SESSÃO DE 27 DE JANEIRO DE 1886 227
pelos illustres exploradores, não necessitava novamente apresentar às côrtes a sua opinião a esse respeito.
Aqui está a rasão da omissão - omissão, que não o foi - porque o governo em tempo competente apresentou às côrtes o documento em que mostrava que effectivamente se tinha feito tal travessia e associou-se com o parlamento aos applausos perfeitamente merecidos, com que elle saudou aquelle illustre facto. Aqui tem portanto a resposta, por parte do governo, á omissão citada pelo illustre deputado.
Se acaso não fosse esta a consideração que nos tivesse movido, não fosse este facto que nos impedia de na minha opinião e na do governo, ter novamente de tratar aquelle assumpto, nós não podiamos deixar de tomar a iniciativa sobre este objecto, e por todos os modos ao nosso alcance, afirmarmos mais uma vez a nossa admiração e a nossa consideração, pelo facto praticado pelos dois illustres exploradores Capello e Ivens.
Vozes: - Muito bem.
(S. exa. não reviu as notas tachygraphicas.)
O sr. Elias Garcia: - Mantenho a opinião, que mais de uma vez apresentei nesta camara, de que é este o ensejo mais apropriado, para apreciar a politica do governo; e quando tantas vezes se repete ser indispensavel tratar principalmente das questões de finanças e de administração, quando mesmo n'este documento se diz, que se o anno anterior for destinado ao exame das questões politicas, esta sessão legislativa deverá ser consagrada às questões de administração e de finanças, mais me confirmo na opinião de que convem abrir debate sobre este documento, desembaraçar completamente o terreno, para que não estejamos a tratar da politica por incidentes e para que a façamos com toda a franqueza, com toda a lealdade, com toda a lisura.
Bem sei que os incidentes já debatidos nesta camara, de algum modo nos dão a feição politica do governo, nos mostram como elle procedeu no intervallo parlamentar, mas nem por isso entendo que seja desnecessário accentuar mais, qual foi a politica do governo, qual é a politica que elle tem, e qual é principalmente a politica que elle se propõe seguir, pelo programma ou pela indicação dos trabalhos, para os quaes chama a attenção da camara.
Diz-se em um dos trechos do discurso da coroa, e na parte correspondente da resposta, que serão apresentadas ao parlamento medidas ou providencias que provejam às necessidades urgentes da administração, mas o governo abstem-se cautelosamente de dizer quaes são essas necessidades urgentes da administração, que trata de attender; quaes são as provincias da administração a que se referem as propostas que tenciona apresentar.
É certo que no mesmo documento se diz logo, que todas essas providencias merecerão, sem duvida, o exame attento da camara, mas que nenhuma occupará por certo, tão particularmente, a sua attenção, como os negócios que dizem respeito ao thesouro publico.
É certo, que um dos nossos mais distinctos publicistas, ha pouco escrevia, que deveriamos principalmente tratar das finanças, e era essa a politica que nos devia occupar; e afigura-se-me que o illustre chefe do partido progressista, que ha pouco acabou de fazer a declaração de que se abstinha de entrar no debate sobre a resposta ao discurso da coroa, por pretender occupar-se principalmente da questão financeira,afigura-se-me, digo, que o illustre chefe do partido progressista perfilha exactamente a opinião do publicista que me referi. Esse publicista dizia que as finanças deviam ser a nossa politica e por essa occasião lembrava a phrase do barão Luiz: "Dae-me boa politica, dar-vos-hei boas finanças".
Parece-me que o publicista a que me referi, e o chefe do partido progressista confundem e baralham o que não se póde confundir nem baralhar.
Elles entendem que póde haver boas finanças sem boa politica, ou julgam que a politica e as finanças são como os dois factores de um producto que se podem alterar na sua ordem.
Entendo que estão enganados; só politica boa é que póde dar boas finanças. Por isso entendo que a primeira cousa de que precisa um parlamento é definir clara e terminantemente a sua posição em presença do governo, para que se saiba bem qual é a politica que tem o governo, e a que toem os que o não seguem. Depois podemos entrar serenamente das questões de administração, tratando-as cada um segundo o seu credo, as suas opiniões e os seus intuitos politicos.
Effectivamente, sr. presidente, o illustre publicista a que me refiro, tem tratado das finanças, e não só elle mas outro escriptor igualmente competente no assumpto; quer um, quer outro, andam ha tempos para cá enlevados no estudo de saber qual é o estado do nosso thesouro, e um e outro tratam com igual solicitude, e igual carinho, de saber se a nossa situação financeira é mais ou menos grave do que foi em outros periodos do governo constitucional. E estes dois contendores não são inimigos, nem sequer mesmo adversários; e é notável que um e outro recommendem cautela e moderação nas despezas, e cheguem a este resultado partindo de pontos inteiramente oppostos. Um diz que o nosso deficit não é um facto que se apresente fimples e unicamente como uma anomalia, como uma excepção; pelo contrario o nosso deficit é persistente, systematicamente persistente e systematicamente crescente, ao passo que o outro assegura que o deficit declina e por isso é cada vez menor.
E assim que, comparando dois periodos financeiros; no periodo que decorre de 1868-1860 até 1876-1877, nove an-nos económicos, as receitas tiveram um augmento médio annual de 1.132:000$000 reis; ao passo que as despezas, no mesmo periodo tiveram o augmento médio annual de 854:000$000 réis, vindo assim a haver entre as receitas o as despezas o saldo favorável para as receitas, 276:000$000 réis.
Isto, como disse, no periodo de 1868 a 1877; ao passo que, no periodo de sete annos que decorre de 1877-1878 a 1883-1884 houve nas receitas o augmento medio ansual de 708:000$6000 réis e nas despezas o augmento medio annual de nada menos de 722:000$000 réis, o que quer dizer que em vez de haver saldo favoravel para as receitas, havia um deficit medio annual de 14:000$000 réis.
Ora, como os dois illustres contendores chegaram á conclusão de que era indispensável attender ao estado do nosso thesouro, e que era necessario moderar as nossas despezas; e um disse que o deficit tinha decrescido, ao passo que outro asseverou que o deficit tinha augmentado, ha portanto aqui algum erro, que se insinuou nos elementos que a nossa contabilidade nos apresenta, erro que induziu provavelmente os dois apreciadores e criticos do estado do nosso thesouro a chegarem a conclusões inteiramente diversas.
Sr. presidente, n'este ponto eu não faço reparos absolutamente nenhuns às observações feitas por parte dos que sustentam que o deficit não é tão grande como se afigurou a outros; noto apenas a explicação dada, e é que no periodo de 1877-1878 a 1883-1884, em um dos annos, uma verba das receitas figura por uma importância muito grande, ao passo que nos últimos annos essa importancia estava largamente reduzida; de forma que era indispensável applicar uma rectificação áquelles elementos, e applicando essa rectificação, em vez de se encontrar oaugmento de deficit, achava-se diminuição, porque nesse caso o augmento das receitas n'aquelle periodo era de 5.253:000$000 réis; e o augmento das despezas de 4.336:000$000 réis; e o que dava uma differença entre a receita e a despeza de 917 contos. E, sr. presidente, cousa singular, este augmento de 9l7:000$000 réis, distribuido pelos sete annos, dá uma diminuição do deficit de 131:000$000 réis por anno; e eu não tenho agora aqui á mão o deficit do anno de