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SESSÃO DE 28 DE JANEIRO DE 1885

Presidência do exmo. sr. Luiz Frederico de Bivar Gomes da Costa

Secretarios-os exmos. srs.

Francisco Augusto Florido de Monta e Vasconcellos
Angusto Cesar Ferreira de Mesquita

SUMMARIO

Dois officios do ministerio da marinha. - Segundas leituras e admissão de dois projectos de lei e de duas propostas para renovação de iniciativa. - Representação da camara de Alijó. - Quatro requerimentos de interesse publico, e outros quatro de interesse particular.-Justificações de faltas dos srs. Guilherme de Abreu, Agostinho Fevereiro, Pedro Franco, Correia de Oliveira, Santos Diniz e Castro Mattoso. - Prestam juramento os srs. Guilherme de Abreu e Agostinho Fevereiro. -Commissões da camara, nomeadas pela mesa. - Mandam para a mesa, um projecto de lei o sr. Gonçalves de Freitas e uma renovação de iniciativa o sr. barão de Ramalho. - Trocaram-se explicações entre os srs. Ferreira de Almeida e ministro da marinha, sobre o que haviam dito em uma sessão anterior.

Na traem do dia levanta-se um incidente sobre a inscripção, em que tomam parto, depois da exposição do sr. presidente, os srs. Vicente Pinheiro, Luiz Jardim, Mariano de Carvalho, Avellar Machado e Luiz de Lencastre. - O sr. Mendes Pedroso, inscripto a favor do projecto de resposta ao discurso da coroa, usa da palavra, sustentando uma moção de ordem e respondendo a alguns pontos dos discursos dos oradores opposicionistas. - Responde-lhe o sr. Alves Matheus, que impugna detidamente o projecto e sustenta a moção de ordem que apresentou nesse sentido.

Abertura - As duas horas e meia da tarde.

Presentes á chamada - 57 srs. deputados.

São os seguintes : - Garcia de Lima, Alfredo Barjona de Freitas, Silva Cardoso, Sousa e Silva, Pereira Corte Real, A. J. da Fonseca, A. J. dAvila, Fontes Ganhado, A. M. Pedroso, Santos Viegas, Pinto de Magalhães, Almeida Pinheiro, Augusto Poppe, Fuschini, Avelino Calixto, Barão de Ramalho, Sanches de Castro, Lobo d'Ávila, Conde de Thomar, E. Coelho, Emygdio Navarro, Fernando Geraldes, Vieira das Neves, Mouta e Vasconcellos, Francisco do Campos, Mártens Ferrão, Augusto Teixeira, J. Alves Matheus, Joaquim de Sequeira, Simões Ferreira, Teixeira de Sampaio, Amorim Novaes, Avellar Machado, Correia de Barros, Azevedo Castello Branco, Ferreira de Almeida, José Frederico, Pereira dos Santos, Figueiredo Mascarenhas, Oliveira Peixoto, Simões Dias, Pinto de Mascarenhas, Luiz Ferreira, Bivar, Luiz Dias, M. da Rocha Peixoto, Manuel de Medeiros, Aralla e Costa, Pinheiro Chagas, Mariano de Carvalho, Martinho Montenegro, Miguel Tudella, Gonçalves de Freitas, Sebastião Centeno, Vicente Pinheiro, Visconde de Ariz, Visconde de Balsemão, Visconde das Laranjeiras e Cousiglieri Pedroso.

Entraram durante a sessão os srs.: - Adriano Cavalheiro, Lopes Vieira, Agostinho Lúcio, Agostinho Fevereiro, Moraes Carvalho, Albino Montenegro, A. da Rocha Peixoto, Anselmo Braamcamp, Antonio Candido, Garcia Lobo, Antonio Ennes, Lopes Navarro, Pereira Borges, Cunha Bellem, Jalles, Moraes Machado, Carrilho, António Centeno, Sousa Pavão, Seguier, A. Hintze Ribeiro, Urbano de Castro, Augusto Barjona de Freitas, Ferreira de Mesquita, Pereira Leite, Neves Carneiro, Bernardino Machado, Caetano de Carvalho, Conde de Villa Real, Cypriano Jardim, Ribeiro Cabral, Sousa Pinto Basto, Góes Pinto, E. Hintze Ribeiro, Estevão de Oliveira, Firmino Lopes, Francisco Beirão, Castro Corte Real, Wanzeller, Frederico Arouca, Guilherme de Abreu, Barros Gomes, Matos de Mendia, Sant'Anna e Vasconcellos, Baima de Bastos, J. A. Pinto, J. A. Valente, Melicio, Scarnichia,

Franco Castello Branco, Souto Rodrigues, João Arroyo, Ponces de Carvalho, J. J. Alves, Coelho de Carvalho, José Borges, Dias Ferreira, Elias Garcia, Laranjo, Lobo Lamare, José Luciano, J. M. dos Santos, Lopo Vaz, Luiz de Lencastre, Reis Torgal, Luiz Jardim, Luiz Osório, Manuel d'Assumpção, Marçal Pacheco, Miguel Dantas, Pedro de Carvalho, Santos Diniz, Pedro Roberto, Rodrigo Pequito, Dantas Baracho, Pereira Bastos, Tito de Carvalho, Visconde de Alentem, Visconde de Reguengos e Visconde do Rio Sado.

Não compareceram á sessão os srs.: - Adolpho Pimentel, Filippe de Carvalho, Correia Barata, Silveira da Motta, Costa Pinto, Ferreira Braga, Teixeira de Vasconcellos, Ribeiro dos Santos, Ferrão de Castello Branco, Sousa Machado. J. A. Neves, Ferreira Freire, Lourenço Malheiro, Correia de Oliveira, M. P. Guedes, Guimarães Camões, Pedro Correia, Pedro Franco e Wenceslau de Lima.

Acta. - Approvada.

EXPEDIENTE

Officios

1.º Do ministerio da marinha, satisfazendo ao requerimento feito pelo sr. deputado Ferreira de Almeida em sessão de 9 do corrente.

Enviado á secretaria.

2.º Do mesmo ministerio, remettendo, em satisfação ao requerimento do sr. Vicente Pinheiro, copias do officio do governador geral da província de Angola que trata da transferencia do batalhão de caçadores n.º 3 de Loanda para Ambaca; do diploma expedido por este ministerio sobre o mesmo assumpto; do officio do mesmo governador geral, relatando os acontecimentos succedidos na primeira divisão de Ambaca, denominada Piri e na banza do soba Cagira, e dos mappas da força do referido batalhão de novembro o dezembro de 1883 e de janeiro e fevereiro do anno findo.

Enviado á secretaria.

Segundas leituras

Projecto de lei

Senhores.- O codigo administrativo de 6 de maio de 1878, abrindo profundas alterações no de 1842, determinou no artigo 392.º que, emquanto o governo não decretar a nova tabella dos emolumentos a que se refere o artigo 356.º se applicará a que está em vigor.

Não se decretou ainda a nova tabeliã, e como o código de 1878 fez profundas alterações no de 1842 acontece que em muitos poucos casos se póde applicar a tabella em vigor.

Resulta, como consequencia inevitavel deste estado de cousas, que decresceram sensivelmente os salários dos escrivães das administrações dos concelhos, ficando quasi que reduzidos aos seus diminutos ordenados.

Alguns d'estes funccionarios têem conseguido que as camaras municipaes lhos tenham augmentado, porém, nos concelhos pobres, em que o município se vê a braços com avultadas despezas obrigatórias, a situação dos mesmos funccionarios é assaz embaraçosa por lhe haverem escassea-

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do os meios de vida, ao passo que tem augmentado successiva e extraordinariamente o preço das subsistencias.

Ninguém contestará que a acção benefica dos poderes públicos deve de preferencia desvellar-se na protecção ao funccionalismo menos retribuido, e sempre que sem elevação das despezas do município e do estado, e sem dar occasião a irregularidades dos differentes serviços, se chegar a um resultado desejavel em ordem a proteger os servidores da nação, não ha motivo justo para que se lhes denegue protecção.

O serviço de secretarios das juntas de lançamento das congruas parochiaes poderia sem inconveniente ser desempenhado pelos escrivães das administrações dos concelhos, recebendo elles as gratificações de que trata o artigo 5.º da lei de 5 de março de 1838, serviço de que já em muitos concelhos estão encarregados os mesmos funccionarios, e que de um modo muito significativo justifica a matéria deste projecto, sendo para notar que na esphera e ordem de tal serviço se dá inteira connexão com a indole administrativa, a que respeita.

É por taes fundamentos que tenho a honra de apresentar á camara o seguinte projecto de lei:

Artigo 1.º Os escrivães das administrações dos concelhos ficam sendo, desde a publicação desta lei, secretários das juntas de lançamento das congruas parochiaes, recebendo, por este serviço as gratificações de que trata o artigo 5.º da lei de 5 de março de 1838, que por esta forma é alterado.

Sala das sessões da camara dos deputados, 27 de janeiro de 1885. = O deputado pelo circulo n.º 74, Joaquim Germano de Sequeira.

Enviado á commissão de administração publica, ouvida a ecclesiastica.

Projecto de lei

Senhores. - A camara municipal do concelho de Alijó, sempre solicita no cumprimento de seus deveres, deliberou em sessão de 15 do corrente mez mandar construir em Alijo uma fonte e um matadouro, melhoramentos da mais reconhecida e urgente necessidade.

A villa de Alijo sede de um concelho de 1.ª classe não tem uma fonte publica que possa abastecer de aguas para os usos domésticos os seus habitantes e por isso vão colhel-a a um rego que corre a descoberto pelo meio da povoação a que se juntam as sobras das regas das terras que lhe ficam superiores e as que escorrem dos terrenos em que frequentemente se apascentam gados domésticos da villa e povos vizinhos e ainda assim no verão não bastam.

E, portanto, insuficiente e impróprio para os usos da população.

Á falta de matadouro são as rezes para o consumo publico, abatidas em uma casa situada ao centro da villa, com grave risco da saúde publica, por não ter nenhuma das condições hygienicas que se exigem em taes estabelecimentos.

As duas obras indicadas custarão, segundo os orçamentos feitos, 5:000$000 réis, quantia que a camara não pode pedir ao imposto nas desgraçadas condições a que a phylloxera tem reduzido a grande maioria do concelho, já tão sobrecarregado com outras despezas impreteriveis.

Tem a camara 7:000$000 réis na caixa geral de depósitos para viação municipal; e a única estrada em construcção póde e deve concluir-se com o subsidio que lhe deve o governo, ou, se este o não pagar a tempo, com o excedente do deposito.

Como não possa, porém, levantar e distrahir do deposito a referida quantia, sem que a isso seja previamente auctorisada por uma medida legislativa, tenho a honra de submetter á vossa illustrada apreciação o seguinte projecto de lei:

Artigo 1.º E a camara municipal do concelho de Alijó auctorisada a levantar dos fundos que para viação municipal tem na caixa geral de depósitos a quantia de réis 5:000$000 para os applicar á construcção de uma fonte e um matadouro na villa de Alijó.

Art. 2.º Fica revogada toda a legislação em contrario.

Sala das sessões da commissão dos deputados, em 27 de janeiro de 1885.= O deputado por Alijó, Joaquim Teixeira Sampaio.

Enviado á commissão de obras publicas, ouvida a de administração publica.

Propostas para renovação de iniciativa

l. ª Renovo a iniciativa do projecto de lei n.º 106 do 1882, approvado nesta camara, em sessão de 14 de março de 1884, sobre uma nova divisão dos julgados da comarca de Villa Verde.

Sala das sessões, em 27 de janeiro de 1885. = Alfredo da Rocha Peixoto.

Lida na mesa, foi admittida e enviada á commissão de legislação civil.

O projecto a que se refere esta proposta é o seguinte:

Projecto de lei n.º 106

Senhores. - A vossa commissão de legislação civil examinou o projecto de lei n.º 81-I, cuja iniciativa foi renovada agora pelo sr. deputado pelo circulo n.º 12, J. C. Rodrigues da Costa, tendente a dividir era cinco julgados a comarca de Villa Verde, que actualmente só comprehende tres.

Tendo em vista que este projecto, de novo apresentado á camara, teve já parecer favorável da illustrada commissão que anteriormente o examinou com attenção detida, baseando os considerandos apresentados em rasões de peso e tão justas, que a vossa commissão actual não duvida adoptal-as em todos os pontos;

Sendo certo que o thesouro não é sobrecarregado, as commodidades dos povos são zeladas e a administração da justiça se amplia, facilitando a boa execução da lei:

É a vossa commissão de parecer que deve ser approvado o seguinte projecto de lei:

Artigo 1.º A actual comarca de Villa Verde será dividida em cinco julgados:

O primeiro, com a séde em Duas Igrejas de Penella, compor-se-ha das freguezias de Arcozello, Azões, Carreiras (S. Miguel), Codeceda, Duas Igrejas, Escariz (S. Martinho), Goães, Godinhaços, Marrancos, Pedregaes, Penas-caes, Portalla das Cabras e Rio Mau;

O segundo, com a sede em Gondomar, será composto das freguezias de Aboim da Nobrega, Bruffe, Gibões, Covas, Gomide, Gondomar, Gondoriz, Oriz (Santa Marinha), Passô, Valdreu, Vallões, Valbom (S. Martinho) e Valbom (S. Pedro);

O terceiro, com a sede em S. Paio de Pico de Regalados, compor-se-ha das freguezias de Athães, Barros, Coucieiro, Oriz (S. Miguel), Ponte (S. Vicente), Pico (S. Christovão), Pico (S. Paio), Prado (S. Miguel), Sande e Villarinho;

O quarto, tendo por sede Villa Verde, compor-se-ha das freguezias de Carreiras (S. Thiago), Dossãos, Esqueiros, Geme, Gondiães, Lanhas, Loureiro, Moure, Moz, Nevo-gilde, Parada e Barbudo, Sabariz, Soutello, Travassos, Turiz e Villa Verde;

O quinto, com a sede em Santa Maria do Prado, compor-se-ha das freguezias de Atheães, Cabanellas, Cervões, Escariz (S. Mamede), Freiriz, Lage, Oleiros, Parada de Gatim e Prado (Santa Maria).

Art. 2.º É revogada a legislação em contrario.

Sala da commissão, em 11 de março de 1882. = João Ribeiro dos Santos = Ayras Frederico de Castro e Solla = Firmino João Lopes = J. A. Neves = Frederico de Gusmão Correia Arouca = Azevedo Castello Branco = J. Novaes =

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A. de Castro P. Corte Real -Luiz Antonio Gonsalves de Freitas, relator.

N.° 81-1

Renovo a iniciativa do projecto de lei n.º 84-M, apresentando em sessão desta camara de 14 de março de 1879, pelo deputado por Villa Verde (circulo n.º 12), Manuel Joaquim Alves Passos, e que tem por fim dividir em cinco julgados a comarca de Villa Verde, actualmente dividida em tres.

Este projecto de lei obteve nessa sessão legislativa, de accordo com o governo, parecer favoravel (sob o n.º 122), das illustres commissões de legislação civil e de estatistica.

Sala das sessões da camara dos senhores deputados, em 23 de fevereiro de 1882.= J. C. Rodrigues da Costa, deputado pelo circulo de Villa Verde (n.º 12).

N.º 122

Senhores. - A vossa commissão de legislação civil foi presente a proposta apresentada pelo sr. deputado pelo circulo n.º 12, Manuel Joaquim Alves Passos, que tem por fim dividir em cinco julgados a comarca de Villa Verde, que, segundo o decreto de 12 de novembro de 1875, consta de tres julgados com as sedes em Pico de Regalados, Villa Verde e Prado.

Considerando que a comarca de Villa Verde é composta de 61 freguezias, com uma população superior a 33:000 almas, dispersa por uma longa area de terreno montanhoso e cortado por gargantas profundas e ribeiros, que nas epochas invernosas tornam difficil a communicação com a sede dos referidos julgados;
Considerando, alem disto, que alguns dos povoados ficam a distancia superior a3 leguas das respectivas sedes; Considerando que a divisão territorial, quer administrativa, quer judicial, deve ter por base a maxima commodidade dos povos, para evitar trabalhos inúteis e desnecessários, que se não recommendam por principio algum de boa administração;
Considerando que com o presente projecto de lei são resolvidos na sua máxima parte os inconvenientes acima apontados, e se facilita aos povos, com menor despendio e trabalho, mais prompto recurso às justiças ordinárias, não soffrendo alteração os limites e importância da comarca de Villa Verde, nem tão pouco se onera o thesouro com o mais pequeno encargo;
Considerando finalmente que a commissão de estatística, que foi ouvida, concorda na sua approvação, de accordo com o governo:
A vossa commissão tem, pois, a honra de submetter ao vosso exame e approvação o seguinte projecto de lei:

Artigo 1.º A actual comarca de Villa Verde será dividida em cinco julgados : o primeiro, com a sede em Duas Igrejas de Penella, compor-se-ha das freguezias de Arcozello, Azões, Carreiras (S. Miguel), Codeceda, Duas Igrejas, Escariz (S. Martinho), Goães, Godinhaços, Marrancos, Pedregães, Penascaes, Portella das Cabras e Rio Mau; o segundo, com a sede em Gondomar, compor-se-ha das freguezias de Aboim da Nobrega, Bruffe, Gibões, Covas, Gomide, Gondomar, Gondoriz, Oriz (Santa Marinha), Passo, Valdreu, Vallões, Valbom (S. Martinho) e Valbom (S. Pedro); o terceiro, com a sede em S. Paio do Pico de Regalados, compor-se-ha das freguezias de Athães, Barros, Coucieiro, Oriz (S. Miguel), Ponte (S. Vicente), Pico (S. Christovão), Pico (S. Paio), Prado (S. Miguel), Saneie e Villarinho; o quarto, com a sede em Villa Verde, compor-se-ha das freguezias de Carreiras (S. Thiago), Dossãos, Esqueiros, Geme, Gondiães, Lanhas, Loureira, Moure, Moz, Nevogilde, Parada e Barbudo, Sabariz, Soutello, Travassos, Turiz e Villa Verde; o quinto, com a sede em Santa Maria do Prado, compor-se-ha das freguezias de Atheães, Cabanellas, Cervães, Escariz (S. Mamede), Freriz, Lage, Oleiros, Parada de Gatim e Prado (Santa Maria).

Art. 2.º Fica revogada a legislação em contrario.

Sala da commissão, em 10 de maio de 1879.= Ignacio Francisco Silveira da Mota = J. M. Borges = Luiz de Len-castre = Lopo Vaz de Sampaio e Mello = Manuel d'Assumpção = Luiz de Bivar = Torres Carneiro = Augusto José Pereira Leite, relator.

á illustre commissão de estatística envia a commissão de legislação a presente mensagem para que se sirva dar sobre o projecto incluso o seu auctorisado parecer. = Pereira Leite.

A commissão de estatística, na parte em que é chamada a dar o seu parecer sobre o projecto n.° 84-M, sobre a nova divisão dos julgados da comarca de Villa Verde, concorda com a illustre commissão de legislação civil.

Sala da commissão, 10 de maio de 1879. = F. A. de Moída e Vasconcelles = A. Osório de Vasconcellos = José Taveira de Carvalho Pinto de Menezes=Manuel Joaquim Alves Passos = João da Costa Brandão e Albuquerque = Francisco de Sousa Rebello Pavão.

N.º 84-M

Senhores. - A comarca de Villa Verde, no districto de Braga, foi pelo decreto de 12 de novembro de 1875, dividida em três julgados, a saber:

Julgado de Pico de Regalados, composto das freguezias de Aboim da Nobrega, Athães, Barros, Bruffe, Ponte (S. Vicente), Gibões, Codeceda, Coucieiro, Covas, Gomide, Gondomar, Gondoriz, Oriz (Santa Marinha), Oriz (S. Miguel), Passo, Panascaes, Pico (S. Christovão), Pico (S. Paio), Prado (S. Miguel), Saneie, Valbom (S. Martinho), Valbom (S. Pedro), Valdreu, Vallões e Villarinho, 20 freguezias com 11:963 almas, segundo o censo de 1864.

Julgado de Villa Verde, composto das freguezias de Azoes, Carreiras (S. Miguel), Carreiras (S. Thiago), Dos-sào, Duas Igrejas, Esqueiros, Geme, Goães, Godinhaços, Gondiães, Lanhas, Loureira, Moz, Nevogilde, Parada e Barbudo, Pedregaes, Portella, Rio Mau, Sabariz, Travassos, Turiz e Villa Verde, 22 freguezias com 10:483 almas, segundo o mesmo censo de 1864.

Julgado do Prado, composto das freguezias ele Arcozello, Atheães, Cabanellas, Cervães, Escariz (S. Mamede), Escariz (S. Martinho), Freiriz, Lage, Marrancos, Moure, Oleiros, Parada de Gatim, Prado (Santa Maria) e Soutello, 14 freguezias com 9:467 almas, segundo o censo referido.

Este agrupamento de tão grande população em tres julgados foi talvez dictado pela consideração de crear o menor numero possível de empregados, mas com isto veiu a soffrer a boa administração da justiça, porque os povos das 61 freguezias ruraes. de que se compõe a comarca, dispersos numa grande área de terrenos montanhosos e cortados por gargantas profundas e ribeiros, preferem o abandono elo seu direito e o soffrimento silencioso do elamno, ao trabalho, risco e despezas necessarias para percorrerem grandes distancias em busca ela sede do julgado. Em vez de terem a justiça ao pé da porta, para facilmente poderem recorrer á sua intervenção nos poucos casos que a lei deixou nos estreitos limites da alçada dos julgados, são alguns povos ela comarca ele Villa Verde obrigados a fazerem jornadas de 3 e mais leguas para encontrarem os juizes ordinarios, que vierem substituir os juizes eleitos.

A experiencia tem mostrado a necessidade do agrupar em julgados menos populosos os habitantes das 61 freguezias, de que se compõe esta comarca, tomando por base da nova divisão as naturaes approximações, habitos e interesses dos povos, bem como a ponderosa consideração de os livrar de percorrerem grandes distancias para encontrarem

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o juiz não letrado, a quem só em casos de pequena importância podem recorrer. A população tem crescido desde 1864, como se vê do novo censo de 1878, por isso mais fácil e rasoavel se torna a nova divisão, que deverá ser feita em cinco julgados, pela forma seguinte:

Ver quadro na imagem

D'este modo ficará a divisão da comarca de Villa Verde accommodada aos interesses dos povos e á boa administração da justiça.

Por todas estas considerações tenho a honra de propor á vossa illustrada apreciação e competencia o seguinte projecto de lei:

Artigo 1.º A comarca de Villa Verde é dividida em cinco julgados, a saber:

Julgado de Penella, com sede na freguezia das Duas Igrejas de Penella, e composto das freguezias de Arcozello, Azões, Carreiras (S. Miguel), Codeceda, Duas Igrejas, Escariz (S. Martinho), Golles, Godinhaços, Marrancos, Pedregães, Penascaes, Portella das Cabras e Rio Mau, 13 freguezias com 1:441 fogos e 6:056 habitantes, segundo o censo de 1878.

Julgado de Gondomar, com sede na freguezia de Gondomar, e composto das freguezias de Aboim de Nobrega, Bruffe, Gibões, Covas, Gomide, Gondomar, Gondoriz, Oriz (Santa Marinha), Passo, Valdreu, Vallões, Valbom (S. Martinho) e Valbom (S. Pedro), 13 freguezias com 1:819 fogos e 6:130 habitantes, segundo o censo de 1878.

Julgado de Pico de Regalados, com sede na freguezia de S. Paio do Pico, e composto das freguezias de Athaes, Barros, Coucieiro, Oriz (S. Miguel), Ponte (S. Vicente), Pico (S. Christovão), Pico (S. Paio), Prado (S. Miguel), Saneie e Villarinho, 10 freguezias com 1:299 fogos e 5:230 habitantes, segundo o censo de 1878.

Julgado de Villa Verde, com sede na freguezia de Villa Verde, e composto das freguezias de Carreiras (S. Thiago), Dossãos, Esqueiros, Geme, Gondiães, Lanhas, Loureira, Moure, Moz, Nevogilde, Parada e Barbudo, Sabariz, Soutello, Travassos, Turiz e Villa Verde, 16 freguezias com 2:021 fogos e 8:402 habitantes, segundo o censo de 1878.

Julgado do Prado, com sede na freguezia de Santa Maria do Prado, e composto das freguezias de Atheaes, Cabanellas, Cervaes, Escariz (S. Mamede), Freiriz, Lage, Oleiros, Parada de Gatim e Prado (Santa Maria), 9 freguezias com 1:707 fogos e 7:403 habitantes, segundo o censo de 1878.

Art. 2.º Fica revogada a legislação em contrario.

Sala das sessões da camara dos senhores deputados, em 14 de março de 1879. = Manuel Joaquim Alves Passos deputado pelo circulo de Villa Verde.

2.ª Renovo a iniciativa do projecto de lei, tendente á constituição da ordem dos advogados, que tive a honra de apresentar em sessão de 16 de abril de 1880, e se acha publicado no Diario do governo n.º 87 d'esse anno, projecto que sob o n.° 80 teve parecer favorável da commissão de legislação civil em 1 de junho de 1881, e que foi de novo apresentado á camara em sessão de 6 de fevereiro ultimo pelo sr. deputado Frederico Arouca.

Sala elas sessões, em 26 de janeiro de 1885. = O deputado, Francisco Beirão.

Lida na mesa, foi admittida e mandada enviar á commissão de, legislação civil.

O projecto a que se refere esta proposta é o seguinte:

Projecto de lei n.º 80

Senhores. - A vossa commissão de legislação civil examinou o projecto de lei apresentado á camara pelo sr. deputado Beirão, que tem por fim constituir a ordem dos advogados.

Foi elaborado este projecto por uma commissão da associação dos advogados, de que é relator o seu secretario rd. Paulo Midosi.

Inutil é expor as vantagens deste projecto, porque, no excellente relatorio que o precede, se explica e demonstra cabalmente a tua utilidade e justiça.

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Limitar-nos-hemos, portanto, darvos conta de algumas modificações Feitas ao projecto primitivo e dos motivos que as justificam.

Auctorisado pela vossa commissão, o relator d'este parecer teve algumas conferencias com o illustre secretario da associação dos advogados. N'estas conferencias accordaram nas alterações que a vossa commissão acceitou e que passam a expor-se:

No projecto não tinha sido prevista a falta de eleição ou de posse do decano;

Attendeu-se agora a esta falta, fazendo cessar as funcções do decano pela forma indicada nos paragraphos novos do artigo 5.º.

Segundo a disposição do artigo 6.º, o conselho da Ordem é formado do decano, dos dois supplentes e dos dois presidentes dos conselhos de disciplina.

Como estes presidentes são membros das corporações de que ha recurso para o conselho da ordem, se tivessem voto em ambos os conselhos, seriam promiscuamente recorridos e julgadores dos seus proprios actos.
Para evitar este inconveniente, negavamos o artigo 20.º voto nos negocios resolvidos pelo conselho de disciplina, de que possa haver recurso.

Segundo outras disposições do projecto, o presidente do conselho de disciplina em todos os outros assumptos, tem voto não só como vogal mas até de qualidade no caso de empate. Ainda nos negocios de que ha recurso, este presidente tem de expor e dirigir a discussão, tomando assim completo conhecimento do seu objecto.
Concordou-se por isso que é presidente tivesse voto em todos os assumptos resolvidos pelo conselho de disciplina.

Fica, porem, inhibido de votar no conselho da ordem sobre os recursos dá sua circumscripção. N'este sentido se alteraram os artigos 6.º e 20.º

Tambem se eliminou do artigo 7.º a obrigação que se impunha á ordem de responder gratuitamente às consultas do governo.

Como este tem os seus conselheiros officiaes, seria verdadeiramente graciosa esta obrigação que ficava pesando sobre a ordem.

Alem d'isso é natural independência d'esta corporação exige que ella não fique por titulo algum na dependência do poder executivo.

Para facilitar aos praticantes o ingresso nos tribunaes, resolveu-se substituir os juizos de policia correccional do projecto por todos os juízos criminaes da primeira instancia, modificando-se assim o artigo 11.º

Supprimiram-se no artigo 23.º as palavras conforme a lei por se referirem á antiga legislação, a qual fica revogada, logo que seja devidamente convertido em lei este projecto.

Entendeu-se o artigo 24.º deixando salvo aos advogados direito próprio, quando a ordemn ao quizer tomar a defeza d'aquelles que invocarem o seu auxilio.

O projecto confere a ordem competencia para conceder ou negar protecção. Póde negar-lh'a no uso liberrimo do seu direito.

Esta negativa, porém, não póde destruir os direitos individuaes dos advogados, aos quaes fica salvada faculdade de usarem dos meios convenientes para fazerem valer esses direitos.

Em vista destas alterações a vossa commissão tem a honra de offerecer á vossa illustrada apreciação o seguinte projecto de lei:

TITULO I

Da ordem e profissão dos advogados

Artigo 1.º A profissão do advogado tem por fim a defeza dos direitos políticos e civis de cada um: repousa na probidade, desinteresse, independência ë Cuidadoso estudo de quem a exerce, e emprega como meios a persuasão e a convicção.

Art. 2.º Os advogados do reino e das ilhas dos Açores e da Madeira são pela presente lei constituidos em corporação com a denominação de ordem dos advogados, e salvo o disposto no artigo 32.º ninguem poderá nessa area exercer a profissão de advogado, sem se achar inscripto nos registos da ordem.

Art. 3.º A ordem dos advogados tem a sua sede principal em Lisboa, e divide-se em duas circumscripções, a saber:

A primeira com a sua sede em Lisboa, comprehendendo os advogados dos districtos das relações de Lisboa e dos Açores.

A segunda com a sua sede no Porto, comprehendendo os advogados do districto da relação.

Art. 4.º Na sede de cada circumscripção haverá um conselho de disciplina.

§ l.º Em Lisboa o conselho de disciplina será composto do presidente, e cinco vogaes; no Porto compor-se ha de presidente, e tres vogaes; haverá tambem em Lisboa seis supplentes e no Porto quatro.

§ 2.º O conselho de disciplina e os seus supplentes são eleitos annualmente, pela assemblea de advogados da respectiva circumscripção, dentre os advogados que na sede desta exercera a sua profissão.

Art. 5.º Os presidentes dos conselhos de disciplina estão sujeitos ao decano, que é o chefe da ordem, e o unico representante d'ella.

§ 1.º O decano e dois supplentes são trienalmente eleitos, pela assembléa de advogados da ordem, dentre os advogados, que tiverem quinze annos pelo menos- de exercício da sua profissão na capital do reino, e ahi residirem habitualmente.

§ 2.º Quando o decano não tiver sido reeleito, terminam as suas funcções, logo que expire o praso de tres annos.

§ 3.º Não se tendo procedido a eleição no tempo util ou não havendo tornado posse o decano novamente eleito, o supplente a quem pertencer conforme o artigo 31.º, deverá assumir as funcções de decano, providenciando immediatamente para que. este cargo seja devidamente exercido.

Art. 6.º Dos conselhos de disciplina haverá recurso para o conselho da ordem, nos casos em que a presente lei o admitte.

§ 1.º O conselho da ordem compõe-se do decano, que é o presidente, e de quatro vogaes, que são os presidentes dos dois conselhos de disciplina e os dois supplentes do decano.

§ 2.º O conselho da ordem funcciona em Lisboa.

§ 3.º O presidente do conselho de disciplina não tem voto nos recursos interpostos na sua respectiva circumscripção.

Art. 7.º Os advogados que exercerem a sua profissão na sede de cada circumscripção, reunir-se-hão periodicamente em conferencia na respectiva sede, e discutirão em sessão publica as consultas jurídicas, que á conferencia forem feitas, ou por qualquer d'elles ou por outro collega seu da respectiva circumscripção, ou por terceiros.

§ 1.º Á conferencia preside o decano, e na sua falta o presidente do respectivo conselho de disciplina.

§ 2.º A resposta às consultas feitas por advogados da mesma circumscripção será gratuita: pela resposta às consultas extraordinárias poderá a conferencia perceber o honorario que se taxar.

TITULO II

Dos praticantes dos advogados e sua inscripção

Art. 8.º Ninguem póde inscrever-se como advogado sem mostrar ter adquirido pelo estudo prático da profissão e conhecimento de seus deveres e dos meios jurídicos que póde empregar. Dahi vem a natural distincção entre pra-

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ticantes e advogados. Uns e outros, porém, são obrigados á inscripção nos registos do ordem.

Art. 9.º Só podem ser admittidos a inscrever-se como praticantes os cidadãos portuguezes que forem bachareis formados em direito pela universidade de Coimbra.

Art. 10.º Os praticantes são obrigados:

1.º A praticar, durante um anno pelo menos, no escriptorio de um advogado inscripto;

2.º A assistir regularmente às conferencias de que trata o artigo 7.º, e a responder às consultas que lhe forem distribuidas.

§ 1.º Na petição para a inscripcão deverá o praticante declarar o nome e domicilio do advogado com quem vae praticar, e consentimento escripto d'este.

§ 2.° O anno de pratica conta-se da data da inscripção.

§ 3.º A assistencia às conferencias só é obrigatoria para os praticantes domiciliados na sede de cada circumscripção.

Art. 11.º Os praticantes com tres mezes de pratica assídua e estudiosa, poderão ser auctorisados a procurar em juizo como solicitadores e a advogar nos juizos criminaes da primeira instancia.

§ único. Essa auctorisação ser-lhes-ha lançada no registo da sua inscripção e cotada no respectivo diploma.

Art. 12.º Só póde ser admittido a inscrever-se como advogado:

1.º O praticante inscripto, que mostrar ter concluído com bom comportamento e aproveitamento o seu anno de pratica;

2.º O cidadão portuguez, bacharel formado em direito pela universidade de Coimbra, que, posto se não tenha inscripto como praticante, tiver servido um anno pelo menos como magistrado do ministerio publico, como juiz ou como lente da faculdade de direito da mencionada univerdade.

Art. 13.º A inscripcão tanto de praticantes como dos advogados e a auctorisação a que se refere o artigo 11.º, requer-se ao conselho de disciplina da circumscripção em que o requerente quizer praticar ou advogar.

Art. 14.º O diploma da inscripcão de praticante com a quota a que se refere o § único do citado artigo 11.º, e o da inscripção de advogado habilita o inscripto a exercer a sua profissão sem dependencia de nenhum outro documento.

§ 1.º O advogado inscripto numa circumscripção pode accidentalmente exercer a sua profissão na outra póde tambem transferir de uma para outra circumscripção a sua inscripcão; mas não póde estar inscripto nas duas circumscripções.

§ 2.º O diploma que habilita a advogar, habilita igualmente a solicitar em juizo.

Art. 15.º Não podem ser admittidos a inscrever-se como praticantes, nem como advogados, os que em regra são inhibidos de procurar em juizo.

Art. 16.º O exercício da profissão do advogado é, alem disso, incompatível com todo o emprego ou profissão, cujos deveres collidam com os do advogado.

Art. 10.º O advogado inscripto gosa de todas as regalias, immunidades e inscripções, que por lei ou costume são concedidas aos magistrados do ministerio publico, e nos actos publicos occupará logar á esquerda d'estes.

TITULO III

Das attribuições dos conselhos

de disciplina e dos seus presidentes, bem como do conselho da ordem e do decano

Art. 18.º O conselho de disciplina é ao mesmo tempo, na sua circumscripção, corpo administrativo e tribunal disciplinar.

Art. 19.º Como corpo administrativo compete-lhe na respectiva circumscripção:

1.º Receber todas as taxas, quotas e rendimentos da ordem e applical-os conforme os orçamentos devidamente approvados;

2.º Organisar e administrar a casa da conferencia, e a livraria annexa;

3.º Prover a todas as necessidades economicas da ordem na respectiva circumscripção.

Art. 20.º Como tribunal compete-lhe na respectiva circumscripção :

1.º Acceitar os requerimentos para inscripção de praticantes e advogados, e resolver sobre elles;

2.º Effectuar a inscripção, quando auctorisada, e passar aos inscriptos o competente diploma;

3.º Conceder aos praticantes a auctorisação a que se refere o artigo 11.º, registal-a e cotal-a no respectivo diploma;

4.º Formar annualmente o quadro dos praticantes auctorisados e dos advogados da respectiva circumscripção, fazel-o imprimir e remetter copia authenticada a todos os tribunaes de primeira instancia civil, commercial ou criminal e aos tribunaes superiores da respectiva circumscripção; bem como ao conselho de disciplina da outra circumscripção e ao decano da ordem;

5.º Conhecer das faltas commettidas pelos praticantes e advogados no exercicio de suas funcções; e especialmente das previstas no artigo 419.º do codigo penal e no artigo 98.º do codigo de processo civil;

6.º Conhecer dos actos de comportamento publico dos praticantes e advogados, que offenderem o decoro da profissão ou o da ordem;

7.º Impor, nos casos de que tratam os dois numeros precedentes, aos praticantes e advogados, as penas disciplinares em que elles houverem incorrido.

§ 1.º As penas que o conselho de disciplina póde impor, são:

1.ª A advertencia particular;
2.ª A censura publica;
3.ª A suspensão até um anno.

§ 2.º O presidente do conselho de disciplina preside e dirige os trabalhos, tendo voto de qualidade no caso de empate.

Art. 21.º De todas as deliberações que o conselho de disciplina tomar como tribunal, excepto no caso do n.º 1.º do § 1.º do artigo precedente, cabe recurso para o conselho da ordem.

§ único. Das deliberações do conselho da ordem não ha recurso.

Art. 22.º Compete ao decano da ordem:

1.º Regular por meio de instrucções dadas aos presidentes dos conselhos de disciplina, o serviço d'elles e dos conselhos, e fixar as epochas em que uns e outros devem praticar os differentes actos da sua competencia;

2.º Advertir particular e paternalmente os praticantes e advogados que pelo seu comportamento careçam dessa advertencia.

Art. 23.º O disposto nos tres artigos precedentes não tolhe aos juizes e tribunaes superiores as medidas que, conforme a lei, julgarem necessárias para manter a policia dentro do respectivo tribunal, e sendo ahi commettida por praticante ou advogado alguma das faltas previstas no artigo 18.º, o juiz ou tribunal fará levantar auto, e remettel-o-ha ao respectivo conselho disciplinar para ahi ter o seguimento legal.

Art. 24.º Todo o praticante auctorisado ou advogado que no exercicio da sua profissão for offendido por qualquer tribunal, juiz ou individuo particular tem o direito de reclamar, perante o respectivo conselho de disciplina, a protecção da ordem.

§ 1.º Apresentada por escripto a reclamação do offendido, deve o conselho, havidas as necessárias informações, resolver sobre ella.

§ 2.º Resolvendo assumir a defeza do offendido, deve

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remetter o processo da reclamação ao decano, para que este, em nome da ordem, requeira a quem, onde, e pelo meio que competir, a correspondente reparação.

§ 3.º indeferindo, o conselho a reclamação, fica resalvada ao reclamante a sua acção individual.

§ 4.º O processo da reclamação e seu recurso, havendo-o correrá e será sempre secreto.

TITULO IV

Das assembleas de circumscripção e da ordem

Art. 25.º Assembléa de cada circumscripção é composta dos advogados inscriptos, na circumscripção respectiva; a assemblea da ordem compõe-se dos advogados inscpriptos em ambas as circumscripções.

Art. 26.º A assembléa, de cada circumscripção reune-se na sede da circumscripção a que respeita. A assemblea da ordem reune-se em Lisboa.

§ 1.º Os advogados que não poderem comparecer nas assembléas a que pertencerem, podem ahi fazer-se representar por procurador.

§ 2.º A procuração só póde ser dada a advogado que tenha assento na assembléa de que se tratar.

§ 3.º Nenhum advogado póde votar mais do que por si e por duas procurações.

§ 4.º Não se admitte mandato imperativo nem estabelecido.

Art. 27.º O decano, ouvidos os presidentes dos conselhos de disciplina, fixará os dias de reunião das assembleas de circumscripção e da assembléa da ordem.
§ único; A convocação será feita com a necessária publicidade e com a sufficiente antecipação, para conhecimento dos advogados das províncias e das ilhas.

Art. 28.º Ás assembléas de circumscripção presidem os presidentes dos respectivos conselhos de disciplina á assembléa da ordem preside o decano.

Art. 29.º Cada assembléa póde funccionar logo que esteja presente, pessoalmente ou por procuração, um terço do numero, de advogados que a compõem!

§ único. Se no dia fixado para a reunião não comparecer numero sufficiente, o decano convocará nova reunião, com a declaração de poder funccionar com qualquer numero.

Art. 30.º Compete às assembléas de circumscripção:

1.º Eleger o respectivo conselho de disciplina e seus supplentes;

2.º Votar á receita e despeza especial da circumscripção;

3.º Deliberar sobre as propostas que. lhe forem submettidas, no interesse económico da respectiva circumscripção.

§ 1.º A eleição do conselho de disciplina e seus supplentes far-se-ha em tres escrutinios separados, um para o presidente, outro para os vogaes, e outro para os supplentes.

§ 2.º No impedimento do presidente é chamado a substituil-o o vogal mais votado no impedimento dos vogaes são chamados os supplentes, tambem pela ordem da votação.

§ 3.º Em igualdade de votos prefere a, antiguidade e entre os igualmente antigos prefere a ordem alphabetica dos nomes.

Art. 31.º Compete á assembléa da ordem:

1.º Eleger o decano e seus supplentes;
2.º Votar à receita e despeza da ordem;
3.º Deliberar sobre as propostas que lhe forem submettidas, e que interessarem ao desenvolvimento geral da ordem e á sua administração economica.

§ 1.º A eleição do decano e a dos supplentes far-se-ha em dois escrutinios separados, um para o decano é outro para os dois supplentes.

§ 2.º Os supplentes serão chamados pela ordem de votação a substituir o decano nos seus impedimentos.

§.3.º É applicavel ao decano e seus, supplentes o disposto no & 3.° do artigo precedente.

TITULO V

Disposições geraes

Art. 32.º O disposto no artigo 2.º da presente lei não tolhe a nomeação de advogados de provisão onde já não houver numero sufficiente de advogados inscriptos.

§ único. Os advogados provisionarios não fazem parte da ordem, nem gosam das immunidades dos membros d'esta.

Art. 33.º O governo fará os regulamentos necessários para a execução da presente lei sob proposta do decano aprovada pela assembléa da ordem.

Art. 34.º Fica auctorisado o governo a estender as disposições da presente lei às províncias ultramarinas quando o julgue conveniente.

TITULO VI

Disposições transitorias

Art. 35.º Os advogados actualmente inscriptos perante os differentes tribunaes, do reino; deverão requerer a sua inscripção, como memoros da ordem, perante a associação dos advogados de Lisboa dentro dê quatro mezes da publicação da presente lei.

§ 1.º Para este effeito deverão os requerentes apresentar certidão da respectiva inscripção, e por ella se lhes regulará a antiguidade.

§ 2.º Deverão no requerimento declarar tambem a comarca ou comarcas onde têem exercido a sua profissão, e em que querem continuar a exercel-a.

Art. 36.º Findo o praso do artigo antecedente o presidente da associação convocará os advogados inscriptos a reunir-se sob a presidencia d'elle em sessão de assembléa da ordem e proceder-se-ha á eleição do decano e seus supplentes.

Art. 37.º O decano eleito procederá em seguida á formação do quadro dos advogados de cada circumscripção, e á convocação das assembléas respectivas para a eleição dos conselhos de disciplina.

§ único. Essas assembléas serão presididas pelo advogado, que o decano para esse fim designar em cada circumscripção.

Art. 38.º Até se effectuar a eleição dos conselhos de disciplina poderão ainda inscrever-se perante o decano os advogados que o não tiverem feito perante a associarão, dentro do praso do artigo 35.º; os advogados que até então se não inscreverem ficam sujeitos às condições geraes da inscripção.

Art. 39.º Fica revogada toda a legislação em contrario.

Sala da commissão, 1 de junho de 1881. = José Maria Rodrigues de Carvalho = F. de Medeiros = M. Celestino = Manuel J. Penha Fortuna = Antonio Lucio Tavares, Crespo - Francisco Beirão = Alves da Fonseca - Tem voto do sr. Dr. Oliveira Valle.

Senhores. - Tenho a honra de apresentar o officio, o relatorio e o projecto de lei juntos, que me foram remettidos pela, associação dos advogados de Lisboa.

Faço minhas as considerações expostas no referido relatorio, e adopto-as para fundamentar o projecto de lei junto, o qual, usando da minha iniciativa de deputado, apresento ao parlamento, a fim de ser submettido á sua esclarecida deliberação.

Sala das sessões, 16 de abril de 1880. = O deputado, por Montemor o Novo, Francisco Beirão.

N.º 164-A

Senhores. - A vossa commissão vem hoje apresentar os seus trabalhos, e lisonjeia-se de em breve espaço terminar

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a sua missão, se não proficientemente, porque não nutre essa vaidade, pelo menos com toda a celeridade compatível com o assumpto de que a associação se occupou, e que interessa ao viver e ser do advogado portuguez, ou, para melhor dizer, ao seu presente e ao seu futuro.

A lei póde muito, mas ainda mais podem os bons costumes; e esses devem andar intimamente ligados á nossa profissão.

É por isso que á vossa commissão não escapou a vida publica do advogado. Embora lhe não devassasse a existencia intima, nas attribuições do conselho de disciplina, consignou um principio altamente essencial para o caracter d'aquelles que exercem essa profissão, á qual, á simultanea do brilhante, uma só mancha lhe impana o brilho, e lhe tira o valor.

Se e licito caminhar da individualidade para a collectividade, o principio é applicavel em toda a sua profícua amplitude.

As nações morrem mais depressa pela dissolução dos costumes, do que pela modificação e pela brandura das leis.

Daqui a vossa commissão teve em vista, caminhando do pequeno comparativamente para o grande, ser módica e benigna nas penas, mas póde tornar-se immensa no rigor para com os de uma classe em toda a parte respeitável e respeitada; e esse rigor deve existir, logo que á pureza dos costumes se não una o desinteresse e a probidade, únicos attributos que tornam o advogado digno da altura em que póde estar collocado.

Nem monopolio nem privilegio, desinteresse e estudo, eis o que a vossa commissão considerou neste projecto definitivo, que tende exclusivamente por um lado a manter as prerogativas da classe, e por outro a conservar a sua disciplina e decoro.

Não esqueceu debaixo deste ponto de vista, á vossa commissão e oppor tenaz resistencia aquelles que julgando offender só o advogado, encontrarão a ordem toda para o defender, sempre que a rasão e a justiça estejam do seu lado.

É concisa a lei que apresentamos, como convinha que o fosse, visto que o seu complemento serão os regulamentos que é mister elaborar, os quaes, comquanto não possam ter o caracter legislativo, à ao de ser submettidos á sancção do governo, e devem sobretudo tirar a sua força da excessiva delicadeza, base da ordem, da rigorosa observância e constante experiência a que os praticantes forçosamente se hão de sujeitar, sem o que não podem merecer a protecção que a ordem estende a todos os seus irmãos.

A vossa commissão curou d'esses praticantes. Lembrou-se da necessidade de os obrigar a um certo tirocínio, essencialissimo, pois os erros no principio depois tarde ou nunca se corrigem.

Para aquelles a quem desde ja nas veias o sangue dos poucos annos, parecerá nimio o zelo. Não o é e o futuro os desenganará.

A morte não espera; rouba provectas intelligencias, provada capacidade e inconcussa sciencia. Improvisa-se tudo melhor ou peior, menos o verdadeiro advogado; e para que seja verdadeiro é indispensável que comece pelo principio, e não queira principiar logo p do fim. Vae nisso a coherencia, o bom juizo, o interesse proprio e ainda a fortuna dos litigantes.

A vossa commissão creou um tribunal de appellação. Não podia esquecer esta garantia, que a associação tanto lhe recommendára.

Negou, porém, recurso na advertência, que é um mero acto paternal ou confraternal, sem publicidade. Já não na censura, que parte de accordão do conselho de disciplina, e que póde e deve ter toda a publicidade e eficacia, sendo de grande alcance moral para o homem de bem - e só homem de bem póde e deve ser advogado.

Foi mais considerada a segunda cidade do reino - o Porto - já pela facilidade das communicações, já por ser a que abriga maior numero de advogados; e sem destruir por modo nenhum os laços de fraternidade que nos ligam a todos os collegas, a vossa commissão sentiu não poder augmentar o numero do conselhos de disciplina; porem, é isso devido á pequenez numerica da classe, em comparação do que ha lá fora.

Para o ultramar providenciará o governo quando o julgue opportuno.

Nobilitemo-nos; occupemos o logar que é nosso, porque o conquistámos; e para isso formulámos a lei, de que nos incumbistes, definitivamente redigida.

A ordem dos advogados pertence hoje a todos os paizes que se prezam de civilisados.

Começando pelos nossos vizinhos, os hespanhões, quando ao terminar o reinado de Filippe II se creava o pensamento da ordem, que depois tanto fructificou, appareciam os estatutos approvados pelo conselho de Castella, e em 23 de novembro de 1617 estabeleceu-se o principio legal de que nenhum, advogado podia exercer a profissão em Madrid, sem que estivesse inscripto no collegio.

Quando a ordem, em 1775, se fixou em Santo Isidro el Real, foi interrompida pela revolução franceza de 1793, que veiu suscitar questões em muitos e variados assumptos.

Então começou a revisão dos estatutos em 16 de junho de 1807, interrompida pelo grito de guerra da invasão franceza em 1808. As águias imperiaes o altivas foram derrotadas nos campas de Bailéu; e em 1820 apparece a mais ampla reforma; e d'essa epocha até hoje hão sido muitos os aperfeiçoamentos; de maneira que, creada uma bibliotheca por simples donativos, segundo o relatorio de Cortina, chefe da ordem, em 1855, contava para cirna de 3:000 volumes e o rendimento animal já era de 30:000 a 35:000 real os de vellun. Os advogados hespanhos têem monte pio e sociedade para soccorrer os jurisconsultos necessitados.

É notavel que no império da Allemanha, começando os advogados por serem nomeados pelo poder executivo, sujeitando-se às leis especiaes de cada estado; e ainda em 29 de outubro de 1874 apparecendo um projecto de organisação judicial, não eram tomados em consideração, quando era 24 de outubro de 1877 o chanceller já apresentava ao conselho federal o projecto da ordem; subindo ao reichstag em 6 de fevereiro de 1878, e sendo hoje lei, desde 1 de julho do mesmo anuo.

Se alongarmos a vista a Friburgo, para Itália, para Genebra, até para Roumania, onde não ha advogados nos tribunaes inferiores, é sempre a ordem ; ou em Friburgo pela lei de 23 de maio de 1877, ou em Italia pela ultima reforma de 8 do junho de 1874, ou, enfim, em Genebra pela lei de 22 de junho de 1878.

Reservamos para o fim a Inglaterra e a França.

A Inglaterra vive, como sempre, de instituições, suas peculiares, com que se dá bem, e que servem maravilhosamente para os seus. Copial-a seria tempo perdido. As suas leis em todos os ramos adaptam-se ao seu paiz e principalmente aos seus costumes. E quanto basta; por ellas se governam com juizo e prudencia; são felizes relativamente, e ricos absolutamente.

Assim nada tinhamos a estudar d'esse paiz, para o applicar ao nosso, porque os inns of court, é casa de residência dos estudantes e praticantes, e vivem ahi sujeitos á tutella dos benchers, directores, e a um chefe.

Hoje era França a ordem é modelo; d'ali transplantámos e aprendemos muito.

A profissão de advogado foi supprimida em 1790 pela revolução que trouxe comsigo não poucas violencias e crimes, como as leis de D. Affonso IV e D. Pedro I, entro nós haviam prescripto a profissão porque o maior numero (dizia este ultimo rei) causava muitas demandais e conten-

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das; e mandava em em sua corte e reino não houvesse advogados.

Em França, como em Portugal, o advogado reconquistou brilhantemente a sua posição; e ali, desde as leis de 22 ventose, anno XIII, titulo 15, até 22 de março de 1852 ficou de tal importância a ordem dos advogados francezes, que elles gosam da supremacia, que bem merecem.

Senhores, o advogado portuguez não occupava a posição que por direito lhe cabe, e sempre lhe coube, inclusive desde as ordenações do liv. 1.º, tit. 48.º, § 4.º, e liv. 1.º, tit. 66.º, § 42.º

Não procuramos pela presente lei crear nenhuma classe privilegiada. Não solicitámos outra garantia senão aquella que as leis do reino conterem ao magistrado do ministerio publico. Advogado e ministerio publico pertencem á magistratura social. Se este defende os interesses da sociedade, aquelle propugna pelos direitos individuaes; e é de individuos que se compõe a sociedade. Ministerio publico e advogados são empenhados em representar a lei no que ella tem de mais augusto e solemne, a sancção. Ambos, finalmente, fazem ouvir a voz commum e serena da sociedade, protegendo a ordem publica e salvando os direitos do maior numero das garras das paixões ruins, da prepotência, e não poucas vezes da injustiça.

Os advogados portuguezes, despidos, pois, de ambições, longe e bem longe dos altos cargos do estado, pedem aqui só o que ninguém lhes póde negar: liberdade e independencia.

E como único desideratum deste limitadíssimo, mas inconcusso direito, eis, senhores, o projecto de lei que temos a honra de vos apresentar.

TITULO I

Da ordem e profissão dos advogados

Artigo 1.º A profissão do advogado tem por fim a defeza dos direitos politicos e civis de cada um: repousa na probidade, desinteresse, independência e cuidadoso estudo de quem a exerce, e emprega como meios a persuasão e a convicção.

Art. 2.º Os advogados do reino e das ilhas dos Açores e da Madeira são pela presente lei constituidos em corporação com a denominação de ordem dos advogados e, salvo o disposto no artigo 32.º, ninguém poderá n'essa área exercer a profissão de advogado, sem se achar inscripto nos registos da ordem.

Art. 3.º A ordem dos advogados tem a sua sede principal em Lisboa, e divide-se em duas circumscripções, a saber;

A primeira com a sua sede em Lisboa, comprehendendo os advogados dos districtos das relações de Lisboa e dos Açores;

A segunda com a sua sede no Porto, comprehendendo os advogados do districto da relação.

Art. 4.º Na sede de cada circumscripção haverá um conselho de disciplina.

§ l.º Em Lisboa o conselho de disciplina será composto do presidente e cinco vogaes; no Porto compor-se-ha do presidente e tres vogaes; haverá tambem em Lisboa seis supplentes e no Porto quatro.

§ 2.º O conselho de disciplina e os seus supplentes são eleitos annualmente, pela assembléa de advogados da respectiva circumscripção, dentre os advogados que na sede desta exercem a sua profissão.

Art. 5.º Os presidentes dos conselhos de disciplina estão sujeitos ao decano, que é o chefe da ordem, e o único representante d'ella.

§ único. O decano e dois supplentes são triennalmente eleitos, pela assembléa de advogados da ordem, dentre os advogados que tiverem quinze annos pelo menos de exercício da sua profissão na capital do reino, e ahi residirem habitualmente.

Art. 6.º Dos conselhos de disciplina haverá recurso para o conselho da ordem, nos casos em que a presente lei o admitte.

§ 1.º O conselho da ordem, compõe-se do decano, que é o presidente, e de quatro vogaes, que são os presidentes dos dois conselhos de disciplina e os dois supplentes do decano.

§ 2.º O conselho da ordem funcciona em Lisboa.

Art. 7.º Os advogados que exercerem a sua profissão na sede de cada circumscripção, reunir-se-hão periodicamente em conferencia na respectiva sede, e discutirão em sessão publica as consultas jurídicas, que á conferencia forem feitas, ou por qualquer d'elles ou por outro collega eu da respectiva circumscripção, ou por terceiros: e darão alem d'isso parecer sobre qualquer objecto juridico em que o governo os consultar.

§ 1.º Á conferencia preside o decano, e na sua falta o presidente do respectivo conselho de disciplina.

§ 2.º A resposta às consultas feitas por advogados da mesma circumscripção ou pelo governo será gratuita: pela resposta às consultas extraordinarias poderá a conferencia perceber o honorario que se taxar.

TITULO II

Dos praticantes de advogados e sua inscripção

Art. 8.° Ninguém póde inscrever-se como advogado sem mostrar ter adquirido pelo estudo pratico da profissão o conhecimento de seus deveres e dos meios jurídicos que póde empregar. D'ahi vem a natural distincção entre praticantes e advogados. Uns e outro?, porém, são obrigados á inscripção nos registos da ordem.

Art. 9.º Só podem ser admittidos a inscrever-se como praticantes, os cidadãos portuguezes que forem bacharéis formados em direito pela universidade de Coimbra.

Art. 10.º Os praticantes são obrigados:

1.º A praticar, durante um anno pelo menos, no escriptorio de um advogado inscripto;

2.º A assistir regularmente às conferencias de que trata o artigo 7.º, e a responder às consultas que lhes forem distribuidas.

§ 1.º Na petição para a inscripção deverá o praticante declarar o nome e domicilio do advogado com quem vae praticar, e juntar consentimento escripto d'este.

§ 2.º O anno de pratica conta-se da data da inscripção.

§ 3.º A assistência às conferencias só é obrigatoria para os praticantes domiciliados na sede de cada circuinscripção.

Art. 11.º Os praticantes com tres mezes de pratica assídua e estudiosa poderão ser auctorisados a procurar em juízo como solicitadores e a advogar nos juízos de policia correccional.

§ único. Essa auctorisação ser-lhes-ha lançada no registo da sua inscripção e cotada no respectivo diploma.ã

Art. 12.º Só póde ser admittido a inscrever-se como advogado:

1.º O praticante inscripto, que mostrar ter concluido com bom comportamento e aproveitamento o seu anno de pratica.

2.º O cidadão portuguez, bacharel formado em direito pela universidade de Coimbra, que, posto se não tenha inscripto como praticante, tiver servido um anno pelo menos como magistrado do ministerio publico, como juiz ou como lente da faculdade de direito da mencionada universidade.

Art. 13.º A inscripção tanto de praticantes como dos advogados e a auctorisação a que se refere o artigo 11.º, requer-se ao conselho de disciplina da circumscripção em que o requerente quizer praticar ou advogar.

Art. 14.º O diploma da inscripção de praticante com a quota a que se refere o § único do citado artigo 11.º, e o

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da inscripção de advogado habilita o inscripto a exercer a sua profissão sem dependencia de nenhum outro documento.

§ 1.º O advogado inscripto numa circumscripção póde accidentalmente exercer a sua profissão na outra; póde tambem transferir de uma para outra circumscripção a sua inscripção; mas não póde estar inscripto nas duas circumscripções.

§ 2.º O diploma que habilita a advogar habilita igualmente a solicitar em juizo.

Art. 15.º Não podem ser admittidos a inscrever-se como praticantes nem como advogados os que em regra são inhibidos de procurar em juizo.

Art. 16.º O exercicio da profissão de advogado é alem disso incompatível com todo o emprego ou profissão cujos deveres collidam com os do advogado.

Art. 17.º O advogado inscripto gosa de todas as regalias, immunidades e isenções, que por lei ou costume são concedidas aos magistrados do ministerio publico, o nos actos públicos occupará logar á esquerda d'estes.

TITULO III

Das attribuições dos conselhos de disciplina e dos seus presidentes, bem como do conselho da ordem e do decano

Art. 18.º O conselho de disciplina é ao mesmo tempo, na sua circumscripção, corpo administrativo e tribunal disciplinar.

Art. 19.º Como corpo administrativo compete-lhe na respectiva circumscripção:

1.º Receber todas as taxas, quotas e rendimentos da ordem e applical-os conforme os orçamentos devidamente approvados;

2.º Organisar e administrar a casa da conferencia, e a livraria annexa;

3.º Prover a todas as necessidades económicas da ordem na respectiva circumscripção.

Art. 20.º Como tribunal compete-lhe na respectiva circumscripção:

1.º Acceitar os requerimentos para inscripção de praticantes e advogados, e resolver sobre elles;

2.º Effectuar a inscripção, quando auctorisada, e passar aos inscriptos o competente diploma:

3.º Conceder aos praticantes a auctorisação a que se refere o artigo 11.º, registal-a e cotal-a no respectivo diploma;

4.º Formar annualmente o quadro dos praticantes auctorisados e dos advogados da respectiva circumscripção, fazel-o imprimir e remetter copia authenticada a todos os tribunaes de 1.ª instancia civil, commercial ou criminal e aos tribunaes superiores da respectiva circumscripção; bem como ao conselho de disciplina da outra circumscripção e ao decano da ordem;

5.º Conhecer das faltas commettidas pelos praticantes e advogados no exercício de suas funcções; e especialmente das previstas no artigo 419.º do código penal e no artigo 98.º do código de processo civil;

6.º Conhecer dos actos de comportamento publico dos praticantes e advogados, que offenderem o decoro da profissão ou o da ordem;

7.º Impor, nos casos de que tratam os dois números precedentes, aos praticantes e advogados, as penas disciplinares em que elles houverem incorrido.

§ 1.º As penas que o conselho de disciplina podo impor, são:

1.ª A advertencia particular;
2.ª A censura publica;
3.ª A suspensão até um anno.

§ 2.º O presidente do conselho de disciplina quando esse conselho funcciona como tribunal, preside e dirige os trabalhos, mas não toma parte nas deliberações de que couber recurso. Em todas as demais vota e tem voto de qualidade em caso de empate.

Art. 21.º De todas as deliberações que o conselho de disciplina tomar como tribunal, excepto no caso do n.º 1.º do § 1.º do artigo precedente, cabe recurso para o conselho da ordem.

§ único. Das deliberações do conselho da ordem não ha recurso.

Art. 22.º Compete ao decano da ordem:

1.º Regular por meio de instrucções dadas aos presidentes dos conselhos de disciplina, o serviço d'elles e da conselhos, e fixar as epochas em que uns e outros devem praticar os differentes actos da sua competencia;

2.º Advertir particular e paternalmente os praticantes o advogados que pelo seu comportamento careçam dessa advertência.

Art. 23.º O disposto nos tres artigos precedentes não tolhe aos juizes e tribunaes superiores as medidas que, conforme a lei, julgarem necessárias para manter a policia dentro do respectivo tribunal, e sendo ahi commettida por praticante ou advogado alguma das faltas previstas no artigo 18.º, o juiz ou tribunal fará levantar auto, e remettel-o-ha ao respectivo conselho disciplinar para ahi ter o seguimento legal.

Art. 24.º Todo o praticante auctorisado ou advogado que no exercicio da sua profissão for offendido por qualquer tribunal, juiz ou individuo particular tem o direito de reclamar, perante o respectivo conselho de disciplina, a protecção da ordem.

§ 1.º Apresentada por escripto a reclamação do offendido, deve o conselho, havidas as necessarias informações, resolver sobre ella.

§ 2.º Resolvendo assumir a defeza do offendido, devo remetter o processo da reclamação ao decano, para que este, em nónio da ordem, requeira a quem, onde, e pelo meio que competir, a correspondente reparação.

§ 3.º Indeferindo o conselho a reclamação, poderá comtudo resalvar ao reclamante a sua acção individual.

§ 4.º Se a não resalvar, o reclamante considerará esse negocio findo para todos os effeitos, salvo se recorrer o obtiver provimento em seu recurso.

§ 5.º Nenhum recurso cabe das resoluções do conselho a que se refere o presente artigo, senão no caso do paragrapho antecedente.

§ 6.º O processo da reclamação o seu recurso, havendo-o, correrá e será sempre secreto.

TITULO V

Das assembléas de circumscripção e da ordem

Art. 25.º A assembléa de cada circumscripção é composta dos advogados inscriptos na circumscripção respectiva: a assembléa da ordem compõe-se dos advogados inscriptos em ambas as circumscripções.

Art. 26.º A assembléa de cada circumscripção reuno-se na sede da circumscripção a que respeita. A assembléa da ordem reuno-se em Lisboa.

§ 1.º Os advogados que não poderem comparecer nas assembléas a que pertencerem, podem ahi fazer-se representar por procurador.

§ 2.º A procuração só póde ser dada a advogado que tenha assento na assembléa de que se tratar.

§ 3.º Nenhum advogado póde votar mais do que por si e por duas procurações.

§ 4.º Não se admitto mandato imperativo nem substabelecido.

Art. 27.º O decano, ouvidos os presidentes dos conselhos de disciplina, fixará os dias de reunião das assembléas de circumscripção e da assembléa da ordem.

§ único. A convocação será feita com a necessária publicidade e com a sufficiente antecipação, para conhecimento dos advogados das províncias e das ilhas.

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SESSÃO DE 28 DE JANEIRO DE 1885 287

Art. 28.º As assembléas de circumscripção presidem os presidentes dos respectivos conselhos de disciplina: á assembléa da ordem preside o decano.

Art. 29.º Cada assembléa póde funccionar logo que esteja presente, pessoalmente ou por procuração, um terço do numero de advogados que a compõem.

§ único. Se no dia fixado para a reunião não comparecer numero sufficiente, o decano convocará nova reunião, com a declaração de poder funccionar com qualquer numero.

Art. 30.º Compete às assembléas de circumscripção:

1.º Eleger o respectivo conselho de disciplina e seus supplentes;

2.º Votar a receita e despeza especial da circumscripção.

3.º Deliberar sobre as propostas que lhe forem submettidas, no interesse económico da respectiva circumscripção.

§ 1.º A eleição do conselho de disciplina e seus supplentes far-se-ha em tres escrutínios separados, um para o presidente, outro para os vogaes, e outro para os supplentes.

§ 2.º No impedimento do presidente é chamado a substituil-o o vogal mais votado: no impedimento dos yogaes são chamados os supplentes, tambem pela ordem da votação.

§ 3.º Em igualdade de votos prefere a antiguidade, o entre os igualmente antigos prefere a ordem alphabetica dos nomes.

Art. 31.º Compete á assembléa da ordem:

1.º Eleger o decano e seus supplentes;
2.º Notar a receita e despeza da ordem;
3.º Deliberar sobre as propostas que lhe forem submettidas, e que interessarem ao desenvolvimento geral da ordem e á sua administração económica.

§ 1.º A eleição do decano e a dos supplentes far-se-ha em dois escrutínios separados, um para o decano e outro para os dois supplentes.

§ 2.º Os supplentes serão chamados pela ordem do votação a substituir o decano nos seus impedimentos.

§ 3.º E applicavel ao decano e seus supplentes o disposto no § 3.º do artigo precedente.

TITULO V

Disposições geraes

Art. 32.º O disposto no artigo 2.º da presente lei não tolhe a nomeação de advogados de provisão onde não houver numero sufficiente de advogados inscriptos.

§ único. Os advogados provisionarios não fazem parte da ordem, nem gosam das immunidades dos membros d'esta.

Art. 33.º O governo fará os regulamentos necessarios para a execução da presente lei sob proposta do decano approvada pela assembléa da ordem.

Art. 34.° Fica auctorisado o governo a estender as disposições da presente lei às províncias ultramarinas quando o julgue conveniente.

TITULO VI

Disposições transitorias

Art. 35.º Os advogados actualmente inscriptos perante os differentes tribunaes do reino deverão requerer a sua inscripção, como membros da ordem, perante a associação dos advogados de Lisboa, dentro de quatro mezes da publicação da presente lei.

§ 1.º Para este effeito deverão os requerentes apresentar certidão da respectiva inscripção, e por ella se lhes regulará a antiguidade.

§ 2.º Deverão no requerimento declarar tambem a comarca ou comarcas onde têem exercido a sua profissão, e em que querem continuar a exercel-a.

Art. 36.º Findo o praso do artigo antecedente o presidente da associação convocará os advogados inscriptos a reunir-se sob a presidência d'elle em sessão de assembléa da ordem e proceder-se-ha á eleição do decano e seus supplentes.

Art. 37.º O decano eleito procederá em seguida á formação do quadro dos advogados de cada circumscripção, e á convocação das assembléas respectivas para a eleição dos conselhos de disciplina.

§ único. Essas assembléas serão presididas pelo advogado, que o decano para esse fim designar em cada circumscripção.

Art. 38.º Até se effectuar a eleição dos conselhos de disciplina poderão ainda inscrever-se perante o decano os advogados que o não tiverem feito perante a associação, dentro do praso do artigo 35.º; os advogados que até então só não inscreverem ficam sujeitos às condições geraes da inscripção.

Art. 39.º Fica revogada toda a legislação em contrario.

Lisboa, 16 de abril de 1880. = Francisco Beirão.

REPRESENTADO

Da camara municipal do concelho de Alijó, pedindo ser auctorisada a desviar dos fundos destinados á viação municipal a quantia de 5:000$000 réis para ser applicada á exploração, compra e encanamento de aguas para a sede do concelho, construcção de uma fonte e de um matadouro.

Enviada á commissão de obras publicas, ouvida a de administração publica, juntamente com o respectivo projecto de lei apresentado pelo sr. Teixeira de Sampaio e que vae publicado no logar competente.

REQUERIMENTOS DE INTERESSE PUBLICO

1.º Requeiro que, pela secretaria da justiça, sejam enviados a esta camara os esclarecimentos por mim requeridos em sessão do 3 de fevereiro de 1882 sobre o movimento dos magistrados judiciaes nas comarcas açorianas nos últimos dez annos.

Requeiro iguaes esclarecimentos com relação aos juízos de segunda iastancia.= Barão de Ramalho, deputado pelo circulo n.º 99.

2.º Requeiro que, pelo ministerio do reino, nos seja enviada copia do auto de investigação levantado em Vouzella contra o professor de instrucção primaria d'aquella villa, António Cardoso de Figueiredo. = O deputado, José Simões Dias.

3.º Requeiro que, pelo ministerio da fazenda, se me da uma nota de todos os processos de liquidação de contribuição de registo por titulo lucrativo, pendentes, com designação das datas em que os mesmos foram instaurados. = O deputado pelo circulo 74, Joaquim Germano Seuqeira,

4.º Requeiro que, pelo ministerio competente, seja remettida a esta camara uma relação nominal dos officiaes do exercito que exerçam qualquer commissão de serviço na escola do exercito e no collegio militar, com a designação dos vencimentos que a cada um destes officiaes foram abonados no mez de dezembro ultimo. = Avellar Machado.

Mandaram-se expedir.

REQUERIMENTOS DE INTERESSE PARTICULAR

1.º Dos capitães de artilheria n.º 5, José Joaquim Ferreira e José Joaquim de Sant'Anna, pedindo que lhes sejam concedidas para a sua promoção as mesmas regalias que aos actuaes capitães almoxarifes e ajudantes de praça

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288 DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS

Apresentados pelo sr. deputado Thomás Bastos e enviados á commissão de guerra, ouvida a de fazenda.

2.º De Luiz Gomes de Carvalho Vieira, administrador do terreiro publico de Loanda, pedindo para se fazer extensiva a lei de aposentação aos empregados municipaes de Loanda.

Apresentado pelo sr. deputado Santos Diniz e enviado á commissão do ultramar.

3.º De Eusebio Catella do Vali e, tenente coronel do exercito de Africa occidental, pedindo que o governo seja auctorisado a contar-lhe no seu tempo de serviço mais 50 por cento.

Apresentado pelo sr. deputado Santos Diniz e enviado á commissão do ultramar.

4.º Dos fogueiros dos barcos a vapor da fiscalisação da alfAndega de Lisboa, pedindo augmento de vencimentos.

Apresentado pelo sr. deputado Santos Diniz e enviada á commissão de fazenda.

JUSTIFICAÇÕES DE FALTAS

1.ª Declaro que, por grave incommodo de saude, não pude comparecer às sessões desta camara, desde 22 do mez de dezembro ultimo. = Guilherme Augusto Pereira de Carvalho de Abreu.

2.ª Declaro que, por doença, não tenho assistido às sessões da camara desde 22 de dezembro passado, e que pelo mesmo motivo faltei a mais algumas. = Agostinho Fevereiro.

3.ª Declaro, em nome do sr. deputado Pedro Augusto Franco, que s. exa. não tem comparecido às anteriores sessões e não comparecerá a mais algumas por incommodo de saude. = Mariano de Carvalho.

4.ª Declaro a v. exa. que o sr. deputado Manuel Correia de Oliveira tem faltado a algumas sessões por motivo justificado. = Joaquim Augusto Ponces de Carvalho.

5.ª Declaro que por motivo justificado tenho faltado a algumas sessões. = Frederico Arouca.

6.ª Declaro que não pude comparecer às sessões de 23, 24, 26 e 27 do corrente, por motivo justificado. = O deputado por Angola, Santos Diniz.

7.ª Participo a v. exa. e á camara que o sr. deputado Francisco de Castro Mattoso da Silva Corte Real tem faltado a algumas sessões da camara por motivos justificados. = O deputado, Luiz de Lencastre.

Para a acta.

O sr. Presidente: - Convido os srs. deputados barão de Ramalho e Oliveira Peixoto a introduzirem na sala, para prestarem juramento, os srs. Guilherme de Abreu e Agostinho Fevereiro.

Prestaram juramento e tomaram assento.

O sr. Presidente: - A mesa, usando da auctorisação que a camara lhe deu, acaba de fazer as nomeações das commissões que ainda não estavam eleitas.

Como são muitas, não as farei ler agora para não tomar tempo á camara, mas pela publicação no Diario das sessões os srs. deputados tomarão d'ellas conhecimento.

São as seguintes:

Commissão de legislação commercial

Alberto Antonio de Moraes Carvalho.
Albino Garcia de Lima.
Antonio Candido Ribeiro da Costa.
Augusto Neves dos Santos Carneiro.
Emygdio Julio Navarro.
Francisco Antonio da Veiga Beirão.
Francisco de Castro Mattoso da Silva Corte Real.
Francisco Vanzeller.
Joaquim Antonio Neves.
Joaquim Germano de Sequeira.
Antonio José Lopes Navarro.
José Luciano de Castro Pereira Corte Real.
Luiz Adriano de Magalhães e Menezes de Lencastre.
Manuel de Oliveira Aralla e Costa.

Commissão de instrucção superior

Adriano Xavier Lopes Vieira.
Alfredo Filgueiras da Rocha Peixoto.
Antonio Candido Ribeiro da Costa.
Avelino Augusto Cesar Maria Calixto.
Bernardino Luiz Machado Guimarães.
Emygdio Julio Navarro.
Francisco Augusto Correia Barata.
Ignacio Francisco Silveira da Motta.
João Augusto Teixeira.
João José d'Antas Souto Rodrigues.
José Dias Ferreira.
José Elias Garcia.
Mariano Cyrillo de Carvalho.

Commissão de instrucção primaria e secundaria

Alberto Antonio de Moraes Carvalho.
Antonio Centeno.
Antonio José Lopes Navarro.
Antonio Ribeiro dos Santos Viegas.
Arthur Urbano Monteiro de Castro.
Augusto Neves dos Santos Carneiro.
Henrique da Cunha Mattos de Mendia.
José Frederico Laranjo.
Luiz Leite Pereira Jardim.
Manuel d'Assumpção.
Rodrigo Affonso Pequito.
Visconde do Rio Sado.
Zophimo Consiglieri Pedroso.

Commissão de saude publica

Adriano Emilio de Sousa Cavalheiro.
Adriano Xavier Lopes Vieira.
Agostinho Lucio e Silva.
Antonio Augusto Correia da Silva Cardoso.
Antonio Freire Garcia Lobo.
Antonio José Pereira Borges.
Antonio Manuel da Cunha Bellem.
Antonio Mendes Pedroso.
Arthur Hintze Ribeiro.
Eduardo José Cabral.
Fortunato Vieira das Neves.
Joaquim José Alves.
José de Azevedo Castello Branco.
Luiz Ferreira de Figueiredo.

Commissão de infracções

Albino Augusto Garcia de Lima.
Augusto José Pereira Leite.
Ernesto da Costa Sousa Pinto Bastos.
Francisco de Castro Mattoso da Silva Corte Real.
João Ribeiro dos Santos.
Joaquim Germano de Sequeira.
Luiz Adriano de Magalhães e Menezes de Lencastre.
Manuel Correia de Oliveira.
Martinho da Rocha Guimarães Camões.

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Commissão de petições

Caetano Augusto de Sousa Carvalho.
Francisco de Barros Coelho e Campos.
João Antonio Pinto.
José Borges Pacheco Pereira de Faria.
Manuel Bento da Rocha Peixoto.
Manuel Pedro Guedes.
Miguel Tudella de Sousa Napoles.
Visconde de Ariz.
Visconde de Balsemão.

Commissão de estatistica
Agostinho Nunes da Silva Fevereiro.
Antonio de Sousa Pinto de Magalhães.
Augusto Cesar Ferreira de Mesquita.
Francisco Augusto Florido de Mouta e Vasconcellos.
Ignacio Francisco Silveira da Motta.
José Bento Ferreira de Almeida.
Marçal de Azevedo Pacheco.
Rodrigo Affonso Pequito.
Tito Augusto de Carvalho.

Commissão de commercio e artes

Adolpho da Cunha Pimentel.
Alberto Antonio Moraes Carvalho.
Antonio Maria Pereira Carrilho.
Antonio de Sousa Pinto Magalhães.
Arthur Amorim Sieuve de Seguier.
Augusto Fuschini.
Bernardino Luiz Machado Guimarães.
Conde de Thomar.
Cypriano Leite Pereira Jardim.
Fernando Affonso Geraldes.
Francisco Augusto Florido de Mouta e Vasconcellos.
João Chrysostomo Melicio.
João Pereira Teixeira de Vascoucellos.
Rodrigo Affonso Pequito.
Tito Augusto de Carvalho.

Commissão do regimento Augusto Fuschini.

Bernardino Luiz Machado Guimarães.
Emygdio Júlio Navarro.
Frederico de Gusmão Correia Arouca.
José Elias Garcia.
Marçal de Azevedo Pacheco.
Mariano Cyrillo de Carvalho.
Miguel Dantas Gonçalves Pereira.
Visconde de Balsemão.

Commissão dos recenseamentos

Antonio Alfredo Barjona de Freitas.
Antonio Manuel da Cunha Bellem.
Antonio Pereira Leite.
Caetano Pereira Sanches de Castro.
Eduardo José Coelho.
Francisco Roberto da Silva Ferrão de Carvalho Martens.
Francisco Wanzeller.
Joaquim Antonio Neves.
José Gonçalves Pereira dos Santos.
José Gregorio de Figueiredo Mascarenhas.
José Maria de Oliveira Peixoto.
J. C. M. de Carvalho.
Manuel Bento da Rocha Peixoto.

Commissão dos relatorios das juntas geraes

Antonio José Ennes.
Antonio Maria de Moraes Machado.
Francisco Wanzeller. F. Coelho de Barros.
José Pereira dos Santos.
José Maria dos Santos.
Luiz Gonzaga dos Reis Torgal.
Luiz Osorio da Cunha Pereira de Castro.
Manuel Bento da Rocha Peixoto.
Sebastião Rodrigues Barbosa Centeno.
Visconde de Reguengos.

O sr. Gonçalves de Freitas: - Pedi a palavra para mandar para a mesa uma proposta para renovação de iniciativa do projecto de lei n.º 15-M de 1883, tornando extensiva a Frederico Augusto da Silva Gomes a disposição do artigo 25.º e paragrapho da lei da organisação da intendencia de marinha.

Ficou para segunda leitura.

O sr. Simões Dias: - Mando para a mesa um requerimento, pedindo, pelo ministerio do reino, uma copia authentica do auto de investigação levantado em Vouzella contra o respectivo professor de instrucção primaria.

Peço urgencia na remessa porque careço deste documento para poder annunciar uma interpellação ao sr. ministro do reino.

Vae publicado na secção competente.

O sr. Germano de Sequeira: - Mando para a mesa um requerimento pedindo, pelo ministerio da fazenda, uma nota relativa a processos pendentes de liquidação de contribuição de registo por titulo lucrativo.

Vae publicado no logar competente.

O sr. Barão de Ramalho: - Mando para a mesa uma proposta para renovação de iniciativa de um projecto de lei, por mim aqui apresentado em 1883.

Sr. presidente, este projecto de lei tem por fim preencher uma grande lacuna, e tornar uma realidade a inspecção directa, certamente o principio mais salutar das recentes leis sobre instrucção primaria, e sem duvida foi por isso que o governo informou favoravelmente por officio de 19 de maio de 1883, em resposta á consulta feita pela respectiva commissão.

Aproveito a occasião para mandar tambem para a mesa dois requerimento, pedindo esclarecimentos ao governo, pela secretaria da justiça, para poder basear algumas propostas no interesse do thesouro e no da administração da justiça nos Açores.

A proposta ficou para segunda leitura.

O requerimento vae publicado a pag. 287 deste Diario.

O sr. Ferreira de Almeida: - Sr. presidente, disse hontem que desejava a presença do sr. ministro da marinha, para chamar a attenção da camara para assumptos que dizem respeito á administração naval, questões disciplinares e outras de alguma importancia.

Hoje vejo presente o sr. ministro da marinha e antes de entrar nas questões a que me quero referir, permitta-me s. exa. e a camara que eu repita o que disse hontem mais desenvolvidamente.

Na questão por mim tratada do embarque do contingente para Moçambique, disse 8. exa. que eu lancei a responsabilidade de actos menos regulares á guarnição do transporte índia.

Tenho a dizer a v. exa. que a guarnição de um navio de guerra não é responsável pela execução das ordens do governo; por consequência, fossem essas ordens quaes fossem, e que apenas critique por inconvenientes e imprevidentes, pela forma e occasião em que se ordenaram e executaram, não póde a responsabilidade d'ellas recair sob a guarnição do transporte India, que executou fiel e religiosamente as ordens que recebeu, não fazendo mais do que o seu dever; procedendo segundo as normas de disciplina, que eu aprendi com os srs. Baptista de Andrade e visconde de Paço de Arcos e outros que são ornamento da classe a que tenho a honra de pertencer.

S. exa. tambem estranhou que, sendo eu official de marinha, levantasse a voz para criticar erros abuso, ou sirregularidades do serviço naval e dos corpos navaes!

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290 DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS

A dignidade de uma corporação, sr. presidente, não se mantém, occultando-lhe os erros, mas repettindo-os, castigando-os e emendando-os, e eu sinto muito que o sr. ministro da marinha, que assignou o projecto das reformas políticas, venha invocar a minha qualidade de official de marinha, quando essas reformas dizem que os pares e os deputados são representantes da nação e não do Rei que os nomeia, ou dos círculos que os elegem. (Apoiados.)

Eu não sou official de marinha dentro do parlamento, aqui sou apenas um dos delegados da soberania popular para zelar os actos da administração publica e os actos do governo, sejam elles quaes forem. (Apoiados.}

S. exa. disse com uma facil audacia - porque é que não formulo notas de interpellação? Eu não pedi documentos conformações, pelo ministerio da marinha, para fazer collecção de curiosidades!

As notas de interpellação ou as explicações que eu tiver de pedir ao governo, hão de ser feitas opportunamente, e quando eu julgar conveniente. Por consequência, parece-me inútil, menos regular e até menos próprio da grandeza de alma dos gigantes da tribuna como s. exa., lançar reptos na arena parlamentar, achando-se s. exa. de um lado armado com todos os recursos que lhe podem fornecer as repartições publicas, commissões consultivas, etc., e eu do outro desprovido ainda de todos os elementos que pedi para estas pugnas parlamentares!

S. exa., para rebater as observações que fiz a ultima vez que tive a honra de fallar nesta camara, disse, e é aqui que se vão ligar os factos para os quaes pretendo chamar a attenção da camara e a do governo que nós não temos só leis no papel; a lei cumpre-se e cumpre-se rigorosamente.

Quer a camara saber como a lei se cumpre?

Dizem os artigos 72.º e 40.º das bases do regulamento geral de contabilidade publica que pelos differentes ministérios serão annualmente apresentados às cortes, quinze dias depois de constituida a camara dos senhores deputados, os mappas indicativos de todos os contratos de valor superior a 500$000 réis.

Parece-me que vão decorridos quinze dias e os taes mappas que os differentes ministérios têem de apresentar ainda cá não estão. Como havemos, pois, de apreciar os actos do governo e fazer as differentes iuterpellações, como o sr. ministro da marinha pela sua parte provoca?

Nem o governo póde invocar a falta de tempo para mandar fazer esses mappas, cuja demora é injustificável, não só porque elle cresceu com o adiamento das cortes, mas porque dispõe de um grande pessoal para poder satisfazer a todas essas necessidades do serviço.

Quer v. exa. saber como se cumprem as leis?

Citarei alguns exemplos.

Façamos uma rápida inspecção á lista da armada. A lei que mandou formular essa lista diz no § 1.º do artigo 24.º que se mencionará a idade dos officiaes.

Desde certo tempo para cá envergonharam-se de apresentar no quadro activo indivíduos de idade provecta substituindo o numero de annos á data da publicação da lista pela idade na data do assentamento de praça! De sorte que um official que, por exemplo, nos termos da lei, devia figurar com setenta e tres annos, apparece com dezeseis!

Quer v. exa. saber como se cumpre a tal lei que não está só no papel?

O commandante geral da armada, que devia ter BÓ um ajudante de ordens, segundo o artigo 7.º do decreto de 28 de outubro de 1859, tem um ajudante e dois adjuntos!

E eis ahi a rasão por que falta o pessoal para os navios poderem ir desempenhar commissões de serviço com as lotações completas; e emquanto esse pessoal superabunda nas repartições, largam os navios que vão desempenhar o pesado serviço do ultramar, com os estados maiores incompletos contra a expressa disposição da lei, tornando assim mais pesado, para os que partem, o serviço naval, provocando rivalidades que porventura seriam salutares se proviessem de uma causa ou principio justo, mas que são odiosas e inconvenientes com aquella origem.

Quer v. exa. saber como se cumpre a lei?

O decreto de 19 de setembro de 1878 impunha a uma commissão composta de um pessoal determinado a inspecção da quantidade e qualidade dos objectos que entram na arsenal da marinha.

O sr. ministro da marinha, reorganisando a commissão fiscal por decreto de 24 de julho de 1884, por meio de uma secção annexa á repartição de contabilidade, nomeou um official de fazenda para fazer parte dessa commissão, em portaria de 4 de agosto do mesmo anno; este official morreu passado pouco mais de um mez, em setembro, e até agora ainda não foi preenchido o logar que está e estivera por tanto tempo vago, o que dá direito a crer que se teve em vista mais uma questão de favor do que a do cumprimento da lei.

E aqui está como a lei não existe só no papel e se cumpre rigorosamente 1

Mas não só não vieram á camara os mappas a que me referi, e que são indispensáveis para apreciar como o governo gere em cada um dos ramos da administração publica o dinheiro dos contribuintes, mas não nos trouxe ainda o sr. ministro da marinha, e parece-me que não era já fora de tempo, um relatorio sobre o estado da marinha, das suas necessidades, das suas reformas, das suas reducções, das suas melhorias; de maneira que não é fácil a quem não dispõe dos elementos que um ministro tem na sua secretaria, p reparar-se de ante mão para fazer as famosas interpellações para que s. exa. appellou.

Eu esperava muito da competência de s. exa. que trouxesse um relatorio pelo qual se avaliassem as condições de organisação da nossa força naval, como base indispensável da organisação do pessoal, proposição esta que não é minha, mas de todos os relatórios estrangeiros, e daquelle famoso inquérito de 1856, às repartições de marinha. Até agora apenas um ministro, o sr. Latino Coelho, em decreto dictatorial, marcou o numero de navios que devia ter a armada e a qualidade d'elles! No parlamento francez, inglez, italiano, americano e allemão apresentam-se sempre os relatórios sobre as cousas navaes, mencionando-se o numero é qualidade de navios qual a dotação ordinária o extraordinária que deve pedir-se para o ministerio da marinha, para satisfazer a esta organisação de material com que se liga a organisação do pessoal.

S. exa. o sr. ministro da marinha que conquistou as cadeiras do poder com o alto talento manifestado nesta camara, tem maior obrigação, do que qualquer outro, de nos proporcionar estes elementos para servirem de base á apreciação da maneira por que s. exa. gere a pasta da marinha.

Tencionava alongar-me mais, citando mais alguns casos sobre o estado de cousas da marinha, as melhorias a fazer para que a marinha tenha as condições de bem satisfazer ao serviço que d'ella se exige, mas não estou hoje physicamente bem disposto para poder continuar, o por isso reservo-me para quando se discutir o bill de indemnidade, ou para a apreciação das reformas sobre a organisação naval quando forem presentes a esta camara; peço, pois licença para terminar, com uma pergunta.

Tenho em meu poder um officio datado de 13 do corrente, é certo, mas que só chegou a esta camara a 23 e à minha mão a 24, isto é, tres dias depois do sr. ministro da marinha lançar aqui o repto para que eu o interpellasse, e n'essa officio diz-se que me serão patentes na secretaria da marinha todos os documentos que eu quizer examinar.

Perguntou se este officio isenta o governo de me fornecer por copia os documentos que pedi, ou se é simplesmente para me serem presentes os originaes que solicitei?

Tenho dito.

O sr. Ministro da Marinha (Pinheiro Chagas): -

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SESSÃO DE 28 DE JANEIRO DE 1885 291

Sr. presidente, primeiro que tudo preciso dar uma explicação ao illustre deputado.

Eu não lhe lancei nenhum repto, nem a minha situação me permitte lançar aqui reptos a pessoa alguma (Apoiados.)

Como o illustre deputado se referiu no seu brevíssimo discurso, antes da ordem do dia, a mil incidentes da administração colonial, eu para me justificar de não poder responder nesse momento a todos os assumptos para que s. exa. chamava a minha attenção, simplesmente pedi que dividisse esses assumptos por diversas interpellações ou perguntas, que eu teria o máximo prazer de responder ao illustre deputado.

Não me parece que seja repto o pedir, attenta a impossibilidade de responder nesse momento a tantos assumptos, que os distribuissem convenientemente, de modo a poder tratar-se particularmente de cada um d'elles.

A isto acresce, que estando a entrar-se na ordem do dia, que era a discussão de resposta ao discurso da coroa, eu não podia nem devia prender por mais tempo a attenção da camara.

O illustre deputado lamentou profundamente que eu não estivesse presente antes da ordem do dia para responder a s. exa.; mas devo dizer-lhe que a minha falta de comparncia n'esta casa é motivada pelas necessidades do serviço da secretaria a meu cargo, onde estou, sempre que falto aqui.

E tanto assim, que de futuro, para me poupar o desgosto de ver nos jornaes a noticia de que s. exa. se dirigiu a mim, não estando eu presente, o que poderá succeder repetidas vezes, porque os negocios do meu ministerio a isso me forçam, peço licença para lembrar ao illustre deputado que esta camara está ligada telephonicamente com o meu gabinete, podendo por isso s. exa., sempre que tenha necessidade de fazer-me alguma pergunta, prevenir-me d'isso, porque dentro de um quarto de hora eu estarei aqui.

No entretanto, repito, eu não posso comparecer na camara, precisamente todos os dias, antes da ordem do dia, sem que soffra a regular administração do meu ministerio, que tem, como é sabido, mais largo expediente do que todos os outros ministerios. (Apoiados.)

Dadas estas explicações...

O sr. Ferreira de Almeida: - Eu não lamentei, pedi que quando podesse ser, estivesse presente.

O Orador: - Pois bem; eu é que lamentei não ter estado presente.

Agora vou responder em breves palavras às perguntas e observações do illustre deputado.

Affirmou s. exa. que a lei não se cumpria, e, sem duvida por mal informado, citou differentes factos, que são inteiramente inexactos.

S. exa. censurou, por exemplo, que eu não tinha ainda mandado á camara, como sou obrigado pelo regulamento de contabilidade, os contratos excedentes a 500$000 réis, feitos no meu ministerio durante o anno passado.

Mas a verdade é que no Diario d'esta camara, sessão de 21 de janeiro, lê-se, na parte do expediente, o seguinte:

«Officios: 1.º Do ministerio da marinha, remettendo os mappas indicativos de todos os contratos realisados no mesmo ministerio, de valor superior a 500$000 reis, d'esse janeiro a dezembro do anno passado.»

Veja s. exa. como foi mal informado, e aqui tem o modo como eu cumpro o preceito que me impõe a lei da contabilidade. (Muitos apoiados.)

Estranhou tambem o illustre deputado que na lista da armada não se apresente actualmente a idade dos officiaes! Mas s. exa. ha de ver que lá se indicam os annos em que cada um senta praça e em que é promovido, e portanto, por meio de uma facil opperação arithmetica, para que não são precisos altos conhecimentos mathematicos, s. exa. poderá de prompto resolver o problema. (Apoiados.)

Queixa-se tambem o illustre deputado de que tendo morrido um official de fazenda, que exercia uma commissão no arsenal, ainda não fosse nomeado outro official para o substituir.

A esse respeito direi simplesmente, que tendo morrido esse official ha muito pouco tempo, uns aias antes da abertura da camara, e tendo entrado para o arsenal novo superintendente, não é para estranhar que ainda me não fosse apresentada a proposta para se fazer essa nomeação.

O sr. Ferreira de Almeida tambem se queixa de que o sr. commandante geral da armada tenha alem de um ajudante, mais um adjunto! V. exa. sabe que fui eu que fiz essa nomeação.

O commandante geral da armada, que é um official muito digno e respeitado, entendeu que precisava d'esse adjunto para o serviço, e eu não sei realmente como possa ser accusado o ministro que deferiu a essa reclamação, fazendo a nomeação indicada como necessaria por pessoa tão competente, por um official tão considerado e respeitado por todos.

Tambem s. exa. se referiu, com estranheza, á falta de apresentação de um relatorio de todos os actos do ministerio da marinha.

Eu respondo que tendo s. exa. a faculdade de ir, sempre que queira, ao ministerio a meu cargo examinar todos os documentos de que carecer, o que todavia não me dispensa de mandar á camara as copias de documentos que s. exa. desejar, e simplesmente facilita o trabalho do illustre deputado; ali poderá verificar que já está na secretaria um pedido meu para me serem fornecidos todos os elementos indispensaveis para o relatorio a que s. exa. se referiu e que eu tenciono apresentar.

Parece-me que não devo ser muito censurado por não ter até agora apresentado á camara esse relatorio, visto que tambem nunca o foi por nenhum dos meus antecessores, de certo por motivos alheios á sua vontade.

Pela minha parte espero poder apresental-o e terei a maior satisfação em cumprir este dever.

Direi agora ao illustre deputado que eu não o censurei por ter feito accusações aos seus camaradas.

Sei perfeitamente que s. exa. aqui é deputado da nação, e reconheço o pleno direito que lhe assiste de zelar os interesses do paiz.

Mas como deputado e como official de marinha cabe-lhe tambem o dever do não lançar accusações sem vir munido das provas em que as baseia.

Estou convencido de que presta um serviço ao paiz, e a qualquer corporação que honra esse mesmo paiz, notando os erros que ella commette e censurando-a quando mereça censura. Mas o que é necessario é que não venham fazer simples insinuações, nem accusações, sem serem fundamentadas em provas que nos habilitem a fazer cumprir a lei e a punir os que faltam a ella.

Disse s. exa. que não accusou os officiaes do transporte India, por transportarem o que s. exa. disse serem escravos, por isso que os officiaes têem obrigação de cumprir as ordens que recebem.

O illustre deputado sabe que os officiaes obedecem ás ordens dos commandantes das divisões navaes, e que estes commandantes são perfeitamente independentes dos governadores geraes, tendo ao mesmo tempo ordem para fazer tudo o que elles lhes pedirem a bem do serviço publico. Por conseguinte, se houvesse qualquer acto que fosse attentatorio da dignidade do paiz, da dignidade nacional e do dever que todos temos de cumprir strictamente os tratados, e de prestar homenagem ao grande principio da emancipação dos escravos, de que temos sido esforçados paladinos, em tal caso o commandante da divisão naval tinha obrigação de protestar contra esse attentado e de não consentir que o navio transportasse gente n'essas condições.

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Acrescentou s. exa. que o transporte Índia levava escravos acorrentados!

Era impossivel que o navio podesse levar homens n'essas condições, sem que o commandante tivesse uma gravissima responsabilidade.

Se os transportados eram escravos, o navio devia ser considerado como negreiro.

Mas felizmente nenhumas provas ha de que sejam procedentes essas accusações, e pela minha parte tenho a certeza absoluta de que tal acto não podo ter sido praticado por um official tão digno como é o commandante do transporte, nem podia ser consentido por officiaes igualmente tão dignos como os que compõem a divisão naval, nem tambem ordenado por um funccionario tão respeitavel como é o governador geral de Angola. Tenho assim respondido ao illustre deputado. (Muitos apoiados.)

(S. exa. não reviu as notas tachygraphicas.)

ORDEM DO DIA

Continuação da discussão do projecto de resposta ao discurso da corôa

O sr. Presidente: - Passa-se á ordem do dia.

Antes de dar a palavra ao sr. deputado que se segue na ordem da inscripção peço a attenção da camara para o facto que vou expor.

Está inscripto sobre a ordem o sr. deputado Luiz Jardim. Mas affirmaram-me hontem que s. exa. pedira a palavra sobre a ordem, e por este modo já s. exa. foi preterido, fazendo-lhe a mesa, ainda que involuntariamente, uma injustiça, que só a camara agora póde reparar, e por isso vou consultal-a, como em occasiões idênticas sempre costumo fazer, sobre se permitte que se altere a inscripção, para collocar o nome do sr. Luiz Jardim depois do sr. Alves Matheus e antes do nome do sr. deputado que se lhe segue na inscripção contra o projecto.

Sobre este incidente acaba de pedir a palavra o sr. Vicente Pinheiro, não posso deixar de lha dar.

O sr. Vicente Pinheiro: - Eu asseguro a v. exa., asseguro á camara, e fio me na justiça, na imparcialidade e na rectidão, a que v. exa. não póde faltar presidindo a esta camara, e a que ainda não faltou no desempenho de tão elevado cargo, asseguro, digo, que o sr. deputado Luiz Jardim não pediu a palavra sobre a ordem.

O sr. Luiz Jardim: - Peço a palavra sobre este incidente.

O Orador: - Se tivesse pedido a palavra sobre a ordem teria protestado contra a inscripção, quando subiu á presidência no fim da primeira sessão conjunctamente commigo.

Não sei, ou não quero eu dizer á camara o que junto de v. exa. então se passou; mas asseguro á camara que a inscripção se fez como se devia ter feito.

O sr. dr. Luiz Jardim não protestou no dia seguinte.

Que tivesse a intenção de pedir a palavra sobre a ordem, acredito-o, e faço justiça a s. exa. debaixo deste ponto de vista; mas s. exa. é incapaz de dizer
que tenha pronunciado as palavras: - Peço a palavra sobre a ordem.

Não as pronunciou, ninguem as ouviu.

Appelo para a dignidade de v. exa., appelo pura a dignidade da camara e ella apreciará.

O sr. Luiz Jardim: - Sr. presidente. Sinto a difficil situação em /que se colloca um deputado progressista, o sr. Vicente Pinheiro, accusando a um seu correligionario de faltar á verdade; lastimo, repito, a situação em que o vejo collocado.

Vozes: - Isto não póde ser.

O Orador: - Tendo sido atacado n'esta camara, pede a imparcialidade que eu falle.

Este incidente deve terminar, porque a camara póde tudo, e a minha individualidade póde pouco.

V. exa., sr. presidente, que representa a camara, póde muito; pois que tem em si a força e a vontade collectiva. V. exa. procedeu com a competencia e alta imparcialidade que o caracterisam; se não fôra assim, v. exa. não estaria occupando esse logar.

Está ahi, porque merece a confiança d'esta assembléa. E assim v. exa. procedeu com todo o acerto, quando, ao levantar-se em seu espirito uma duvida, veiu trazel-a ao tribunal competente para que elle a resolvesse.

O illustre deputado não devia pretender entrar na consciencia alheia.

Quando eu subi as escadas da presidencia e fui aflfirmar, como deputado da nação, que tinha pedido a palavra sobre a ordem, era bastante a minha affirmativa para que se não pozesse em duvida o que eu declarava.

Um deputado é homem de verdade; e nem os povos costumam dar os seus poderes a homens que não têem a sua consideração e o seu respeito; e quando uma assembléa delega no seu presidente os poderes de um julgamento, não podem esses poderes ser sobrepujados pela opinião individual de um homem só, porque contra essa opinião individual está o corpo collectivo.

Eu disse, e repito, que tinha pedido a palavra sobre a ordem; mas, como se levantassem duvidas, o ar. presidente trouxe-as para o tribunal competente, que é esta casa do parlamento.

O illustre deputado, pois, accusou-me injustamente; e eu continuo a deplorar a posição difficil em que s. exa. se collocou.

Se a camara me tivesse dado a palavra, eu, cuja voz não tenho em conta de eloquente, tel-a-ía offerecido, em beneficio da camara, a qualquer deputado que porventura estivesse inscripto e que tivesse empenho na preferencia; porque d'esse modo, mais lucrava a discussão, e eu aprendia.

Agora, porém, visto que se levantou este incidente, peço a esta assembléa, que resolva consoante a justiça, e eu acatarei as suas decisões.

O sr. Presidente: - Desejo accentuar bem a declaração de que eu não inscrevi o sr. Luiz Jardim sobre a ordem, e sim sobre a materia; mas desde que hontem se me affirmou de uma fórma positiva e categorica que o mesmo sr. deputado pedira a palavra sobre a ordem, achando-se assim preterido, entendi que era do meu dever consultar a camara ácerca de uma reclamação, que a me»a, na altura em que vae o debate, já não podia, nem devia attender.

Este foi o meu pensamento, e sempre por este modo tenho procedido; porque nunca quero prejudicar, nem ser desagradavel a qualquer dos srs. deputados.

O sr. Mariano de Carvalho: - Parece-me que sobre este incidente, que tomou a feição de uma questão pessoal, não póde recair votação alguma da camara, e a v. exa. é que cumpre decidir sobre a inscripção como for de justiça.

A camara não póde pronunciar-se sobre a questão; eu pela minha parte recuso-me a votar.

O sr. Presidente: -Parece-me que se deve pôr termo neste incidente. (Muitos apoiados.)

E peço aos srs. deputados Vicente Pinheiro e Luiz Jardim que retirem qualquer phrase ou palavras com que reciprocamente possam ter-se melindrado.

O sr. Luiz Jardim: - Esqueceu-me responder áquelle argumento do sr. Vicente Pinheiro, em que insinua que era meu dever o protestar no dia seguinte ao da inscripção.

Não protestei nem protestaria no dia seguinte, ou nos outros, porque esse protesto importava uma vaidade que não tenho, qual [...] provocar uma votação da camara, quando a minha palavra tão pouco vale.

O sr. Avellar Machado: - Parece-me que, desde o momento em que o sr. Jardim declara e affirma que pe-

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diu a palavra sobre a ordem, v. exa. não póde deixar de assim o inscrever.

Se v. exa. tiver alguma duvida a este respeito, póde v. exa. mesmo resolvel-a com os srs. secretarios e não propor á camara que a resolva, como muito bem disse o sr. Mariano de Carvalho.

O sr. Presidente: - Este incidente está terminado.

A camara no terreno em que a questão agora se collocou não póde deliberar, e nada tem a resolver.

Torno a pedir aos srs. deputados Vicente Pinheiro e Luiz Jardim, que retirem qualquer phrase porventura menos conveniente.

O sr. Vicente Pinheiro: - Como v. exa., sr. presidente, se está referindo a mira, devo declarar que não foi intenção minha offender pessoa alguma.

Eu entendo que a camara, sem julgar das minhas afirmações ou das affirmações do sr. dr. Luiz Jardim póde muito bem pronunciar-se por meio de uma votação sobro se a inscripção se deve alterar ou não, porqne ella está feita de uma certa fórma, e só a camara póde auctorisar que ella se altere.

Não quero dizer que a camara votando desta forma se pronuncie a favor das minhas considerações ou das do sr. dr. Luiz Jardim.

Eu affirmo que o sr. dr. Luiz Jardim não pediu a palavra sobre a ordem, e declarei desde o principio que fazia justiça a s. exa. de que tivera a intenção de pedir a palavra sobre a ordem, mas nego o facto.

O sr. Luiz Jardim: - Eu affirmo ao sr. deputado que pedi a palavra sobre a ordem.

O Orador: - Desde que o sr. dr. Luiz Jardim faz esta affirmativa, eu calo-me; desisto da palavra para não fazer sobre este incidente a menor consideração.

O sr. Luiz de Lencastre: - Roqueiro a v. exa. que consulte a camara sobre se julga este incidente sufficientemente discutido.

O sr. Presidente: - Não é necessario. Estou certo de que o sr. deputado Luiz Jardim, em presença dos reparos suscitados pela reclamação, relativa á inscripção e desde que a camara já não póde deliberar sobre o incidente, será o primeiro a desejar que a inscripção se mantenha como está. (Apoiados.)

Tem a palavra sobre a ordem o sr. Mendes Pedroso.

O sr. Mendes Pedroso (sobre a ordem) - Em satisfacão que dispõe o regimento, vou mandar para a mesa a minha moção de ordem, que é a seguinte:

«A camara, satisfeita com as declarações do sr. presidente do conselho ácerca do accordo que existiu com o partido progressista para a realisação das reformas politicas, continua na ordem do dia. = Mendes Pedroso.

Devo declarar que outra devia ser a minha moção, mas as palavras pronunciadas pelo sr. Barros Gomes ácerca do assumpto a que ella se refere, obrigaram-me a conservar a redacção com que a tinha feito desde o primeiro dia em que pedia palavra.

Quando hontem acabou de fallar o sr. Eduardo Coelho, eu teria tido muita satisfação em responder immediatamente a algumas das suas mais frisantes considerações, mas o adiantado da hora não me permittiu que me fosse concedida a palavra.

Agora peço a v. exa. e á camara que me permittam que eu faça um bosquejo largo sobre os discursos dos oradores que têem tomado a palavra n'este debate, e por esta occasião direi o que se me offerecer a respeito das palavras proferidas pelos sr. Barros Gomes e Eduardo Coelho.

O primeiro orador que tomou parte n'esta discussão foi o sr. Anselmo José Braamcamp. Quando ouvi o veneravel chefe do partido progressista tomar a palavra, abriguei por momentos a doce esperança de que s. exa. e o seu partido, embora continuando a hostilisar a marcha governativa seguida pelo governo regenerador, aconselharia ainda assim o seu partido, a que não visse no projecto de resposta ao discurso da corôa, mais do que uma sincera homenagem ao augusto cheio do estado e resposta ás palavras que lhe tinha dirigido ao abrir os trabalhos das duas camaras legislativas.

Pareceu-me ainda, que s. exa. viria aconselhar ao seu partido a que não entrasse n'estes debates irritantes, em que os animos se exaltam e se perde um immenso tempo que póde ser applicado á resolução de problemas que trazem comsigo a filicidade e o desenvolvimento do paiz; principio este que eu supponho ter sido a verdadeira e unica causa do accordo celebrado entre os dois partidos; porque effectivamente tratando-se de levar a cabo as reformas políticas, para que esta camara foi convocada, convinha que ellas se fizessem com o concurso de todos os partidos, na mais completa, harmonia e sem as convulsões que estas reformas por outro modo feitas, podem originar.

Pensei ainda que o nobre chefe do partido progressista aconselharia aos seus correligionarios a que empregassem toda a energia e forças de que podessem dispor, para a questão mais importante para o nosso paiz, isto é, para a questão financeira. Que empregassem todos os seus esforços para a resolução de questões que se traduzam na felicidade publica, e para que combatessem o governo caso elle se desviasse d'esse caminho.

Não foi, porém, assim; o sr. Anselmo Braamcamp e o seu partido entenderam não dever fazer esse sacrifício, e vieram declarar rôto o accordo, e livres de todas as responsabilidades.

Quando vi o sr. Braamcamp lançar no parlamento a sua declaração de guerra affigurou-se-me que diante de mira se desenvolvia uma d'essas maravilhosas scenas d'Ossian, e que s. exa. como o chefe de Erin, ou de Goclin, fazendo echoar o seu escudo de combate, chamava os seus melhores soldados á peleja, e mais e robusteceu esta idéa, quando vi o nobre presidente do conselho, com aquella pujança e nobre altivez que o caracterisa, levantar briosamente a luva que lhe era arremessada.

Foi um momento solemne para mim sobretudo, que não estou habituado ás luctas parlamentares. Os dois chefes politicos encetaram o debate e os seus discursos foram escutados com a mais respeitosa attenção, no mais religioso silencio. Conticuère omnes!

Depois seguiram-se os mais denodados campeões e ouvindo-os um depois do outro atacar e defender o projecto, fazendo sempre os mais brilhantes e eloquentes discursos, recordei-me tambem d'aquella lucta entre os dois poetas, Menalca e Dameta, tão perfeitamente descripta por Virgilio, e d'aquelles mimosos versos, ambo cantare pares, ambos florentes, cetatibus, arcades ambo.

A discussão continuou até agora, sempre tão levantada, que eu não posso sem um fremito de indignação ouvir todos os dias affirmar que o nosso prestigio parlamentar se vae perdendo, e que a decadencia do nosso systema parlamentar se vae successivamente accentuando mais. E lamento que sejam aquelles a quem mais corria o dever de zelar o prestigio do parlamento portuguez, aquelles que ás vezes se lembram de lhe fazer taes accusações, e que são os primeiros a desmentil-as, quando elevam a tribuna com a sua palavra inspirada.

Sr. presidente, emquanto no parlamento portuguez se destinguirem como agora talentos tão robustos, que levantem os debates até onde os podiam fazer chegar os gigantes de outrora, não tenho receio de que o systema parlamentar deixe de ser uma assembléa respeitavel e respeitada, e não uma ficção.

Se do alto d'aquella tribuna estivesse um profundo observador, um homem completamente estranho ás nossas lides parlamentares, um homem que não pertencesse a esta nação, e que depois nas suas memorias fosse escrever a impressão que este debate havia causado no seu espirito, estou certo de que havia de fallar a nosso respeito como um grande publicista Edgard Quinet fallou a respeito do con-

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gresso hespanhol, quando assistiu ás suas reuniões, no tempo em que Olozaga, Martinez de la Rosa, Lopez e tantos outros, oram o ornamento da tribuna hespanhola, e que disse que aquelles oradores pelo seu temperamento, pelo sangue meridional que os aquecia, tinham nos seus discursos um calor, um enthusiasmo, que não se encontram nos mais distinctos parlamentares das outras nações.

Aqui, sr. presidente, é preciso uma observação importante.

A natureza é toda povoada de contrastes, existem por toda a parte. Ao lado do leão possante e corajoso, foge a tímida gasella; junto do cedro altivo que vae topetar com as nuvens, crescem os lichens humildes; na tela a mais bem desenhada, as tintas mais brilhantes, não sobresáem, sem que lá exista a sombra; nas grandes assembléas é preciso que as mediocridades façam ouvir a sua voz rude e incorrecta para que a palavra encantada dos grandes tribunos refulja com todo o seu explendor.

Sr. presidente, eu precisava fallar, porque aqui tambem sou a sombra, a sombra do quadro, e não a sombra no sentido de espectro, porque não quero que a minha sombra tenha pretensões a amedrontar ninguem.

E este sacrificio, é tanto mais para desculpar, quanto é elle completamente voluntario.

Sr. presidente, sou soldado do partido regenerador porque tenho visto que é esse o partido que mais longo tem levado os melhoramentos públicos, que sempre acompanha o progresso, e a evolução constante do espirito humano, e que embora só lhe tenha chamado partido conservador, essa denominação é tão pouco adequada ao seu genio governativo que são os partidos que só dizem mais avança dos, os progressistas, que continuadamente lhe estão dizendo - pára.

Adoro como todos a verdade e a liberdade, mas não creio que isso inhiba de pertencer a um partido politico e apoiar uma situação.

Abrigo talvez idéas mais democraticas do que aquellas que se attribuem ao partido regenerador, e que melhor se coadunam com o programma do partido que tem por chefe o illustre jurisconsulto o sr. José Dias Ferreira; mas é tal a minha confiança no gabinete actual e no sr. presidente do conselho, que não terei duvida de acceitar som hesitação o seu projecto do reformas politicas, persuadido que na presente conjunctura não é opportuno nem prudente fazer ao paiz e á democracia mais largas concessões.

Em todo o caso declaro de modo bem positivo, que sempre subordinarei á minha consciencia, e às minhas convicções, a resolução de qualquer medida legislativa submettida á apreciação do parlamento, e que não darei o meu voto senão aquellas que se me affigurarem proveitosas ao paiz.

Vou passar em revista varios argumentos apresentados por alguns dos illustres deputados da opposição.

Como apresentei uma moção relativamente ao accordo, permitta-me v. exa. que em primeiro logar a elle me refira.

Quando começou esta discussão afigurou-se-me logo que o partido progressista tinha todo o cuidado em cortar os ataques directos aos actos praticados polo partido regenerador durante o intervallo parlamentar, e que os seus ataques se dirigiam principalmente á dictadura exercida por esse partido, que era a reforma do exercito e o adiamento das côrtes, e que esse argumento era apenas trazido ao debate para justificar a quebra do accordo.

O sr. Anselmo Bramcamp começou por dizer que o accordo não fôra roto, estava findo, e estava lindo desde que na outra casa do parlamento se havia votado a necessidade das reformas politicas, e a reforma da lei eleitoral.

O sr. Emygdio Navarro, fallando em seguida ao sr. Anselmo Braamcamp, disse, com respeito ao mesmo accordo, que elle estava roti depois do acto dictatorial praticado pelo governo poucos dias depois de encerrado o parlamento; e acrescentou s. exa. mais tarde que o accordo se tinha despedaçado completamente quando o governo adiára as cortes do dia 5 de novembro para o dia 15 de dezembro do anno passado.

O sr. Barros Gomes veiu ultimamente dar uma explicação um pouco diversa.

S. exa. disse que o accordo estava findo, como tinha dito o sr. Braamcamp.

Mas s. exa. acrescentou que não era possivel que o partido progressista continuasse no accordo com o partido regenerador, por isso que o partido progressista não sabia quaes eram as bases para as reformas politicas que o governo havia de apresentar ao parlamento.

É admiravel esta observação do sr. Barros Gomes.

Creio que toda a gente sabia quaes eram as bases das reformas politicas que o governo regenerador havia do apresentar ao parlamento.

Eu conheci as todas, excepto a do artigo transitório, que se lê na respectiva proposta.

Ora conhecendo-as eu, conhecia-as de certo o partido progressista; e, conhecendo-as o partido progressista, havia de conhecei-as o illustre deputado.

Vejo, portanto, que ha aqui uma contradicção.

Pergunto eu: quando é que acabou a final o accordo?

O accordo acabou quando se votou a lei eleitoral; quando o governo assumiu a dictadura; ou quando o governo adiou as camaras?

É preciso, realmente, aclarar este ponto; é necessario mostrar qual foi a epocha em que o accordo deixou de existir, porque até hoje, dado por findo em qualquer d'esses pontos, ainda depois o dão como subsistente.

Disse mais o sr. Barros Gomes, e foi por isso que apresentei a minha moção, que o accordo estava findo, mas que continuava a haver um accordo de benevolencia do partido progressista para com o partido regenerador.

Não me parece que o partido regenerador tenha necessidade d'esta benevolencia, que, aliás, póde parecer um acto de caridade. (Apoiados.)

Mas como é que a dictadura podia influir de um modo directo no complemento do accordo?

Que relações podia haver entre o accordo para as reformas politicas e a dictadura?

E, se as relações do accordo estavam completamente despedaçadas pela dictadura, para que é que foi buscar o adiamento das côrtes para que o desaccordo se consummasse inteiramente?!...

O que me parece é que o accordo não existia para as reformas politicas, por parte do partido progressista.

Pois então o partido progressista, tendo as reformas políticas ha tanto tempo no sou programma e tendo estado no poder dois annos sem poder cumprir essa parte do mesmo programma, entende que esta demora de alguns dias é que vem prejudicar o paiz?

Não posso de modo algum acredital-o.

Demais ainda, se o partido progressista não acceitava as reformas que se pretendem fazer, reformas que eram conhecidas, e aqui ha contradicção entre o sr. Emygdio Navarro e o sr. Barros Gomes, porque as julgava uma provocação á opinião publica, como é que, quando se tratou do accordo, resolveu mantel-as?

Eu creio que o governo regenerador, quando tratou do accordo, tinha por fim reunir todos os partidos, para que elles cooperassem de accordo nas modificações a fazer na lei fundamental do estado, o que não fosse um pomo de discordia essa reforma tão altamente apregoada por necessaria, e que realmente eu creio é indispensável introduzir no nosso codigo politico, onde algumas das suas disposições não se podem sustentar em face dos modernos principios de liberdade politica, e que por caducas devem d'ahi ser definitivamente riscadas.

O partido progressista queria outra cousa, queria uma lei eleitoral mas livre, que determinasse a representação

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das minorias, uma lei eleitoral que trouxesse como effectivamente trouxe, grande numero de deputados.

O sr. Lobo d'Avila ha dias perguntou se a eleição tinha sido livre, foi libérrima; (Apoiados) foi a eleição mais livre que se tem realisado desde 1852, não só livre pela lei, em que estão consignados os princípios que permittem a representação das minorias, mas ainda da parte do partido regenerador não houve opposição; houve tolerancia. O partido regenerador tinha a certeza de que qualquer que fosse o numero de deputados progressistas que viesse ao parlamento, havia de realisar o accordo que tinha feito, e que lhe parecia que existia ainda.

O partido progressista sabe que as eleições nos circulos plurinominaes não foi disputada; que o partido regenerador nas eleições uninominaes podia fazer uma certa opposição ao partido progressista; e nas eleições de accunmlação o partido regenerador não entrou.

Isto é uma cousa clara.

Ainda mais; desejou-se mesmo fazer passar uma lei eleitoral que podesse sor sophismada, porque a representação das minorias da maneira por que está exarada na lei eleitoral permitte a um governo que não quizer usar d'essa tolerancia, que eu louvo e applaudo sempre, permitte, digo, evitar que as minorias sejam tão largamente representadas, como agora foram.

É por isso que, se eu estivesse n'esta camara na occasião em que foi votada esta lei, eu, apesar da disciplina partidaria, não teria votado esta lei, e votaria outra que me parecia mais liberal apresentada pelo sr. Dias Ferreira.

De sorte que agora vê-se uma cousa: quem lucrou com o accordo foi o partido progressista. É o partido regenerador que podo dizer, como disse o sr. Navarro, que não quer mais accordos, e repetir aquella phrase que Virgilio poz na bôca de Lacoonte: «Time Danaos e dona ferentes».

Vou agora occupar-me de algumas considerações que apresentou o sr. Barros Gomes, que mostram que o partido progressista, se tinha exercido a dictadura, fizera-o em condições completamente differentes d'aquellas em que a fizera o partido regenerador; que a questão propriamente economica em que se achava o thesouro n'aquella occasião fôra o motivo por que o partido progressista teve necessidade de se constituir em dictadura. Mas a s. exa. parece que esqueceu dizer uma cousa, e a este ponto já hontem se referiu o sr. Eduardo Coelho, que dissolvida uma camara immediatamente se deve convocar outra.

Creio que esta phrase se póde applicar ao partido progressista. Porque não convocou immediatamente as côrtes? Porque a machina não estava montada, e era necessario preparar as cousas de modo que viessem ao parlamento apenas seis ou oito deputados do partido regenerador; e assim aconteceu. Este procedimento foi talvez exigido por alguma rasão de ordem superior.

O partido regenerador fez a reforma do exercito que era ha muitos annos reclamada e que desde 1864 se não fazia. Essa reforma havia passado na camara dos deputados e tinha já parecer da commissão de guerra na outra casa do parlamento, parecer que tinha a assignatura dos membros mais conspicuos d'essa camara e que representavam a maioria, havendo por consequencia quasi a certeza de que seria approvado.

Se o governo se constituiu em dictadura foi porque as eleições se deviam realisar a 29 de junho. O partido progressista exigia que ellas se fizessem pelo recenseamento de 1883 e não pelo de 1884, e v. exa. e a camara sabem que, se o acto eleitoral se realisasse dois dias depois, havia de fazer-se pelo recenseamento de 1884.

Todas as dictaduras podem justificar-se, quando aquillo que se faz á sombra d'ellas é urgente o de proveito para o paiz.

Mão condemno por isso o partido regenerador. Muitos outros governos têem feito dictaduras. Fel-a Passos Manuel em 1836, decretando a reforma da escola polytechnica vinte dias antes de se reunirem as cortes constituintes, e ninguem dirá que Passos Manuel não fosse um dos nossos mais distinctos e liberaes homens d'estado.

Visto que fallei na necessidade da reforma do exercito, direi mais alguma cousa sobre o assumpto.

Se a reforma do exercito tem algum defeito, provém de não ser tão completa como devia.

O quadro dos officiaes deve estar completo. Esta é a primeira cousa que ha a fazer. Aprende-se mais facilmente a obedecer do que a mandar.

Disse o sr. Lobo d'Avila que havia regimento que tinha muitos officiaes, mas que não tinha soldados. É necessario que s. exa. reflicta que o exercito não se póde organisar como se fosse composto de soldados de chumbo; é cousa que leva muito tempo e não se faz n'um momento nem mesmo em poucos dias, e sem um improbo trabalho.

Eu desejaria que a nação em um momento dado tivesse um exercito para resistir ao inimigo, que houvesse as condições necessarias para montar um exercito em pé do guerra em uma occasião critica, porque assim tem feito a Suissa, assim o fez a Bélgica e a Dinamarca. Se não procedesse por tal fórma, não teria esta ultima nação na lucta em que se empenhou com a Austria e a Prussia podido salvar a sua honra, succumbindo só depois de muitos dias, e de uma resistencia desesperada, sem que uma nação amiga lhe estendesse a mão.

É necessario termos armamento em abundancia, porque de contrario, quando vier o momento de angustia e for necessario pôr o exercito em pé de guerra, teremos de lhe fornecer armas velhas, sacrificando inutilmente os nossos soldados em lucta desigual.

Para se organisar o exercicio como deve ser, gasta-se muito dinheiro, é verdade, mas as cousas que são indispensaveis fazem-se, e as economias fazem-se nas despezas que menos urgem.

A Allemanha gasta quanto é preciso gastar e procura immediatamente crear receita para fazer face a essa despeza extraordinaria. Ainda ha pouco em uma só cidade, em Strasburgo, gastou 16 milhões de francos para pôr-se a par da sciencia moderna.

Nós temos muitas estradas, temos muitos melhoramentos materiaes, mas temos ainda muita cousa a fazer, realisar muitos outros cmprehendimentos, é preciso não parar!

Disse o sr. Barros Gomes, que se o partido progressista não tinha podido realisar o seu programma, é porque quando subira ao poder se vira a braços com algumas das mais importantes questões, especialmente a questão economica.

Pois a questão económica podia assoberbar completamente as attenções de um governo composto de homens tão intelligentes e energicos a ponto de não lhes permittir que realisassem o seu programma?

O illustre deputado o sr. Eduardo Coelho, alludindo hontem a este mesmo acontecimento, expoz largamente o que tinha succedido naquella epocha, e disse que não foram as circumstancias economicas, nem a falta de tempo que obstaram a que o governo progressista realisasse o seu programma, mas porque aquelle governo largou o poder muito antes de o esperar, por circumstancias anormaes.

O sr. Eduardo Coelho disse hontem, que o partido progressista não tinha podido realisar o seu programma, o era fóra de duvida que tinha caído em frente das manifestações da rua e em presença da attitude da outra casa do parlamento.

Sr. presidente, não quero entrar na apreciação dos motivos que fizeram cair tão cedo o partido progressista; mas se esse partido caiu em frente das manifestações da rua e na presença da attitude da outra casa do parlamento, ou o partido progressista tinha perdido a opinião publica, que está sempre a invocar n'esta casa, ou então não teve energia bastante para reprimir essas manifestações, que o não

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deviam fazer desesperar. E respondendo peremptoriamente ás observações do sr. Eduardo Coelho sobre este ponto, direi que, se o partido progressista caiu em presença das manifestações da camara dos pares, não foi porque o partido progressista não tivesse tambem nomeado alguns pares n'essa epocha, e então caíu por sua propria culpa. (Apoiados.)

O partido progressista a primeira cousa que devia fazer era immediatamente executar o seu programma na parte que dizia respeito á constituição do estado e á reforma n'aquella casa do parlamento. Se o tivesse feito, não teria succedido isso; queixe-se de si. (Apoiados.)

O sr. Eduardo José Coelho referiu-se hontem tambem á visita que Sua Magestade tinha feito ao Rei de Hespanha, e quiz dizer-nos, que a maneira por que o nosso monarcha tinha sido recebido em Hespanha fôra em consequencia do seu procedimento para com o partido progressista, e que se quizera fazer essa manifestação fôra mais para maltratar o Rei de Hespanha! Não me parece que isso possa ser assim. (Apoiados.) O nosso monarcha todas as vezes, que tem ido á Hespanha, tem sempre sido recebido da mesma maneira. (Apoiados) E não me parece que o povo hespanhol procedesse assim diante do seu monarcha, que tem satisfeito a todos os preceitos constitucionaes do seu paiz. (Apoiados.) Não me parece que o povo hespanhol tenha motivo para se queixar.

O sr. Barros Gomes fallou tambem nas propostas que o partido progressista tentava apresentar para corrigir as demazias dai camaras e dos districtos. Ora, as demazias das camaras e dos districtos que s. exa. pretendia vir corrigir pelas leis do sr. José Luciano de Castro não eram outras senão as medidas auctorisadas pelo codigo administrativo promulgado em 1878.

Permitta-me s. exa. que lhe diga que o codigo de 1878 é uma das leis mais liberaes que têem apparecido n'este paiz.

Este codigo é um dos maiores monumentos de gloria e do talento de Antonio Rodrigues Sampaio; (Apoiados.) e se fosse tirado, os municipios e os districtos seriam os primeiros a vir pedir uma lei tão liberal como aquella.

O codigo administrativo de 1878 é uma lei a cuja sombra os municipios têem podido emprehender melhoramentos materiaes que até ahi não tinham. (Muitos apoiados.) De certo que antes quero esta lei, com os seus pequenos defeitos, do que outra que venha cercear ás camaras municipaes e aos districtos as regalias que por esta lhes são commettidas.

Demais, as camaras municipaes lá têem já a sua tutella que são as juntas geraes de districto. O que são as juntas geraes senão os parlamentos dos districtos, e para as quaes são escolhidos os homens mais distinctos das localidades?

Agora tenho de entrar em outros assumptos que são propriamente aquelles em que fallou o sr. Barros Gomes, para mostrar quanto tinha sido proveitosa ao paiz a administração progressista.

Disse s. exa. que no anno de 1877-1878 fôra necessario recorrer ao credito na importancia de 8.645:000$000 réis, em 1879-1880, 9.159:000$000 réis; em 1880-1881, segundo anno da administração progressista, 6.030:000$000 réis, e 1881-1882, 5.325:000$000 réis.

Mostrou tambem s. exa. que o rendimento dos diversos ministerios tinha augmentado successivamente, durante a gerencia do ministerio progressista; mas esqueceu-se dizer que depois d'essa gerencia os rendimentos do estado continuaram a augmentar. (Apoiados.)

S. exa. disse tambem que a causa do augmento de receita fora, entre outras, o imposto de rendimento lançado pelo governo progressista.

Completamente de accordo.

Se o partido regenerador lançasse outros impostos que produzissem 1.000:000$000 ou 2.000:000$000 réis, seria muito facil augmentar o rendimento do estado.

S. exa. acrescentou ainda que se fizera uma reducção de despezas em obras publicas na importância de 3.000:000$000 réis approximadamente.

Ora, combinando a reducção de despeza nas obras publicas com o augmento do rendimento do imposto lançado pelo partido progressista, dá essa differença de 3.000:000$000 réis a 4.000:000$000 réis que se encontra no período decorrido de 1877-1878 a 1881-1882.

S. exa., fallando no direito sobre o tabaco, apresentou uma idéa que eu não posso deixar de chama peregrina.

Apesar de muito respeito e consideração que tenho pelo illustre deputado não posso deixar de dizer que o argumento apresentado por s. exa. com respeito ao rendimento do tabaco não colhe.

Disse s. exa. que esse rendimento foi crescendo successivamente, havendo em dois annos um augmento de réis 150:000$000 e que depois, em consequencia da reforma das pautas, já não crescia do mesmo modo; e acrescentou que se continuasse a haver augmento, em vez de 2.000:000$000 réis a 3.000:000$000 réis, teria ascendido a 4.000:000$000 réis.

O rendimento do tabaco é um imposto, e não é sobre uma industria nacional que elle vae recaír.

Este anno póde render 3.000:000$000 réis, para o anno póde render 2.000:000$000 réis, sem que haja medidas que possam contribuir para esta differença na producção do imposto.

Sr. presidente, eu ainda tenho que fazer algumas considerações com relação ao orçamento do estado. O orçamento mostra que ha uma differença entre a receita e a despeza; ha uma differença de cerca de 1.800:000$000 réis, a qual é muito mais pequena do que a que existia no orçamento do governo progressista.

Não digo mais nada, porque das questões orçamentaes entendo pouco; mas para esta questão é que eu queria que convergissem todos os esforços dos representantes da nação, afim de por uma vez se acabar com o deficit.

Tem-se dito muitas vezes que a baixa dos nossos fundos provém d'este desequilibrio orçamental; não me parece que seja assim e affigura-se-me que a baixa que tem havido nos nossos fundos não vem só do desequilíbrio orçamental; tenho ouvido dizer que esta baixa tem sido tambem dada com outros fundos: é devida á taxa elevada do dinheiro lá fóra e á guerra desastrosa que tem havido entre a França e a China, entre a Inglaterra e o Soldão.

Esta circumstancia não póde deixar de ser levada á conta para explicar a baixa dos nossos fundos; entretanto elles de um momento para o outro podem subir, sem que como agora tenha havido motivo sufficiente para a descida.

Agora direi algumas palavras com relação a outro assumpto. É quanto á questão do Zaire.

Pelos documentos apresentados pelo sr. Barros Gomes parece-me que não ha completa e perfeita analogia com o que se deu com relação ao tratado de Lourenço Marques. Differe muito o tratado de Lourenço Marques do tratado do Zaire.

Com relação a Lourenço Marques ninguém nos contestava o nosso direito; com relação ao Zaire, a Inglaterra era a primeira a contestar-nos o nosso direito n'aquella nossa região.

Portanto, entre os dois tratados a questão não póde ser tratada do mesmo modo, e a arbitragem invocada a propósito da nossa possessão em Bolama tambem não póde ser invocada.

Seriam os juizes os primeiros a querer quinhão na partilha!

O sr. Barros Gomes disse tambem que o governo é que tinha provocado esta conferencia, mas s. exa. diz n'outra parte (leu) que Gladstone declarara ao nosso embaixador que Bismarck lhe affirmára, que esta questão do Zaire não poderia ser decidida senão por meio de uma conferencia,

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e d'aqui se deprehende que a idéa não partiu do nosso governo, embora depois a acceitasse sem reluctancia.

Era preciso regular de qualquer fórma os nossos direitos no Zaire, e havendo tão multiplicadas pretensões não me parece possivel fazel-o por outro modo.

Não vejo em que a dignidade do paiz nisto esteja compromettida, podendo comtudo succeder que a resolução d'este negocio, que ainda se ignora, nos não seja tão favoravel como seria para desejar.

Disse tambem s. exa. que o governo ignorava o que se passava lá fóra a respeito do Zaire, porque até fora o ministro dos negocios estrangeiros de Inglaterra, lord Granville, quem lhe dissera que provavelmente a Allemanha e a Belgica viriam fazer seria opposição ao tratado.

Isto só prova que a Inglaterra tambem ignorava as aspirações da Allemanha e da Belgica, e que só quando as negociações estavam muito adiantadas teve d'ellas conhecimento.

E não me admira que Bismarck se dirigisse primeiro ao governo de uma nação poderosa, que preferisse dar esta explicação antes áquelle governo, do que ao governo de Portugal; o que se não póde contestar é que muito proximo de se assignar o tratado, é que quando as negociações entaboladas pareciam estar proximas da sua terminação, é que o governo inglez teve informações de que a Allemanha e a Belgica pretendiam oppor-se áquella posse exclusiva, áquella sancção de direitos até ali contestados, e que isto annullou todas as diligencias feitas para a sanção de um tratado que nos reconhecia a soberania d'aquella região, apesar do muito mal que se diz (quando convem assim fallar) da alliança ingleza.

Existindo, porém, simples boatos, antes das duvidas sobre a assignatura do tratado, não era o governo portuguez que devia dirigir-se ás outras nações e perguntar-lhes o que desejavam.

Estou cançado, e não quero cançar mais a attenção da camara, por isso porei fim a estas pouco interessantes reflexões.

Vozes: - Muito bem, muito bem.

(O orador foi muito comprimentado.)

O sr. Alves Matheus (sobre a ordem): - (Cumprindo, as prescripções do regimento começo, por ler a minha moção de ordem.

(Leu.)

Não entro com grande satisfação n'esta lide politica, em que a palavra conceituosa, cordata e auctorisadissima do sr. Anselmo Braamcamp descerrou horizontes a um debate, que pela pujança e pelo valor das orações já pronunciadas ficara brilhantemente assignalado na nossa historia parlamentar. Não está abatido o prestigio do parlamento portuguez, como com rasão disse o illustre deputado, que me precedeu, porque as discussões não desdizem aqui na sua altura da fórma elevada por que se travam nos parlamentos das nações mais civilisadas da Europa. Mas entro desconfortado e triste n'este debate por ver moços intelligentes, distinctos, florentes na idade e no talento converterem as suas auspiciosas primicias parlamentares em estrado de uma dictadura monstruosa, injustificavel, inaudita, porque sem necessidade foi exercida quarenta e oito horas depois de encerrado o parlamento, porque por essa dictadura foi audaciosamente esbofeteada a constituição do estado, porque ao seu objectivo se deram as feições e as apparencias, não de um acto de justiça, mas de um acto de favor, encaminhado porventura a transformar era guarda pretoriana da politica do sr. Fontes os briosos e valentes officiaes do exercito portuguez, que não têem sido, nem hão de ser senão os desinteressados e leaes defensores da ordem, da independencia, da liberdade e da dignidade da patria.

Não pensava eu, que o adiamento, que tem sido objecto de largas considerações por parte dos differentes oradores, que têem entrado n'esta discussão, fosse defendido pelo sr. Mendes Pedroso, com um argumento, que, a despeito da resolução em que estava de não fallar sobre este assumpto, me impõe o d«ver de responder-lhe.

Affirmou o illustre deputado, que de, um adiamento de tão poucos dias não podia resultar prejuizo algum para o paiz. Ha sempre prejuizo e damno em se violarem as leis; ora o acto do governo não foi apenas adiamento da reunião das côrtes, foi, o que é muito mais grave, o adiamento da convocação d'ellas, e isto com manifesta e flagrante infracção do § 4.° do artigo 74.° da carta constitucional, que expressamente determina que, dissolvida uma camara, será immediatamente convocada outra (Apoiados.)

Não ha sophihmas, não ha argucias, não ha cavillações, que possam convencer-nos, de que a palavra immediatamente póde protender-se e prolongar-se até ao praso de seis mezes.

Desde que o sr. Fontes, á sombra, do accordo, que já não existia, se julgava auctorisado para exercer dictaduras injustificaveis, para decretar adiamentos illegalissimos, para pôr a sua vontade e o seu alvedrio acima das leis, acima das instituições e dos interesses publicos, o partido progressista não podia, sem quebra do seu decoro, nem deslustre dos seus brios, manter-se acorrentado e preso ás estipulações de um pacto politico, que já não subsistia. (Apoiados.)

Pretender, que depois d'aquelles factos o d'aquelles attentados o accordo subsistisse, seria impor ao partido progressista com a abdicação da sua autonomia e da sua dignidade politica a imperiosa autocracia dos dictados e dos arbitrios do sr. Fontes; seria querer, que o mesmo partido fosse o docil e desairado instrumento dos seus astuciosos planos; seria querer, que principios, leis, autonomias partidarias e todos os elementos de vida politica, que ainda nos restam, se tornassem uma peanha da dictadura permanente do sr. Fontes diante da qual devem, a seu juizo, desarmar-se todas as resistencias, cessar todas as luctas, emmudecer todos os aggravos, e só se ouvir de um a outro extremo do paiz a toada sonora e harmoniosa de applausos, que exaltem o seu nome, e de vozes, que glorifiquem o seu poder. Mas o accordo, que o sr. Fontes desejava que durasse até á consummação dos tempos em prol e em beneficio dos arranjos da sua politica? O accordo morreu, e quem lhe lavrou o epitaphio foi o sr. Fontes com o decreto de adiamento; e eu desejo, que as cinzas do accordo se não transmudem em sementeira de desconfianças e discordias no seio do nenhum partido; faço votos para que a sua morte seja o inicio e o alvorescer de um periodo mais duro e trabalhoso sim para a vida dos partidos, mas mais viril e mais fecundo.

O accordo morreu; não me deixou saudades depois de morto, porque tambem nunca me inspirou, affectos emquanto vivo.

Declaro com a minha nativa franqueza, que, ou pelas qualidades do meu temperamento, ou por effeito de muitas desillusões, nunca este pacto politico me causou enthusiasmo e mereceu o meu applauso.

Militando na politica, ha vinte e seis annos, nunca a minha disciplina partidaria foi posta a uma prova mais dura.

Reconheço e tributo sincera homenagem ás patrioticas aspirações, aos elevados intuitos, e aos generosos sentimentos politicos d'aquelle honrado e intelligentissimo cavalheiro, que foi o negociador do accordo por áparte do partido progressista; mas as minhas repugnancias eram profundas desde a nascença d'este pacto politico.

Pareceu-me, que o sr. Fontes pretendia aproveitar com a idéa das reformas politicas um elixir de longa vida no poder.

Conheço a historia dos accordos, convenios e transacções politicas feitas em Portugal nos ultimos trinta e cinco annos, e essa historia mostra-nos em traços relevantes os instructivos episodios, ou da força do leão, ou das manhas da raposa.

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O resultado tem sido sempre mau, protestos, queixas, desconfianças e desmembramentos partidarios.

Comprehendo e admitto um accordo perante uma grande calamidade publica, perante uma guerra civil, que dilacere o paiz, e perante uma guerra estrangeira, que ameace a Bua independência, porque em tal caso e n'essa hypothese é um dever de honra e uma prova de civismo sacrificar nos altares da pátria todos os dissidios, todos os conflictos e aggravos; mas nas epochas normaes e serenas, que nenhuma tempestade perturba, entendo, que não deve haver outro accordo senão o de cada partido promovendo dentro dos seus arraiaes e em desaccordo com os processos governativos dos outros partidos o bem e a felicidade do paiz, e a resolução dos problemas que mais lhe interessam.

O desaccordo é o estimulo da lucta, como a lucta é a condição da vida.

Creio, que os partidos mais lucram e mais se exaltam, mantendo bem estremes os seus principios, bem abalisados os seus campos, bem distinctas e autonomas as suas bandeiras.

Os primeiros periodos da nossa historia constitucional foram turbados por graves desordens e por contenções ás vezes cruentas, mas ao menos eram tempos de fé, de abnegação e de convicções nobilitadas e enaltecidas ás vezes pelo espirito de sacrificio levado às ultimas e mais admiraveis consequencias. (Apoiados.) N'esta quadra de uma parda decadencia politica, em que a confusão das idéas mais de uma vez tem acompanhado a confusão dos partidos, e em que o sr. Fontes, conservador por temperamento, por índole e por tradição, o que lhe não tomo a mal, se entraja agora impropriamente n'uns retalhos mal descosidos da bandeira progressista, eu não condemno nem maldigo os progressos e os melhoramentos materiaes, que conquistámos nos ultimos annos, mas sinto e deploro, que com a posse o fruição d'elles coincida a tibieza das crenças politicas e o quebrantamento da vitalidade partidaria. Entre esta phase serena, em que se preiteijam transacções, e aquella frágua chamejante, em que ao passo, que se retemperavam as idéas, se fortaleciam os caracteres, eu não hesito, não vacillo em dar a esta as minhas sinceras preferencias.

A lucta partidaria, por mais que encareça conciliações e concordias a palavra eloquente do sr. Manuel d'Assumpção, póde ser accesa, tenaz e intransigente, mas póde e deve ser ao mesmo tempo leal, cavalheirosa, digna, isenta de odios pessoaes, de agitações tumultuarias, e de arruaças temulentas, como aquellas com que o partido regenerador coroou em 1881 a guerra santa declarada ao governo progressista em nome da gravidade das circumstancias.

Como o accordo está morto, vem a ponto citar a phrase animosa do marquez de Pombal perante as ruinas fumegantes de Lisboa em 1755, «enterremos os mortos e cuidemos dos vivos». Deixemos o accordo, que morreu e tratemos de um vivo, que não obstante os attestados de boa saude, que lhe passa a illustre commissão do projecto de resposta, padece grave enfermidade, que demanda todos os nossos cuidados e attenções. Esse enfermo é a fazenda publica. (Apoiados.)

Quem considerar o documento, que está submettido á apreciação da camara, como um criterio seguro da situação politica e economica do paiz, do estado da sua administração e das suas finanças, da integridade e desenvolvimento das suas colonias, ha de pensar, que nenhumas difficuldades, nenhuns perigos, nenhumas sombras escurecem os horisontes da vida nacional; ha de imaginar, que sob o feliz consulado d'este governo a liberdade, a justiça e a abundancia se uniram e fraternisaram n'uma santa conspiração para offerecerem ao mundo o modelo correctissimo de uma nação exemplarmente regida; ha de pensar, se não possuir outros elementos de informação, que são copiosos os nossos recursos opulentas as nossas receitas e prosperas as nossas finanças; que se de fronteiras a dentro não ha males, que nos assoberbem, nem sobresaltos, que nos inquietem, lá fóra são escrupulosamente respeitados os nossos direitos, e se mantém intemerata e illesa a tunica sagrada da patria, que representa uma propriedade, que é legitima, e recorda um esforço, que foi heroico. (Apoiados.)

Mas infelizmente factos incontestaveis, evidentes e lastimosos apagam as cores festivas d'esse idylio, e projectam sobre o ridente quadro, que se nos traçou n'esse documento, a sombra de verdadeiros desastres. (Apoiados.) É forçoso referir-me agora ao illustre deputado, que acabou de fallar, o sr. Mendes Pedroso.

Disse s. exa., que as eleições foram liberrimas.

Oh! Sr. presidente! Foram liberrimas as eleições e correu uma larga regueira de sangue era diversos pontos do paiz, e foram até fuzilados pobres e inoffensivas mulheres, (Muitos apoiados.) que em 1884 nem pensavam, nem se lembravam, de que haveria n'este paiz auctoridades tão intolerantes, tão facciosas, tão desvairadas pelo influxo das paixões politicas, que reproduzissem á face da nação horrorisada as truculentas e tragicas scenas de ha quarenta annos. (Muitos apoiados.)

As eleições foram liberrimas e treze ou quatorze cadaveres ficaram como monumento, como tropheu, como funebre attestado do acatamento e do respeito tributado á liberdade da urna. (Muitos apoiados.)

As eleições foram liberrimas e o sr. Mendes Pedroso, seguindo n'este ponto a trilha já aberta pelo sr. Fontes, lança-nos, aos deputados da opposição, com profundo aggravo da logica e da coherencia, a extraordinaria e contraproducente insinuação de que nós representâmos aqui a munificencia e a generosidade do sr. Fontes, e não a vontade do paiz e a liberdade da uma reconhecida e confessada no discurso da coroa. (Vozes: - Muito bem.)

Eu poderia fazer largas considerações, em resposta ao sr. Mendes Pedroso, ácerca da conferencia de Berlim, em que o governo diz haver-se feito representar por convite do imperador da Allemanha de accordo com o governo francez.

Para responder ao illustre deputado é sufficiente lembrar, que o governo portuguez, agachando-se á sombra de uma calculada reserva, occultou uma circumstancia muito grave, que está bem aclarada no Livro Azul distribuido no parlamento inglez. Essa circumstancia é que o governo portuguez foi o primeiro a propor a idéa da reunião da conferencia, e que tomou tal iniciativa sem ter adquirido antecipadamente a certeza de ter a seu lado alguma potencia, que defendesse e amparasse ali os direitos da nossa soberania. (Apoiados.)

Não tenho a immodesta pretensão de derramar luz sobre um assumpto, que ficou completamente esclarecido no notabilissimo discurso ha dois dias pronunciado n'esta casa pelo meu prezadissimo amigo e illustre parlamentar, o sr. Barros Gomes. E aproveito a occasião para o felicitar por esse discurso, que revelou a seriedade e profundeza dos seus estudos e a sua alta competencia em todos os assumptos, a que s. exa. consagra as applicações de sua robusta intelligencia; esse discurso daria honra aos primeiros parlamentos do mundo, (Apoiados.) e seria sufficiente para conquistar-lhe reputação de estadista, se a não tivesse já bem firmada. (Apoiados.)

É sempre desagradavel fazer referencias a um ministro ausente.

Não está presente o sr. ministro dos negócios estrangeiros...

Vozes: - Esta, está.

O Orador: - Felizmente vejo entrar s. exa. Digo felizmente porque desejo fazer algumas observações para mostrar, que me não satisfizeram em todos os pontos as respostas, que deu hontem ao sr. Barros Gomes.

O sr. ministro dos negocios estrangeiros, fazendo uma pallida e deficientissima resenha das negociações diploma-

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ticas com a Inglaterra, marcou n'ellas dois pontos principaes: o da benevolencia e o da resistencia, e não hesitou em representar de submisso e zeloso advogado do governo inglez, dizendo, que a dureza das condições por elle impostas eram a consequencia necessaria da fortissima pressão exercida pelo parlamento e pela opinião publica na Inglaterra, mas que mesmo em tal situação convinha mais ao governo portuguez continuar a tratar com a Inglaterra.

Não attentou, porém, s. exa., em que a opinião publica na Inglaterra é um verdadeiro poder, diante do qual se curvam todos os governos, e que em taes circumstancias não podiamos alimentar esperanças de resultado favoravel, e que só conseguiamos indispor contra nós a Allemanha e a França com a cega e imprudentissima teimosia em tratarmos com a Inglaterra, a despeito das reiteradas e instantes advertências, que o seu governo nos fazia, de que o tratado do Congo não podia prevalecer sem a sancção das outras potencias e sem por conseguinte se lhe dar um caracter de internacionalidade. Á vista da mudança da attitude da Inglaterra um governo habil, avisado, prudente e amestrado pela lição dos desenganos, proporia immediatamente a arbitragem, que é o recurso mais seguro das nações pequenas, que não têem por si senão a força do direito e a egide da justiça.

Se o recurso da arbitragem não fosse acceito, devia o governo de Portugal dirigir-se immediatamente á Allemanha e á França, e talvez fosse possível, a troco de algumas concessões, conseguir-se o triumpho da nossa causa e a consolidação do nosso dominio no Zaire. Disse o sr. ministro dos negócios estrangeiros, que o sr. Barros Gomes não dera verdadeiro valor á acção da associação internacional; o sr. Barros Gomes não preteriu este ponto, fallou por forma bem nitida da influencia embora illegitima da associação, referiu-se aos seus manejos e ás suas intrigas para nos tornar odiosos e nos alienar as sympathias da Europa.

Acceitando como indubitavel, que a associação internacional tem na verdade a importancia, que o sr. Bocage lhe attribuiu, e que nem o sr. Barros Gomes, nem eu lhe contestamos, é certo, que essa mesma importancia fornecia á associação numerosos elementos de informação, que a habilitavam para bem conhecer as intenções das differentes potências da Europa, e que bem as conhecia, prova-o a circumstancia de que, estando já posto de parte o tratado de 28 de fevereiro de 1884, ha vendo-se já manifestado contra nós uma grande indisposição, Stanley tinha ainda duvidas e receios de qual seria a attitude, que a Allema-nha haveria de tomar n'esta questão, e em 16 de agosto d'aquelle anno publicava na imprensa allemã uma carta celebre, em que Stanley saudava o povo allemão pelo vivo interesse, que lhe mereciam os interesses coloniaes, e dizia summariamente:

Se a Allemanha quer tomar a peito e deveras os problemas de colonisação, não tem senão duas soluções a adoptar, e são, ou reconhecer a associação internacional ou ligar-se a Portugal.

Reconhecendo a associação internacional, abre adiante de si um espaço immenso a melhoramentos materiaes e vantagens incalculaveis; terá a Allemanha nas paragens africanas arroteamentos productivos, colonias florescentes, permutações lucrativas, caminhos de ferro, isenção de impostos, emfim, as douradas perspectivas de um verdadeiro éden nas margens fertilissimas do Zaire; mas se preferindo a outra solução se ligar a Portugal os resultados serão lastimosos, serão embaraços á navegação, a ruina do commercio, o trafico da escravatura, uma rede oppressora de impostos vexatorios, a acção esterilisadora das auctoridades portuguezas, ruins, maldosas, avarentas e perversas; será um tenebroso quadro de horrores, de protervias e desgraças.

Tenho as obras de Stanley, e em nenhuma das suas paginas encontrei palavras denunciadoras de uma animosidade tão sanhosa como injusta contra Portugal.

Esta carta calculadamente eacripta, se por um lado mirava a aggravar a indisposição contra nós, mostrava por outro, que ainda a esse tempo, note-se, 26 de agosto do anno passado, Stanley tinha serios receios de que Portugal chegasse a um accordo com a Allemanha.

O desaproveitamento d'esse favoravel ensejo, e a má direcção dada ás negociações pelo governo portuguez, que nos representava por toda a parte como autómatos e satelites da Inglaterra, explica até certo ponto a resposta, que á carta de Stanley dava seguidamente o illustre professor allemão e celebre africanista Schwein Furht.

Poucos dias antes de partir para o Egypto, publicava o sabio allemão a sua carta escripta em linguagem emphatica, sem deixar de ser muito expressiva.

Dizia elle: «Vejo no appello feito pela imprensa ao povo allemão um signal dos tempos».

«A Inglaterra não póde mais exercer uma acção colonisadora benefica e fecunda sobre a área immensa de tantas e tão dilatadas regiões. O seu manto de purpura, á força de distender se e retesar-se atra vez de tão amplos territorios, começa a romper-se e desfiar-se.

«Mas a Inglaterra, para tolher o passo aos outros povos, emprega o obstruccionismo, e para isso nenhuma nação se lhe presta melhor do que Portugal, que é um manequim nas suas mãos.

«A America não vae á Africa por causa da doutrina de Monroë; nos braços da França ou da Allemanha hão de cair mais cedo ou mais tarde os estados livres do Congo.»

Parece, que estes documentos não foram comprehendidos, nem o seu verdadeiro alcance apreciado pela nossa perspicaz diplomacia, e por este sabio governo. Especialmente a significação da carta de Stanley, que é ao mesmo tempo idylio e libello, é tão evidente, que devia ser aproveitada para a melhor direcção das negociações.

Temos uma diplomacia apparatosa e cara, que, tirante algumas excepções honrosas, prestará para muito, mas não para ver com perspicacia, para informar com promptidão, nem para negociar com acerto. O governo, esse, com os olhos piedosamente fitos na Inglaterra, ignorava tudo; ignorava os intentos, os planos e as disposições da Allemanha, para uma extensa dilatação colonial, disposições em parte resultantes do estado da sua industria e das suas necessidades economicas, que contrastam com a grandeza collossal do seu poderio militar.

O governo ignorava mais tarde e quando era já passada a occasião propicia para negociarmos vantajosamente com a Allemanha, as declarações peremptorias e categoricas do principe de Bismarck, de que não reconhecia os nossos direitos historicos e incontestaveis no Zaire.

O governo ignorava os documentos, que ha pouco citei e que tiveram na Allemanha uma larga publicidade. E como ignorava tudo, tomou a iniciativa da reunião da conferencia, e teceu assim a corda, em que havia de ser estrangulado o direito, a soberania e a honra da nação. (Apoiados.) Ora, um governo que, não obstante ser um congresso de sabios, como nos declarou o sr. Fontes, não póde desempenhar tão altas e poderosas funcções; (Apoiados.) se não é réu de ignorancia, é culpado por negligencia e descuido, e arriscou assim não só grandes interesses públicos, mas tambem uma cousa mais séria e sagrada, que é o brio e a dignidade da nação. (Apoiados.)

Sei, que nos tempos, que vão correndo, é pouco feliz a situação e a sorte das nações pequenas, que sómente podem contar com o respeito e a sympathia, que merece o direito aluado á fraqueza.

Mas, quaesquer que fossem as consequencias, cumprisse o governo os seus deveres dirigindo as negociações a tempo, com acerto, com precaução e tambem com firmeza; não confiasse cegamente na protecção da Inglaterra, porque ella nos tem desamparado em crises apertadíssimas, como foi a do conflicto levantado por causa do apresamento da barca Charles & George, em que, por cum-

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prirmos fielmente os tratados celebrados com aquella potencia para a repressão do tranco da escravatura, ficámos sujeitos ás bofetadas mais ultrajantes e cruéis, que podem ferir um povo altivo, pundonoroso e digno.

Se o governo tivesse procedido com tino e cuidado, tiria ficado livre de todas as responsabilidades, e poderia dizer hoje, de cabeça levantada: fizemos o que podiamos e o que deviamos; Portugal será victima de mais um infortúnio, mas não é victima dos nossos erros.

As humilhações e os trances, que desde os preliminares da conferencia o governo tem soffrido, são a terrivel e justissima expiação da guerra santa, em que o tratado de Lourenço Marques, cujas responsabilidades principalissimas pertencem ao partido regenerador, foi a primeira arma de combate em 1881.

É tempo do me cingir ao objecto da minha moção de ordem.

No projecto de resposta ao discurso da corôa affirma-se, que a situação da fazenda publica é tão desaffrontada, que não inspira receios. É uma novidade singular, extraordinaria e por isso mais grata ao paiz.

Se nós estivessemos na antiga Roma, tinhamos rasões de sobejo para a tão jubiloso annuncio clamarmos em unisonancia de vozes: subamos ao Capitolio e decretemos as honras civicas e as corôas triumphaes aos consules benemeritos, que pelos desvelos de uma administração justa e patriotica nos deram a lograr tamanha e tão avantajada felicidade.

Para que o quadro das glorias financeiras do governo ficasse mais brilhante e completo supprimiram-se como discordantes e importunas as palavras «deficit e desequilibrio orçamental», que temos encontrado em todos os documentos anteriores da mesma natureza. Ao pensamento, que determina estas systematicas dissimulações, são perfeitamente applicaveis as notaveis palavras proferidas pelo illustre Thiers no parlamento francez em 1865.

Disse alguem: calumniáe, que sempre ficará alguma cousa; é desgraçadamente uma verdade. Em materia de finanças dissimuláe, dissimuláe, que sempre ficará alguma cousa. Mas no caso presente nada ficará d'estas dissimulações artificiosas, destas traças engenhadas com o fim de esconder a verdade ao paiz, não ficará a recordação de um esforço serio, efficaz e decisivo, para resolver a questão de fazenda; só ficará do pé, persistente e perduravel a memoria do engenhoso addicional de 6 por cento, e do vexatório imposto sobre o sal. (Apoiados.)

Não é com estes apoucados e insufficientes expedientes que o governo ha de fundir pedestal para as suas glorias financeiras (Apoiados.) e grangear as benemerencias do paiz.

Mas com que fins e com que propositos se disfarça a verdade conhecida, a verdade incontroversa, a verdade evidentissima no ponto, que mais interessa á vida e ao futuro do paiz?

Se é para attenuar as derrotas financeiras do governo, se é para adormentar o paiz n'um travesseiro feito de illusões, desatinada politica é esta, que de taes meios se vale e soccorre para escurecer a verdade.

Em assumptos financeiros são as illusões a cousa mais perigosa, mais nefasta e desastrosa, porque as illusões passam e os factos ficam. (Apoiados.)

As difficuldades, que a principio podiam atalhar-se com um esforço energico, perseverante e bem encaminhado, mais tarde só podem resolver-se a preço de duplicados e dolorosos sacrifícios. (Apoiados.)

E quando os disfarces cáem, as simulações se dissipam e as miragens desapparecem, e a amargura dos grandes desenganos impõe fatalmente a necessidade dos grandes sacrificios não é raro, que protestos irritados abram o prefacio de revoluções estrondosas.

Tambem a França, tambem essa grande e poderosa nação se deixou deslumbrar pela palavra dos seus estadistas, dos seus governos e dos seus diplomatas; tambem ella foi victima até 1870 das mais deslumbrantes, mais apraziveis e enganosas illusões e só acordou quando se viu vencida, ensanguentada e humilhada; quando ao desastre tremendo, que em Sedau aniquilava um exercito respondia em Paris a revolução implacavel, que derribava uma dynastia.

Sr. presidente, não quero nem as exagerações pavorosas, que aterrara sem necessidade, nem os optimismos seductores, que encarecem sem fundamento.

Entre os dois extremos vae o caminho chão, direito e plano da verdade lealmente sentida e corajosamente formulada.

Pela minha parte mais me arreceio do deficit da verdade do que do déficit da fazenda, (Apoiados) porque á extincção d'este e áquelle o maior impedimento.

Houve n'este paiz em 1880 um ministro illustradissimo, trabalhador, tão intelligente como modesto, tão distincto pelos quilates do talento como pelas energias de caracter. Esse ministro defrontou-se resolutamente com a questão de fazenda.

Depois da organisação financeira realisada em 1860 pela poderosa intelligencia e pela forte vontade do sr. conde do Casal Ribeiro neuhuns trabalhos, nenhumas providencias se lhes avantajavam mais, não só pela largueza de vistas e pela perspectiva dos resultados, senão tambem por assentarem, não em simples expedientes, mas em um systema bem reflectido e ponderado.

O relatorio apresentado ás côrtes em 1880 pelo sr. Barros Gomes não tem sómente para mim o grande valor de ser um monumento de sabedoria, como reconheceram os seus proprios adversarios, tem igualmente o grandíssimo merecimento de ser o espelho da verdade.

Bem e avisadamente entendia o sr. Barros Gomes, que assim como a um doente se não podia fazer uma operação dolorosa sem que elle se convencesse de que ella lhe era indispensavel, tambem ao paiz se não podiam pedir mais impostos e exigir novos sacrificios sem lhe mostrar a absoluta necessidade d'elles, e sem lhe dizer franca e imparcialmente a verdade.

Se o imposto do rendimento, que tem sido para a Inglaterra desde muitos annos o seu primeiro recurso tributario, e que foi para a Italia o primeiro instrumento da sua regeneração financeira, se esse imposto tão tenazmente impugnado por aquelles, que mais tarde lhe aproveitaram uma parte, se tivesse estabelecido, e enraizado no meio de nós, se a par d'isso tivessemos uma administração economica, regrada, severa e escoimada de prodigalidades e dissipações seria possivel affirmarmos hoje com fundamento, que a nossa situação financeira estava limpa de difficuldades e desassombrada de receios. Mas quando os factos na sua realidade inflexivel nos denunciam uma situação muito ao invez disto, quando esto paiz pobre e mingoado em recursos vê mais de metade da sua receita absorvida pelos encargos da divida publica, quando vivemos, ha muito, a vida amargurada que se cifra em levantar divida fluctuante para acudir ao deficit, e em contrahir emprestimos para consolidar a divida fluctuante, quando nos arrastâmos alquebrados e exangues pelas escorregadias sinuosidades de um circulo, que se não é de todo como o desenhado no Inferno de Dante, é de desacertos, de tormentos e flagicios, que não têem, nem podem ter outra saida e outro termo senão o paradeiro dos desastres, quando as difficuldades do presente se associam ás incertezas do futuro para quebrantar as esperanças mais viris, vem o governo dizer ao paiz, que esteja tranquillo e descansado, porque ás finanças não vão á véla, vão a vapor e com prospera viagem.

Não bastava ao governo o falseamento systematico dos principios e das instituições, era preciso para complemento dos seus feitos e glorias, que elle arvorasse sobre as finanças desmanteladas a desbotada bandeirola dos niythos e das ficções.

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Vamos aos factos, que roboram e confirmam estas palavras.

Abrindo o orçamento apresentado, ha pouco, a esta camara, encontrâmos nelle calculado o deficit em reis 1.887:000$000; diz o governo que, pelo augmento das receitas e pela diminuição das despezas, é licito e apropositado acreditar, que no orçamento futuro deve o deficit ficar reduzido ás modestas proporções de 800:000$000 réis! Desde muitos annos, o acrescimo das receitas e a reducção nas despezas tem sido para este governo os dois pontos fundamentaes, de que elle fia a resolução da questão da fazenda e o equilibrio dos orçamentos; mas infelizmente esse equilibrio nunca chega, porque a tendência irresistivel para os gastos excessivos e o desvairado systema de pretender talhar largos mantos em estofo estreito, tornam impossivel, por mais que as receitas cresçam e os sacrificios se aggravem, a realisação e o cumprimento das promessas do governo. (Apoiados.)

Ha dois annos declarava o governo, que o deficit era de 200 e tantos contos, e como o reputava moribundo, celebrava-lhe de antemão exéquias solemnes, mas o mofino zombava das sentenças de condemnação, e, ha um anno, apparecia elevado á somma de 700 e tantos contos!

D'esta vez o governo protestava solemnemente, que havia de garrotar o deficit, que havia de chumbar-lhe para sempre a pedra do sepulchro e dotar-nos até com o apreciavel beneficio de um saldo de alguns contos de réis. Pois, sr. presidente, não obstante todas estas ameaças, todos estes golpes, todos estes pregoes de exterminio, o déficit total nos dois annos anteriores elevou-se a réis 7.000:000$000.

E como o governo se vê agora obrigado a confessar, que o deficit é de 1.887:000$000 réis e portanto muito superior ao declarado nos annos antecedentes, devemos armar-nos já de coragem e de resignação para contemplarmos o terrivel advento de um deficit, que ha de exceder a réis 7.000:000$000.

Para bem se apreciar o que valem as repetidas promessas de diminuição de despezas, basta considerar, que em relação ao exercicio de 1884-1885, temos nas despezas dos differentes ministerios um augmento na importancia de 313:000$000 réis, e que ternos nos encargos da divida publica um acrescentamento de 1.378:000$000 réis, resultante do ultimo emprestimo.

E se attendermos aos proximos encargos resultantes já da construcção simultanea de uns poucos de caminhos de ferro, já do levantamento da divida fluctuante e das dispendiosas e imprudentissimas propostas do sr. ministro das obras publicas, poderemos calcular e prever com certeza a que ficará reduzida a annunciada reducção das despezas. (Apoiados.)

Temos um deficit avultado, e onde ha deficit ha um grande mal e póde haver um grande perigo. (Apoiados.)

O deficit, no organismo de uma nação, por maiores que sejam os seus recursos, é sempre uma brecha escancarada, que ao mais pequeno abalo e ao repontar da primeira adversidade, póde ser a causa de crises graves e de lastimosas perturbações.

Quem tem deficit carece de recorrer ao credito e quem vive do credito não póde dizer, que a sua situação é favoravel, desaffogada, isenta de difficuldades e livre de receio. (Apoiados.)

E quem tem a responsabilidade principal da existencia do deficit é o sr. Fontes, porque com as suas administrações, que são a clamorosa antithese da economia e da sobriedade nas despezas, tem contribuido para o alimentar, porque desperdiçou os ensejos mais favoraveis, mais propicios e de molde para extinguir o deficit, (Muitos apoiados.) porque o sr. Fontes e os seus governos calejaram no habito entranhado e incorregivel de augmentarem as despezas, sem se inquietarem com a falta de receitas necessarias para as satisfazer (Apoiados.), porque a facilidade das complacencias, a febre dos arranjos e a vangloria de melhoramentos incompativeis com os nossos recursos, os tem precipitado em dispêndios immoderados, cujas funestas consequências estamos vendo nos abalos do nosso credito, no esgotamento das faculdades tributarias, na triste e geral convicção de que por este caminho e por este systema de governo, com um crescendo de despezas sempre mais alto do que o crescendo das receitas não ha dinheiro que chegue e todas as exigencias, todos os impostos representam um sacrificio improductivo, um sacrificio baldado, um sacrificio perdido menos para provocar a paciencia do contribuinte, menos para mostrar, que o flagello das vexações tributarias é quasi sempre a causa principal da explosão das coleras populares e das perturbações da ordem publica. (Apoiados.)

Lamento sinceramente, em nome dos mais vitaes interesses do paiz, que o sr. Fontes com as poderosas faculdades do sou espirito, com a sua larga experiencia dos negocios publicos, com a convicção que tem, como estadista e como portuguez, da absoluta necessidade de eliminar este grande embaraço da nossa vida economica, não aproveitasse aquelle periodo tranquillo e relativamente prospero, que transcorreu de 1871 a 1876 e deixasse de prestar então ao paiz um serviço relevantissimo, a que ficaria perpetuamente vinculada a gratidão nacional.

Essa conjunceão feliz e tão opportuna talvez não volte tão cedo, e nem o sr. Fontes nem os cyreneus, que convocou em seu auxilio, têem já a força e a auctoridade precisas para resolverem a questão de fazenda, e a consequencia forçosa será legarem, aos seus successores uma situação tormentosa e ouriçada do difficuldades talvez insoluveis, porque os murmurios e os protestos, que nos chegam aos ouvidos dizem e muito acentuadamente significam, que o paiz não está resolvido a pagar mais. (Apoiados.)

Desde 1872, anda o sr. Fontes afazer ao deficit minacissimas declarações de guerra e sempre a viver com elle nas mais estreitas e affectuosas relações.

N'essa epocha annunciava-nos s. exa. o celebre e celebrado saldo de 27:000$000 réis.

Era 1882 protestava no tom firme e solemne de uma arreigada convicção, que ia matar o deficit de vez.

E o que succedeu?

Em ambas as occasiões o sr. Fontes largava a pasta da fazenda, deixava incompleta e malograda a sua missão, e dava ao paiz a prova authentica da derrota dos seus planos e dos seus compromissos, podendo neste ponto comparar-se a esses batalhadores, que ao iniciar-se um combate disparam ao inimigo feros e ameaças, decretam a si mesmo as palmas do triumpho e depois de despedidos os primeiros golpes desanimam, retrocedem e desamparam o campo da batalha entregando a combatentes não mais felizes a espada, que lhes caira das mãos desfallecidas.

A avisada e patriotica observação do sr. Braamcamp, do que era preciso parar, respondeu o sr. Fontes com a nota do velho hymno, que muitas vezes lhe tenho ouvido, e disse «parar é morrer».

Essa phrase, considerada em absoluto, não é verdadeira, assim como tambem o não é a contraposta de que caminhar é viver.

Eu não quero a immobilidade, que petrifica e que é a negação do progresso, nem quero o movimento rapido, accelerado e vertiginoso, que, representando um excesso de vida, póde tambem conduziu á morte. (Apoiados.) Para as nações, parar no caminho, ou antes na ladeira dos desatinos, dos desperdicios e dos actos de má politica e de má administração, é um dever, uma necessidade e um principio de salvação.

Sr. presidente, construir ao mesmo tempo os caminhos de ferro do Douro a Salamanca, de Traz os Montes, da Beira Baixa, do Algarve e o ramal de Vizeu, é caminhar sim, mas para enormes sacrificios, que hão do condensar-se n'uma situação afflictiva o incomportavel, em que será

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preciso ordenhar o sangue do povo; é caminhar para a desconfiança dos mercados monetarios, para a baixa cada vez mais descendente dos nossos fundos, para a irritação do contribuinte, para a banca-rota, para os grandes erros, que são quasi sempre precursores dos grandes desastres.

Mas o sr. Fontes é grande, e os seus prophetas maximos, apontando para os caminhos de ferro, para as estradas ordinarias, para as Unhas telegraphicas, para as escolas a radiarem luz e para os portos artificiaes a convidarem a navegação, entendem, que com estes brazões e tropheus ha de revestir-se e exornar-se o monumento erigido á gloria do sr. Fontes; mas esqueceram-se os illustres oradores da maioria de collocar sobre esses tropheus, e no alto d'esse monumento um espectro mirrado, livido e sombrio. Esse espectro é o deficit.

O partido progressista não emboca a tuba epica para exaltar as próprias glorias, e deixa á historia imparcial a tarefa e o cuidado de referir os grandes serviços, que prestou ao paiz desde a desvinculação da terra até á construcção gratuita de um caminho de ferro.

Este ultimo e valiosissimo serviço nunca os governos regeneradores, com todos os seus apregoados merecimentos, poderam fazer ao paiz.

Prestou-lh'o, porém, o partido progressista, e nomeadamente aquelle homem intelligentissimo, aquelle estadista insigne, aquelle meu dilecto amigo Saraiva de Carvalho, que nos deixou a nós todos os da sua grei não só uma memoria saudosa, que nos commove, e uma gloria imperecivel, que nos illustra, senão tambem um grande exemplo, que nos estimula. (Apoiados.)

Sr. presidente, eu não contesto nem deprimo os altos e culminantes merecimentos, que sobredouram o espirito do sr. Fontes; não desconheço nem amesquinho os serviços, que s. exa. tem prestado ao paiz durante a sua longa carreira publica; mas é certo que esses serviços nos têem ficado muito caros, e, qualquer que seja a apreciação que se faça da sua importância e da sua valia, não estão consubstanciados em uma obra tão grande, tão fecunda e gloriosa como aquella em que Mousinho da Silveira, o homem mais eminente da nossa historia constitucional, lançou os fundamentos da nossa transformação economica e social, desapressou a terra de antigas e oppressoras servidões, e deu á revolução liberal um melhor abono de victoria nas leis justas, que libertavam, do que nas espadas fortes, que combatiam.

O maior serviço, que o sr. Fontes, astro radiante da politica portugueza, podia prestar neste momento ao paiz, era o de eclipsar-se nas alturas do poder, contentando-se com a gloria de haver arrastado para o seu centro de attração os sábios, que não póde encontrar na sua illustrada e dedicada maioria, onde lhe não faltavam homens competentes para gerir as pastas da marinha e obras publicas.

Os sabios deixaram-se attrahir e passaram uma esponja sobre a democratica constituição de 1838, sobre a largueza das franquias populares, sobre as vehementes aggressões, que tinham feito ao governo na imprensa e no parlamento.

E eu sinceramente lamento, que o sr. Pinheiro Chagas, um homem de grande talento, que não precisava da luz d'aquelle astro para ver e alcançar e conquistar um grande futuro, se deixasse enamorar do sacrifício sublime de servir o seu paiz como ministro, a ponto de desamparar o posto que intrepidamente occupava aqui e lá fóra nas reuniões populares quando a sua voz eloquente trovejava indignada contra o syndicato de Salamanca, e grudava no rosto do sr. Fontes e dos seus collegas o rotulo infamante de traidores á patria e em altos brados pedia ao povo, que guardasse na sua memoria este terrivel estigma, que lhe rompia da consciencia e do coração e fosse em seguida associar-se áquelles, que assim maltratára, sem reparar, sem ver primeiro, se no logar onde se sentava ao lado d'elles estava já apagada a nodoa produzida pela espirrar d'aquella invectiva crudelissima. (Apoiados.)

Vozes: - Deu a hora.

O Orador: - Eu pouco mais tenho a dizer, mas se v. exa. e a camara assim o resolverem, terminarei na sessão seguinte.

O sr. Presidente: - O regimento dá-lhe a faculdade de concluir o seu discurso, apesar de já ter dado a hora.

O Orador: - Eu de pouco tempo preciso para terminar hoje, mas se a camara não quizer prolongar a sessão, continuarei na sessão seguinte.

Vozes: - Falle, falle.

O Orador: - Agradeço á camara a sua benevola demonstração.

Sr. presidente, para mostrar, que o estado da fazenda publica é para inspirar receios não preciso de invocar a existencia de um deficit avultado, nem lembrar a circumstancia de que, tendo-se contrahido, ha poucos mezes, um emprestimo de 18.000:000$000 réis, já nos vimos obrigados a levantar divida fluctuante na importancia de alguns milhares de contos para pagarmos o coupon da divida correspondente ao semestre findo.

Para mim basta como argumento o resultado do ultimo emprestimo; o governo recebeu o dinheiro, mas a maior parte dos títulos ficou encalhada nas carteiras das casas bancarias, com quem o governo contratou.

Este facto é uma lição severa dada ao governo, é a condemnação formal da sua administração financeira, é mais um aviso feito ao paiz para que mude de vida, e é uma demonstração irrecusável de que não devemos pensar tão cedo em contrahir outro emprestimo. (Apoiados.)

É verdade, que o paiz se tem desempenhado escrupulosamente dos seus compromissos, e que tem honrado o seu credito e o seu nome, mas para isto tem-se submettido a sacrificios gravissimos, e em presença d'elles não póde affirmar-se sem uma irrisão amarga, que tem recursos de sobra.

Ha recursos de sobra e muitos milhares de contribuintes fazem grande sacrificio em pagar ao estado pesadíssimos impostos directos o indirectos, e está-se accentuando um movimento geral de resistencia contra as corporações administrativas, que, abusando da faculdade illimitada de tributar, que lhes confere o codigo administrativo, estão exigindo tanto e mais do que o estado.

Ha sobra de recursos e a provincia do Douro, que ainda ha doze annos era a mais prospera do paiz, soffre actualmente em relação ao seu antigo rendimento annual um deficit calculado em 3.500:000$000 réis, e está-nos offerecendo o lutuoso espectaculo de ruina, de fome, e de miseria.

No norte do reino mais de dois terços da propriedade estão presos nas garras da hypotheca; as execuções por dividas á fazenda são innumeraveis e constituem um verdadeiro flagello; a agricultura, a industria e o commercio levam, á mingua de capitães baratos, uma vida attribulada e cortada de embaraços; instrucção primaria e profissional atrazada e escassamente diffundida, administração relaxada e anarchica, industria sempre incapaz de luctar com a concorrencia estrangeira, a propriedade em parte hypothecada e dando em todo o paiz um rendimento medio não excedente a 3 por cento; os bancos descontando a 6, 7 e 8 por cento, eis os traços escuros e as desastradas condições d'este paiz, onde, ao lado de um thesouro sempre faminto se levanta o vulto magestoso de um estadista sempre impenitente.

Não é com as risonhas affirmações contidas no projecto de resposta, não é com hyperboles inchadas, com phantasmagorias ostentosas e com fogos fátuos, que ha de firmar-se o credito publico, fomentar-se a riqueza nacional, e que hão de restabelecer-se as finanças e sanearem-se os males, de que enferma o paiz.

Não é com a reforma do regimen penal da imprensa, que as instituições monarchicas hão de auctorisar-se e assegurar-se-lhes consideração e prestigio perante a opi-

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nião e a consciencia publica. Essa irreflectida e desgraçada reforma, cujas inspirações e fins não quero malsinar, foi um passo errado, foi um erro grande, porque produziu um resultado contraproducente, e se vivesse o grande publicista Antonio Rodrigues Sampaio, se no animo e nos conselhos do governo podessem influir e preponderar ainda os avisos da sua voz auctorisada, elle repetiria que para os desmandos e abusos da imprensa o melhor correctivo é a propria imprensa, e principalmente a opinião publica. (Apoiados.)

Nós vimos, que a pena, que devia corrigir os réus, se transformou em glorificação, que exaltou as victimas; vimos responderem ás sentenças condemnatorias proferidas nos tribuuaes os applausos e as acclamações da praça publica; vimos a nodoa dos convicios e das affrontas imprimir-se mais larga e mais escura no proprio logar, que mais queriam parapeitar o defender uns desatentados e infelizes paladinos. O processo mais seguro para consolidar as instituições e eleval-as no conceito publico, não está em empregar contra os desacatos da imprensa rigores e severidades excepcionaes, está em o governo ser o primeiro a dar saudaveis exemplos de respeito por estas instituições, em não exercer dictaduras desnecessarias e affrontosas do poder legislativo, e em não commetter abusos e attentados, que são a negação absoluta da lei, da justiça e dos interesses publicos.

Eu comprehendo perfeitamente quaes são os intentos e os planos do sr. Fontes ao apresentar uma proposta de reformas politicas, que são uma evasiva de largas e verdadeiras reformas, ao fazer em dictadura a reforma do exercito o em dar-lhe por epilogo o proprio dia do anniversario natalicio do chefe do estado, e ao descrever-nos as finanças numa situação lisonjeira; mas o sr. Fontes está completamente illudido.

A força dos acontecimentos, a força da verdade e a força do opinião hão de um dia aniquilar esses planos, como as rajadas do temporal varrem e dispersam as folhas seccas das arvores.

Ou seja pela acção do tempo, que é irresistivel conductor de desenganos, ou pela acção de desastres, que são às vezes um poderoso estimulante para a consciencia das nacionalidades, que não querem morrer, o paiz ha de acordar da sua profunda lethargia para se envergonhar da sua profunda decadencia, e quebrará então o eixo de uma política estreita, egoista, utilitaria, sem altos fins e sem largos horisontes, eixo formado de sophismas e de ficções, de preponderancias absorventes, e de condescendencias illicitas, de imprevidencias, que não querem ver, e de erros, que não querem corrigir-se.

Perante a perda das colonias, cuja exploração e desenvolvimento devia ser o ponto de convergencia dos esforços e da actividade do paiz, perante a ruína da fazenda publica, perante os estremecimentos do nosso credito, perante as penúrias do thesouro, os lyrismos e as jubilosas affirmações do governo não minoram antes aggravam os males públicos, porque occultam a verdade e a primeira necessidade de um povo é conhecer o que é para fazer o que lhe cumpre.

E quando o paiz conhecer bem a gravidade da sua situação, rodeada de perigos e difficuldades, ha de resolver-se a entrar seriamente no governo de si mesmo, e a só admittir uma politica sã, uma politica forte e levantada, que tenha por norte, não o predomínio de um homem, mas o engrandecimento da patria, que tenha por inspiração e por norma principios e não arranjos, reformas largas, serias e verdadeiras nos homens e nas instituições, e não íllusorios simulacros, que nada remedeiam e a ninguem satisfazem.

Tenho dito.

Vozes: - Muito bem.

(O orador foi comprimentado por muitos srs. deputados.)

O sr. Presidente: - A ordem do dia para amanhã é trabalhos em commissões, e para sexta feira a continuação da que estava dada.

Está levantada a sessão.

Eram pouco mau de cinco horas da tarde.

Redactor = S. Rego.

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