232 DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS
funccionar como deputado, participo a v. exa. para os devidos effeitos.
Deus guarde a v. exa. Fundão 27 de janeiro do 1886. - Illmo. e exmo. sr. presidente da camara dos senhores deputados da nação, Agostinho Nunes da Silva Fevereiro.
Á secretaria.
SEGUNDAS LEITURAS
Projecto de lei
Senhores. - A camara municipal de S. Vicente da Beira, não podendo pelos recursos ordinarios occorrer á urgente necessidade de edificar uma casa para as escolas de ensino primario existentes na cabeça do concelho, vem pedir
auctorisação para desviar do fundo de viação a quantia de 1:584$164 réis para esse fim. Considerando que a auctorisação pedida representa um acto de protecção ao ensino primario, cuja difusão constituo a mais salutar garantia da prosperidade nacional, tenho a honra de submetter á vossa illustrada apreciação o seguinte projecto de lei:
Artigo 1.° É auctorisada a camara municipal de S. Vicente da Beira a desviar do fundo de viação a quantia de 1:584$164 réis para a construcção de um edificio em que se accomodem as duas escolas de ensino primario, existentes na sede do referido concelho.
§ unico. A referida camara poderá levantar já do fundo de viação a quantia de 884$164 réis, existentes na caixa geral de depositos, ficando auctorisada a levantar os restantes 700$000 réis, logo que esta quantia se liquide.
Art. 2.° Fica revogada a legislação em contrario. = O deputado, Reis Torjal.
Lido na mesa, foi admittido e enviado á commissão de administração publica, ouvida a de fazenda.
Propostas de lei mandadas para a mesa, na sessão anterior, pelo sr. ministro das obras publicas e que por falta do tempo não foram lidas n'essa sessão.
Senhores. - Pelo ministerio a meu cargo, seja dito em honra dos meus antecessores e dos parlamentos que lhe comprehenderam a utilidade e lhe concederam os meios extraordinarios de que se têem servido, completaram-se e prepararam-se no decurso de trinta e tres annos trabalhos de uma importancia que não é licito desconhecer e que não é justo negar. Esses trabalhos, ha muito reclamados, como impreteriveis, por todos os interesses sociaes, estudados e annunciados pelas diversas administrações liberaes que successivamente presidiram aos destinos da nação, eram quasi todos fatalmente adiados em quanto a paz não póde firmar-se no seio da familia liberal ou emquanto as nossas mais caras liberdades eram chamadas a litigio.
Nem se diga que os melhoramentos publicos que foi preciso emprehender em grande escala para nos approximarmos dos que nos levaram longa dianteira, absorviam os cuidados que por este ministerio se davam ao commercio, á industria, á agricultura. A viação publica não se faz para embellezamento da terra, proporciona-se entre a producção e o mercado, restituindo em offertas e barateza ao consumidor e em procura e commodidade ao productor muito mais do que a um e outro exige de encargos. A telegraphia e o correio servem todos os interesses sociaes e ser vem a industria e a agricultura, servindo principalmente o commercio. O melhoramento dos portos, o alumiamento das costas fazem-se principalmente para o commercio que é o grande commissario ,da agricultura e das industrias fabris. Para mais especialmente favorecer a industria por vezes se tem inquerido das suas difficuldades; infelizmente a industria retrahe-se quando a interrogam e prefere viver doente e queixar-se, a deixar ver e curar as suas enfermidades. Alem d'isso o governo prepara-lhe pautas favoraveis
e tem-lhe fornecido ensinamento especial, superior, secundario e elementar.
A agricultura prefere continuar, em grande parte, com os seus processos tradicionaes, já hoje proveitosamente substituidos nos outros paizes cultos, a aproveitar-se dos inventos que dia a dia se multiplicam, a estudar nas escolas theoricas e praticas, já hoje creadas, ou para aproveitar as suas lições ou para noticiar os seus defeitos.
Até mesmo para concorrerem a exposições que se lhes proporcionam ou para responderem a consultas que se lhes dirigem, se recusam os nossos lavradores, tomados de uma descrença tanto mais lamentavel, quanto é certo que os poderes publicos difficilmente podem intentar melhoramentos proficuos quando encontram a resistencia ou a inercia d'aquelles que por utilidade propria deviam ser os seus melhores auxiliares.
O esmorecimento, porém, que póde tomar um individuo ou uma classe, matar uma aspiração ou um interesse não póde nunca justificar a inacção dos poderes publicos no estudo da doença e na applicação dos remedios; mais precisos quanto maiores forem as resistencias, a inercia que se lhes opponha.
Não somos nem desejâmos parecer pessimistas na apreciação das nossas riquezas industriaes e agricolas, mas não occultemos que lhes falta muito para se considerarem prosperas.
Conta-se, quanto á agricultura, que augmenta a nossa producção vinicola, mas será porque augmenta em larguissima escala a plantação dos vinhedos. Não passe desappercebido a ninguem que a vinha tem sido, e continua a ser, combatida por doenças que talvez só a reconstituição do solo por meio de uma cultura nutriente poderá curar radicalmente.
Estão visivelmente depauperados os terrenos que ha longos annos produzem, a exigencias de uma cultura pouco próvida.
Um dos meus illustres antecessores affimava ha poucos annos, advogando a protecção official aos adubos artificiaes, que, exhaustas como se acham as terras cerealiferas entre nós, a custo se conseguem obter de trigo 8 a 11 hectolitros em media por hectare, 11 a 14 de milho, 6 a 9 de centeio, 10 a 12 de cevada, e que de vinho dificilmente se podem esperar 15 a 20 hectolitros.
Este quadro, senhores, não é extremamente lisonjeiro, porque em confronto achâmos que a França produz hoje em trigo 20 a 30 hectolitros por hectare, e a Inglaterra 30 a 40. Não fallando em alguns paizes da America.
Se quizessemos soccorrer-nos de estatisticas especiaes, organisadas sobre as notas dos governos civis achariamos que a producção do trigo no continente e nas ilhas adjacentes nos annos de 1882, 1883, 1884, se conservou estacionaria, a de milho teve um pequeno augmento, bem como a de aveia, decrescendo a producção do centeio. É certo porém que os direitos cobrados nas alfandegas no ultimo anno economico accusam um augmento de producção muito consideravel.
Mas se estas estatisticas não merecem toda a fé que muito convinha podessem merecer (refiro-me ás notas dos governos civis) e não merecem, por culpa dos lavradores, o que não póde negar-se é a grande importação de cereaes estrangeiros em parte devida ao augmento crescente do consumo, e em parte a que o actual processo das moagens faz perder muito ás qualidades superiores dos nossos trigos, e principalmente prejudicar a sua apparencia na comparação com os estrangeiros.
Se da agricultura passarmos á estatistica da nossa industria fabril, tanto quanto essa estatistica se póde fazer, e se tem conseguido com louvaveis esforços realisar, encontramos epochas distinctas de relativa prosperidade, separadas por periodos extremamente escuros, intervalando tentativas de estudos e esforços de renascimento mais ou menos bem succedidos.