134 DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS
assim um erro, que o volante economico da lei da offerta e da procura corrigirá violentamente.
Outra necessidade economica imperiosa se nos apresenta, e a collocação dos vinhos, que representa a maior riqueza agrícola do nosso paiz.
Para a collocação dos nossos vinhos temos os mercados interno e os externos, sendo o interno o maior actualmente porque os externos estão quasi fechados, pelo menos para os vinhos de pasto de consumo directo.
E o que succede no mercado interno, especialmente nos centros de consumo, como são as nossas duas grandes cidades, Lisboa e Porto?!
Em Lisboa praticam-se falsificações de vinhos por diversas formas, todas ellas tendentes a deslocar do consumo os vinhos genuínos, com o duplo inconveniente para o thesouro e para a saude do publico.
São tres os principaes processos do falsificação empregados no mercado de Lisboa:
1.° Desdobramento com agua e vinho naturalmente alcoolico;
2.° Desdobramento com agua e vinho alcoolisado com alcool industrial;
3.º Fabrico de vinho artificial com agua, alcool industrial o tinturas apropriadas.
Assim:
"Cada casco de vinho de 15° do alcool é desdobrado com 7 ou 8 almudes de agua.
"Cada casco de vinho de 19° (elevado a esta graduação com alcool industrial) é desdobrado com 18 a 20 almudes de agua.
"Fabricam-se 15:000 pipas de vinho artificial dentro das barreiras de Lisboa.
"O preço do alcool industrial é de 240 réis por cada litro, e, pagando apenas 270 réis de direitos de consumo na sua entrada em Lisboa, dá em resultado que por 500 réis se obtém um producto que, sendo desdobrado com sete ou oito partes do agua, ficará um liquido com a força alcoolica approximada á dos vinhos de pasto geralmente expostos á venda. Aquella mistura fica assim dentro das barreiras por um preço que, em media, se poderá computar em 60 réis cada litro."
Por estes dados, que eu li por não os poder conservar de memoria, se vê qual é a importância das falsificações, BÓ no mercado de Lisboa. De modo que cada almude (17 litros) do vinho artificial ficará pelo preço maximo de 1$020 =17 X 60. Emquanto que para os vinhos genuínos 80 dá o seguinte.
Actualmente em Lisboa a grande massa de vinhos de consumo não custa menos de 900 réis por cada 1l litros, numero redondo; com o imposto de barreira sobe a 10560 réis, o ainda com as despezas "acessórias para o transpor-tar para os armazéns, etc., eleva- se a 1 $600 réis, números tambem redondos. No fabrico das taes 15:000 pipas ha por consequência uma margem de 580 réis de interesso liquido por cada almude de 17 litros.
Poderia minorar-se um pouco este estado de cousas pelo estabelecimento da escala alcoolica ; mas para isto era preciso que a taxa minima do imposto de consumo em Lisboa fosse tal, que podesse deslocar o fabrico de vinhos artificiaes, feitos com o alcool industrial. Que onus deveria pesar sobre o alcool industrial para não poder deslocar os vinhos genuínos, como são, por exemplo, os da região lorreana, que não têem em geral mais de 10° a 11° graus de alcool de constituição?
E que diriamos então dos vinhos verdes?!
Qual deveria ser, pois, o limite minimo da escala alcoolica, applicavel a esses vinhos, de modo que não podessem ser deslocados do consumo pelo alcool industrial misturado com agua e materias corantes? Não é fácil responder.
Eu pertenço a uma região onde os vinhos são naturalmente alcoolicos; estamos por isso numa situação especial relativamente â viticultura portugueza. Nós não produzimos vinhos para a caldeira e, em geral, os nossos vinhos ntto precisam ser alcoolisados para se poderem vender directamente ao consumidor.
Estamos por conseguinte em uma situação boa em relação á questão do alcool de vinho, mas muito mal emquanto á collocação dos vinhos, em concorrência com outros menos alcoólicos e com os artificiaes, se fosse estabelecida a escala alcoolica.
Se a taxa minima do imposto de consumo em Lisboa difficilmente deslocaria o vinho fabricado com alcool industrial misturado com tinturas, quando applicada a vinhos genuinos de mínima graduação alcoolica, póde a camara imaginar o que succederia com os vinhos naturalmente alcoolicos do Alemtejo!
Esta é uma questão muito complicada.~
Eu fiz parte do congresso viticola reunido nesta mesma sala, e tive a honra de fallar ácerca desta questão, transigindo até um certo limite mínimo de graduação, 13°,5, creio eu, de percentagem alcoólica, para se poderem collocar as grandes massas de vinhos do Alemtejo, sem prejudicar os vinhos baixos da região torreana e outros parecidos. Levantaram se, porém, taes difficuldades, que foi impossivel chegar a um resultado satisfactorio.
Quanto aos mercados estrangeiros dá-se o seguinte. E mais do que averiguado que os nossos vinhos não podem ser exportados sem adubação alcoolica, principalmente os chamados vinhos do Porto. Para que possam concorrer com os productos similares de outras nações até os artificiaes de Cette e Hamburgo - carecem de alcool barato.
Por outro lado, os viticultores que produzem vinho, denominado de caldeira, querem que o preço do alcool de vinho se mantenha por forma a remunerar as suas explorações viticolas. Com este antagonismo de interesses a questão parece irreductivel.
Só o bom regimen do alcool industrial poderia regular esta questão magna da viticultura e do commercio de vinhos. A base cenologica da aguardentação dos vinhos é certamente o emprego exclusivo do alcool de vinho, e só como um mal necessario se póde tolerar o alcool industrial depois de bem rectificado. Por consequencia, a única maneira de harmonisar interesses, até onde fosse possivel, era estabelecer o preço máximo do alcool de vinho (como se fez para os cereaes) de modo a que nunca podesse concorrer com elle o do alcool industrial, nem mesmo o nacional. O deficit da nossa producção seria supprido pelos alcooes estrangeiros, dando-se preferencia ao alcool de vinho. A collocação do alcool industrial nacional, antes do alcool de vinho estrangeiro, é um acto de respeito por interesses estabelecidos, especialmente na região insulana.
Como se sabe, o alcool industrial fabricado pelos modernos processos da rectificação fica em melhores condições hygienicas, e os homens públicos de todos os paizes têem reconhecido a necessidade de que a rectificação se faça por conta do estado para assegurar o melhor resultado da operação, embora a producção geral seja livre.
Agora o que não se comprehende é que se diga que os nossos vinhos de exportação são adubados com alcool de vinho, e que ao mesmo tempo se tpeça a diminuição da taxa aduaneira do alcool industrial. É uma cousa exquisita esta contradicção.
Eu respeito o commercio licito, porque a viticultura nlo póde collocar os seus productos directamente nas mãos do consumidor; ha de servir-se necessariamente de intermediários. Mas como é que ou hei de comprehender que esses intermediarios queiram collocar os vinhos do seu commercio depois de aguardentados com alcool estrangeiro e que não é de vinho?!
Eu não provoco ninguem, desejava apenas explicações. Só alguém mas podesse dar ficava satisfeito, porque desejo aprender.
Mas o que eu desejava, acima de tudo, era ver harmo-