252 DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS
termos da lei, pelos quarenta maiores contribuintes de cada um dos tres bairros - oriental, central e occidental. A sua competência era para organisar os recenseamentos relativamente ás freguezias que compunham cada um dos mesmos tres bairros. Ora estes, passando a ser quatro, aggregando-se-lhes freguezias que eram estranhas á cidade, e passando outras freguezias que são da cidade de uma para outra circumscripção, resulta que as commissões passam a ter attribuições mais largas, e é possivel, e é mesmo certo que alguns, ou mesmo muitos, dos que foram eleitores das commissões de recenseamento não tivessem actualmente a mesma capacidade legal.»
Não sei se o partido progressista esposa esta doutrina.
Tudo isto, sr. presidente, era com respeito á eleição que se havia de fazer. Mas que aconteceu mais? É que mesmo sem o proprio decreto de 17 de setembro fallar em outra irregularidade, foi ella suggerida por qualquer modo ás commissões, a de fazerem a seu talante e a seu capricho, um apuramento dos quarentas maiores contribuintes da contribuição predial para poderem ser chamados em janeiro d'este anno a eleger a commissão de recenseamento.
Não podia nenhuma commissão fazer isto nos bairros novos, nem o sr. ministro o ousou marear no seu decreto; mas ensinou-o provavelmente por meio de algum dos nossos amigos! Pois que para com aquelles que estão dispostos a inclinar-se perante as vontades do ministro ou perante os seus caprichos, temos visto sempre que o governo é excessivamente benevolente; e se ha alguma auctoridade não digo já que reaja, mas que murmure da illegalidade que se pratica, é immediatamente victimada, como aconteceu aqui mesmo na cidade de Lisboa.
De forma que temos um governo, que deve ter os seus agentes em diversos pontos para manter a lei; mas apenas um agente a quer manter, é destituído! Recommenda o governo aos seus agentes, que infrinjam a lei!
E o que é lastima, é que não haja cidadãos que resistam! Eu não me admirava de que os cavalheiros do partido regenerador se inclinassem, como amigos do governo, perante o seu arbitrio; mas que a opposição fizesse o mesmo, é o que é para estranhar. Depois d'estas violencias, veiu, como acontece sempre, a fraqueza.
Todos os governos violentos são fracos. (Apoiados.) E eu não tenho absolutamente receio nenhum dos governos que se levantam com grandes violencias.
Se vejo os poderes levantarem-se com grandes violencias, não tenho receio algum d'elles; esses poderes são fraquissimos.
Todo o governo violento é fraco e por isso se ha tyrannetes que ameçam alguem, riu-me, porque a taes ameaças outra resposta não ha, senão rir a bandeiras despregadas.
Haviam de fazer o que? Nada, haviam de calar-se ou fugir. (Riso.)
Aqui está como o governo procedeu, aqui está como por infelicidade minha, tenho de referir aqui, como procedeu, uma parte da opposição progressista.
O que é certo, porém, é que não escapou mesmo ao publicista a que me referi, o indicar o remedio para a situação irregular em que nos encontrâmos.
Dizia elle:
«Sabemos que não ha meio perfeitamente legal de eleger as commissões de recenseamento em janeiro, mas constituindo-se rapidamente as camaras legislativas poder-se-ha vencer a difficuldade por uma lei de expediente.»
Ora eu adoptei exactamente este conselho, esta doutrina, perfilhei-a e vim aqui apresentar um projecto para isso, e foi por essa rasão que ao apresental-o logo disse, que contava com o apoio de uma parte do partido progressista. Não sei se deva contar ou não, em todo o caso o que direi, é que bem o prega frei Thomás. (Riso.)
Mas o que resulta de tudo isto?
Resulta, que as commissões de recenseamento que estão eleitas ou que foram eleitas, foram-no por collegios eleitoraes illegalmente constituidos; porque não se sabe, se os eleitores que os elegeram eram ou não os que deviam ser, porque em vez de serem apurados na conformidade da lei, foram-no na conformidade do arbitrio das proprias commissões.
E pergunto agora ao illustre chefe do partido progressista, que é membro de uma dessas commissões, se s. exa. não se sente n'uma má posição porque lhe podem lançar em rosto o não estar n'aquelle logar legitimamente eleito; porque o collegio que o elegeu não era legitimo para o eleger.
Pergunto a s. exa., que tantas vezes aqui se levanta, e applaudo-o por isso, para fulminar os que atacam as leis, e para pugnar pela liberdade do suffragio, pergunto a s. exa., repito, se agora com esta pecha g. exa. se póde manter e conservar em uma commissão, sabendo que os que o elegeram para essa commissão se constituiram illegalmente?
E quer a camara saber o que resulta de serem constituídas as commissões por este modo, por esta fórma?
Começando por não saberem se os que as elegeram eram ou não os legitimos eleitores, essas commissões, apenas se constituíram, deram logo prova de desconhecimento da lei; não só não correspondem ao pensamento benefico da lei, nem o comprehendem, mas até desconhecem completamente as disposições legislativas.
Essas commissões, illegalmente eleitas, reuniram-se no dia 25 de janeiro, e estão hoje constituidas. A lei marca que para a cidade de Lisboa e para a cidade do Porto haja em cada bairro um certo numero de secções.
Para que creou a lei estas secções? Qual foi o pensamento que o legislador teve? Evidentemente foi o pensamento de descentralisar os trabalhos, de tornar mais facil aos eleitores o fazerem-se inscrever no livro do recenseamento, de verificarem se eram ou não garantidos os seus direitos. Não podia ter sido outro o pensamento do legislador.
Pois quer v. exa. saber o que acontece? As commissões de secção, uma d'ellas só diz que ha de começar os trabalhos, portanto não sabemos como ella os regulará. E n'este ponto eu ponho de parte a secção a que pertence o illustre chefe do partido progressista, porque essa annunciou que trabalharia, mas ainda não disse quando. As secções do primeiro bairro, essas já annunciaram.
Ora, o primeiro bairro comprehende desde Soccorro, S. Lourenço e S. Thiago até ao Beato, Charneca e Olivaes.
Pois as secções reunem-se todas na rua da Mouraria, e realmente, para commodidade dos cidadãos que habitam no Beato, na Charneca ou nos Olivaes não ha nada melhor de que reunirem-se commissões de secção na rua da Mouraria. Mas ha mais: a commissão reune-se das onze horas da manhã ás tres da tarde, nem mais cedo nem mais tarde; e nos dias santificados não se reúne. Quer dizer que o jornaleiro, o homem que trabalha de sol a sol, que mais facilmente podia vir á commissão no dia santificado, nesse dia a commissão vae repousar.
Será isto comprehender o pensamento da lei? Será isto executar a lei no sentido benefico, que ella parece ter tido? Não é.
Mas querem ver ainda como é que esta commissão comprehende a lei? Diz que o recenseamento ha de estar concluído até 15 de fevereiro. Porque lei se estará regulando? Pela lei de 1878, quando nós temos a lei de 1884, pela qual os prasos vão até 25 de fevereiro. Quer dizer que as commissões, em vez de elucidarem os cidadãos, estão a confundil-os. Não sei se está presente algum membro d'essas commissões; mas esta é a verdade.
Quanto ás commissões de secção do segundo bairro, tambem não posso deixar de apontar o modo como ellas comprehendem a lei. Pertencem ao segundo bairro, o Campo Grande, Lumiar, Ameixoeira e Carnide; pois o eleitor tem do vir aos paços do concelho.
Aqui, ao menos, não se diz que nos dias santificados a