castello Branco: - Ouçam, ouçam.
Vozes: - Ouçam, ouçam.
O Orador: - A manifestação da camara não póde apenas significar a attenção que lhe merece o que terminei de ler.
O magistrado que assigna esta declaração sabe cumprir os seus deveres e obrigar os seus subordinados a cumpril-os igualmente, e é por isso que eu lhe dou todo o valor.
Posso assegurar á camara, que se hão de cumprir aã leis e que a administração da justiça na camara de Valle Passos ha de entrar nos seus justos limites.
O sr. Barros Gomes: - Pedi a palavra por ver na bancada do governo o sr. ministro do reino, e tambem por se achar a seu lado o illustre ministro da justiça, cuja3 tendências artisticas são conhecidas e têem até sido celebradas pela imprensa periódica. O meu intento é chamar a attenção do governo para o estado em que só encontra uma preciosidade artística das muito poucas que nós possuímos em Lisboa, e que attrahindo a attenção dos estrangeiros, não parece infelizmente haver fixado a dos nacionaes tanto quanto baste para a preservar da ruína imminente, que a está ameaçando.
Existe na igreja das Mercês uma téla de Rubens, cuja authenticidade póde dizer-se indisputável. Quando muitos outros elementos, como a tradição constante, o estylo peculiar, o cunho da escola não bastassem para o confirmar, é certo haver desde muito uma auctoridade eminente, como o é em tudo quanto se refere a assumptos de bellas artes em Portugal, o conde de Rackzinsky, declarando ao tratar dos quadros, por muitos títulos notáveis que se encontram na freguezia das Mercês, o que está representando o Christo triumphante era incontestavelmente um quadro de Rubens e acrescentava ainda o conde: «uma das mais nobres e elevadas producções do grande artista flamengo.» Noutro logar da sua bem conhecida obra As artes em Portugal, elle dá a existência desse quadro como uma das provas de quanto antigamente o gosto pelas bellas artes se havia desenvolvido em Portugal, sabendo-se apreciar entre nós os bons trabalhos dos grandes mestres.
Tendo, pois, a fortuna de conservar um primor de arte tão notável, é muito para lamentar que nenhum governo, e n'isto não vae censura ao actual, visto referir-me a todos, tenha até agora diligenciado que esse quadro vá enriquecer a nossa collecção do museu nacional. Está claro que é necessario para isso alcançar o consentimento, ou da junta de parochia ou da irmandade respectiva; não sabendo qual das duas entidades é que póde auctorisar a saída d'aquella obra de arte da igreja das Mercês. É certo