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SESSÃO DE 30 DE ABRIL DE 1887

Presidencia do exmo. sr. José Maria Rodrigues de Carvalho

Secretarios os exmos. srs.:

Francisco José Medeiros
Francisco José Machado

SUMMARIO

Presta juramento e lema assento o sr. José Severino de Avellar. - Allocução lida peio sr. presidente a Sua Majestade, felicitando pelo anniversario da outorga da carta constituicional e resposta de El-Rei.- Dá-se conhecimento de sete officios, sendo dois do ministerio da fazenda, um do da justiça, outro do ministerio dos negocios estrangeiros, outro do da marinha, outro do ministerio do reino e um da associação commercial do Perto. - Têem segunda leitura e são admittidas tres propostas para renovação de iniciativa, apresentadas, uma pelo sr. Moraes a Sarmento. outra pelo sr. Antonio Candido e a terceira pelo sr. Fernandes Vaz. - Diversas apresentadas.- Diversas representações apresentadas pelos srs. presidente e Firminoo João Lopes. - Requerimentos de interesse publico, mamandados para a mesa pelos srs. Oliveira Valle, Alfredo Brandão e Pinheiro Chagas, e outros do interesse particular apresentados pelos srs. Avellar Machado, Oliveira Valle e Sousa Machado. - Justificações de faltas dos srs. Antonio Maria de Carvalho, Joaquim da Fonseca, Silva Cordeiro, Oliveira Valle, Santiago, Cardoso Vidente e Souto Rodrigues. - Dispensa-se o regimento para entrar em discussão o parecer relativo á eleição do circulo de Sotavento de Cabo Verde, que é logo approvado, sendo em seguida proclamado o sr. Augusto Pinto de Miranda Montenegro. - Sob proposta do sr. Valle resolve-se aggregar o sr. Francisco Matoso á commissão de legislação commercial. - O sr. Guilherme de Abreu associa-se ás considerações feitas pelo sr. Alves de Moura em favor da construcção da estrada de Braga a Chaves. - Sob proposta do sr. Ennes resolve-se que a mesa nomeie as commissão que faltam. - O sr. Arroyo chama a attenção do governo para dois assumptos. Responde, o sr. ministro do reino. - O sr. Avellar Machado pede explicações sobre irregularidades que, diz, se estão praticando na administração do districto de Santarem. Responde-lhe o sr. presidente do conselho. - O sr. Consiglieri Pedroso interroga o governo ácerca da não execução do artigo 11.° do decreto de 12 de agosto de 1886. Responde-lhe o sr. ministro do reino. Usa novamente da palavra sobre o mesmo assumpto o sr. Consiglieri, respondendo-lhe segunda vez o sr. ministro. - O sr. visconde de Monsaraz participa que se acha constituida a commissão do bill. - Trocam se explicações entre o sr. Pinheiro Chagas e os srs. ministros das obras publicas e do reino; com o primeiro ácerca da escola Rodrigues Sampaio e com o segundo a respeito da suspensão do artigo 11.° do decreto de 12 de agosto de 1886, e sobre uma noticia relativa ao chalet da casa pia de Lisboa.

Na ordem do dia continua em discussão a questão prévia, relativamente ao processo eleitoral de circulo de Felgueiras. Usa em primeiro logar da palavra, combatendo o parecer da commissão, o sr. Franco Castello Branco, que sustenta uma moção de ordem. Responde-lhe o sr. Silva Cordeiro, que apresenta tambem uma moção. - Approva-se uma proposta do sr. presidente do conselho, para que o sr. Lopo Vaz possa accumular as suas funcções legislativas com as de vogal effectivo do supremo tribunal administrativo. - Combate o parecer em discussão o sr. Marçal Pacheco, que apresenta tambem uma proposta.

Abertura da sessão - Ás duas horas e meia da tarde.

Presentes á chamada 69 srs. deputados. São os seguintes:- Alfredo Brandão, Alfredo Pereira, Alves da Fonseca, Antonio Castello Branco, Campos Valdez, Oliveira Pacheco, Antonio Ennes, Gomes Neto, Tavares Crespo, Moraes Sarmento, Antonio Maria de Carvalho, Mazzietti, Hintze Ribeiro, Augusto Pimentel, Eduardo de Abreu, Eduardo José Coelho, Fernando Coutinho (D.) Firmino Lopes, Francisco Beirão, Francisco de Barros, Francisco Matoso, Fernandes Voz, Francisco Machado, Francisco de Medeiros, Lucena e Faro, Severino de Avellar, Frederico Arouca, Guilherme de Abreu, Sá Nogueira, Pires Villar, João Pina, Cardoso Valente, Izidro dos Reis, Dias Gallas, Santiago Gouveia, João Arroyo, Menezes Parreira, Teixeira de Vasconcellos, Sousa Machado, Correia Leal, Silva Cordeiro, Joaquim da Veiga, Oliveira Valle, Oliveira Martins, Avellar Machado, Barbosa Collen, Ferreira Galvão, José Castello Branco, Pereira o Matos, Abreu Castello Branco, Vasconcellos Gusmão, José de Napoles, Ferreira Freire, José Maria de Andrade, Rodrigues de Carvalho. José de Saldanha (D,), S;uitOá Moreira, Julio Graça, Luiz José Dias, Manuel José Correia, Pinheiro Chagas, Marçal Pacheco, Marianno Prezado, Miguel da Silveira, Miguel Dantas, Pedro Victor, Estrella Braga, Visconde de Silves e Casiglieri Pedroso.

Entraram durante a sessão os srs.: - Anselmo de Andrade, Baptista de Sousa, Antonio Candido, Antonio Centeno, Antonio Villaça, Ribeiro Ferreira, Antonio da Fonseca, Pereira Borges, Guimarães Pedrosa, Fontes Ganhado, Pereira Carrilho, Urbano de Castro, Augusto Fuschini, Victor dos Santos, Bernardo Machado, Lobo d'Avila, Conde de Villa Real, Elizeu Serpa, Emygdio Julio Navarro, Goes Pinto, Madeira Pinto, Matoso Santos, Gomes Monteiro, Francisco Ravasco, Gabriel Ramires, Guilhermino de Barros, Scarnichia, Franco de Castello Branco, Souto Rodrigues, Alves Matheus, Simões Ferreira, Jorge O'Neill, Ferreira de Almeida, Ruivo Godinho, Elias Garcia, Laranjo. Pereira dos Santos, Figueiredo Mascarenhas, Simões Dias, Abreu e Sousa, Julio Pires, Lopo Vaz, Vieira Lisboa Bandeira Coelho, Manuel d'Assumpcão, Marianno de Carvalho, Pedro Monteiro, Tito do Carvalho e Visconde da Torre.

Não compareceram á sessão os srs.: - Albano do Mello, Sousa e Silva, Jalles, Simões dos Reis, Santos Crespo, Conde de Castello de Paiva, Elvino de Brito, Estevão de Oliveira, Casal Ribeiro, Baima de Bastos, Vieira de Castro, Alves de Moura, Barbosa de Magalhães, Dias Ferreira, Alpoim, Oliveira Matos, José Maria dos Santos, Pinto de Mascarenhas, Mancellos Ferraz, Manuel Espregueira, Brito Fernandes, Pedro Diniz, Thomás Bastos, Vicente Monteiro e Visconde de Monsaraz.

Acta - Approvada.

O sr. Presidente: - Acha-se nos corredores da camara, a fim de prestar juramento, o sr. deputado José Severino de Avellar. Convido os srs. Antonio Ennes e Julio Graça a servirem de introductores.

Prestou juramento e tomou assento o sr. Severino de Avellar.

O sr. Presidente: - Tenho de communicar á camara que a grande deputação, encarregada de felicitar Sua Magestade El-Rei pelo anniversario da outorga da carta, constitucional, cumpriu a sua missão, e foi recebida por Sua Magestade com a costumada affabilidade.

Por essa occasião tive a honra de ler a seguinte allocação:

«Senhor. - Celebrar as datas memoraveis que na vida das nações consubstanciam um fausto acontecimento e recordai ao mesmo tempo um beneficio assignalado, é um alto e imprescriptivel dever para todos os que se prezam de tributar culto á justiça e á gratidão.

«A data que hoje se commemora insculpiu-se na nossa historia como uma das mais luzidas e gloriosas; e com jubilo será relembrada sempre por todos os portuguezes, sinceramente devotados ás melhorias e aos progressos da sua patria.

«Ha sessenta e um annos que o augusto avô de Vossa Magestade, o Senhor D. Pedro IV, de saudosa memoria, dando mais um eloquente testemunho do seu elevado e magnanimo espirito, outorgou a este povo a carta constitucio-

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nal da monarchia, e implantou assim neste paiz o regimen liberal, que tarde chegaria a estabelecer-se, se não tivesse a escudal-o o prestigio de um nome illustre e o esforço de um braço valoroso. A espontanea outorga da carta constitucional descerrou uma era, nova, auspiciosa e fecunda para a vida, para o engrandecimento e para o futuro da nação.

«Foi o diploma valiosissimo das liberdades e das franquias populares, e foi conjunctamente o poderoso instrumento de uma grande transformação economica e social.

«A camara dos deputados da nação portugueza congratula-se, pois, com Vossa Magestade, por tão festivo anniversario, e faz sinceros e ardentes votos para que Deus prolongue e proteja as preciosas vidas de Vossa Magestade, de Sua Magestade a Rainha a Senhora D. Maria Pia, de Suas Altezas Reaes os Senhores Duques de Bragança e Principe da Beira, e de toda a familia real portugueza.»

Sua Magestade dignou-se responder com a allocução que passo a ler:

«São para mim sempre em extremo agradaveis as manifestações da camara dos senhores deputados n'este dia, em que publicamente commemorâmos o fausto anniversario da outorga da carta constitucional da monarchia.

«Profundamente convencido dos beneficos resultados que para a verdadeira civilisação dimanam do nosso codigo politico, é meu sincero e constante empenho a manutenção e alargamento das garantias outorgadas e heroicamente defendidas por meu augusto avô.

«Agradeço, pois, com o mais intimo prazer á camara dos senhores deputados as suas felicitações e os comprimentos que por esta occasião me dirige e á familia real.»

Creio que a camara desejará que estas allocuções sejam publicados no Diario da camara. (Apoiados.}

EXPEDIENTE

Officios

1.° Do ministerio da fazenda, remettendo, em satisfação ao requerimento do sr. Arroyo, copia das tabelias dos rendimentos cobrados, e da entrada e saída de fundos no cofre da agencia financial em Londres, nos mezes de fevereiro a dezembro de 1886; e bem assim o officio do conselheiro director geral de contabilidade publica que acompanha as ditas tabelias.

Á secretaria.

2.° Do mesmo ministerio, remettendo um exemplar da pauta geral das alfandegas actualmente em vigor.

Á secretaria.

3.° Do ministerio da justiça, remettendo, em satisfação ao requerimento do sr. Marcai Pacheco, nota dos julgados municipaes, creados até esta data, por virtude do decreto dictatorial de 29 de julho de 1886.

Á secretaria.

4.° Do ministerio dos negocios estrangeiros, participando que na secretaria d'estado d'este ministerio existe unicamente um empregado, addido ao quadro, o primeiro official João Caetano Pato Infante de Lacerda.

Á secretaria.

5.° Do ministerio da marinha, remettendo, em satisfação ao requerimento do sr. Arroyo, documentos relativos aos operarios do arsenal da marinha, empregados na appropriação do vapor Açor.

Á secretaria.

6.° Do ministerio do reino, remettendo o processo relativo á eleição de um deputado, que ultimamente se realisou no circulo n.° 138 (Sotavento 1.°).

Á commissão de verificação de poderes.

7.° Da associação commercial do Porto, remettendo duas representações dos negociantes d'esta cidade, contra a proposta que eleva a classificação nos direitos do assucar.

Á commissão de fazenda.

Segundas leituras Renovações de iniciativa

1.ª Renovo a iniciativa do projecto de lei, que auctorisa o governo a tornar definitiva a concessão provisoria, feita á camara municipal de Chaves, das muralhas e fossos, que circumdam a villa, apresentado na sessão de 12 de março de 1886.

Lisboa, 26 de abril de 1887. = Moraes Sarmento.

Lida na mesa foi admittida e enviada ás commissões de guerra e de fazenda.

A proposta refere-se ao seguinte:

Projecto de lei

Senhores. - Pela carta de lei de 23 de junho de 1879 foi o governo auctorisado a entregar á camara municipal de Chaves as muralhar e fossos que circumdam a villa, para serem aquellas demolidas e estes aproveitados, conforme as exigencias da população e as condições de salubridade publica.

Esta cessão foi limitada ao periodo de oito annos, contados da data da publicação da lei, findos es quaes as muralhas e fossos deveriam voltar ao dominio e posse da fazenda publica.

Parece, porém, não haver motivo plausivel para esta limitação, attentos os considerandos com que a illustrada commissão de guerra de então acompanhou o respectivo parecer:

«Considerando que a villa de Chaves sómente poderá entrar no systema de defeza do paiz, numa dada hypothese, e que n'este caso não serão de certo as actuaes derrocadas muralhas que porão abstaculo ao invasor;

«Considerando que, por se não haver ligado importância áquella praça, só não tem desde muitos annos tratado da sua conservação, e por isso as muralhas, com excepção d'aquellas sobre as quaes têem sido levantadas edificações, que pertencem a particulares, só acham em estado de grande ruina, que todos os dias augmenta pela acção do tempo e pelo nenhum cuidado que d'ellas se toma;

«Considerando que, para o desenvolvimento da villa de Chaves, é indispensavel rasgar aquellas muralhas, e que importa conceder ás povoações os auxilios que possam concorrer para o seu adiantamento e progresso.»

A estes considerandos da illustrada commissão de guerra, sufficientes por si para fundamentarem o nosso projecto, póde ainda acrescentar-se o seguinte:

A praça de Chaves é de systema abaluartado imperfeitissimo, com os parapeitos todos de pedra, espaço interior limitadíssimo e occupado completamente por edificações particulares, assente no valle e por isso dominada de todos os lados por alturas situadas a alcance efficaz da moderna artilheria, com perfis de pequeno relevo e sem as necessarias condições de desenfiamento.

Finalmente possuo um tal conjuncto de defeitos que, dado mesmo que estivesse em bom estado de conservação, tornariam completamente nullo o seu valor defensivo em face dos modernos recursos do ataque.

Para uma unica cousa presta : é para apertar num laço de pedra a natural expansão da importante villa de Chaves!

Como todas as terras contidas dentro do recinto das antigas praças de guerra, tem esta villa das estreitas e tortuosas, habitações com pouca luz, mal ventiladas, defeituosas, acanhadas, em manifesto divorcio com todos os modernos principios de hygiene; e estes tristes e graves defeitos subsistirão emquanto as muralhas que a circumdam

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não forem demolidas, para darem logar ao rasgamento de das espaçosas, á diffusão da população, ao levantamento de novas edificações, que satisfaçam aos preceitos hygienicos, que a sciencia das construcções modernamente aconselha.

Por estes ponderosos motivos, tendo a honra de submetter á vossa illustrada apreciação o seguinte projecto de lei:

Artigo 1.° É o governo auctorisado a tornar perpetua á camara municipal de Chaves a cessão temporaria das muralhas é fossos que circumdam a villa, feita pela carta de lei de 23 de junho de 1879.

Art. 2.° A camara municipal de Chaves poderá aproveitar os fossos e ordenar a demolição das muralhas conforme as necessidades da população, as exigencias de embellezalento e as condições de salubridade publica.

Art. 3.° Fica revogada a legislação em contrario.

Sala das sessões, em 5 de março de 1886. - Antonio Luiz Gomes Branco de Moraes
Sarmento = Eduardo José Coelho.

2.ª Declaro que renovo a iniciativa do projecto de lei n.° 165 de 1885.= Antonio Candido.

Lida na mesa, foi admittida e enviada á commissão do ultramar, ouvida a de fazenda.

A proposta refere-se ao seguinte

Projecto de lei n.° 165

Artiho 1.° É auctorisado o governo a jubilar o arcediago da sé de Loanda, Timotheo Pinheiro Falcão com o ordenado de 400$000 réis, correspondentes ao cargo de professor do seminario episcopal de Angola e Congo.

Art. 2.° Fica revogada a legislação em contrario.

3.ª Renovamos a iniciativa do projecto de lei n.° 254-B, de 1880, apresentado na sessão de 26 de maio, que tem por fim determinar que seja annexada á comarca de Trancoso a freguezia de Cotimos, pertencente á de Pinhel.

Sala das sessões, em 28 de abril de 1887.= A. Carrilho = Francisco José Fernandes Vaz, deputado pelo circulo de Trancoso.

Lida na mesa, foi admittida e enviada á commissão de legislação civil, ouvida a de estatistica.

A proposta refere-se ao seguinte:

Projecto de lei

Senhores.- A freguezia de Cotimos pertenceu sempre á comarca e concelho de Trancoso, como era de justiça e de conveniencia para os seus moradores, cujas relações de toda a ordem são com a Villa de Trancoso e com as demais povoações que ficam ao poente da grande ribeira denominada do Maçoeime.

Pela ultima reforma comarca, porém, adjudicou-se aquella freguezia á comarca de Pinhel, sem se attender a que não só esta cidade lhe não fica mais perto do que Trancoso, mas ainda lhe era prejudicialissima tal mudança, por terem os moradores de Cotimos de atravessar com frequencia a ribeira de Maçoeime, cuja passagem é sempre perigosa e muitas vezes impossivel no inverno, e porque nenhumas relações tem está povoação com Pinhel, ao passo que as tem quotidianas e para todas as necessidades da vida com Trancoso, onde aliás continua a pertencer administrativa e politicamente.

Contra esta annexação a Pinhel reclamaram immediatamente todos os moradores da freguezia de Cotimos, e as suas justas queixas e representações para voltarem para Trancoso têem sido repetidas vezes dirigidas aos poderes publicos.

Os justissimos fundamentos de taes representações acham-se abonados e confirmados pelas informações officiaes da auctoridades administrativa e judicial do concelho e comarca de Trancoso, e do governador civil do districto da Guarda, as quaes foram enviadas á secretaria da justiça, em cumprimento de uma portaria.

É, pois, de inteira justiça attender taes representações, que, sem prejuizo para ninguem, se dirigem a alliviar os moradores da freguezia de Cotimos dos pesados encargos, despezas, perigos e vexames que lhes resultam de terem de ir a Pinhel só para tratar dos seus negocios judiciaes, quando todas as outras suas relações commerciaes, agricolas, administrativas, fiscaes e politicas são, e sempre foram, com Trancoso.

É por estes fundamentos que tenho a honra de propor á vossa sabia approvação o seguinte projecto de lei:

Artigo 1.° A freguezia de Cotimos fica pertencendo, para todos os effeitos judiciaes, á comarca de Trancoso.

Art. 2.° Fica revogada a legislação em contrario.

Sala das sessões da camara dos deputados, em 25 de maio de 1880.= O deputado pelo circulo n.° 59, J. Paes de Abranches.

REPRESENTAÇÕES

1.ª Dos negociantes da cidade do Porto, contra a alteração da classificação dos direitos do assucar, e contra a elevação das taxas.

Apresentada pelo sr. presidente, ê enviada á commissão de fazenda.

2.ª De negociantes da cidade do Porto, no sentido da antecedente.

Apresentada pelo sr. presidente, e enviada á commissão de fazenda.

3.ª Dos juizes das comarcas de Lisboa, Porto, Cartaxo, Alijo, Castro Daire, Thomar, Rezende, Villa Verde, Idanha a Nova, Celorico de Basto, Mertola, Setubal, Santa Comba Dão, Sabugal, Ancião, Sinfães, Alcacer do Sal, Alemquer, Braga, Villa Franca de Xira, Castello Branco, Tavira, Oliveira do Hospital, Louzada, Fornos de Algodres, Gollegã, S. João da Pesqueira, Melgaço, Faro, Baião, Praia da Victoria, Arouca, Vouzella, Mangualde, Trancoso, Soure, Valença, Reguengos de Monsaraz, Coimbra, Guimarães, Vianna do Castello, Pedrogão Grande, Macedo de Cavalleiros, Villa Nova de Ourem, Meda, Torres Novas, Pombal, Ourique, Monsão, Montemór o Velho, Ponte da Barca, Evora, Paredes, Fronteira, e dos juizes do tribunal administrativo do districto de Aveiro, Vianna do Castello, Evora e Leiria, protestando contra as disposições dos decretos n.° l, de 17 de julho, 26 de junho e 23 de agosto de 1886.

Apresentadas pelo sr. deputado Firmino João Lopes, e enviadas á commissão de fazenda, e mandadas publicar no Diario do governo.

REQUERIMENTOS DE INTERESSE PUBLICO

1.° Requeiro que me seja dada copia do officio n.° 56 de 26 de junho de 1884, do procurador geral da corôa e que existe na direcção geral das alfandegas. = Dr. Oliveira Valle.

2.° Requeiro que o ex.mo ministro da marinha e ultramar haja de enviar a esta camara, com a possivel brevidade:

I. Uma nota da classificação dos candidatos no concurso para o provimento dos juizes de segunda instancia do ultramar, annunciado no Diario do governo n.° 35, de 15 de fevereiro de 1887, e realisado em 18 de março do mesmo anno;

II. Copia das informações e documentos que foram presentes ao jury para fazer aquella classificação, com respeito aos três primeiros candidatos classificados;

III. Copia dos decretos de nomeação dos candidatos providos nos logares para que se abriu aquelle concurso;

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IV. Copia dos officios dirigidos pelo ministerio da marinha e ultramar aos juizes promovidos, em virtude do mesmo concurso, á segunda instancia do ultramar, depois dos seus despachos. = Alfredo Cesar Brandão, deputado pelo circulo n.° 62.

3.° Roqueiro que, pelo ministerio da marinha e ultramar, sejam remettidos a esta camara, com a possivel brevidade, os seguintes documentos:

I. Copia do toda a correspondencia trocada entre a direcção geral do ultramar e a da marinha e informação n'esta direcção geral, ácerca da reversão ao posto de primeiro tenente da armada do official de marinha Custodio Miguel Borja, quando foi exonerado de governador da provincia de S. Thomé e Principe;

II. Copia das informações dos governadores das nossas provincias ultramarinas ácerca da necessidade de se proceder no ultramar a trabalhos chorographicos, topographicos e hydrographicos;

III. Copia do diploma legal e mais fundamentos em que se baseou a promoção feita ao posto immediato do primeiro tenente da armada Custodio Miguel Borja, nomeado em commissão para nas provincias ultramarinas proceder a trabalhos chorographicos, topographicos e hydrographicos;:

IV. Nota cios adiantamentos e abonos feitos a este official nas diversas commissões de que tem sido encarregado, e da sua divida á fazenda até á data em que estes documentos forem remettidos á camara;

V. Nota dos vencimentos arbitrados ao mesmo official, pela commissão de que foi encarregado em portaria de 29 de janeiro de 1887;

VI. Nota do estado em que se encontra, ou do destino que teve o processo crime, em que foi pronunciado na comarca de S. Thomé, o ex-governador desta provincia Custodio Miguel Borja;

VII. Nota do pessoal de que se compõe a commissão de cartographia, creada na secretaria da marinha e ultramar pela portaria de 13 de abril de 1883, quer effectivo, quer adjunto, vencimentos que recebem os individuos que fazem parte da mesma commissão, sua categoria, e empregos ou outras commissões que accumulem com aquelle serviço;

VIII. Copia das reclamações dos governadores das provincias ultramarinas ácerca da necessidade de se nomearem empregados especiaes para os trabalhos chorographicos, topographicos e hydographicos no ultramar;

I. Nota da qualidade de empregos para que têem sido despachados Pedro Maria Telles Menezes de Athaide e Mello, o actual administrador do concelho de S. Thomé, e José Navarro Pereira de Andrade, do tempo em que exerceram, ou desde que exercem os referidos empregos, e data dos respectivos despachos. = Alfredo Cesar Brandão, deputado pelo circulo n.° 62.

4.° Roqueiro que, pelo ministerio da marinha e ultramar, sejam remettidos a esta camara, com a possivel brevidade:

I. Copia de todos os telegrammas do governador geral de Moçambique com respeito á ultima invasão e guerra dos vatuas no districto de Inhambane;

II. Copia da correspondencia official entre o governador geral de Moçambique com respeito a esta invasão o guerra;

III. Nota dos fundamentos invocados pelo governador geral de Moçambique para demittir o capitão mor das terras de Inhambane, coronel Fornasini, e copia da respectiva portaria de demissão;

IV. Nota dos processos crimes em que tem sido envolvido o actual capitão mór das terras de Inhambane, e dos crimes por que está pronunciado;

V. Nota dos empregados publicos dependentes do ministerio da marinha e ultramar, que estão prenunciados ou envolvidos em processos crimes, e das commissões que desempenham;

VI. Copia da correspondencia official entre o coronel Fornasini e o governador geral de Moçambique, com respeito á ultima invasão e guerra dos vatuas, no districto de Inhambane, e com respeito á demissão d'aquelle official do cargo de capitão mór das terras d'este districto. = Alfredo Cesar Brandão, deputado pelo circulo n.° 62.

5.° Requeiro que, pelo ministerio da marinha e ultramar, sejam remettidas a esta camara com a possivel brevidade:

I. Nota das concessões dos aforamentos dos terrenos pertencentes ao estado, na provincia de Moçambique, feitas nos termos do decreto de 4 de dezembro de 1861, desde a data d'este decreto até hoje, data das concessões e termos em que foram feitas;

II. Nota de todos os prazos da coroa, actualmente arrendados no districto de Quelimane, com indicação do nome dos arrendatarios, epocha e fórma dos arrendamentos e renda;

III. Nota das prorogações concedidas aos actuaes arrendatarios de prazos no districto de Quelimane, epocha em que foram feitas, por que tempo e por que praso ou renda;

IV. Nota das informações dos governadores geraes da provincia de Moçambique, e dos governadores do districto de Quelimane, com respeito ás prorogações dos arrendamentos dos prazos da corôa n'este districto, nas differentes epochas em que estas prorogações têem sido concedidas;

V. Nota especial das concessões e prorogações feitas á firma Correia e Carvalho, de Quelimane, e respectiva consulta da junta consultiva do ultramar com respeito a cada concessão ou prorogação, designação dos vogaes que subscreveram as consultas, e informações dos governadores da provincia;

VI. Relatorio dos prazos do districto de Quelimane admnistrados por conta do estado, ou da fazenda, e seu rendimento liquido annual até ao fim do anno economico de 1885 a 1886;

VII. Nota de todas as companhias, emprezas e sociedades, registadas no ministerio da marinha e ultramar, que exercem o seu commercio ou industria nas nossas possessões da Africa oriental = Alfredo Cesar Brandão, deputado pelo circulo n.° 62.

6.° Requeiro que, pelo ministerio da marinha e ultramar, sejam remettidas a esta camara, com a possivel brevidade:

I. Nota da importancia total da receita e despeza das nossas possessões ultramarinas em cada um dos dez ultimos annos economicos, e do respectivo deficit ou saldo annual;

II. Copia dos orçamentos da receita e despeza da junta da fazenda de Moçambique para os annos economicos de 188o a 1886 e 1886 a 1887, com a respectiva nota das dividas existentes, sua data, credores, títulos, fins com que foram feitas e auctorisações;

III. Nota das obras e reformas, submettidas á approvação do governo, na provincia de Moçambique, durante os annos economicos de 1885 a 1886 e 1886 a 1887, e das propostas para o augmento da receita provincial, correspondente ás despezas com aquellas obras e reformas que não estivessem comprehendidas nos orçamentos d'aquelles annos:

IV. Copia da conta do activo e passivo da junta de fazenda de Moçambique em 30 de junho de 1884, 1885 e 1886 e dos balancentes e respectivas observações, correspondentes ao primeiro semestre do anno economico de 1886 a 1887;

V. Nota de todas as commissões creadas pelo actual governador geral da provincia de Moçambique, durante a sua gerencia ou em exercicio n'esta provincia durante a sua gerencia, das respectivas gratificações arbitradas sem auctorisação, e do pessoal encarregado de cada commissão;

VI. Nota das providencias adoptadas pelo governador

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geral de Moçambique, e das indicações feitas por esta auctoridade ao governo da metropole em virtude dos trabalhos d'aquellas commissões. = Alfredo Cesar Brandão, deputado pelo circulo n.° 62.

7.° Requeiro que, pelo ministerio da marinha e ultramar, sejam remettidos a esta camara, com a possivel brevidade, os seguintes documentos:

I. Nota dos fornecimentos feitos pela companhia africana ao governo da provincia de Moçambique, e das formalidades com que são feitos;

II. Nota especificada do fornecimento de armas e pólvora para a guerra do Chiputura;

III. Nota especificada da applicacão de 24:000$000 réis, que são annualmente entregues á companhia africana para o districto de Manica;

IV. Nota especificada dos fornecimentos feitos â fazenda publica na provincia de Moçambique pelos negociantes Aurbach e Douald Currie, durante a gerencia do actual governador desta provincia, preço e destino de cada objecto fornecido.- Alfredo Cesar Brandão, deputado pelo circulo n.° 62.

8.° Requeiro que, pelo ministerio da marinha e ultramar, sejam remettidos a esta camara, com a possivel brevidade, os seguintes documentos:

I. Nota dos motivos em que se baseou o governador geral de Moçambique para dissolver a ultima camara municipal de Quelimane;

II. Copia dos documentos em que se baseou o mesmo governador para ordenar uma syndicaneia ao primeiro substituto do juiz de direito na comarca de Quelimane, Balthazar Farinha;

III. Nota do resultado d'esta syndicaneia e das providencias tomadas com respeito ao juiz syndicado, durante a syndicancia e depois d'ella. - Alfredo Cesar Brandão, deputado pelo circulo n.° 62.

9.° Requeiro que, pelo ministerio da marinha o ultramar, sejam remettidos a esta camara, com a possivel brevidade, os seguintes documentos:

I. Nota das coaveniencias de serviço publico, que motivaram a transferencia do ajudante da conservatoria de Quelimaue, José Bernardo de Albuquerque, para a comarca de S. Thomé, e do escrivão de direito, Daniel dos Santos, da mesma comarca para a de Guiné;

II. Copia do despacho de pronuncia, proferido pelo juiz de direito da comarca de Quelimane contra o actual delegado da corôa e fazenda na mesma comarca;

III. Nota das providencias adoptadas pelo sr. ministro depois de ter conhecimento desta pronuncia, e em virtude d'ella. = Alfredo Cesar Brandão, deputado peio circulo n.° 62.

10.° Requeiro que, pelo ministerio da marinha e ultramar, sejam remettidos a esta camara, com a possivel brevidade, os seguintes documentos:

I. Copia das duas ultimas syndicancias feitas aos prazos da corôa no districto de Quelimane por Francisco Martins Canhoto e Henrique Carlos Lima;

II. Nota dos empregos publicos que estes individuos exerciam ao tempo das syudicancias e dos empregos que actualmente exercem. = Alfredo Cesar Brandão, deputado pelo circulo n.° 62.

11.° Requeiro que, pelo ministerio dos negocios estrangeiros, me sejam enviadas copias do officio ou officios em que o ex-director dos negocios estrangeiros expoz ao respectivo ministro o estado de indisciplina em que se achava a secretaria, e copia de qualquer officio em resposta a essas accusações, escripta por alguem do mesmo ministerio. = Manuel Pinheiro Chagas.

Mandaram-se expedir.

REQUERIMENTO DE INTERESSE PARTICULAR

1.° Dos officiaes do corpo de engenharia João Maria Aguiar de Aguiar, Arnaldo Augusto de Sousa Queiroz, Carlos Roma Machado de Faria e Maia, Luiz Antonio de Sousa Viana, Teixeira de Menezes, Roberto Rodrigues Mendes, José Carlos Teixeira Corto Real, J. Augusto Pereira do Valle, Francisco de Paula de Azevedo, Joaquim Narciso Renato Descartes Baptista, José Dias Moreira e Sousa, José Alves de Almeida Araujo, Bernardo Pinheiro Correia de Mello e Ladislau Miceno Machado Alvares da Silva, contra a organisação dos serviços technicos de obras publicas, approvada pelo decreto dictatorial de 24 de julho de 1860.

Apresentados pelo sr. deputado Avellar Machado, e enviados á commissão de obras publicas.

2.° De Antonio Allemão de Mendonça, segundo official do corpo dos officiaes de fazenda da armada, pedindo para ser approvado um projecto de lei que determine qual deve ser a sua posição na escala do corpo dos officiaes de fazenda da armada.

Apresentado pelo sr. deputado Oliveira Valle, e enviado á commissão de marinha.

3.° De Joaquim Ferreira, archivista com a graduação de tenente do cominando geral de artilheria, pedindo para ser comprehendido nas disposições do artigo
4.º da carta de lei de 10 de abril de 1874, unicamente para os elleitos da reforma, regulando-se a sua promoção no respectivo quadro em relação aos actuaes almoxarifes de artilharia.

Apresentado pelo sr. deputado Oliveira Valle, e enviado á commissão de guerra, ouvida a de fazenda.

4.° De Francisco Morgado Gomes, aspirante de fazenda da armada, pedindo que lhe seja concedida gratificação igual á dos officiaes combatentes.

Apresentado pelo sr. deputado Sonsa Machado, e enviado á commissão de marinha, ouvida a de fazenda.

5.° De Manuel Coelho Lobão, director machinista dos pharoes, aposentado, pedindo melhoria de aposentação.

Apresentado pelo sr. deputado Oliveira Valle, e enviado á commissão de obras publicas:, ouvida a de fazenda.

JUSTIFICAÇÃO DE FALTAS

1.ª Declaro que por motivo justificado faltei ás sessões de 16, 26 e 27 do corrente mez. = O deputado por Arouca, Antonio Maria de Carvalho.

2.ª Participo a v. exa. que por incommodo de saude tenho faltado as sessões da camara. = Antonio Joaquim da Fonseca, deputado por S. Thomé.

3.ª Declaro que por motivo justificado não compareci ás sessões de 18 e 22 do corrente. = O deputado, J. A. da Silva Cordeiro.

4.º Declaro que faltei ás sessões de 25 e 28 do corrente mez por motivo justificado. - Dr. Oliveira Valle.

5.ª Mando para a mesa uma declaração de não ter comparecido á sessão de quinta feira, nem comparecer hoje o Sr. José Maria de Alpoim, por motivo de doença. = Santiago.

6.ª Tenho a honra de participar a v. exa. que faltei por motivo justificado ás duas ultimas sessões d'esta camara. = O deputado por Gaia, João Cardoso Valente.

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7.ª Faltei ás ultimas sessões por motivo justificado. = Souto Rodrigues. Para a secretaria.

O sr. Presidente: - Cumpre-me participar á camara que recebi duas representações assignadas por grande numero de negociantes do Porto ácerca da proposta de lei do sr. ministro da fazenda para reforma da pauta, sobre os direitos que paga o assucar. N'essas representações pede-se que o assucar continue a ser classificado, como tem sido desde 1874, que não sejam augmentados os actuaes direitos, e que estes se estabeleçam segundo as differentes qualidades de assucar.

Acompanha estas representações um officio da direcção da associação commercial do Porto, que me pede para as apresentar na camara. A direcção da associação commercial do Porto, affirmando no officio, que me dirige, os seus desejos de não crear embaraços á acção do parlamento, nem ao plano financeiro do sr. ministro da fazenda, expende algumas considerações sobre o assumpto das referidas representações.

Tanto estas, como o officio, vão ser remettidas á commissão de fazenda.

O sr. Oliveira Valle: - Mando para a mesa uma justificação das minhas faltas nos dias 25 e 26 deste mez.

Mando juntamente tres requerimentos; um do director machinista dos pharoes, pedindo que lhe seja applicada a disposição que se acha exarada no decreto de 12 de dezembro de 1836; outro de Joaquim Ferreira, archivista, com a graduação de tenente, do commando geral de artilheria, que se julga prejudicado pelo decreto de 10 de abril de 1864, e pede que lhe seja applicavel a disposição do artigo 4.°; e o terceiro do sr. Antonio Allemão de Mendonça, segundo official de fazenda da armada, que se julga prejudicado na sua carreira e pede uma providencia que fixe a sua posição na escala do corpo dos officiaes de fazenda.

Parecem-me procedentes as rasões apresentadas nestes tres requerimentos; e por isso espero que sejam attendidas as pretensões de que elles tratam.

Mando tambem para a mesa um requerimento, pedindo, pelo ministerio da fazenda, copia do officio n.° 56 de 26 de junho de 1884, do procurador geral da corôa, e que existe na direcção geral das alfandegas.

Mando, finalmente, o parecer da commissão de poderes sobre a eleição do circulo de Sotavento, Cabo Verde, e peço a v. exa. que, dispensando-se regimento, este parecer entre já em discussão.

Por ultimo, proponho que seja aggregado á commissão de legislação commercial o illustre deputado o sr. Francisco de Castro Matoso da Silva Côrte Real.

A justificação vae publicada no logar competente, e os requerimentos tiveram o destido indicado a pag. 339.

Leu-se na mesa o seguinte

PARECER

Senhores. - A vossa commissão de verificação de poderes examinou o processo eleitoral do circulo de Sotavento de Cabo Verde, e do seu exame verificou que o numero total de votantes foi de 5:141 e que obtiveram votos os seguintes cidadãos:

Augusto Pinto de Miranda Montenegro .... 5:131 votos
Joaquim Theophilo Braga .... 2 votos
João Araujo Minhoto .... 1 »
Hypolito Olympio C. Andrade .... 1 »

E porque o cidadão Augusto Pinto de Miranda Monte negro obteve a maioria legal dos votos, e não tendo havido protesto ou irregularidade, que duvida faça, e porque o cidadão eleito apresentou o seu diploma na devida fórma; é a vossa commissão de parecer que seja approvada a referida eleição e que seja proclamado deputado Augusto Pinto de Miranda Montenegro.

Sala das sessões, em 30 de abril de 1887.= José Maria de Andrade = Alfredo Pereira = A, L. Tavares Crespo = Dr. Oliveira Valle, relator. - Tem voto dos srs. Alves da Fonseca = Baptista de Sousa.

Dispensado o regimento, foi o parecer approvado sem discussão, e seguidamente proclamado deputado o sr. Augusto Pinto de Miranda Montenegro.

Leu-se a seguinte

Proposta

Proponho que seja aggregado á commissão de legislação commercial, o sr. deputado Francisco de Castro Matoso da Silva Corte Real. = O vogal da commissão, Dr. Oliveira Valle.

Foi admittida e seguidamente approvada sem discussão.

O sr. Guilherme de Abreu : - Sr. presidente, só póde comparecer á sessão de quinta feira, depois de se haver passado á ordem do dia, e por isso não estava presente, quando o meu illustre collega, o sr. Alves de Moura, se estreiou brilhantemente nesta casa, advogando uma causa justissima, a da estrada de Braga a Chaves, pela qual tenho pugnado constantemente desde 1860, n'esta camara, e particularmente, perante os governos que apoiava, e nos quaes, seja dito em homenagem á verdade, encontrei sempre a mais benovola disposição para activarem a feitura da mesma estrada, tanto quanto lho permittiam os escassos limites da exigua verba consignada no orçamento para viação ordinaria.

Da melhor vontade me associo, pois, ás judiciosas considerações expendidas pelo illustre deputado, e reforçadas pelo meu nobre collega, o sr. Alves Matheus, quanto á necessidade e urgencia de concluir-se aquella estrada.

E sem querer instaurar aqui um concurso de preferencias, em que provavelmente interviriam todos ou quasi todos os meus respeitáveis collegas, permitta-se-me apenas dizer, que, entre todas as estradas ainda não concluidas, se me afigura ser a de Braga a Chaves a de maior alcance commercial e economico, sempre reconhecido pelos poderes publicos desde 1850, e que já figurava num plano de viação geral, como incontestavelmente é a mais antiga das que se acham em construcção.

Se estes titulos são motivo de preferencia, como creio, amerceie-se especialmente o governo da misera e mesquinha, que ainda está em via de formação e já tem cabellos brancos. (Apoiados.)

Do mesmo modo e com igual prazer me associo ás sensatas observações do illustre deputado, com respeito aos melhoramentos que instantemente reclama o estabelecimento thermal do Gerez,

É realmente uma vergonha para o paiz que aquellas aguas, de reconhecida e quasi maravilhosa efficacia para algumas enfermidades de estomago e figado, nem sequer tenham sido analysadas scientificamente, applicando-se ainda empyricamente, como no tempo de D. João V, que foi o fundador do estabelecimento.

E ainda mais vergonhoso é , que, sendo tão grande a concorrencia ao estabelecimento, não haja ali uma pharmacia, nem mesmo permanentemente um medico, que dirija e aconselhe os doentes no uso das aguas e banhos, porque o tenue ordenado, que se lhe paga, não attrahe concorrentes ao partido.

O nobre ministro das obras publicas, respondendo ao sr. Alves de Moura, disse que era preciso que a iniciativa particular auxiliasse o governo nos melhoramentos a emprehender. Mas eu desconfio muito da saude ministrada por emprezas industriaes, que hão de curar muito mais dos seus interesses, do que do
credito do estabelecimento e do allivio dos enfermos.

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Tenha o governo muito cuidado, que não vão ellas estragar o beneficio, que a Providencia nos outorgou n'aquelle abençoado manancial.

Desejava ainda repicar noutro campanario, segundo a phrase consagrada para assumptos de interesse local, mas não o posso fazer na ausencia do nobre ministro das obras publicas e por isso fica o repique (Riso.) de remessa para quando s. exa. comparecer antes da ordem do dia.

O sr. Antonio Ennes: - Creio que toda a camara deseja occupar-se do estudo das propostas do governo, e da apreciação dos seus actos.

A camara tem inteira confiança na mesa, (Apoiados.) e como ha ainda nove com missões a eleger, o que de certo occuparia umas poucas de sessões, eu proponho que a mesa seja encarregada de escolher os deputados que as devem compor.

N'este sentido mando para a mesa uma proposta, e peço que ella entre desde já em discussão, só a camara a considerar urgente.

É a seguinte

Proposta

Proponho que sejam nomeadas pela mesa as commissões de infracção, petições, estatistica, agricultura, commercio e artes, saude publica, regimento, recrutamento e juntas geraes. = Antonio Ennes.

Admittida a urgencia, foi posta em discussão e seguidamente approvada.

O sr. Firmino João Lopes: - Mando para a mesa uma representação, assignada pelos juizes dê direito de primeira instancia em Lisboa, com annucncia da maior parte dos seus collegas, como justificam as declarações juntas, contra algumas disposições do decreto n.° 1 de 17 de julho de 1886, por lhes parecerem offensivas de direitos adquiridos, assignados em leis anteriores. Pretendem que sejam alteradas essas disposições, interpretadas ou revogadas por fórma que se mantenham nos termos da representação.

Peço a v. exa. para que consulte a camara sobre se permitte que ella seja publicada no Diario do governo.

O sr. João Arroyo: - Pedi a palavra porque desejo chamar a attenção do sr. ministro do reino para alguns assumptos de que vou occupar-me; em primeiro logar, lembrarei a s. ex. a communicação que fiz á camara, em uma das ultimas sessões, relativa a factos praticados pelas auctoridades administrativas de Vallongo. Por essa occasião pedi ao sr. ministro da marinha, que estava presente, que communicasse ao sr. ministro do reino as injustiças d'esse proceder, e pedi para que s. exa. o sr. José Luciano, se apressasse a dar explicação ao parlamento, dos factos apontados, se os soubesse, e caso não tivesse conhecimento d'elles se habilitasse de fórma a poder justificar-se das faltas e abusos praticados por essa auctoridade.

Alem d'isto, sr. presidente, chamo especialmente a attenção do sr. ministro para um facto que julgo gravissimo, e que envolve uma infracção completa e cabal dos direitos dos cidadãos portuguezes.

Na sessão de 16 de abril tive a honra de dirigir ao sr. ministro do reino largas considerações relativamente aos tumultos do Porto, por occasião do movimento dos manipulares de tabaco, e então s. exa. em resposta disse que eram vagas as accusações que eu dirigi, tanto ao governo como ás auctoridades suas delegadas.

Não tive tempo de replicar a s. exa., e ha de estar fresquissima na memoria da camara a recordação das scenas passadas nas sessões de 16 e de 18.

Ultimamente, porém, deu-se um facto no Porto relativo a este assumpto, para o qual não posso deixar de chamar a attenção do governo, e em especial do sr. ministro do reino, pedindo immediatas, promptas e urgentes providencias.

Sr. presidente, ha poucos dias um cavalheiro d'aquella cidade, solicitador encartado, dirigiu ao commissario geral de policia um requerimento pedindo que se lhe passasse uma certidão em que se dissesse quantos individuos tinham sido presos pela policia civil e guarda municipal, por occasião dos graves acontecimentos que alli se deram em março; quantos tinham ido para bordo do índia; quantos tinham sido entregues ao poder judicial para serem processados, e o numero de dias que estiveram detidos a bordo d'aquelle navio.

Como v. exa. vê, o requerimento não se referia a assumpto, não contendia com materia que pela sua natureza perigosa ou secreta necessitasse de ser archivada no commissariado geral de policia do Porto unicamente para os fins officiaes; era um requerimento perfeitamente fundado e relativo a actos que deviam ser do conhecimento do publico, com respeito aos quaes se não compadece a nossa intelligencia que possa existir o mais pequeno segredo ou a mais pequena duvida ou tergiversação por parte da auctoridade em fornecer a qualquer cidadão os esclarecimentos que pede.

Pois este requerimento teve o seguinte despacho: «Indeferido ». (Vozes: - Ouçam! Ouçam!)

O commissario geral de policia do Porto recusou-se a despachar por outra fórma ao requerido n'este papel!

V. exa. comprehende que este indeferimento, já de si inexplicavel e indesculpavel, é muito aggravado ainda pelo caracter da auctoridade a que me refiro; v. exa. sabe que a auctoridade policial, pela natureza especial das suas attribuições, está em relações directas com o chefe do districto, e que relativamente a todas as questões policiaes ha uma correspondencia immediata e completa entre o governador civil e o chefe da policia; por consequencia, é necessario que o sr. ministro do reino, ou de immediatas providencias para que este requerimento seja despachado, a fim de que o publico tenha completo conhecimento do que n'elle se pede, ou que s. exa. explique qual é a extraordinaria jurisprudencia estabelecida pelo governo, á face da qual se póde indeferir um requerimento desta ordem. (Apoiados.)

Parece-me que s. exa. não duvidará dar promptas explicações á camara, e no caso de concordar em que tal indeferimento contém um grave abuso e um ultrage mesmo feito ao direito que assiste a qualquer cidadão de pedir esclarecimentos á auctoridade administrativa ou policial, desde que o assumpto não seja de sua natureza perigoso para a ordem publica ou secreto, tambem não terá duvida em dar promptas e precisas providencias para que o commissario geral de policia do Porto reforme o seu despacho.

Peço a s. exa. o favor de responder aos dois pontos a que acabo de referir-me.

O sr. Ministro do Reino (Luciano de Castro): - Por informação do meu collega o sr. ministro da marinha, já sabia que s. exa. chamara a minha attenção em uma das sessões anteriores sobre umas prisões feitas em Vallongo.

Pedi immediatamente ao sr. governador civil que por telegramma me informasse a este respeito; e a resposta foi a que consta do seguinte telegramma:

«Exmo. presidente do conselho de ministros. - Lisboa. - Na noite de 14 para 15 foram arremessadas bombas de dynamite ás casas do regedor de Vallongo e de outro individuo. Administrador levantou auto de investigação o fez capturar tres individuos sobre quem recaíram graves suspeitas de auctores do crime, e mandou-os entregar sob custodia ao juiz do primeiro districto criminal. = O governador civil, Albino Montenegro.»

Não posso dar outros esclarecimentos ao sr. deputado porque não os tenho; mas logo que cheguem ao ministerio do reino informações mais circumstanciadas, não terei duvida em trazel-as á camara e fornecel-as a s. exa.

Se é verdade como eu creio, que tudo se passou como informa o sr. governador civil, não me parece que tenha havido abuso por parte da auctoridade administrativa.

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No entanto, eu aguardo outras informações, e logo que as receba, trazel-as-hei á camara.

O sr. Arroyo: - V. exa. permitta-me uma interrupção?

O Orador: - Póde v. exa. fallar.

O sr. Arroyo: - O telegramma do sr. governador civil do Porto de fórma alguma responde ás arguições que eu fiz ao governo. Resume-se a relatar um facto que eu proprio communiquei á camara.

Suspeita-se de que alguns individuos que foram presos, tenham sido os auctores do crime a que se refere o telegramma. Mas as minhas arguições não se referiam ao facto da prisão. Referiam-se: primeiro, ao facto de não terem sido presos em flagrante delicto; segundo, ao facto de terem sido conservados em prisão, ás ordens da auctoridade administrativa, mais tempo do que permitte a carta constitucional ; terceiro, aos maus tratos infringidos a esses presos pelas auctoridades d Vallongo.

O Orador: - Sobre esses factos é que eu pedi informações ao governador civil do Porto, e a resposta foi a que acabei de ler; de onde devo concluir que os factos a que s. exa. alludiu carecem de fundamento; mas nem por isso deixarei de insistir de novo com aquelle funccionario para que, não por telegramma, mas por officio, me dê informações circumstanciadas a esse respeito, e logo que venham, não só não terei duvida em trazel-as á camara; mas creia s. exa. que darei todas as providencias necessarias para que, se algum abuso houve, seja logo corrigido.

O illustre deputado chamou tambem a minha attencão sobre o indeferimento dado pelo commissario geral de policia do Porto a um requerimento em que lhe pedia informações sobre factos que s. exa. diz serem publicos.

Se o illustre deputado me fizer a mercê de me passar á mão esse requerimento, eu mandarei perguntar ao governador civil d'aquella cidade quaes foram as rasões do indeferimento, e se ellas não me satisfizerem, darei as ordens necessarias para que o commissario passe a certidão pedida.

Nada mais posso dizer ao illustre deputado.

(S. exa. não reviu as notas tachygraphicas.)

O sr. Arroyo: - Agradeço ao sr. ministro a resposta que acaba de me dar.

O sr. Avellar Machado: - Mando para a mesa varios requerimentos de mui distinctos officiaes de engenheria, pedindo á camara que não dê sancção legislativa ao decreto dictactorial de 24 de julho ultimo, que reorganisou os serviços technicos do ministerio das obras publicas.

Peço ao sr. presidente se digne dar a estes requerimentos o conveniente destino.

Aproveito a occasião de estar presente o sr. ministro do reino para pedir explicações a s. exa. das graves irregularidades que se estão dando na administração do districto de Santarem, especialmente no circulo que tenho a honra de representar em côrtes.

Como v. exa., sr. presidente, sabe, o codigo administrativo do sr. José Luciano, decretado em 17 de julho de 1886, determina no artigo 241.°, que traia das attribuições dos administradores do concelho, o seguinte:

«Art. 241.°

§ 3.° Examinar annualmente o estado das escolas de ensino primario, publicas ou particulares, o estado dos archivos, da escripturação e dos cofres da camara municipal, das juntas de parochia, irmadades, confrarias o misericordias, hospitaes e outros quaesquer institutos de beneficencia, etc.

«§ 5.° Participar ao governador civil os actos das administrações das irmandades, associações de piedade, beneficencia, etc., que envolvam offensa da lei ou regulamento de administração publica, ou dos seus compromissos, estatutos, etc.

«6.° Remetter com informação circunstanciada ao governador civil os orçamentos das irmandades, confrarias, misericordias, etc.

«§ 7.° Remetter com informação circumstanciada ao governador civil para serem mandados ao tribunal de contas, ou apresentados ao tribunal administrativo, as contas da gerencia das camaras municipaes, das juntas de parochia, misericordias, etc., e mais corporações a que se refere o n.° 3.°»

Ora, dá-se a circumstancia de que o administrador do concelho de Mação (que pertence ao circulo n.° 86), está exercendo, conjunctamente com as funcções d'este cargo, as de presidente da mesa administrativa e as de thesoureiro effectivo da misericordia. Quer dizer que, como administrador do concelho, é elle que informa dos seus proprios actos, na qualidade de presidente da mesa administrativa da misericordia, e que examina o estado dos archivos, da escripturacão e dos cofres d'aquelle estabelecimento de caridade!

É ainda o administrador do concelho que fiscalisa a applicação dos dinheiros da misericordia, que os recebe, guarda e conserva, que dá balanço ao cofre, etc., isto apesar de haver um thesoureiro nomeado, das que serve apenas ... in partibus!

Qualquer que seja o espirito retrogrado que haja presidido á elaboração do novo codigo administrativo com que o sr. ministro do reino quiz dotar este paiz, não me parece que s. exa. pretendesse ir até ao ponto de querer investir as auctoridades administrativas da faculdade de fiscalisarem os seus proprios actos. Seria o cumulo da irrisão!

Dou conhecimento ao sr. ministro d'estas irregularidades e estou certo que, se s. exa. as conhecesse, teria já posto cobro a tão... desusado procedimento, para me não servir de outra expressão mais energica, mas que era verdadeiramente applicavel ao caso.

Chamo tambem a attencão do sr. ministro para um acto irregularissimo praticado pelo presidente da camara municipal de Santarem, e de que s. exa. naturalmente deve ha muito ter conhecimento.

Afianço a v. exa., sr. presidente, segundo informações fidedignas que me foram ministradas, que a anarchia na camara a que me refiro tem chegado ao ponto de funccionarem conjunctamente doze vereadores, assignando todos a acta!

Como v. exa. sabe perfeitamente, o artigo 100.° do novo codigo administrativo dá aos concelhos de primeira ordem, isto é, aos que tenham 40:000 habitantes, ou que sejam cabeças de districto, nove vereadores para constituirem a respectiva municipalidade.

Seria, pois, absolutamente inexplicavel que o presidente da camara levasse a ignorancia da lei até ao ponto de permittir que funccionassem doze vereadores em vez de nove o que a auctoridade administrativa faltasse aos deveres que lhe são impostos pelo artigo 241.° do codigo, se o facto não fosse dictado pelo mais descarado facciosismo politico.

Quando se tratou da eleição dos delegados municipaes ao collegio eleitoral para a escolha dos pares do reino electivos, o presidente da camara municipal quiz, contra lei expressa, violentar os vereadores effectivos, obrigando-os a votarem como oitenta maiores contribuintes e não como vereadores; e como elles não quizessem acceder a tal prepotencia e persistissem em permanecer nos logares que legitimamente lhes pertenciam, o presidente não ousou expulsal-os depois da categorica declaração que fizeram de que não prescindiam de exercer os seus direitos, garantidos na lei.

Mas, apesar d'isto, o presidente da camara ousou chamar tres cidadãos para funccionarem de vereadores por alguns instantes, tomando logar os intrusos ao lado dos tres vereadores legitimes; e como a auctoridade administrativa não protestasse contra esta farça, a sessão celebrou-se com doze vereadores, assignando todos a acta.

É esta uma irregularidade do tal ordem, que o sr. ministro deve ter conhecimento d'ella, e o funccionario que está á frente do districto, que é um cavalheiro serio, cor-

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dato, e digno, qualquer que seja o seu facciosismo politico, deverá ter precedido como lhe prescreve a lei. Estou; certo que esse funccionario, que respeito, não deseja levar a administração ao cahos em que a podem lançar factos d'esta ordem.

Se actos tão abusivos se praticassem n'algum concelho sertanejo, não seria tão grande o meu espanto. Mas na cabeça de um dos concelhos mais importantes do reino, numa cidade, capital de districto, a poucas dezenas de kilometros distante de Lisboa, é extraordinario!

Funccionarem doze vereadores ao mesmo tempo, unicamente, para que o presidente da camara podesse ter a triste gloria de vencer uma eleição, sem que houvesse qualquer recurso por parte da auctoridade fiscal da lei, seria de pasmar n'outra qualquer situação politica.

Peço, pois, a v. exa., que se informe o mais breve possivel sobre os factos que acabo de narrar, e providenceie da maneira mais rapida que ser possa, por isso que irregularidades d'esta ordem não podem tolerar-se de modo algum.

Espero que v. exa. tomará a peito, como costuma, as observações que fiz, unicamente no cumprimento do meu dever, ,e sem que qualquer resentimento pessoal ou politico me guie n'esta questão, que é de legalidade, e ao mesmo tempo de dignidade e de moralidade.

Tenho dito.

Os requerimentos vão publicados a pag. 339.

O sr. Presidente do Conselho de Ministros (Luciano de Castro).: - Pedi a palavra para dizer ao illustre deputado que tomei nota dos factos a que s. exa. se referiu e que tratarei de providenciar a respeito d'elles, quanto caiba nas minhas attribuições.

Espero que s. exa. ficará satisfeito com as providencias que hei de tomar logo que as auctoridades administrativas me informem.

Quanto ao facto attribuido á camara municipal de Santarem, mandarei tambem pedir informações...

O sr. Avellar Machado: - Uma copia da acta.

O Orador: - Uma copia da acta, justamente.

Mas v. exa. sabe que a acção do governo é pouco efficaz a esse respeito.

O sr. Avellar Machado: - Lá está o codigo.

O Orador: - Creia o illustre deputado que, se houve alguma infracção de lei, em virtude da qual o ministerio publico administrativo tenha de proceder, dar-lhe-hei as instrucções precisas.

É o que posso fazer.

O sr. Avellar Machado: - Agradeço ao sr. presidente do conselho e ministro do reino a promessa que acaba de fazer e espero que a cumpra.

O sr. Consiglieri Pedroso: - Se insisti, durante tres ou quatro sessões, pela presença do sr. ministro do reino, não foi pelo simples facto de incommodar s. exa., nem tão pouco pelo prazer de dirigir-lhe qualquer pergunta, a que s. exa. tivesse, por cortezia, de dar uma resposta pro forma.

O assumpto sobre que desejo chamar a attenção do sr. ministro, parece-me da mais alta importancia, por isso que contende estreitamente, não só com a reforma da instrucção secundaria, tal como foi decretada pela dictadura de 12 de agosto de 1886, mas ainda mesmo com os progressos; d'esse grau de instrucção, tanto pelo que diz respeito ao aproveitamento dos alumnos, como á maneira por que as disciplinas são professadas por parte dos respectivos lentes;

Não me alargo em mais considerações e limito-me por agora unicamente, a fazer uma pergunta ao sr. ministro do reino; conforme a resposta de s. exa. assim replicarei, para. o que desde já peço a v. exa. que, na occasião devida, consulte a camara sobre se me permitte responder immediatamente às considerações que o sr. ministro apresentar.

No artigo 11.º do decreto de 12 de agosto de 1886 diz-se:

«Os professores proprietarios e aggregados dos lyceus serão sempre nomeados pelo governo, em concurso de provas publicas dadas no lyceu da sede da circumscripção respectiva.»

No regulamento dos concursos para o provimento dos logares de professores dos lyceus, approvado por decreto de 16 de setembro de 1886, diz-se no artigo 3.° o seguinte:

«O concurso será aberto dentro de trinta dias depois de declarada a vagatura.»

Esta é a legislação, tanto organica como regulamentar, que diz respeito ao preenchimento das vacaturas nos differentes lyceus do reino. Pois até hoje, apesar da letra expressa do artigo 11.° do decreto de 12 de agosto e da, letra não menos expressa do respectivo regulamento, e, apesar de ter sido publicada no Diario do governo ha dois mezes a lista das, vacaturas, até hoje, digo, ainda se não mandou abrir, por parte da direcção geral de instrucção: publica, o concurso a que se referem os dois artigos citados!

Eu pergunto ao sr. ministro do reino que rasão de força, maior existe em virtude da qual uma lei da dictadura tenha a pouco trecho, isto é, a poucos mezes depois, de decretada, sido posta de parte. (Apoiados.)

Esta rasão deve evidentemente ser grave e poderosa!

Eu não quero por forma alguma tomar tempo desnecessario á camara, e por isso não farei considerações previas, sobre a resposta do sr. ministro do reino, que eu por emquanto ignoro absolutamente; mas, repito, peço a v. exa., sr. presidente, o obsequio de me conceder a palavra immediatamente a s. exa., para que não estejamos a protrahir indefinidamente um assumpto da mais alta importancia. (Apoiados.)

O sr. Presidente do Conselho de Ministros (Luciano de Castro): - Direi em poucas palavras, a rasão porque não mandei abrir concurso para o provimento dos professores nos lyceus centraes. A rasão é simples e creio que o illustre deputado ha de tomal-a na devida consideração.

Depois da publicação do decreto dictatorial que reformou os lyceus e depois de publicado o decreto regulamentar dos concursos dos professores, subiram ao ministerio do, reino representações dos professores provisorios dos mesmos lyceus, pedindo para que lhes fosse applicada a disposição provisoria da lei de 1880 que auctorisa o governo a prover sem concurso os professores que tenham mais de seis annos de serviço e um curso superior analogo. E porque esta disposição se tornou extensiva ao collegio militar, os professores requerentes, faziam valer esta circumstancia, pedindo que lhes fosse tambem applicada.

Ora, estando o decreto que reformou-a instrucção secundaria dependente da approvação das cortes, pareceu-me mais regular esperar que o parlamento se pronunciasse a esse respeito, ou adoptando-o tal qual está, ou inserindo-lhe alguma disposição provisoria, e só depois d'isto abrir os concursos.

E esta a rasão da falta que s. exa. estranha. Afigurou-se-me que eu seria mais respeitoso para com o parlamento e mostraria todo o desejo de acertar, esperando que a camara se pronunciasse a respeito do decreto a quem e refiro.

Logo que a camara se pronuncie ou seja confirmando-o ou fazendo-lhe qualquer modificação, hei de executar a lei conforme for votada pelo parlamento e mandarei proceder logo á abertura dos concursos.

São estas as explicações que tenho a dar ao illustre deputado.

O sr. Consiglieri Pedroso: - Peço a v. exa. que consulte a camara sobre se consente que eu responda ao sr. ministro do reino.

Resolveu-se affirmativamente.

18 *

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O sr. Consiglieri Pedroso: - Começo por agradecer á camara a permissão que deu, alterando a ordem da inscripção, para eu responder desde já ao sr. ministro do reino, e creia que não abusarei de similhante permissão, alongando por muito tempo as minhas considerações. Mas v. exa. comprehende que este assumpto é importante, e que se perderia muito mais tempo se eu fosse forçado a responder ao sr. ministro n'outra occasião, pois necessariamente teria então de recomeçar o debate.

A dois pontos se resume a minha replica ao sr. ministro do reino. O sr. ministro não cumpriu as disposições do decreto de 12 de agosto de 1886, e as do regulamento de 17 de setembro do mesmo anno, apesar d'essas disposições serem bem claras e terminantes, em primeiro logar porque no ministerio do reino existem representações contra o artigo da lei de que se trata, e em segundo logar porque o sr. presidente do conselho entendeu que, contendo esse decreto materia que está comprehendida no bill de indemnidade e por conseguinte sujeita á resolução da camara, não podia desde já dar execução á mesma lei sem que o parlamento sobre ella se pronunciasse.

Peço licença para fazer algumas considerações sobre estas duas singularissimas rasões, que em seu favor adduziu o sr. Luciano de Castro. Começarei por dizer que o parlamento nada tem com as representações que os professores provisorios, advogando os seus interesses, entenderam dever dirigir ao governo. Os professores, a que me refiro, estavam no seu direito representando contra um decreto da dictadura que, segundo elles, os ía ferir; mas pergunto, basta que haja um certo numero de representações contra um decreto que tem força de lei, para que o governo possa, por seu livre alvedrio, suspender a sua execução? Pois basta que haja um certo numero do representações, cujo valor mesmo a camara desconhece, para que o sr. ministro do reino se julgue auctorisado a suspender uma lei, sem ao menos o parlamento ser ouvido? Esta doutrina poderá ser muito liberal se assim o quizerem, mas então ao menos façam-na adoptar por todos os ministerios e em todos os casos analogos!

Eu estarei de accordo com o sr. ministro do reino em acceitar a suspensão da lei de 12 de agosto de 1886, se s. exa. obrigar tambem o seu collega da fazenda a suspender a execução do decreto de 27 de janeiro relativo ao regimen dos tabacos, uma vez que contra esse decreto ha representações bem mais graves, bem mais serias e bem mais numerosas do que contra o decreto de 12 de agosto de 1886. (Apoiados.)

Disse no outro da a proposito da discussão que está pendente na segunda parte da ordem do dia, o sr. ministro das obras publicas, que não podia haver duas jurisprudencias, uma para os regeneradores quando eram maioria, e outra para os progressista? quando eram maioria tambem; pois digo eu, applicada ao caso, de que se trata, esta doutrina de s. exa., como é então que ha duas jurisprudencias no governo?

No ministerio do reino suspende-se a execução de um decreto com força de lei unicamente porque ha algumas representações contra elle sem que o parlamento tenha d'essas representações a mais leve noticia sequer, a não ser neste momento; no ministerio da fazenda as representações contra o decreto de 27 de janeiro ultimo são sublinhadas com as cutiladas da guarda municipal do Porto: (Apoiados.) são apoiadas pelos factos de que a camara em interpellação especial ha de occupar-se dentro em pouco, e apesar d'isso o governo continua impassivel, julgando que é do seu dever manter este estado de cousas, contra o qual meio paiz se levanta a protestar!

Eu desejava que o sr. ministro do reino me explica-se como é que no governo podem coexistir duas jurisprudencias tão diversas...

Uma voz: - É porque há dois ministros do reino.

O Orador: - Se ha dois ministros do reino não sei; em todo o caso deve haver um unico presidente do conselho! Isto quanto ao primeiro ponto.

Com relação ao segundo ponto, o governo entende que, estando pendente sobre a doutrina do decreto de que se trata uma votação parlamentar, e devendo o mesmo governo ser absolvido da responsabilidade em que incorreu por exercer a dictadura, guarda-se para depois da absolvição da camara fazer executar a lei em toda a sua força.

Mas então, como é que se applica esta doutrina aos effeitos do regulamento de 14 de setembro de 1886, e não se applicou desde logo á propria publicação do mesmo regulamento? Porque se o argumento colhe para o regulamento não ter execução, senão depois do governo estar relevado da responsabilidade constitucional em que incorreu, era melhor que o governo não fizesse o regulamento em quanto não estivesse pelo parlamento approvada a lei. (Apoiados.)

Rasões de outra ordem ha, motivos mais graves e mais fortes, com certeza, pesaram no animo do sr. ministro para o impedirem de executar uma lei, que o governo julgou tão importante, que até dispensou a cooperação do parlamento para a decretar em dictadura. -(Apoiados.)

Com effeito, se a lei póde estar agora á espera da sua execução até que as camarás absolvam o governo por a ter decretado, não era melhor, mais constitucional, mais correcto, s. exa. aguardar que as mesmas camaras interviessem na feitura da propria lei? Isto não é invocar precedentes, porque eu não quero incorrer todos os dias na censura que um illustre amigo meu, que se senta nos bancos do governo, ha pouco contra mim formulou em conversação particular, accusando-me de faccioso por eu citar a todo o momento, para martyrio do governo, as palavras de alguns ministros, quando eram opposição. Não tenho culpa, porém, de a proposito de qualquer assumpto, encontrar uma incoherencia dos homens mais eminentes do partido progressista!

Alem d'isso, sr. presidente, eu n'este momento dou prova de que não quero continuar a merecer, nem mesmo particularmente, tão injusto epitheto da parte do cavalheiro a quem me estou referindo, por isso que me limito a discutir a resposta que n'este instante me foi dada.

Repito; para concluir, quanto ao primeiro ponto, não é admissivel que o sr. presidente do conselho declare ao parlamento que suspendeu a execução de uma lei em virtude de representações que tem-no ministerio do reino contra ella.

Em quasi todos os ministerios ha protestos a respeito de assumptos bem mais importantes; e, apesar d'isso, o governo não se julgou auctorisado a alterar uma linha sequer dos seus decretos, ou a modificar sequer um ponto das suas medidas! (Apoiados.)

Em segundo logar a doutrina do sr. ministro do reino de que espera pela discussão do bill, para então fazer executar o artigo 11.° da lei a que me, retiro, é um subterfugio de mau gosto, e que para o caso sujeito não colhe.

Ou devia ser logo executado o regulamento que se refere ao decreto, que reformou a instrucção secundaria; ou então a doutrina de s. exa. devia applicar-se, não só a este caso especial, mas a todas as leis que o governo promulgou em dictadura, não lhes dando execução sem o parlamento se ter pronunciado a respeito d'ellas. (Apoiados.)

É evidente, e insisto n'este ponto, que ha um motivo, que eu posso suspeitar, mas que não posso trazer para a discussão, porque me faltam as provas para parlamentarmente o fazer valer; é evidente, digo, que ha um motivo, que o illustre ministro não quiz revellar, mas que embaraçou a resposta que s. exa. se viu forçado a dar às minhas perguntas, que aliás eram bem claramente formuladas.

Se s. exa. quizer dar outras rasões que possam corroborar as suas primeiras affirmativas, estimarei muito que o parlamento possa d'ellas ter conhecimento.

Se s. exa. não tem outros motivos para allegar, alem

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d'aquelles que já allegou, eu, tomando nota do facto e pedindo á camara que tome tambem nota d'elle, reservar-me-hei para, em debate mais largo, onde não esteja tão apertado pela estreiteza do tempo, pedir contas ao illustre ministro, quanto ao modo por que s. exa. procedeu a respeito da execução do artigo 11.° do decreto com forca de lei de 12 de agosto de 1886.

Tenho dito.

O sr. Presidente do Conselho de Ministros e Ministro do Reino( Luciano de Castro): - Sr. presidente, o illustre deputado está enganado. Eu não suspendi nenhuma lei; o que apenas suspendi foi a execução de um artigo do decreto regulamentar de 16 de setembro de 1886, que mandou abrir os concursos para o provimento dos logares de professores dos lyceus, no praso de trinta dias, depois de se declararem as vacaturas.

As vacaturas foram publicadas ha já algum tempo. Eu o que fiz foi demorar a execução d'esta disposição do regulamento. De resto o decreto que reformou os lyceus está em plena execução.

O sr. Consiglieri Pedroso: - O artigo 11.° não está em execução.

O Orador: - As considerações do illustre deputado caem pela base, por que todo o decreto que reformou os lyceus está em execução, menos, como disse, na disposição regulamentar que diz respeito ao praso para a abertura dos concursos.

O sr. Consiglieri Pedroso: - Isso veremos.

Orador: - Repito, o que suspendi foi a disposição do artigo 3.° do decreto regulamentar de 16 do setembro de 1866; e, portanto, parece-me que as observações do illustre deputado carecem de fundamento.

Não tenho pretensões de convencer s. exa.; o que pretendo é defender-me o melhor que possa. E isso que trato de fazer.

Quanto á consideração que entendi dever ter para com o parlamento, esperando a sua resolução a respeito do decreto a que alludi, parece que ao illustre deputado não agradou. Pareceu-lhe mal que assim procedesse. Mas deve s. exa. ter em attenção que o meu fim foi evitar que, quando as cortes tomassem qualquer resolução no sentido de modificar mais ou menos as disposições relativas aos concursos, estes estivessem já abertos, ficando assim frustrada a acção parlamentar.

O que torno a dizer a s. exa. é que não suspendi nenhuma lei ; o que suspendi foi a execução do decreto regulamentar de 16 de setembro de 1886.

Imagine s. exa. que se tinham aberto os concursos e que as cortes resolviam que fossem applicadas aos professores provisorios as mesmas disposições transitorias que estão inseridas na lei de 1880, que dispensam os concursos aos professores que tenham mais de seis annos de ensino e um curso superior; havia de suspender os concursos depois de abertos?

O sr. Consiglieri Pedroso: - É isso o que póde succeder a todas as medidas decretadas em dictadura.

O Orador: - Ora eu ouvi o illustre deputado com tanta paciencia, sem nunca o interromper, que me parecia ter é direito de esperar igual procedimento da parte do illustre deputado.

O sr. Consiglieri Pedroso: - Póde v. exa. fallar que não o interromperei mais.
Peço a palavra.

O Orador: - A observação que o illustre deputado fez é applicavel a todas as leis, porque contra todas ellas póde haver reclamações; mas nem todas as leis estão como os actos dictatoriaes dependentes da confirmação das cortes. Esta é a differença.

E póde v. exa. estar certo de que eu não censuraria nenhum ministro que, em circumstancias identicas, tivesse procedido como eu.

Quiz aguardar as decisões parlamentares para não praticar um acto que causaria prejuizos irreparaveis, na hypothese do parlamento modificar algumas das disposições do decreto que reforma a instrucção secundaria.

Sobre o assumpto é o que tenho a responder ao illustre deputado: e ha de permittir-me s. exa. que eu n'esta occasião não esteja a discutir as cutiladas do Porto, nem o decreto de 27 de janeiro, sobre tabacos, porque isso não vem para aqui. Se não o satisfazem as rasões que dei, eu não tenho outras.

(S. exa. não reviu as notas tachygraphicas.)

O sr. Presidente: - Estão ainda inscriptos alguns srs. deputados, e entre esses o sr. Pinheiro Chagas, que pediu a palavra para quando estivesse presente o sr. ministro do reino.

Era já hora de passar á ordem do dia; mas como na quarta feira ultima o sr. Pinheiro Chagas manifestou desejos de chamar a attenção do sr. ministro do reino sobre assumptos que julga importantes; e como o sr. ministro do reino prometteu que hoje responderia, parece-me que assim, dadas estas circumstanciss especiaes, a camara quererá que se continue a dar a palavra aos srs. deputados que estão inscriptos, até que chegue a vez ao sr. Pinheiro Chagas. (Apoiados.)

Consultada a camara assim se resolveu.

O sr. Visconde de Monsaraz: - Mando para a mesa a seguinte

Participação

Participo a v. exa. e á camara que está constituída a commissão do bill, sendo
escolhido para presidente o sr. deputado Eduardo José Coelho, para secretario a mim, participante, e para relator o sr. deputado Antonio Candido. = Visconde de Monsaraz.

Para a secretaria.

O Sr. Alfredo Brandão: - Mando para a mesa diversos requerimentos, pedindo esclarecimentos pelo ministerio da marinha.

Estes requerimentos são todos numerados, e eu peço a v. exa. que faça com que os documentos pedidos me sejam enviados pela ordem numerica dos mesmos requerimentos.

Mando tambem para a mesa duas propostas para renovação de iniciativa de dois projectos de lei.

Os requerimentos vão publicados na secção competente a pag. 337.

As propostas ficaram para segunda leitura.

O sr. João Santiago: - Mando para a mesa uma justificação de faltas.

Vae publicada, a pag. 339

O sr. Pinheiro Chagas : - Começa por agradecer á camara o ter-lhe permittido usar da palavra, assim como não podia deixar de agradecer ao sr. presidente do conselho a resposta que dera ao sr. Consiglieri Pedroso, na qual s. exa. mostrava um certo respeito pelo parlamento.

O governo, depois de haver publicado um grande volume de decretos dictatoriaes, mostrava agora o desejo de que a execução de um d'esses decretos fosse demorada até que a camara se manifestasse ácerca d'elle.

Era curioso, porém, que o sr. presidente do conselho dissesse que não suspendera a execução de um decreto dictatorial mas sim a execução de um acto. O decreto não estava era execução na parte relativa ao concurso dos professores, ponto importante, e s. exa. dizia que elle não estava suspenso!

E o melhor ainda era que o decreto dietatorial fóra suspenso por um simples despacho do ministro, o que provava a pouca importancia que o governo dava aos seus decretos com força de lei.

Pondo, porém, de parte este ponto, o orador, chama a attenção do sr. ministro do reino para o seguinte:

A camara dos deputados em 1883, querendo prestar homenagem á memória de Antonio Rodrigues Sampaio, votara uma lei em que determinou se erigisse em S. Bar-

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tholomeu do Mar uma escola de ensino primario; com a denominação de Escola de Antonio Rodrigues Sampaio.

Desde o momento em que se votara a creação dessa escola,, era claro que no orçamento se devia consignar a verba para a construcção do edificio, e effectivamente assim se tinha feito e começara a construcção; mas agora noticias vindas dali diziam que estavam, suspensas as obras, e pela sua parte receiava que houvesse a intenção de se não proseguir n'essa construcção, e de a mandar fazer num outro local.

Como estavam presentes os srs. ministro do reino e das obras publicas, pedia a qualquer d'elles que se dignasse dar algumas explicações á camara a tal respeito.

Outro ponto para que queria chamar a attenção do sr. ministro do reino era para um facto que vira noticiado n'um jornal.

Era sabido que junto ao edificio da casa pia, em Belem, sé, construira um chalet, que fôra por muito tempo residencia do director da casa pia, e que para esse edificio fôra ultimamente transferida a enfermaria das creanças, com approvação do sr. ministro do reino, que elogiára o director interino por essa resolução.

Constava agora que o novo director, ha pouco nomeado para aquelle estabelecimento, o sr. Oliva, reclamara o chalet para sua residencia, e parece que effectivamente para lá ia residir.

Desejava, pois, saber qual o motivo por que aquelle edificio se não dava o destino que fôra marcado pelo director interino, com applauso do sr. ministro do reino.

(O discurso será publicado na integra quando s. exa. o restituir.)

O sr. Ministro das Obras Publicas (Emygdio Navarro): - (S. exa. não restituiu o seu discurso a tempo de ser publicado n'este logar.)

O sr. Ministro do Reino (Luciano de Castro) :- Responderei ás observações do sr. Pinheiro Chagas, ainda com relação á suspensão do artigo 11.° do decreto dictatorial, que reformou a instrucção secundaria.

Se s. exa. tivesse querido ter o incommodo de ler esse decreto, que não lhe mereceu essa importancia, não teria caído no equivoco, que transparece das suas palavras, e reconheceria que o artigo 11.° está suspenso por outro artigo do mesmo decreto. E o artigo 27.°, que torna os concursos dependentes de regulamento.

Em face desse artigo, verá s. exa. que não tinha rasão para fulminar contra mim uma accusação tão vehemente, como aquella com que pretendeu esmagar-me.

Com respeito ao chalet da casa pia, permitta-me o illustre deputado dizer-lhe que o informaram mal.

O sr. Pinheiro Chagas: - Quem me informou foi o Diario popular.

O Orador: - Segue-se d'ahi que alguem informou mal o Diario popular.
Effectivamente fui á casa pia, onde me demorei a examinar o museu industrial, e só tarde cheguei ao chalet; mas não approvei nem desapprovei a mudança da enfermaria para ali; o que fiz foi mandar, três ou quatro dias depois, um officio ao respectivo provedor, ordenando-lhe que suspendesse a mudança da enfermaria para o chalet.

Por este facto póde o illustre deputado avaliar a impressão que me resultou d'essa visita. E a este respeito não digo mais nada, porque a administração da casa pia está sujeita a uma syndicancia, cujo resultado ainda não tenho em meu poder. Mais tarde verei o modo como devo proceder.

Por agora julgo inconveniente dizer cousa alguma a respeito d'aquelle estabelecimento.

(S. exa. não reviu as notas tachygraphicas.)

O sr. Pinheiro Chagas: - A resposta do sr. ministro do reino obrigava-o a replicar.

Tinha s. exa. dito que o artigo 11.° do decreto dictatorial estava suspenso, porque o artigo 27.° d'esse mesmo

Decreto o suspendia até que a sua disposição fosse regulamentada; mas, observa o orador, desde, o momento, em que o regulamento já se achava publicado, a lei devia ser executada, e não podia ficar suspensa.

Com relação á casa pia, desde que o sr. ministro lhe per dia que suspendesse o seu juizo até chegar a syndicancia, a que mandára proceder, nada mais diria.

Ao sr. ministro das obras publicas agradecia as explicações que s. exa. dera sobre a escola de S. Bartholomeu do Mar, e como s. exa. declarava que era sua, intenção, trazer uma proposta de lei para transformar a escola de ensino primário em escola de pilotagem, aguardava essa apresentação, pedindo que ella se realisasse o mais depressa possivel.

Concluindo, mandou para a mesa um requerimento pedindo, pelo ministerio dos negocios estrangeiros, copia do officio ou officios em que o ex-director geral dos negocios estrangeiros expoz ao ministro o estado de indisciplina em que se achava a secretaria, e copia de qualquer officio em resposta a essas accusações, escripto por algum empregado do mesmo ministerio.

Mandou-se expedir.

(O discurso será publicado na integra quando s. exa. o restituir.)

O sr. Presidente:- O sr. Firmino Lopes mandou para a mesa uma representação dos juizes das varas de Lisboa e pediu que ella fosse publicada no Diario do governo. Vou consultar a camara a este respeito.

Assim se resolveu.

Teve o destino indicado a pag. 337.

ORDEM DO DIA

Continuação da discussão do parecer da commissão de poderes sobre o requerimento relativo á remessa do processo eleitoral de Felgueiras para o tribunal especial.

O sr. Presidente: - Passa-se á ordem do dia.

Continua em discussão a questão previa e tem a palavra sobre a ordem o sr. Franco Castello Branco.

O sr. Franco Castello Branco: - (S, exa. não restituiu o seu discurso a tempo de ser publicado n'este logar.)

O sr. Ministro do Reino (Luciano de Castro): - Mando para a mesa a seguinte

Proposta

Senhores. - Em conformidade com o disposto no artigo 3.° do acto addicional á carta constitucional da monarchia, o governo de Sua Magestade pede á camara dos senhores deputados a necessária permissão para que o sr. deputado Lopo Vaz de Sampaio e Mello, vogal effectivo do supremo tribunal administrativo, possa accumular, querendo, as funcções legislativas com as d'aquelle cargo.

Secretaria d'estado dos negocios do reino, em 26 de abril de 1887.= José Luciano de Castro.

Foi approvada.

O sr. Silva Cordeiro (sobre a ordem): - Apresentou a seguinte moção:

«A camara, affirmando a inalienabilidade da sua jurisdicção, relativamente ao processo da eleição de Felgueiras passa á ordem do dia. = O deputado, J. A. da Silva Cordeiro.»

Fez longas considerações em sustentação desta proposta, respondendo ao mesmo tempo á algumas das observações feitas pelo sr. Franco Castello Branco.

(O discurso será publicado na integra guando s. exa. o restituir.)

Lida na mesa a moção de ordem foi admittida e ficou em discussão.

O sr. Marçal Pacheco (sobre a ordem): - Mando para a mesa a seguinte proposta:

«Considerando que a commissão assenta os fundamentos

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do parecer que se discute sómente na existencia de factos;

«Considerando que taes factos são inteiramente destituidos de verdade e que só por erro de apreciação a commissão os invocou:

«Proponho que o parecer volte de novo á commissão para que esta o emende e reforme.

«Sala das sessões, 30 de abril de 1887.= O deputado por Faro, Marçal Pacheco.»

Sr. presidente, começo por felicitar o illustre deputado que me precedeu no debate, felicitando igualmente a camara pelo discurso brilhante que acaba de ouvir. Se pouco ou nada aproveitou á questão, deu todavia á camara mais que sobrado motivo de regosijo por contar no seu seio um membro tão distincto. E quanto mais distinetas são as qualidades do orador que me precedeu, tanto mais deve doer ao sr. ministro das obras publicas tel-o arrastado a um duro sacrificio, porque, diga-se a verdade, foi o sr. ministro das obras publicas quem provocou esta questão.

(Interrupção do sr. Silva Cordeiro que se não percebeu.)

Esteja s. exa. descansado que nisto não vae a menor censura; digo isto porque, se o sr. ministro das obras publicas não viesse mostrar á camara o seu empenho em que a eleição de Felgueiras não fosse ao tribunal especial, ninguem teria necessidade de o secundar...

O sr. Silva Cordeiro: - Eu não vim secundar o sr. ministro das obras publicas, vim expor simplesmente a minha opinião.

O Orador: - Muito bem; mas se o sr. ministro das obras publicas não fallasse, naturalmente, nem esta questão existia, e não existindo a questão, não teria o illustre deputado tomado a palavra sobre ella. (Apoiados.)

O sr. ministro das obras publicas não seria a causa determinante do illustre deputado fazer o seu discurso, mas foi de certo a causa occasional. (Riso. - Apoiados)

Feitos os comprimentos do estyla, permitia-me v. exa., sr. presidente, que, antes de mais nada, e desde já, eu retire d'este lado da camara uma accusação injusta e menos exacta, que acaba de fazer-lhe o illustre deputado. S. exa. accusou-nos, e até áquelles que ainda não fallaram, de termos collocado a questão no terreno estreito e mesquinho da coherencia e dos precedentes partidarios.

Mas, sr. presidente, quem foi que trouxe a questão para aqui? Pois o que diz o sr. relator no seu parecer?

O parecer diz:

«A commissão, acatando, como lhe, cumpre, a deliberação d'esta camara, tomada na sessão de 12 de janeiro de 1885, e considerando que o requerimento foi dirigido á mesa já depois de haver sido apresentado á camara o parecer sobre esta eleição, deve ser ella considerada, para todos os effeitos, como estando debaixo da sua jurisdicção directa e immediata.

«Considerando que, n'estas circumstancias, segundo a jurisprudencia da camara, é esta quem deve conhecer e julgar ácerca d'esta eleição, é a commissão de parecer que o processo não podo ser remettido ao tribunal especial.»

V. exa. vê que o sr. relator allega uns certos factos; estes factos são-nos attribuidos a nós, diz-se claramente que fomos nós que os praticámos. Naturalmente, nós, chamados assim á barra, tinhamos e temos o dever e o direito de nos defendermos. Mas não fomos nós que trouxemos a questão para este terreno; foi o sr. relator da commissão, e, por consequencia, foi o illustre deputado; porque, segundo a theoria do sr. relator, as commissões são delegações da maioria, e, portanto, se a commissão de verificação de poderes é delegação da maioria, se o illustre deputado que me precedeu - pertence á maioria, é claro que foi s. exa. quem trouxe a quentão para este terreno. (Apoiados)

O illustre deputado quiz mostrar á camara que o governo não tinha que intervir n'esta questão, que era uma questão da camara, uma questão aberta, open question, como s. exa. disse, em inglez. Pois eu fallando tambem em inglez? dir-lhe-hei: All-right! (Riso prolongado).

Mas eu digo que estou com illustre deputado em que isto deve ser um questão aberta, não é pelos mesmos motivos, que s. exa. expoz. O illustre deputado fundou-se no artigo do regimento, que diz que todo o parecer deve dizer se é ou não dado de accordo com o governo: e concluiu que se este parecer nada diz a este respeito, é porque o governo nada tem com a questão. Perdão, eu digo que o governo não tem opinião sobre o assumpto que se debate, mas é porque o governo se incumbiu já de nos dizer que não está de accordo comsigo mesmo a este respeito. (Apoiados.)

O sr. ministro das obras publicas tem uma opinião, e o sr. presidente do conselho tem outra. Isto é o que ficou bem averiguado. Ahi está a rasão porque o parecer não diz se o governo está ou não de accordo. E porque não se sabe quem é n'estas circumstancias o governo. (Riso.- Muitos apoiados.)

O illustre deputado que me precedeu no debate, com a sua susceptibilidade nimiamente melindrada, maguou-se muito por ter dito o sr. Franco Castello Branco, ou algum outro membro d'este lado da camara, que a maioria não se determinava n'este assumpto pela sua consciencia. Ora, o illustre deputado vae ver que ninguem põe em duvida a verdade da consciencia da maioria.

O sr. Silva, Cordeiro: - Eu fallei sómente da minha consciencia.

O Orador:- Pois tambem ninguem põe em duvida a consciencia do illustre deputado.

Se o parecer for approvado, a maioria não terá votado com consciencia ao justo, do verdadeiro, na sua accepção eterna e absoluta, mas de certo terá votado com a sua consciencia aconselhada pelo sentimento das conveniencias partidarias. Se o parecer for rejeitado, a maioria terá posto de lado a inspiração partidaria, mas terá votado com a consciencia do que é justo e verdadeiro.

Fique, pois, tranquillo o illustre deputado, que nós nem por um momento pomos em duvida que a maioria ha de votar com consciencia. Se votar a favor cio parecer, vota com consciencia, a consciencia partidaria; se votar contra, vota com consciencia, a consciencia da verdade. Riso. - Apoiados.)

Não ha n'isto melindre nem offensa para ninguem.

Todos os que andam envolvidos n'estas questões publicas sabem quantas vezes os homens superiores da politica põem de parte a consciencia para attender a reclamações instantes e de occasião. E fazem-n'o sempre em nome dos principios.

Na triste confissão d'este facto não ha injuria para ninguem.

Tambem o illustre deputado, a que estou respondendo, fallou muito nas
imperfeições da lei eleitoral de 21 de maio de 1884.

N'este ponto somos os menos competentes para responder.

Quando nós temos um advogado tão illustre e tão digno, que é um ornamento da tribuna, e a mais bella palavra desta casa, quando está n'esta sala o sr. Antonio Candido, que, sempre que falla sobre estes assumptos de direito eleitoral, affirma que possuimos a lei mais perfeita da Europa o do mundo, francamente nós não devemos tomar a palavra. Envio o illustre deputado para o sr. Antonio Candido, e elle de certo se encarregará de lhe responder. (Riso . - Apoiados.)

Ainda e tambem o illustre deputado que me precedeu, fallou de differentes argumentos juridicos que se podiam, invocar sobre o assumpto.

Fallou-nos da excepção de incompetência, do caso julgado, do aresto e não sei se da litis pendencia. Não é a primeira vez que tudo isto é trazido para esta questão. Mas, francamente, sr. presidente, ouvindo-se fallar tanto em aresto, excepção de incompetencia, caso julgado e litis pendencia parece que estamos no tribunal da Boa Hora ou

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em qualquer outro tribunal judicial. Mas é preciso que de uma vez nos convençamos que aqui é a camara dos deputados. Esta invocação de termos e meios juridicos póde fazer-se para formular uma comparação ou por mera figura de rhetorica. Sempre e tão constante é inconveniente, porque a final a gente chega a convencer-se de que estamos n'um tribunal.

Ora aqui não ha advogados, nem juizes, nem representantes do ministerio publico. Ha representantes do paiz. (Apoiados.) Não estamos aqui para exercer vindictas de um partido contra outro, em nome de casos julgados, maus ou bons, d'este ou d'aquelle partido. (Apoiados.)

Estamos para fazer leis sabias e justas e cooperar para o bem geral do paiz, e mais nada. E claro que podemos errar, na apreciação da justiça, podemos não ser suficientemente sábios para fazermos leis sabias. Com isso, porém, já o eleitor conta; (Riso.} agora com o que elle não conta, quando para cá nos manda, contando com os erros e fragilidades da nossa intelligencia e do nosso espirito, é com este facto de estarmos para aqui entretidos e occupados nestas sabatinas, em que o sr. ministro das obras publicas se levanta para dizer «isto é bom porque os senhores o fizeram, ha dois annos, mas se ê mau, aguentem-se!» (Apoiados.)

(Com vehemencia.) Isto é deploravel, isto é triste, isto é corrosivo, não póde ser, não póde continuar, e contra isto é que me revolto. (Apoiados.)

Caso julgado! O que é o caso julgado f Mas o caso julgado ou é uma creação de pura phantasia que os senhores da maioria fabricaram para seu uso e não merece discussão, ou é um meio de prova juridica, segundo a sua noção legal, e então é preciso applical-o tal qual elle é, acceital-o com toda a sua significação.

Ora vejamos o que é o caso julgado. Eu abro o codigo civil e leio:

Art. 2503.° O caso julgado só póde ser invocado como prova, verificando-se as seguintes condições:

«1.ª A identidade do objecto, sobre que versa o julgamento.» Esta eleição é a da Madeira? Não é; é a de Felgueiras. Logo não ha identidade de objecto. (Apoiados.)

«2.ª A identidade do direito ou causa de pedir.» O direito é o mesmo? Não. Ha dois annos, pedia-se que a eleição da Madeira fosse ao tribunal especial, estando já em discussão nesta casa, o respectivo parecer. Agora pede-se que vá a de Felgueiras, quando o parecer da commissão nem conhecido é d'esta camara.

«3.º A identidade dos litigantes e da sua qualidade juridica.» Pergunto ainda:
Os litigantes são os mesmos? Ningurem o dirá.

Como se vê, o caso julgado, ou é um argumento contraproducente, ou não serve para nada na questão que se debate. (Apoiados.)

Mas se por um momento eu me deixasse arrastar por esta argumentação jurídica, então teria direito a pedir aos illustres deputados que a acceitassem com todas as consequencias.

O artigo 2507.° do codigo civil trata das provas. Qual é o meio de prova que está em primeiro logar? E a confissão das partes. E quaes são as partes n'este processo? E a maioria e somos nós. Ora nós podemos invocar, contra o que agora se pretende, a confissão da maioria, porque a maioria, pela voz dos seus membros mais importantes é graduados, sustentou, confessou em 1880, que era sempre occasião de ir ao tribunal especial qualquer eleição. (Apoiados.)

Mas digâmos a verdade. Não é regular esta discussão por este caminho da jurisprudencia, do aresto, do caso julgado, da litis pendencia, porque, a final, nós somos a assembléa dos deputados da nação para dizermos o que sentimos e pensamos, pela noção que tivermos da rasão e da justiça das causas que defendemos, e sómente sobre isto é que a camara delibera na completa consciencia da sua soberania. Tudo o mais é introverter o methodo dos debates
falsear a nossa missão.

Não sei se deixei algum ponto para dar resposta ao illustre deputado que me precedeu.

Se deixei, foi de certo devido a esquecimento involuntario, e nunca a propósito de não responder ao distincto orador, por quem tenho a maior consideração.

Sr. presidente, a hora está a dar, está dando agora mesmo, e eu não desejava ficar com a palavra reservada para outro dia...

Vozes de todos os lados da camara: - Falle, falle.

O Orador: - Agradeço penhoradissimo a grande benevolencia que a camara quer ter comigo, e passo rapidamente a sustentar a minha proposta.

Mas antes de entrar propriamente no assumpto da minha moção, direi duas palavras ao illustre relator da commissão, em resposta ás que s. exa. quiz proferir no seu ultimo discurso, com sobrescripto directo para mim.

S. exa. fez o favor de alludir ao modesto discurso que eu proferi na sessão de 1885.

S. exa. não fez senão honrar-me, e eu quero corresponder, agradecendo-lhe reconhecido a sua delicadeza.

Disse s. exa. que mal estranhara eu que o sr. Elias Garcia attribuisse a cavalheirismo dos membros da opposição de então a assignatura d'elles no requerimento da eleição da Madeira.

Criticando as minhas censuras, disse o sr. relator que não, que não havia motivo para estranhezas da minha parte, que sempre assim se tinha feito, que entre cavalheiros era assim que se procedia, que o cavalheirismo é uma noção que está entendida em todas as assembléas, e que entre cavalheiros era natural
emprestarem-se as assignaturas de uns a outros, etc., etc.

Ora, eu quero dizer ao illustre relator da commissão, que apesar da muita consideração que tenho por s. exa., não posso admittir similhante doutrina.

Nós somos todos cavalheiros, de certo, mas uma assembléa de cavalheiros não é precisamente uma assembléa de deputados.

As assembléas de deputados são assembléas de cavalheiros, mas uma assembléa de cavalheiros nem sempre é uma assembléa de deputados. (Riso. - Apoiados.)

O caso do empréstimo das assignaturas dá logar ás mais singulares consequencias; eu tenho aqui uma moção, e o illustre relator da commissão é um cavalheiro, como ninguem póde pôr em duvida; eu prezo-me tambem de o ser. Somos, portanto, dois. cavalheiros. Posto isto, vou fazer um pedido ao illustre relator:

V. exa. empresta-me a sua assignatura?

O sr. Alves da Fonseca: - Talvez.

O Orador: - Repare v. exa. que é para a minha proposta...

O sr. Alves da Fonseca: - Para essa, não.

O Orador : - Ah! Não empresta ? Mas ambos somos cavalheiros! (Riso.) Mas s. exa. não empresta a sua assignatura porque ficava sem ella. (Riso.)

Esta theoria do emprestimo e do cavalheirismo applicada ás assignaturas é singularissima! (Apoiados.)

É claro que nós não podemos dispensar o manual de civilidade do sr. João Felix Pereira, mas não é por elle que positivamente havemos de regular as discussões...

Os deputados assignam as propostas, os projectos de lei, os requerimentos em nome da justiça e do interesse publico, que recommendam. Só isto póde ser e nada mais do que isto.

Tambem se referiu o sr. relator a outras palavras minhas, a respeito do - sempre - do - nunca - e do - algumas vezes - e disse que este - algumas vezes - osculava entre os dois termos de eternidade, como o pendulo de um relogio.

Não cheguei bem a comprehender o que eram estes dois

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termos de eternidade, mas isso importa pouco ao caso. O que eu claramente percebi foi que o illustre relator pretendeu alegrar a camara, fazendo graça, espirito, humorismo, ácerca do que eu disse na sessão de janeiro de 1885. Não levo isto a mal ao illustre relator. Sei que o não fez para me maguar.

O sr. Alves da Fonseca: -Apoiado.

O Orador:- Sei-o bem. O illustre relator entendeu talvez que tirava d'ahi um effeito aproveitavel á causa que defendia. Nenhum outro intuito teve, estou seguro. Mas, porque esta é a minha convicção, permitta-me o illustre relator que eu, á boa paz, lhe diga uma cousa. Quando o illustre deputado quizer arrancar á camara um riso alegre e franco, uma gargalhada sonora e divertida, mesmo muitos risos e muitas gargalhadas, o illustre deputado não precisa de explorar os discursos alheios nem as idéas dos outros. Isso é bom para quem não tem recursos proprios. (Riso.- Apoiados) O illustre deputado não carece de ter essa preoccupação. Falle... e deixe correr o marfim. (Riso prolongado.)

Nisto não vae a minima injuria nem desconsideração para com o illustre deputado, vae sómente um troco de amabilidade a que eu não podia faltar... (Riso.)

Liquidada esta divida de gratidão, vou já, a correr, justificar a minha proposta.

O parecer, que se discute, tem duas partes essencialmente distinctas, embora tenham um caracter commum: o de serem ambas inexactas. Estas duas partes distinctas são os considerandos e a conclusão. Eu afianço á camara agora, amanhã, aqui, na imprensa, em toda a parte, onde se possa fazer uma demonstração intellectual, que estes considerandos são inteiramente desprovidos de verdade. (Muitos apoiados.)

Eu chamo para este ponto a attenção da camara, porque isto é uma questão grave. (Apoiados.) É grave que se diga a uma camara o que não é verdade. (Apoiados.)

Creio que a commissão o fez, não por vontade, mas por erro intellectual. Mas certo é que o fez.

O parecer diz:

Considerando que o requerimento foi dirigido á mesa, já depois de haver sido apresentado á camara o parecer sobre esta eleição, etc.

Isto não é verdade, sr. presidente. Eu nego que isto seja exacto.

O requerimento não foi apresentado depois do parecer. Liquidemos este facto. O parecer foi apresentado na mesa quando na mesa foi apresentado o requerimento.

Não discuto nem me é licito discutir, depois da palavra honrada de v. exa., sr. presidente, qual foi o primeiro que pediu a palavra, se o sr. relator, se o apresentante do requerimento.

Nem isso importa para a questão. O que eu affirmo contra a commissão é que o parecer não foi distribuído pela camara ao mesmo tempo em que foi apresentado o requerimento. (Apoiados.) Não foi ao mesmo tempo e, muito menos, antes do requerimento ter sido presente na mesa. (Apoiados.)

A mesa não é a camará. E preciso que não se introduza esta logomachia para escurecer a verdade dos factos. (Apoiados.) A mesa é uma cousa e a camara é outra. (Apoiados.) A mesa é uma delegação da camara como o são todas as commissões, mas são delegações para exercerem direitos nos estrictos limites d'essas delegações. (Apoiados.)

E mal se comprehenderia que a mesa e as commissões fossem delegações da camara para todos os effeitos.

Então para que estariamos nós aqui? O mais economico seria reunirmo-nos no primeiro dia, nomearmos a mesa o as commissões e irmo-nos embora ...

Cá ficavam a mesa e as commissões para representar a camara. (Apoiados.) Mesa e commissões discutiriam e votariam (Apoiados.) Mas esta theoria é absurda, não se póde sustentar um minuto. (Apoiados.)

O regimento, que é lei desta casa e que a todos os momentos se dispensa, e este facto prova incidentemente a força dos arestos, prova com quanto escrupulo e consciencia a maioria da camara não quer agora passar por cima do aresto de 1885, quando passa a cada momento por cima do regimento, que não é outra cousa senão uma serie de arestos e de deliberações da camará... o regimento, repito, diz no artigo 12.°:

«Os pareceres que se apresentarem sobre os processos eleitoraes serão impressos e distribuidos pela junta preparatoria ou pela camara, para poderem entrar na ordem do dia.»

Como o illustre relator vê, a não ser que se admitta que a impressão e distribuição não levam tempo, é claro que ha de ser necessario que a apresentação na mesa preceda a distribuição na camara.

Apresenta-se o parecer na mesa, em seguida é impresso e distribuido e, depois, é que é apresentado á camara.

Logo é clarissimo que, tendo o parecer dado entrada na mesa ao mesmo tempo que o requerimento, como ninguem nega e até foi affirmado pelo sr. presidente, esse parecer foi distribuido na camara depois de estar ha mesa o requerimento. (Apoiados.)

Portanto, quando aqui se diz que o requerimento foi dirigido á mesa depois de haver sido apresentado á camara o parecer, diz-se uma cousa que não é exacta. (Muitos apoiados)

O segundo considerando diz:

«Considerando que nestas circumstancias, segundo a jurisprudencia da camara, é esta quem deve conhecer e julgar desta eleição, etc.»

Também é inexacto este considerando. Admittindo por um momento esta terminologia, a jurisprudencia da camara, nem por isso deixa de ser certo que a jurisprudencia ou o precedente da camara não podem consistir naquillo que eu digo, no que diz o sr. Franco Castello Branco, ou no que diz o sr. Emygdio Navarro.

Precedente da camara só póde assentar na deliberação que a camara tenha tomado. (Apoiados.)

Só essa deliberação póde constituir precedente. Ora v. exa., sr. presidente quer saber, talvez não queira, porque de certo já o sabe, qual foi o aresto, jurisprudencia, caso julgado ou como queiram chamar-lhe, da camara em 1885?

Eu vou ler o que a camara votou. Foi isto: «A camara delibera proseguir na discussão e apreciação do processo eleitoral da Madeira, reserva-se a plenissima liberdade de o approvar ou rejeitar consoante o entender n» sua consciencia soberana e continua na ordem do dia.»

Aqui está o que a camara votou e approvou. Este é o precedente da camara.

Eu estou prompto a sustentar o que então disse, mas ainda quando não o sustentasse, isso nada importava á questão, porque eu podia sustentar com maus argumentos uma cousa boa. Os meus argumentos não servem para infirmar a verdade da causa que sustentei. Os meus argumentos podiam ser maus, não serem procedentes, e no emtanto eu podia, no fundo da questão, ter por meu lado a justiça e a verdade. (Apoiados.)

Consequentemente o que se póde invocar como precedente da camara foi o que ella deliberou. Nada mais e nada menos. (Apoiados.) .Quando o sr. relator quizer saber da minha coherencia politica estou às suas disposições. Quando s. exa., ou algum membro desta casa, quizer liquidar contas com a minha responsabilidade politica, tem o direito de invocar o que eu disse e eu lhe responderei como poder e souber, mas quando quizerem fallar em nome das deliberações da camara, não podem argumentar com as minhas opiniões, Voas ou más. A deliberação foi esta: proseguir na discus-

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são. Ora, quem diz proseguir, diz continuar, e quem diz continuar, suppõe um começo; logo houve começo de discussão, discussão pendente. (Apoiados.)

Onde está agora a discussão sobre este parecer? Está o parecer da eleição de Felgueiras em discussão? Pediu algum membro d'esta casa a palavra sobre elle? Não. Logo, quando o sr. relator diz que funda o seu parecer sobre uma deliberação da camara, affirma uma inexactidão, invoca um facto que não é verdadeiro, que não existiu. (Apoiados.)

E não é preciso que eu o diga, já s. exa. o disse no primeiro dia em que fallou.

O sr. relator disse que não era propriamente este o caso de 1885, mas que era guasi. (Apoiados.)

Pois então ponha s. exa. aqui no parecer, que é a quasi jurisprudencia da camara, e nós lhe provaremos então, se é o caso de admittir o quasi ou retirar o quasi. (Riso. - Apoiados.)

Vamos á conclusão do parecer.

Muitas vezes uma conclusão, sob o ponto de vista logico, é falsa, mas a doutrina
que contém é verdadeira. Mas aqui não ha verdade sob nenhum aspecto.

A conclusão do parecer é falsa como conclusão e é falsa como doutrina. E falsa como conclusão, porque as premissas, contidas nos considerandos, são destituidas de verdade, como já mostrei á saciedade. (Apoiados.)

É falsa a doutrina porque é absurda, e é absurda porque implica a inexecução do artigo 11.° da lei de 21 de maio. Uma interpretação de lei que conduz á impossibilidade da sua execução é forçosamente falsa. (Apoiados.)

Sr. presidente, eu sou o mais insuspeito que posso fallar n'esta casa ácerca d'esta lei e da sua execução. Sou o mais insuspeito porque eu disse em 1885 e agora não tenho duvida em repetilo e affirmarei sempre, que reputava e reputo a lei de 21 de maio attentatoria do prestigio d'esta camara e sobretudo do principio da divisão dos poderes, que é a base primordial em que deve assentar o systema representativo e o jogo regular das instituições.

Eu sempre entendi que esta lei era uma dimanação d'aquella triste politica juridica do sr. José Luciano de Castro, que consiste em entregar tudo aos tribunaes judiciaes e fazer do governo deste paiz, em vez de um governo constitucional, um governo judicial. (Apoiados.) Mas as minhas theorias e os meus principies, a minha vontade e as minhas affirmações, quanto a doutrinas, cessam diante do dever que tenho de obedecer á lei. (Apoiados.)

A lei deve ser cumprida emquanto for lei. E não o digo agora por conveniencia partidaria, já o disse e affirmei em 1885 e ainda o sustento, hoje, em 1887.
Eis o que eu dizia n'esta casa em 1885:

«Entretanto, eu nem fui ouvido nem consultado. Nenhuma responsabilidade me cabe no accordo e suas consequências. Vá a responsabilidade a quem de direito. Isto, porém, não quer dizer que eu não acceite a lei, viesse ou não viesse do accordo. É lei do paiz. Tanto basta para lhe dever obediencia.

«Isto que faço são estudos retrospectivos tendentes a provar que não póde invocar-se o prestigio desta assembléa, quando se lhe pede que abdique da sua jurisdicção por uma reconsideração que nenhum motivo justifica.» (Apoiados.)

Em 1887 sabem o que eu fiz?

A camara vê, comprehende nitidamente que sob o. ponto de vista das conveniencias partidarias d'este lado da camara, quando os primeiros pareceres aqui se apresentaram para irem os pareceres ao tribunal de verificação de poderás, e quando pelas vozes auctorisadas dos srs. Elias Garcia e Consiglieri Pedroso, aqui se levantou a questão de se saber se a camara devia ser ou não ouvida sobre os respectivos requerimentos, no meu ponto de vista partidario eu devia dizer e votar que não. Pois eu disse e votei que sim. A camara é testemunha que eu, com o meu voto e com a minha modesta palavra, me puz ao lado da maioria (Apoiados.)

Portanto, sou coherente, e o que sustentei em 1885 sustento-o agora. Sou coherente nos actos e nas palavras, nos actos, sr. presidente, que é onde custa mais a sustentar-se a dignidade da coherencia. (Apoiados.)

N'esta questão pensei sempre como penso agora. E o que eu não comprehendo, o que é desgraçado, o que é triste, é que sejam o sr. ministro das obras publicas e a maioria progressista os que venham agora acobertar-se com a falsa invocação de um precedente mais falso ainda, para renegarem, como Judas, as suas affeições ás doutrinas e princípios que ha dois annos sustentaram nesta casa. (Apoiados.)

Isto é que é triste, desgraçado e corrosivo! E sobretudo damnoso para as instituições, porque quando o paiz perder a fé nos seus homens publicos, ai das instituições! (Apoiados.)

Ai das instituições, sr. presidente, porque menos se gastam as instituições por si proprias do que com o desprestigio dos homens que as servem. (Apoiados.} Mas eu já presentia este deploravel espectáculo de incohereucia e contradicção da parte dos homens do governo! Querem v. exas. e a camara saber porque?

Quando o sr. Lopo Vaz apresentou aqui o requerimento para ir ao tribunal especial a eleição de Villa Real de Santo Antonio, um dos mais conceituados jornaes de Lisboa, e que passa por ser orgão do sr. ministro das obras publicas, commentou o caso. E antes de proseguir eu devo fazer uma declaração. Quando eu cito n'este logar a opinião de um jornal não é para chamar á autoria os seus redactores ou os seus editores. E pela muita consideração que me merece essa opinião. Mais nada. Mas dizia o alludido jornal então:

«O sr. Lopo Vaz apresentou um requerimento, assignado por quinze deputados, para que fosse enviado ao tribunal de verificação de poderes a eleição de Villa Real de Santo Antpnio. Sangrando-se em saude, como vulgarmente se diz, o sr. Lopo
Vaz, que de certo se lembrava da triste proeza da maioria regeneradora em 1885, quando, a despeito de um requerimento de quinze deputados, negou a remessa ao tribunal do processo eleitoral da Madeira, o sr. Lopo Vaz, dizemos, reeditou, em tom plangente, as sophisterias que em 1885 tinham sido apresentadas, buscando distinguir, onde a lei não distingue.

«O artigo 11.° da lei de 21 de maio de 1884 diz textualmente o seguinte:

«Artigo 11.° A verificação de poderes dos deputados «eleitos continuará a ser feita pela junta preparotoria ou pela camara.

«Quando, porém, tiver havido algum protesto nas assembléas primarias ou nas de apuramento, o respectivo processo será julgado por um tribunal, organisado como no artigo seguinte se preceitua, logo que assim tenha sido requerido por quinze deputados eleitos ou com poderes já verificados.»

«Tal é a letra da lei. Em 1885, os regeneradores sophismaram-n'a, negando aos seus adversarios a garantia que n'ella se consignou. Agora começam os mesmos regeneradores por pedirem para os seus o que recusaram aos contrarios.
Excellente logica! Santa coherencia! Maravilhosa iniciação da chefia do sr. Lopo Vaz!

«Por sua parte, a maioria não fez objecções, e a lei, que os regeneradores illudiram, será agora fielmente cumprida.»

Olhem se o sr. Lopo Vaz senão sangra em saude! (Riso.) Como isto é curioso e divertido! Não é uma opinião de ha dois annos, e de ha quinze dias! (Apoiados.)

Nós sophismámos a lei em 1885. Logo, o parecer da commissão que agora querem approvar é um sophiama. (Apoiados.) E por isso a lei será agora fielmente cumprida... (Riso.)

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É o que se está vendo. (Riso. - Apoiados.)

Quando li isto, disse lago de mim para mim: temos caso! (Riso.)

E porque o disse? E porque o suspeitei? Foi, sr. presidente, porque é sabido que quando o partido progressista faz uma affirmação, succede precisamente o contrario! (Apoiados.) Infelizmente é esta a verdade. Custa dizel-a, porque nada aproveita o paiz com esto espectáculo que nos dão os nossos adversarios. (Apoiados.)

Mas é assim! (Apoiados.)

O partido progressista é perseguido inexoravelmente, constantemente, por um destino fatal e inexpugnavel que em toda a parte e a cada instante o acompanha e affecta! Onde elle fizer uma promessa, onde elle indicar um programma, ahi apparece logo uma falta de cumprimento, um desmentido acabado e completo! (Apoiados.)

E eu já não quero fallar no programma da Granja, em programmas politicos e promessas antigas. Na nossa terra os programmas politicos, prescrevem quasi por tão pouco tempo como o que é marcado na lei, para as prescripções das dividasáàs pharmacias! (Riso. - Apoiados.)

Bastam os programmas recentes. Vejam. O sr. José Luciano de Castro apresentou-se n'esta casa, em 22 de fevereiro, á frente do ministerio que ali está.

Com voz serena e grave, em tom austero expoz o seu programma.

Eram cinco os pontos cardeaes d'esse programma:

1.° «Tolerancia.) (Apoiados.)

2.° «Reducção nas despezas.» (Apoiados.)

3.° «Nenhum aggravamento de impostos.» (Apoiados.)

4.° «Ministério da agricultura.» (Riso.)

5.° «Manutenção do respeito á lei.» (Apoiados.)

Veja v. exa. e veja a camara! A tolerancia foi affirmada pelo governo em mil despachos de transferencias, demissões e aposentações, sem fallar no modo como foi garantida a liberdade eleitoral em diversos pontos do paiz. (Apoiados.)

A reducção de despeza está escripta no orçamento! (Apoiados.)

O nenhum aggravamento de impostos está demonstrado na contribuição sumptuária e de renda de casas e na proposta de reforma pautal.

O ministerio de agricultura... diga o sr. Navarro o que fez d'esse ministerio.(Riso.)

Tenho pena de não ver presente o sr. Oliveira Martins, porque lhe queria perguntar, se o ministerio da agricultura ficou no bolso do sr. ministro das ouras publicas. (Riso).

Manutenção do respeito á lei! Ah ! sr. presidente! Manutenção do respeito á lei! que escarneo e que irrisão! O governo deu-nos a prova do seu respeito á lei em oito mezes da mais desenfreada e descarada dictadura que tem havido n'este paiz! (Apoiados.)

Isto é triste, é profundamente deprimente, é desgraçãdo e deploravel! Não ha de fazer só mal ao governo, creiam-n'o os srs. ministros, ha de fazer mal ao paiz, ha de fazer mal a mais alguem! (Apoiados.)

Vozes: - Muito bem.

(O orador foi cumprimentado por muitos srs. deputados de todos os lados da
camara.)

Leu-se na mesa a seguinte

Moção de ordem

Considerando que a commissão assenta os fundamentos do parecer que se discute sómente na existencia de factos;

Considerando que taes factos são inteiramente destituidos de verdade e que só por erro de apreciação a commissão os invocou:

Proponho que o parecer volte de novo á commissão para que esta o emende e reforme.

Sala das sessões, 30 de abril de 1887. = O deputado por Faro, Marçal Pacheco.

Foi admittida, ficando em discussão com o parecer.

O sr. Presidente: - A ordem do dia para segunda feira é a continuação da que está dada.

Está levantada a sessão.

Eram seis horas e meia da tarde.

Discurso proferido pelo sr. deputado Teixeira de Sampaio, na sessão de 22 de abril, e que devia ler-se a pag. 178, col. 1.ª

O sr. Teixeira, de Sampaio: - Tendo de defender n'esta assembléa a minha eleição; sou fatalmente impellido a contar á camara uma longa serie de crimes praticados pelos delegados do governo no concelho de Alijo durante periodo eleitoral decorrido desde novembro, do anno passado do até 9 de marco do corrente anno, quer dizer, desde que começaram as eleições municipaes e districtaes, até que terminou a eleição de deputados.

O governo, e com especialidade o sr. ministro do reino, é o principal responsavel por essa serie de crimes praticados pelos seus delegados, pelo pouco cuidado que teve; na escolha d'esses mesmos delegados.

Investidos assim, com pouco cuidado, da auctoridade elles e os seus amigos, á disposição de quem a collocaram, serviram-se d'ella não para manter o respeito á lei e salva-guardar a liberdade de todos e a livre expressão do voto dos eleitores, mas para exercerem vinganças, para fazer toda a casta de proezas, e, o que é mais, para saciarem profundos e inveterados odios.

Em Alijo fizeram-se duas eleições municipaes e de procuradores á junta geral, e duas eleições, ou antes três eleições da commissão de recenseamento, e fez-se a eleição de deputado.

Já v. exa. vê que é facto unico no paiz, que se repetissem tantas eleições em quatro mezes. Estou profundamente convencido que desde que ha eleições neste paiz nada houve que se lhe assimilhasse.

Tratando de defender a validade da minha eleição, devo relatar todos os factos criminosos occorridos n'essas eleições locaes, porque mostram á evidencia que havia n'aquelle concelho uma especie de associação para fins eleitoraes com o intuito, não só de escamotear á opposição as eleições que do direito lhe pertenciam, porque tinham mais votos que os governamentaes; mas sobre tudo e principalmente para obstar a que eu tivesse assento n'esta camara. (Apoiadas.)

A primeira eleição teve logar no dia 14 de novembro.

N'essa eleição correu o acto eleitoral com regularidade, a não serem alguns pequenos incidentes nas assembléas de Alijo, Favaios Sanfins e Villar de Maçada. Restava uma, que era a de Santa Eugenia, onde principalmente tencionavam roubar, não sei se a expressão é parlamentar, a eleição á opposição.

Assim aconteceu. Para isso o que se|fez? Ao sol posto só faltaram para votar os eleitores de Santa Eugenia, aos quaes o presidente annuciou que votariam no dia seguinte e por isso se retiraram.

N'este momento o delegado da auctoridade, para mais facilmente conseguir o seu fim, começou a bradar que o presidente da assembléa tinha com os cadernos mettido dentro da uma urna porção de listas. O presidente contestou dizendo que se abriria a uma se porventura elles dessem a sua palavra de honra de que não tentariam viciar o acto eleitoral. Promettendo que sim, abriu-se a uma e nesse momento começou a gritar que estavam roubados. Era o signal para virem de uma casa proxima homens armados, como effectivamente vieram, espancando o presidente, roubando a papelada toda e arrancando a uma que estava por prevenção parafusada á mesa, ficando só o fundo pegado á tabua da mesa. Levaram tudo, fazendo grande vozearia, dando vivas ao governo; em fim praticando actos de vandalismo e selvageria. (Apoiados.)

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Receiando que no dia seguinte apparecessem os da opposição, mandou ir força militar de Alijo, com auxilio da qual e de cabos de policia fez como quiz a eleição, sendo vedada á opposiçao entrar mais na igreja.

Este delegado da auctoridade é o recebedor da comarca. Foi querelado e pronunciado pelo roubo da uma e ferimentos no presidente da assembléa. Fique-o sabendo o sr. ministro da fazenda, se o não sabia ainda.

Note a camara a circumstancia que vou apontar. No dia seguinte, estando ainda a correr o acto eleitoral em Villar de Maçada achavam-se reunidos no adro da igreja tres ou quatro indivíduos, entre os quaes o actual administrador do concelho, e estavam combinando o modo como haviam de travar desordem para empalmarem a votação á opposiçao n'aquella assembléa. O mais graduado influente n'aquella fregüezia disse então que não fizessem cousa alguma porque já se tinha conseguido o que se queria na assembléa de Santa Eugenia, segundo lhe dizia o conselheiro Jeroynmo Barbosa num bilhete que mostrou.

Quando logo tratar da primeira eleição da commissão de recenseamento terei occasião de mostrar o papel que este cavalheiro desempenhou n'essa eleição.

Para que a opposiçao não podesse protestar contra a validade dá eleição, o chefe do districto mandou assistir ao apuramento um administrador de fóra do concelho, nomeado ad hoc, que, com o auxilio da cavallaria e infanteria que tinha á sua disposição, arrancou violentamente os cadernos é mais papeis da eleição das mãos do presidente e mandou-o expulsar dos paços do concelho, assim como aos portadores opposicionistas é aos espectadores, entre os quaes me achava também, e a ninguem mais permittiu a entrada nos paços do concelho, sendo preciso protestar perante o tabellião.

A eleição foi annullada por accordão de 20 de dezembro, de que aqui tenho, certidão; o heroe foi tambem querelado e pronunciado, como o recebedor delegado do administrador na assembléa primaria de Santa Eugenia, de que tambem aqui tenho certidões.

Subiram ao governador civil e ao ministerio do reino queixas officiaes, mas nenhumas providencias se deram. As auctoridades administrativas em Alijo recolhem em suas casas e protegem réus de crimes os mais graves.

Não ha ali segurança pessoal, estamos fóra da lei!!

Seguiu-se a eleição da commissão do recenseamento. N'esta trabalhou-se activamente de um e de outro lado, como facilmente se acredita. Não podendo a auctoridade vencer legalmente, vedou com a força militar a entrada nos paços do concelho aos eleitores da opposiçao; e até nem ao sr. juiz de direito consentiram entrada no tribunal para exercer suas funcções, nem ao medico a entrada na cadeia para visitar um doente preso; o proprio escrivão da camara não póde entrar nos paços do concelho desde as sete horas da manhã até ás dez horas da manha do dia 9, em que o administrador lhe mandou entregar a chave. Fizeram-se então duas eleições, uma dentro dos paços do concelho com 14 eleitores e outra fóra com 22.

Debalde se pediram providencias ao chefe do districto e ao sr. ministro do reino; sé as deram não se conheceram.

Estas eleições foram tambem annulladas por accordão de 14 de janeiro, e o administrador do concelho foi querelado e pronunciado.

De tudo isto tenho diante de mim certidões authenticas.

Na casa do cavalheiro, signatario do bilhete a que atraz me referi, foi tão heroico feito combinado na noite de G para 7 de janeiro estando presente o administrador do Concelho e o commandante da força, que tão celebre se tornou tambem na segunda eleição da camara, roubada á opposição pelo segundo na assembléa do Santa Eugenia.

Prova-o outro documento authentico aqui presente.

Depois d'esta approximava-se a segunda eleição da camara, que devia fazer-se em 16 de janeiro.

Houve grande dificuldade em arranjar presidentes para as assembléas, visto o modo como tinha sido tratado na primeira eleição o presidente da assembléa de Santa Eugenia e o que tinham feito na assembléa de apuramento e na eleição da commissão de recenseamento. A commissão de recenseamento, visto que os seus membros é que tinham de presidir á eleição, reuniram-se em sessão e resolveram dirigir um petição ao chefe do districto para que na eleição a que ía proceder-se estivessem nas assembléas delegados da auctoridade, escolhidos, para que se garantisse a liberdade dos eleitores e a segurança das mesas.

Uma copia d'esta acta veiu para o ministerio do reino, porque a commissão resolveu pedir providencias ao sr. ministro do reino, e outra copia foi leval-a o sr. vice presidente da commissão, acompanhado de outros cavalheiros, ao chefe do districto, o qual prometteu que havia de ser garantida a liberdade eleitoral e a segurança dos cidadãos e das mesas.

Mas infelizmente não aconteceu assim, apesar de ir para lá de vespera o novo administrador, o sr. dr. Botelho, de Villa Real; estando de mais a mais presente o sr. governador civil de cuja chegada tive noticia ás sete horas da manhã do dia da eleição.

Entre a chegada dos dois (o sr. governador civil chegou às cinco horas da manhã de domingo), as cousas prepararam-se de modo que foram para Santa Eugenia um delegado do administrador e o commandante do destacamento a que já alludi, o lá foi por elles roubada a uma do modo mais criminoso ainda do que da primeira vez, chegando o commandante da força ao excesso de entrar dentro da igreja e dar vivas ao governo, deitando o bonet ao ar, devendo acrescentar que o sr. Botelho me tinha dito de vespera que para nenhuma assembléa o iria representar tal individuo, por occasião em que lhe fui pedir que o não mandasse para a assembléa da minha terra.

Uma voz:- O nome d'elle?

O Orador:- O nome daquelle militar é João Carlos Teixeira, tenente de infanteria n.° 13.

O sr. José de Azevedo Castello Branco:- V. exa. dá-me licença?

O Orador: - Pois não.

O sr. José de Azevedo Castello Branco:- Effectivamente deu-se esse caso; mas aquelle militar teve a paga condigna, porque em Villa Real queixava-se elle de que lhe não tivessem dado os 100$000 réis que lhe tinham promettido para fazer aquillo que fez.

Ao menos, coitado, não recebeu dinheiro.

O Orador:- Eu direi mais.

Quando elle acabou o seu destacamento, saiu da povoação dando vivas ao governo, e dando morras aos Barbosas, porque não lhe tinham dado o dinheiro por ter roubado a uma em Santa Eugenia, e porque nem ao menos lhe tinham dado alguma cousa para melhorar o rancho dos soldados no entrado ou não sei em que occasião.

Devo dizer que os outros factos constam de documentos authenticos; mas este ultimo ouvi referir publicamente em Alijo.

Conhecido o roubo, o chefe do districto, no domingo á noite, mandou-me chamar á casa onde eu estava hospedado. Fui á secretaria ter com elle, e mostrou-se maguado pelo que tinha succedido, convidando-me até para que no dia seguinte se fizesse repetir a eleição em Santa Eugenia, pois estava conhecedor das patifarias que lá se tinham feito.

Respondi que não podia annuir a esse pedido, porque os governamentaes se tinham apoderado de todos os papeis e até as listas nos tinham roubado n'essa occasião, e tinham a eleição feita.

A eleição fôra inteiramente illegal, mas não se podia já repetir. E todavia, sr. presidente, validou-se, porque assim

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SESSÃO DE 30 DE ABRIL DE 1887 353

era preciso, segundo se dizia, para satisfazer as exigencias dos amigos do governo em Alijó; o que é certo é que no governo civil se retardaram documentos que deviam servir para a sua apreciação e julgamento.

Notem agora os illustres deputados a circumstancia que vou narrar, e que é importantissima.

A reclamação deu entrada no ultimo dia do praso marcado para a sua apresentação; foi no sabbado seguinte, 29 de janeiro.

O chefe do districto devia mandal-a dentro de dois dias ao administrador do concelho; o administrador do concelho devia envial-a dentro de três dias ao governador civil e o chefe do districto apresental-a dentro de cinco dias ao tribunal.

Querem v. exas. saber o que aconteceu? Foi que a reclamação assim informada só foi presente ao tribunal do districto a 10 de fevereiro!

Exactamente no mesmo dia em que o tribunal tinha já decidido a eleição, validando-a!

Póde ser que estivesse dentro do praso, mas notem os illustres deputados esta coincidência: a reclamação foi remettida do governo civil para o presidente do tribunal, exactamente no dia e já depois que a eleição estava decidida e validada.

Antes d'isso um periodico da localidade, orgão do partido progressista, declarava que, se porventura a eleição fosse invalidada, os governamentaes de Alijo se absteriam de votar em outra qualquer eleição, e não dariam ao governo um voto sequer na eleição de deputados.

Vozes: - Ouçam, ouçam.

O Orador: - Não sei se seria esse o motivo; em todo o caso os factos levam-me a essa illação.

Ha mais uma circumstancia.

Foi uma commissão de Villa Real, pelo menos diziam serem de lá os cavalheiros que a compunham, declarar ao chefe do districto, que se a eleição fosse annullada não trabalhariam na eleição de deputados.

O que é certo é que ella foi validada com rapidez era 10 de fevereiro, mas lá ficou a reclamação para 27 de março, exactamente no dia immediato ao da eleição de deputados.

Mas ha mais.

O chefe do ditricto, no dia 17 de janeiro, mandou syndicar a Santa Eugenia a
respeito dos factos que lá se passaram.

Esta syndicancia fez-se, segundo creio, com imparcialidade; segundo o proprio administrador me disse, inqueriram-se 18 testemunhas, 9 de um lado e 9 do outro, e essa investigação administrativa mostrou á evidencia como as cousas se tinham, passado em Santa Eugenia.

O que era natural então era que o chefe do districto d'esse vista ao representante do ministerio publico para elle reclamar contra a validade da eleição.

Essa investigação nunca appareceu no tribunal administrativo; nem o original d'ella, pelo menos até ha poucos dias, apesar de ter sido enviado ao representante do ministerio publico, estando o sr. delegado effectivo no uso de licença.

Aqui tem v. exa. como procederam os delegados do governo nas duas eleições da camara e na eleição da commissão de recenseamento do concelho de Alijo.

Parecia que os delegados da auctoridade, que tinham assim commettido uma grande serie de crimes, deviam ter sido demittidos; pois não me consta que nenhum fosse demittido.

No meio de tudo isto é sabido em todo o districto de Villa Real que os delegados do governo affirmavam que haviam de vencer por bem ou por mal, e se não que haviam de inutilisar esta eleição.

Com effeito tudo se encaminhara para isso. E elles mesmos costumavam andar bem informados, porque antes mesmo da primeira eleição da camara espalharam que
se o pae do carteiro de Alijo não desse aos governamentaes uns tantos votos, de que dispunha, seria demittido.

Uma voz: - Isto é com o sr. ministro das obras publicas. (Riso.)

O Orador: - Insistiram com o pae, pediram, ameaçaram mesmo, elle resistiu, e o filho foi demittido.

Espalharam que o escrivão de fazenda, Cazimiro Pereira Rodrigues, que, estando em Vallongo, creio, foi transferido para Polares, seria promovido, até ao dia 11 ou 12 de novembro, para terra de segunda classe, com a condição de se collocar ao lado da auctoridade, dando a sua votação aos governamentaes na Granja de Alijó.

A promoção fez-se a 10 ou 11 de novembro, e no domingo seguinte lá estava ao lado da auctoridade, dando a sua votação, que nunca lhe tinha dado, porque fora sempre regenerador.

Affirmaram tambem, e com muita antecipação, que seria transferido o escrivão de direito., meu amigo pessoal e politico, e com effeito foi transferido.

Vê-se, pois, como eu disse, quê elles costumavam andar sempre bem informados em tudo que avançavam.

Quem pratica tudo isto, é certamente, porque não tem votos para vencer, é capaz de tudo para inculcar o contrario. E com taes adversarios, dada qualquer traficancia eleitoral, fácil é saber de onde vem.

Entrarei agora na apreciação do parecer; e como se conclue nelle pela annullação da eleição da assembléa de Villa Chã, della, nessa parte, sómente me occuparei.

Devo, porém, dizer antes que me causou estranheza, que logo no começo do parecer se dissesse que funccionaram simultaneamente duas assembléas de apuramento, quando mais abaixo se affirma que a minoria se separou da maioria por esta não consentir que aquella assignasse a acta vencida. As assignaturas presuppõem tudo já feito, visto que com ellas terminava a acta.

E restringindo-me propriamente á parte do parecer respeitante a Villa Chã, vejo, em primeiro logar, que no quinto periodo, que começa: «No dia immediato, 8, o commandante declarou que só entregaria a uma por ordem superior», quando na acta está consignado que declarou que (tinha instrucções para não entregar a uma á mesa» sem ordem tambem superior, o que é muitissimo differente; no primeiro caso, a responsabilidade pode abranger só o commandante, e no segundo, comprehende esse superior que lhe deu tal ordem, o que indica que havia combinação e accordo previo com alguém para adiar a entrega até á chegada de José Thomás Rodrigues Teixeira, seu instrumento, para concluir a obra começada.

E como este chegou só às onze horas da manhã, só então, isto é, duas horas mais tarde do que a legal, se deu a uma á mesa, como a mesma acta diz.

Sr. presidente, o illustre relator embaraça-se com a differença de descargas nos dois cadernos, com a desharmonia d'ellas com o numero de listas contadas, e ainda com a falta de seis d'estas.

Não tem motivo para isso.

O caderno do Teixeira, que tem muitas mais descargas do que o do Mathias, foi accusado de suspeito e falsificado desde a assembléa de Villa Chã até esta assembléa e sem protesto de ninguem, e contra o do Mathias não appareceu, desde Villa Chã até aqui, reclamação alguma. Portanto, é por esto que a camara se deve regular nas operações a fazer.

E sendo assim as 31 listas contadas a mais do que as descargas feitas neste caderno devem descontar-se ao meu antagonista, porque são o resto das que José Thomás Rodrigues Teixeira tinha mettido na uma e que não sairam, porque o administrador tirando-mas da mão as metteu novamente na urna. E a falta de 4, cujo destino se ignora, não é substancial, porque, deduzindo-as á minha maioria, ainda fico mais votado do que o meu competidor.

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354 DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS

Mas essas listas, que são as que saíram da assembléa de Villa Chã, faziam parte do maço deitado pelo Teixeira? Certamente, porque a acta o declara, visto que eram do mesmo padrão que a outra parte do maço que tinha sido tambem tirado sem reclamação de ninguem até hoje, e igualmente affirmo que estas tinham o nome do meu competidor. Pois então a camara não se contenta com a affirmação solemne da mesa, nas condições em que foi feita, e sem que até agora fosse contestada?! Mas ha mais. Não diz tambem a acta que o escrutinador Teixeira era governamental, e que o representante do governador civil o mandou prender por deitar o maço de listas ? E eu tenho aqui certidões de onde se vê que não foi posto á ordem do juizo, que não deu entrada na cadeia, e que a auctoridade administrativa, nem investigou contra elle, nem ao menos mandou simples participação para juizo!

Pois póde haver mais criminoso favor ao crime?

Não quer isto dizer que elle foi seu instrumento? E póde crer alguem que o fosse para me beneficiar a mim?

Foi preso, ou antes guardado sob essa apparencia pela força militar, com receio de que recebesse ali o seu justo castigo, para o mandarem para casa; quando podesse ir, como foi, sem perigo!

Tenho ainda a notar á camara, que esse Teixeira é compadre do Rodrigo Nobrega, actual administrador do concelho de Sabrosa e irmão do nosso antagonista. Tenho aqui documento autentico que o comprova.

Agora vou ler á camara uma carta que me passaram às mãos na assembléa de Villa Chã, que diz:

«Amigo Sousa. -Estão aqui homens da villa, do mando do Salles, elle manda dizer que a todo o custo se annulle. = Nobrega.»

O Sousa era o administrador do concelho de Alijo que estava tambem na assembléa de Villa Chã, e a letra e assignatura da caria era d'aquelle Rodrigo Nobrega, segundo declara o tabellião no reconhecimento.

Provavelmente contava com segurança com o vencimento da eleição para sen irmão e pedia lha annullassem!!!

Era a meu favor e contra o irmão!!!

Convem notar que o cavalheiro da parte de quem fazia a instante recommendação tem logar proeminente entre os amigos do governo em Villa Real.

Tudo isto constitue, creio eu, prova realmente juridica e moral a meu favor.

E quanto ao mais a camara julgue como grande juiz.

Se a camara, convicta do meu direito, approvasse o parecer, annullando a minha eleição, seria mais criminosa ainda do que o escrutinador Teixeira, que se arriscou... a levar um tiro ou uma facada, ou a ser punido pela justiça, e os illustres deputados nenhum d'esses riscos correm.

Sinto não ver presente o sr. ministro de remo para lhe pedir o favor de me dizer se, no caso não esperado, de ser repetida a eleição, a opposição em Alijo póde contar com as garantias de segurança e liberdade a que tem direito.

Redactor = S. Rego.

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