256 DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS
lei tinha sido executada indevidamente ou que negavam a competência da commissão de recenseamento, podiam recorrer para esses tribunaes.
Porque o não fizeram? (Muitos apoiados.)
E, sr. presidente, devo dizer mais uma vez, que não comprehendo esta doutrina liberal, em que os illustres deputados republicanos andam sempre a fallar. Descentralisação constante para tudo, mas ao mesmo tempo querem ver a mão do governo metida em todos os negocios! (Muitos apoiados.)
O meu desejo é diverso. Sustento, como a melhor doutrina liberal, pelo que respeita ao exercicio dos direitos politicos, que o governo deve intervir o menos possivel em negocios d'essa natureza.
Na lei ha recursos para os tribunaes, que hão de decidir, se houver reclamações, a favor ou contra essas reclamações.
É, pois, obrigado o illustre deputado a reconhecer a competencia legal das commissões de que se traia e que ellas têem mesmo a sancção dos tribunaes. (Apoiados.)
Sr. presidente, n'esta ordem de idéas respondo eu tambem a umas arguições que o illustre deputado fez ao governo, de camaradagem com outro partido, a respeito do modo porque procederam as commissões de recenseamento.
Desde que estão estabelecidos recursos para os tribunaes, o governo abstem-se de intervir.
É esta mesma doutrina a que se applicou em relação á commissão do recenseamento do Porto. Sabem todos que esta commissão era partidária da actual situação; e que fez o governo? Declarou nada poder fazer, visto que os prasos estavam fixados na lei e todos podiam reclamar e recorrer.
Por consequencia o facto do governo, em nome da lei, deixar de intervir, demonstra a sua imparcialidade. (Muitos apoiados)
Devo ainda dizer ao illustre deputado, que do mais a mais a lei eleitoral, como s. exa. sabe, manda que cada bairro de Lisboa e Porto, para os effeitos do recenseamento, seja divido em cinco secções.
Note bem o illustre deputado que a lei não diz: «os tres bairros de Lisboa e os dois do Porto.»
Ora desde que a reforma administrativa mandava juntar um quarto bairro, claro está, que era absolutamente necessario, que a esse quarto bairro, se applicasse a mesma doutrina estabelecida na lei de 1884. Só assim se daria cumprimento á lei.
Como queria o illustre deputado, que aparecessem três bairros divididos em cinco secções, cada um, e um quarto bairro só, sem a divisão de secções, nos termos da lei de 1884?!
Era evidente, que o governo percisava de harmonisar todas as leis em vigor sobre o assumpto e de lhe dar a melhor execução possivel; e foi exactamente o que fez. (Apoiados.)
Não desejo tomar mais tempo á camara, nem fatigar-lhe a sua attenção; mas precisamos ver o que pretendia o projecto apresentado pelo illustre deputado, qual era a sua intenção.
Creia s. exa. que eu tambem leio, porque gosto de ouvir a todos e gosto de ler tudo quanto me é possivel ler; mas o que faço sempre é uma escolha nas minhas leituras. O illustre deputado diz que lê tudo e que tem pena de não poder ler mais; tambem eu, mas repito, o que costumo é escolher o que hei de ler e n'essa escolha prefiro, com muito prazer, os trabalhos do illustre deputado, especialmente quando se referem a assumptos que respeitam á pasta dos negocios do reino, que estou gerindo. Li portanto o seu projecto de lei.
Em que consiste elle?
Para evitar uma supposta violação da lei, s. exa. diz: «A camara municipal reune-se com o escrivão de fazenda e trata de apurar os quarenta maiores contribuintes em tres listas, que são, uma para a commissão do recenseamento politico, outra para o recenseamento dos pares, e a outra para o recenseamento do municipio de Lisboa.»!!
E fazia-se tudo isto, sem poder haver, uma só reclamação! Tudo se fazia, segundo o seu projecto, ex equo et bono! (Riso.)
Aqui está o remedio heroico que o illustre deputado descobrio para sanar as difficuldades e as irregularidades, que lhe parece ver n'esta parte da reforma administrativa!
Ora eu sei que se o seu projecto fosse convertido era lei, podia ser accusado de tudo, menos de illegal, porque era lei ; mas o que é preciso saber, é se elle está em condições de poder ser convertido em lei, e que melhorias, que vantagens trazia para a situação actual.
Vejamos o que aconteceu. Aconteceu que as commissões que se achavam legalmente eleitas para os tres bairros de Lisboa, e a que já se achava, tambem legalmente eleita, para o concelho de Belém, com o qual se constituiu quasi todo o quarto bairro, fizeram o actual recenseamento, abrindo e facilitando todos os recursos, contra todos aquelles que fossem indevidamente inscriptos, ou que o não tivessem sido, recursos, que se os houve, deviam ter seguido os seus tramites, recahindo sobre elles o julgamento dos tribunaes competentes.
Depois de tudo isto, é que os quarenta maiores contribuintes apurados n'um recenseamento elegeram as actuaes commissões recenseadoras que estão funccionando.
O que queria o illustre deputado que se fizesse em vez disto? Lá está no seu projecto: reunia-se a camara municipal com o escrivão de fazenda, e á porta fechada, fazia-se tudo, como que em segredo, sem poder haver recurso algum para os tribunaes; e dali sabiam as commissões de recenseamento! E eram essas commissões de recenseamento que, no entender do illustre deputado, ficavam revestidas de toda a auctoridade e que davam todas as garantias aos cidadãos!
Peço desculpa ao illustre deputado, mas não posso concordar com o seu systema. (Apoiados.) E permitta-me dizer-lhe que, apesar de ser legal o que se fizesse em virtude do seu projecto, depois de approvado e convertido em lei, nem por isso a commissão, que fosse eleita teria mais auctoridade do que aquella que está funccionando actualmente.
Eu creio que tenho explicado claramente o meu pensamento. A commissão de recenseamento foi eleita pelos 40 maiores contribuintes apurados pela outra commissão que havia sido eleita no anno passado com todas as garantias legaes.
Quando se fez o apuramento desses 40 maiores contribuintes, abriu-se o recurso para os tribunaes contra qualquer irregularidade praticada por essa commissão; e é depois de decididos esses recursos, se os houve, que a commissão está funccionando.
Pelo projecto do illustre deputado, se elle fosse convertido em lei, a commissão do recenseamento era sem duvida legalmente escolhida pelos contribuintes; mas esses contribuintes tinham, sido apurados pela camara municipal e pelo escrivão de fazenda, sem se abrir recurso contra qualquer irregularidade; e eu confesso francamente á camara que não só acho legal o que se fez até aqui, mas prefiro, pelo lado das garantias, o systema actual, ao que offerece o illustre deputado no seu projecto, que não teria, senão o mérito de ser legal.
E não basta isto, para se dizer que offerece todas as garantias aos cidadãos.
Era legal, mas eu sustento que o que se fez era legal tambem, com a differença de que se fez com todas as garantias, ao passo que, pelo projecto do illustre deputado, nenhumas haveria.
Creio ter respondido aos principaes argumentos do illustre deputado, e se for preciso dar de novo algumas expli-