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Discurso que devia ser transcripto a pag. 222, col. 3.ª, lin. 92 do Diario de Lisboa, na sessão de 23 de janeiro

O sr. Ministro da Fazenda (Lobo d'Avila): — Tratarei a questão que occupa a attenção da camara com serenidade de animo; mas tambem com a cabeça levantada, porque tenho a consciencia de que cumpri o meu dever. Não quero fazer recriminações; não quero retribuir com injurias e aggressões as aggressões e injurias que me têem dirigido; não quero entrar n'essa pugna, em que os doestos substituem os argumentos; mas tambem não venho de cerviz curvada pedir misericordia aos meus adversarios, antes pelo contrario os convido e empraso a que apresentem to dos os documentos que têem para me arguir, porque estou prompto para responder e mostrar á face do meu paiz que cumpri o meu dever como ministro, e que nunca desmenti a minha consciencia de homem honrado. (Muitos apoiados. — Vozes: — Muito bem.) Não estranho, nem posso estranhar, que os membros do parlamento venham á camara pedir contas ao governo de todos os seus actos; reconheço que elles estão no pleno exercicio do seu direito, no desempenho do seu mandato; mas não posso todavia deixar de deplorar o desvario das paixões politicas e dos interesses despeitados, que ás vezes se combinam, e que não julgam o homem com imparcialidade, que aggridem o ministro com injustiça, e que substituem o juizo frio e recto pela arguição acrimoniosa e apaixonada. E n'isto que digo não alludo determinadamente a ninguem; fallo em these, fallo em geral. Digo que lastimo esta allucinação dos espiritos, porque o que deve interessar a todos, não é injuriar o individuo e pretender feri-lo no seu caracter; mas sim conhecer a verdade, atacar o funccionario nos seus erros, se os tem, procurar emendar-lho os defeitos, mas nunca abrigar o intuito de o vulnerar na sua reputação para o desauctorisar, e depois dizer lhe: «Retirae-vos do poder, porque estaes sem força moral para gerir a causa publica». Similhante systema é pernicioso e immoral, e devia ser banido das nossas pugnas politicas, sendo substituido pela analyse dos factos ácerca da gerencia dos negocios, porque só por esse meio se póde chegar desapaixonadamente ao conhecimento da verdade (apoiados). O doesto, a insinuação e a calumnia são armas defezas e funestas, cujo uso desejara ver abandonado, por bem do meu paiz, e mesmo para bem d'aquelles que as empregam; porque sempre que d'ellas se usa ha quasi a certeza de ficar ferido quem a emprega (apoiados).

Os que suspeitara constantemente das intenções dos outros, que tratam de desfigurar todos os actos alheios, para lhes dar uma interpretação falsa, e mesmo contraria ao caracter dos individuos que os praticam, esses, que sempre suspeitam o mal sem fundamento, nem argumentos positivos, dão um triste documento de suas qualidades moraes, e auctorisam a suspeitar de que elles, nas circumstancias em que vêem collocados os seus adversarios, seriam capazes de praticar aquillo que insinuam que elles praticaram; por isso deploro esse systema, porque elle não faz senão depor principalmente contra quem o emprega (apoiados). E depois quaes são as consequencias que se tiram d'aqui? Um partido ferido por este modo nos homens publicos que o representam, quando, a seu turno, passa para a opposição, lança mão dos mesmos meios de guerra de que usaram os seus adversarios, e d'estas retaliações resulta que aquillo que a principio fóra um desabafo de paixões, um desafogo de despeitos impensados, vae transformar-se n'um systema fatal ao progresso das nossas instituições (apoiados).

Principiemos por fazer justiça uns os outros, e depois discutiremos placidamente (apoiados). Ali (apontando para a esquerda), entre os individuos que me combatem, não vejo senão homens de bem; não suspeito da sua honra nem do seu caracter; aqui, entre os membros que honram o governo com o seu apoio, ninguem tem direito de suspeitar outra cousa; todos devem respeitar a sua honra e o seu caracter, assim como a dos membros do gabinete (apoiados). Todos devem fazer justiça ás intenções dos homens publicos: sejamos severos e rigorosos na apreciação dos seus actos, mas nunca insinuemos calumnias contra as intenções dos individuos (apoiados).

Quando estabeleço esta doutrina, repito, estabeleço-a em these, não me refiro a pessoa determinada, nem quero especificar ninguem; estabeleço a em honra de nós todos, em beneficio do paiz e a bem do progresso do systema constitucional, ao qual, sobretudo, prejudicam infinitamente estas reconvenções permanentes, que desauctorisam todos os homens publicos (apoiados).

Que dirão os estrangeiros quando lerem os nossos periodicos, quando virem essas demasias de linguagem, essa exacerbação, essa virulencia, esse desregramento de certa imprensa a que entre nós se dá muito desconto, mas que lá fóra póde não lhe ser dado? Hão de dizer: «Que paiz é aquelle onde ha taes homens publicos, e onde na imprensa se escreve d'aquelle modo?» E não é assim, felizmente; e por isso lastimo que a imprensa que emprega esses meios, e que usa de tal linguagem, esteja desacreditando o nosso paiz e fazendo com que, sendo aliás composto de homens honrados e bons, possa ser tido por um paiz onde estejam em maioria individuos que não têem essas qualidades, ou que pelo menos seja uma nação que possue muitos homens á frente dos seus negocios, que não têem estes sentimentos nem este caracter, o que é uma gravissima injustiça. Por este modo a imprensa que adopta tão pernicioso systema, faz um grande mal a esta instituição e desvirtua o seu nobre sacerdocio, cavando o seu descredito e a sua ruina; porque desde que se vê que ella te entrega a estas exagerações, nunca mais se acredita o que escreve, e quando fallar a verdade a respeito de qualquer assumpto, não inspira confiança a ninguem, e deixa de ter aquelle criterio moral, aquella auctoridade que só póde ter quando é a expressão do modo de sentir e pensar do publico, a respeito dos factos que se passam no paiz (apoiados).

É por isso que lastimo e muito, que se empregue este systema altamente nocivo ás instituições, ao bem da causa publica, ao proprio credito da imprensa e dos homens que para ella escrevem. Não o lastimo por mim, repito-o, pois sempre vi e tenho fé em Deus que hei de continuar a ver essa calumnia desbragada, que a paixão suggere nos momentos de delirio, cair-me aos pés (muitos apoiados).

Pois que? Um homem que não tem na idéa senão servir o seu paiz e zelar os interesses publicos, que envida todos os esforços para cumprir o seu dever, que põe a mão sobre a sua consciencia e que a sente tranquilla, ha de tremer diante da calumnia? (Apoiados.) Não treme (muitos apoiados). Esse homem póde ter qualquer defeito, póde ter erros, e quem os não tem? (Apoiados.) Erros e defeitos são inherentes á humanidade, a todos nós (apoiados). Póde ter erros, pôde ter defeitos, mas os seus adversarios nada mais têem de que o accusar (apoiados). Apontem-se os erros, corrijam-se os defeitos, analysem se os actos, mas não se calumnie (apoiados). Discutam, reconheço que têem direito de o fazer, desejo mesmo que o façam, está isso na indole do systema constitucional, está de accordo com as minhas aspirações e com o meu caracter (apoiados).

N'outro dia, quando comecei a fallar, disse que — estimava muito que o nobre deputado, que abriu o debate, apresentando algumas arguições contra a minha gerencia, tivesse principiado por fazer justiça ás minhas intenções, e empregasse phrases urbanas para exprimir a sua discordancia de opinião e a sua critica a respeito dos meus actos; portanto já se vê que a doutrina que acabo de estabelecer não tem referencia alguma individual, estabeleci-a em these, e folgo muito que o nobre deputado, que encetou a discussão, desse testemunho de que convinha entrar n'este novo caminho que, infelizmente, nem sempre tem sido trilhado (apoiados). Mas fazendo completa justiça ás intenções do nobre deputado, ao seu caracter, assim como aos seus conhecimentos e intelligencia, porque não se carece de deprimir ninguem para se discordar da sua opinião, comtudo não posso deixar de dizer, sem d'aqui querer tirar nenhuma inferencia desfavoravel ou offensiva á sua pessoa, que, pelo conjuncto de circumstancias que se apresentam, é impossivel que uma opinião despreoccupada, e um espirito imparcial, não veja que ha uma especie de plano premeditado de aggredir-me e de atacar-me (apoiados repetidos); porque se