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SESSÃO DE 30 DE JANEIRO DE 1888

Presidencia do ex.mo sr. José Maria Rodrigues de Carvalho

Secretarias os ex.mo Francisco José de Medeiros

José Maria de Alpoim de Cerqueira Borges Cabral

SUMMARIO

O sr. presidente dá conta de haver recebido uma representação da associação dos empregados do estudo, pedindo que lhe seja votado um subsidio de 8:000$000 réis para poder pagar hoje e de futuro as suas pensões, ou que se providenceie de outra fórma, que melhore as precarias circumstancias em que se encontra. - Dá-se conta de tres officios, dois do ministerio da justiça e uma do ministerio da fazenda, enviando esclarecimentos requeridos pelos srs. Ruivo Godinho, José Novaes e João Arroyo.- O sr. Francisco Machado apresenta e justifica um projecto de lei que manda para a mesa, determinando que o posto de sargento ajudante no exercito seja provido no primeiro sargento mais antigo da sua arma.- O sr. Sant'Anna e Vasconcellos chama a attenção do governo, e faz differentes considerações ácerca da crise que pesa sobre a ilha da Madeira, e que se aggrava de dia para dia, exaltando os animos e arrastando os povos a desatinos. Responde-lhe o sr. ministro da fazenda. - O sr. Arthur Hintze Ribeiro apresenta e justifica, uma representação, que manda para a mesa, da parceria proprietaria da fabrica de tabacos michaelense, estabelecida em S. Miguel - O sr. Frederico Arouca apresenta uma representação dos proprietarios, agricultores e industriaes do concelho de Campo Maior, adherindo ao protesto contra as licenças industriaes.- O sr. Moraes Carvalho, por parte do sr. Lopo Vaz, apresenta uma representação dos mesarios da irmandade de Nossa Senhora a Branca, da cidade de Braga, contra as disposições da proposta de lei n.° 3. - Apresentam requerimentos de interesse particular os srs. Firmino Lopes, Augusto Ribeiro, Goes Pinto, Brito Fernandes e Santos Moreira. - O sr. Ferreira de Almeida apresenta uma nota de interpellação ao sr. ministro da fazenda, e um requerimento, pedindo esclarecimentos, pelo mesmo ministerio.- O sr. Franco Castello Branco apresenta uma nota de interpellação ao sr. ministro das obras publicas, e um requerimento, pedindo esclarecimentos, pelo mesmo ministro. - O sr. José Novaes, referindo-se a uma carta que veiu publicada no Campeão das provincias, e assignada pelo sr. Alexandre de Seabra, em que viu uma injuria para o corpo legislativo, perguntou ao sr. ministro da justiça se já dera ordem para o respectivo delegado proceder contra o signatario d'aquelle documento, ou se tencionava del-a. Responde lhe o sr. ministro da justiça, replica o sr. Novaes e de novo responde o sr. ministro da justiça.- O sr. Arouca requer que se consulte a camara sobre se permittia que se abrisse uma inscripção especial sobre este incidente. A camara resolve negativamente. - O sr. Franco Castello Branco, que tinha a palavra, refere-se ao mesmo incidente, e outra vez responde acerca d'elle o sr. ministro da justiça. - Justificaram na suas faltas ás sessões os srs. José Maria de Andrade, Alfredo Brandão, Antonio de Azevedo Castello Branco, Gabriel Ramires, Mendes da Silva, Baracho, Lopo Vaz e Guimarães Pedrosa.
Na ordem do dia continúa a discussão do projecto n.° 6, sobre as alterações á lei da contribuição industrial. - Usa da palavra, que lhe ficara reservada, o sr. João Arroyo, e falla até ao encerramento da sessão.

Abertura da sessão - Ás tres horas da tarde.

Presentes á chamada 67 srs. deputados. São os seguintes: - Albano de Mello, Alfredo Brandão, Alves da Fonseca, Sousa e Silva, Antonio Castello Branco, Oliveira Pacheco, Tavares Crespo, Simões dos Reis, Hintze Ribeiro Augusto Pimentel, Santos Crespo, Miranda Montenegro, Augusto Ribeiro, Bernardo Machado, Conde de Castello de Paiva, Eduardo de Abreu, Eduardo José Coelho, Feliciano Teixeira, Firmino Lopes, Francisco de Barros, Castro Monteiro, Francisco Machado, Francisco de Medeiros, Lucena o Faro, Gabriel Ramires, Sá Nogueira, Sant'Anna e Vasconcellos, Pires Villar, João Pina, Franco de Castello Branco, Dias Gallas, João Arroyo, Menezes ,Parreira, Vieira de Castro, Teixeira de Vasconcellos, Rodrigues dos Santos, Sousa Machado, Correia Leal, Alves Matheus, Silva Cordeiro, Oliveira Valle, Amorim Novaes, Alves de Moura, Avellar Machado, Ferreira Galvão, Barbosa Collen, Pereira de Matos, Abreu Castello Branco, Laranjo, Pereira dos Santos, José de Napoles, Alpoim, José Maria de Andrade, Rodrigues de Carvalho, José de Saldanha (D.), Pinto Mascarenhas, Santos Moreira, Julio Pires, Manuel d'Assumpção, Manuel José Correia, Mariano de Carvalho, Marianno Prezado, Matheus de Azevedo, Miguel da Silveira, Miguel Dantas, Dantas Daracho e Estrella Braga.

Entraram durante a sessão os srs.: - Moraes Carvalho, Mendes da Silva, Alfredo Pereira, Anselmo de Andrade, Baptista de Sousa, Campos Valdez, Antonio Villaça, Pereira Borges, Fontes Ganhado, Pereira Carrilho. Barros e Sá, Augusto Fuschini, Victor dos Santos, Conde de Villa Real, Elvino de Brito, Elizeu Serpa, Emygdio Julio Navarro, Goes Pinto, Madeira Pinto, Mattoso Santos, Fernando Continho (D.), Freitas Branco, Almeida e Brito, Francisco Beirão, Francisco Mattoso, Fernandes, Vaz, Severino de Avellar, Frederico Arouca, Candido da Silva, Cardoso Valente, Scarnichia, Izidro dos Reis, Souto Rodrigues, Santiago Gouveia, Alfredo Ribeiro, Joaquim da Veiga, Oliveira Martins, Jorge de Mello (D.), José Castello Branco, Ferreira de Almeida, Eça de Azevedo, Dias Ferreira, Ruivo Godinho, Elias Garcia, Figueiredo Mascarenhas, Ferreira Freire, Barbosa de Magalhães, Oliveira Matos, José Maria dos Santos, Simões Dias, Abreu e Sousa, Poças Falcão, Manuel Espregueira, Manuel José Vieira, Brito Fernandes, Pinheiro Chagas, Marçal Pacheco, Pedro Monteiro, Pedro de Lencastre (D.), Pedro Victor, Sebastião Nobrega, Vicente Monteiro e Visconde de Silves.

Não compareceram á sessão os srs.: - Serpa Pinto, Antonio Candido, Antonio Centeno, Ribeiro Ferreira, Antonio Ennes, Gomes Neto, Guimarães Pedrosa, Moraes Sarmento, Antonio Maria de Carvalho, Mazziotti, Jalles, Barão de Combarjúa, Lobo d'Avila, Conde de Fonte Bella, Estevão ,de Oliveira, Francisco Ravasco, Soares de Moura, Guilhermino de Abreu, Guilhermino de Barros, Casal Ribeiro, Baima de Bastos, Joaquim Maria Leite, Simões Ferreira, Jorge 0'Neill, Guilherme Pacheco, Vasconcellos Gusmão, Santos Reis, Julio Graça, Julio de Vilhena, Lopo Vaz, Mancellos Ferraz, Vieira Lisboa, Luiz José Dias, Bandeira Coelho, Visconde de Monsaraz, Visconde da Torre, Wenceslau de Lima e Consiglieri Pedroso.

Acta - Approvada.

EXPEDIENTE

Officios

Do ministerio da fazenda, remettendo, em satisfação ao requerimento do sr. João Arroyo, copia das actas das sessões do conselho de administração da companhia nacional de tabacos, desde a data em que o governo tomou posse.
A secretaria.

Do ministerio da justiça, remettendo, em satisfação ao requerimento do sr. Ruivo Godinho uma relação dos empregados d'esta secretaria aposentados desde fevereiro de 1885 até á presente data.
A secretaria.

Do mesmo ministerio, remettendo, em satisfação ao re-

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querimento do sr. José Novaes, nota do numero de presos entrados na penitenciaria nos annos de 1885, 1886 e 1887,
A secretaria.

REPRESENTAÇÕES

Da associação dos empregados do catado, pedindo um subsidio.
Apresentada pelo sr. presidente, da camara, enviada á commissão de fazenda e mandada publicar no Diario do governo.

Da parceria proprietaria da fabrica do tabacos michaelense, protestando contra a lei de l8 de agosto de 1887.
Apresentada pelo sr. deputado Hintze Ribeiro e enviada á commissão de fazenda.

De proprietarios, agricultores o industriaes de Campo Maior, protestando contra a lei e regulamento da cobrança da contribuição industrial por meio de licenças.
Apresentada pelo sr. deputado Arouca, enviada á commissão de fazenda e mandada publicar no Diario do governo.

Dos mesarios da irmandade de Nossa Senhora A Branca, da cidade do Braga, protestando contra as disposições da proposta da lei n.° 3, do 31 de dezembro ultimo, respeitantes a irmandades e outras instituições analogas.
Apresentada pelo sr. deputado Moraes Carvalho, enviada á commissão de fazenda e mandada publicar no Diario do governo.

NOTAS DE INTERPELLÇÃO

Desejo interpellar o ex.mo ministro da fazenda, sobre a organisação em geral da esquadrilha aduaneira, e em especial sobre a transferencia da séde da circumscripção na costa do Algarve, de Furo para Villa Real de Santo Antonio.= J. B. Ferreira de Almeida, deputado pelo circulo n.° 92.

Requeiro seja prevenido o sr. ministro das obras publicas, commercio e industria, de que desejo interpellal-o ácerca do decreto de 10 de novembro de 1887, que declarou do utilidade publica e urgentes as expropriações de diversas propriedades no mesmo decreto mencionadas, para o alargamento da mata do Bussaco. = Franco Castello Branco.
Mandaram-se expedir.

REQUERIMENTOS DE INTERESSE PUBLICO

Requeiro que, pelo ministerio das obras publicas, seja remettida a esta camara uma nota circumstanciada das despezas feitas com o inquerito industrial em 1881.= O deputado, J. A. da Silva Cordeiro.

Requeiro que, pelo ministerio da fazenda, sejam remettidos a esta camara, os originaes ou copias dos documentos que digam respeito ao material da esquadrilha aduaneira, o bem assim dos que serviram para, determinar a transferencia da sede, na circumscripção do Algarve, de Faro para Villa Real de Santo Antonio. = J. B. Ferreira de Almeida, deputado pelo circulo n.° 92.

Requeiro que, pelo ministerio das obras publicas, commercio e industria, sejam remettidas com a maxima urgencia a esta camara copias authenticas da proposta do inspector floresta, e dos pareceres ou consultas das estações competentes, a que se faz referencia no decreto de 10 de novembro de 1887, o qual declarou de utilidade publica e urgentes as expropriações de algumas propriedades, como necessarias para o alargamento da mata do Bassaco. = Franco Castello Branco.
Mandaram-se expedir.

JUSTIFICAÇÃO DE FALTAS

Declaro a v. exa. e á camara que o sr. deputado Antonio de Azevedo Castello Branco não tem comparecido ás ultimas sessões, nem comparecerá á de hoje, por motivo de doença. = O deputado, Augusto Pimentel.
Participo a v. exa. que faltei a algumas sessões no mez de janeiro por motivo justificado. - O deputado, Alfredo Cesar Brandão.

Participo a v. exa. e á camara, que por doença faltei a algumas sessões. = O deputado, á de Azevedo Castello Branco.

Declaro a v. exa. que, por incommodo de saude, não tenho podido comparecer ás sessões da camara. = Henrique Sant'Anna e Vasconcellos deputado pela Madeira.

Tenho a honra de participar a v. exa. e á camara que não pude comparecer na sessão de sabbado ultimo, dia 28 do corrente mez, por motivo de incommodo de saude. = O deputado pelo circulo n.° 90, José Maria de Andrade.

Participo á camara que o sr. deputado Guimarães Pedrosa faltou a uma sessão da semana passada, falta á de hoje e faltará a mais alguma por motivo de molestia. = Francisco José Machado.

Declaro ter faltado a algumas sessões da camara durante o mez, por motivo justificado. = Gabriel José Ramires.

Declaro que por motivo justificado deixei de comparecer ás sessões de 27 e 28 do corrente. = O deputado, Alfredo Mendes da Silva.

Declaro que por motivo justificado faltei a algumas sessões. = Sebastião Baracho.

Participo a v. exa. e á camara que o sr. deputado Lopo Vau de Sampaio e Mello por justo motivo faltou á ultima sessão e faltará á sessão de hoje. = Moraes Carvalho.

Declaro que por motivo justo não pude comparecer a tres sessões durante o corrente mez. = O deputado, J. A. da Silva Cordeiro.
Para a secretaria.

REQUERIMENTOS DE INTERESSE PARTICULAR

Do enfermeiro naval do l.ª classe Francisco da Silveira Bettencourt, pedindo lhe hoje contado, para todos os effeitos, o tempo que serviu como enfermeiro auxiliar.
Apresentada pelo sr. deputado Augusto Ribeiro e enviado á commissão de marinha

Dos majoras reformados José Rofino de Almeida Figueredo, Martinho José Teixeira Homem, Manuel Teixeira de Magalhães, Thomás Antonio Cardoso de Novaes, pedindo que seja approvado por esta camara o projecto de lei apresentado na camara dos dignos pares pelo exa. sr.mo sr. D. Luiz da Guinara Leme, em sessão de; 9 de corrente, tendente a melhorar o saldo dos officiaes reformados anteriormente á lei de 22 de agosto do anno findo
Apresentados pelo sr. deputado Firmino João Lopes e enviados ás commissões de guerra e de fazenda.

Do major reformado João Bento Pereira, fazendo igual pedido.
Apresentado pelo sr. deputada Goes Pinto e enviado ás commissões de guerra e de fazenda.

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Do major reformado Nuno Augusto Carlos de Figueiredo, fazendo igual pedido.
Apresentado pelo sr. deputado Santos Moreira e enviado á commissão de fazenda, ouvida a de guerra.

De João Francisco das Noves, primeiro sargento da 7.ª companhia de reformados, pedindo melhoria de situação.
Apresentada pelo sr. deputado Brito Fernandes e enviado á commissão de guerra.

O sr. Presidente: - Recebi uma representação da associação dos empregados do estado em que pedem a esta camara um subsidio de 8:000$000 réis para pagarias suas pensões e melhorar as circumstancias precarias em que se encontra. Vae ser enviada a respectiva commissão.
Tambem me podem os signatarios da representação para esta ser publicada no Diario do governo.
foi approvada a publicação.
O sr. Francisco Machado: - Sr. presidente, pedi a palavra para mandar para a mesa um projecto de lei, mas antes d´isso permitta-me v. exa. e a camara, que ou faça algumas considerações, a fim de fundamentar o projecto que tenho a honra de mandar para a mesa.
Antes da reforma do exercito, decretada em 1884, os postos de sargentos ajudantes do exercito eram exercidos pelos sargentos mais antigos e providos pelo ministerio da guerra. Depois da organisação do exercito, determinou-se que os postos de sargentos ajudantes fossem providos por concurso e pela escolha do commandante.
Sr. presidente, dá isto em resultado ser muitas vezes escolhido o sargento mais moderno, ou o que não é mais antigo da comporação, d'onde resulta que a disposição da reforma de 1884 é descabida e prejudicial para a disciplina.
Todos sabem que os sargentos ajudantes são chefes da classe de officiaes inferiores em cada regimento e por isso têem de manter a disciplina e muitas vezes têem de commandar. Por esta circumstancia dá só um facto, que é os sargentos mais antigas, terem sido commandados pelo sargento mais moderno.
Isto é grave para a disciplina.
Tem que se alterar esta disposição, que não dá na pratica o resultado que se esperava. Sendo os sargentos ajudantes chefes de classe do officiaes inferiores, o que acontece é que o sargento mais moderno de um dia para, o outro vae commandar o sargento maio antigo e este, em sendo promovido a official, vae commandar o que o commandou a elle.
E esta a rasão que me faz apresentar este projecto de lei.
Abstenho-me de fazer mais largas considerações, o reservo me para quando é projecto entrar em discussão. O projecto é o seguinte.
(Leu o projecto.)
(O sr. deputado não reviu as notas tachygraphicas.)
O sr. Sant´Anna e Vasconcellos: - Pedi a palavra para declarar a v. exa. que não tenho comparecido ás sessões da camara por incommodo de saude.
Por igual motivo não me foi dado assistir á reunião para que s. exa. o sr. presidente do conselho de ministros convocou alguns dignos pares e os illustres deputados pela Madeira, a fim de discutir as providencias que ao governo cumpria adoptar, em ordem a combater a crise, verdadeiramente assustadora, que tem assolado o districto do Funchal; crise que vem de longa data, e que ultimamente se aggravou até ao ponto do sobresaltar os animos, arrastando os povos das freguezias ruraes a excessos, que nós todos lamentâmos.
Sr. presidente, vi o telegramma que o governo expediu ao governador civil do Funchal, depois da conferencia, e applaudo o governo pela adopção de algumas das medidas que o alludido telegramma promette, e que me parecem, acenadas.
Devo, porém, dizer a v. exa. que se essas medidas podem ate certo ponto attenuar os males que affligem aquella ilha, tambem é certo, que nem todas ellas juntas são remedio efficaz e decisivo.
Sr. presidente, é profunda convicção minha, e não é a primeira vez que o faço sentir n'esta casa, que a regeneração economica da Madeira depende essencialmente de providencias extraordinarias, de medidas energicas, indispensaveis para levantar um povo, que já nada póde, vencido, esmagado pela adversidade. (Vozes: - Muito bem, muito bem.)
A que devem as Canarias a sua actual prosperidade, o seu renascimento economico, depois do profundo abatimento em que as lançara a depreciação da cochonilha? Inquestionavelmente á mais ampla liberdade de transacções commerciaes, ao porto franco, que ali tem attrahido, com grave detrimentado dos nossos interesses, numerosas companhias de navegação, que antigamente iam ao Funchal refazer-se de mantimentos o de combustivel
Sr. presidente, as circumstancias em que se encontra a Madeira, relativamente ás Canarias, onde ha porto franco, a insistente rivalidade d'aquellas ilhas hespanholas, disputando á possessão portugueza a navegação de escala, merece, exige que o governo corresponda, procurando os meios de desenvolver e amparar os interesses madeirenses, ha muito descurados e compromettidos. (Apoiados.)
Offereço este problema á meditação do sr. ministro da fazenda, e espero de s. exa. o que tenho direito a esperar do seu reconhecido talento e dotes superiores de administração.
Sr. presidente, é por igual urgente e imperiosa a necessidade de regular e favorecer a emigração. A Madeira, inhabitavel, como é, em parte consideravel da sua área, não póde comportar 140:000 almas, ou seja 200 habitantes, approximadamente, por kilometro quadrado. Paiz algum do mundo tem população tão densa, accumulada em tão estreita superficie territorial.
Basta dizer a v. exa. que as Canarias, com toda a sua riqueza agricola e commercial, contam apenas 38 habitantes por kilometro quadrado. Aproveite-se a emigração da Madeira, fazendo-a convergir para o Alemtejo, se se realisar a projectada colonisação d'esta provincia.
Chamo a attenção do governo, que não deve limitar-se a attenuar o mal nos seus effeitos, mas investigar-lhes as causas, para o atalhar na origem, chamo a especial attenção do governo para a necessidade de remodelar o contrato de colonias, questão grave e complexa, e por isso mesmo digna do talento do sr. ministro da fazenda. É necessario estabelecer com equidade e justiça as relações e reciprocos interesses entre senhorios e colonos; e promover a uns e a outros, meios de levantarem capitães baratos, salvando os das garras da usura, sob a pressão das quaes, não ha, não póde haver industria agricola que prospere. (Muitos apoiados.)
Sr. presidente, limito-me á simples indicação d'estas medidas, por não julgar opportuno entrar desenvolvidamente na apreciação d´ellas, n'este grave momento, em que a todos nós cumpre auxiliar, e de modo algum tolher a acção do governo (Apoiados. - Vozes: Muito bem, muito bem.)
Agradeço os apoiados com que me honram; mas antes de concluir, sr. presidente, seja-me licito estranhar que não fossem attendidas ha mais tempo as reclamações dos representantes da Madeira, que n'esta e na outra casa do parlamento levantavam a sua voz, pedindo providencias para aquelle districto; e que só hoje se procure obtemperar ás justissimas exigencias d'aquelles povos, depois de terem resultado de tão reprehensivel abandono tumultos, ferimentos e mortes. (Apoiados.)
Tambem, não posso deixar de lamentar que ainda não

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fosse substituida a auctoridade superior do districto, que não teve força nem prestigio (Apoiados) para conter nem reprimir os tumultos. É possivel que essa auctoridade, pelo caminho em que hoje se lançou, agrado áquelles que principalmente contribuiram para o seu desprestigio, pela guerra violenta e anormal que lhe moveram na imprensa funchalense; mas aquelle caminho, o das vindictas e perseguições, a que não têem escapado os proprios correligionarios, não é, de certo, o mais proprio para remover attritos, para conciliar vontades, para serenar os animos irritados e inquietos. (Apoiados.)
A Madeira carece hoje, mais do que nunca, de um governador civil prudente, conciliador, estranho completamente ás paixões politicas locaes, que não esteja n'este momento angustioso, exacerbando mais os animos com vinganças e perseguições, em que tudo é sacrificado a um rancor desnobre,- tudo,- desde a justiça o a dignidade, até ás conveniencias do serviço e considerações de ordem publica.
As resoluções tomadas na conferencia foram communicadas ao governador civil do Funchal por telegramma assignado por dois membros do governo, por pares e deputados; ainda assim faço votos para que se não reflicta n'essas promessas a desconfiança com que o povo olha para a auctoridade, que as tem de fazer conhecidas no districto.
Tenho dito.
Vozes: - Muito bem.
O sr. Ministro da Fazenda (Marianno de Carvalho: - Na primeira parte do discurso do illustre deputado que acaba de fallar, tenho principalmente a agradecer a benevolencia com que s. exa. me tratou.
Quanto á segunda parte, permitta-me v. exa. que não me occupe d´ella, n'este momento. Creio que a questão da Madeira póde ter uma solução, mas o primeiro meio de conseguir-se uma solução que a todos convenha, é que as paixões politicas locaes não venham envolver-se n'ella. (Apoiados.)
Se o illustre deputado, nas considerações que fez, tivesse formulado accusações certas e determinadas contra o sr. governador civil da Madeira, como não era eu o competente para responder lhe, porque não ou o superior imediato d´aquelle funccionario, preveniria o meu collega do reino, para que viesse na primeira sessão que podesse responder a s. exa. e proceder conforme as circumstancias o aconselhassem. (Apoiados.)
O illustre deputado, porém, não fez aceitações determinadas, limitou-se a asserções, muito respeitaveis pela pessoa de quem vem, mas que não passaram de generalidades.
Permitia me portanto o illustre deputado que me abstenha de entrar n'esse debate em que não abstenha mesmo nada que responder a s. exa., por isso que, desde que não ha accusações precisas, não póde haver discussão.
Volto, pois, á primeira parte do discurso do illustre deputado, parte que sinceramente applaudo e á qual me associo do coração.
S. exa. indicou, como meios de acudir á situação da Madeira, tres questões; a questão do porto franco, a questão da emigração e a necessidade da reforma nos contratos de colonia.
Quanto ao porto franco, v. exa. sabe quanto eu sou favoravel ao desenvolvimento das franquias commerciaes. Já procurei por meio de uma proposta de lei, que teve a honra de ser votada por esta camara, desenvolver o estabeleci mento de portos francos n'aquelles pontos da monarchia em que me pareceu que os poderia haver, sem inconveniente para os interesses creados nem para os rendimentos do thesouro.
Na Madeira não me parece que se possa estabelecer já o porto franco; mas o que póde facilmente fazer-se é estabelecer armazens francos o que é differente dos portos francos.
E é preciso não nos illudirmos com uma cousa; e tenho pena de não estar prevenido para esta conversação em que estamos, porque, se o estivesse, teria trazido uns certos esclarecimentos, para mostrar ao illustre deputado que a sorte da navegação das Canarias não e tão favoravel como s. exa. disse.
É certo que as Canarias são porto franco, mas tambem é certo que ali os impostos de sanidade e de tonelagem, que pesam sobre os navios que lá vão, não são nada moderados.
Ora estou convencido que, debaixo d'este ponto de vista, a Madeira com o seu imposto de tonelagem abolido poderá competir com as Canarias.
Repetidas vezes se tem dito n'esta camara (tem-n'o dito o sr. Fuschini desde 1885, e eu já tive occasião de o dizer tambem) que o principal mal da ilha da Madeira e a viciosa constituição da sua propriedade, a qual é indispensavel que os poderes publicos procurem melhorar.
Mas o illustre deputado não póde desconhecer que um defeito de longos annos, que tem raizes na tradição e que contende com o direito de propriedade, não póde ser emendado sem um estudo profundo.
S. exa. sabe que o governo nomeou uma commissão de pessoa que julgou competentes para estudarem a crise economica da Madeira, e que todos aguardâmos com anciedade os resultados dos estudos d'essa commissão para resolvermos a questão.
Quanto á emigração, tem o illustre deputado toda a rasão.
A população da Madeira já era excessiva em relação ás culturas ricas, já era excessiva quando ali predominavam as culturas da canna e da vinha.
O sr. Sant´Anna e Vasconcellos: - E tanto assim que havia uma emigração regular todos os annos.
O Orador: - É exacto. Apesar de existirem as culturas ricas, a Madeira póde dar emigração para o Brazil e para as ilhas de Sandwich.
E todos sabem que existe em Demorara unia importantissima colonia portugueza, que, segundo as ultimas noticias, recebidas por intermedio da auctoridade consular, constava de uma população de 20:000 pessoas, quasi todas da Madeira, em boa situação, procurando educar os filhos, dando-lhes mesmo uma educação scientifica, colonia em fim que prosperava o dava honra, a Portugal.
A emigração, digo, já existencia quando ali havia as culturas ricas, porque já então era excessiva a população. E poior é agora a situação, quando as culturas ricas, as culturas da canna e da vinha, destruidas por calamidades naturais., superiores a todo o esforço humano, desappareceram e foram substituidas por culturas pobres.
E tudo isto é aggravado por difficuldades de transporte, porque a final o augmento extraordinario de navegação no Funchal, emquanto não se melhoraram os meios de comunicação, o que é difficil em ,muitos casos, não dá resultado, porque é quasi impossivel abastecer os navios.
O melhoramento para a Madeira não depende só da melhor constituição da sua propriedade, depende tambem da abertura do vias do communicação, por onde os productos possam ser trazidos aos logares do consummo.
Disse eu que, se a população da Madeira já era excessiva com as culturas ricas, mais excessiva é ainda com as culturas pobres.
O que é necessario é que o governo, pelos meios que tem á sua disposição, e que os illustres deputados pela Madeira, pelos meios de persuassão, façam convencer aquelles povos de que, promovendo-se ali a emigração, não se quer violental-os o vexal-os, antes só quer melhorar a sua situação economica.
E isto não é indifferente.
Quando se chega a dizer om alguns pontos do paiz que o governo é tão tyrannico e barbaro que acaba de publicar uma lei determinando que todas as familias que tiverem cinco filhos serão obrigadas a matar o quinto, quando aqui

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se diz isto, é preciso a boa vontade de todos para persuadirem os madeirenses de que a emigração lhes não é prejudicial. Se o governo procurar estabelecel-a; não é de modo nenhum no intuito de os prejudicar, mas sim de os favorecer. E creio que tem um vasto campo de colonisação na Europa e na Africa.
Tem esse vasto campo na Africa; porque toda a região do Huilla se presta á colonisação europea; temos ainda as regiões de Lourenço Marques, para onde não promovemos emigração portugueza, estando nós na situação de ter em Africa uma das melhores cidades africanas, com auctoridades, mas bem subdios portuguezes.
É necessario attender a esta situação por qualquer fórma, não só no que diz respeito áquelles pontos, mas ainda com relação aos campos que medeiam entre o litoral e a serra do Libombo, onde ha terrenos feiteis e em boas condições de salubridade.
Com esta idéa de colonisação, muito se conseguirá e alguma cousa poderá aproveitar á Madeira; mas para isso, repito, é condição essencial que todos quantos n'aquella ilha têem influencia, sem distincção de côr politica, se associem ao governo, com o pensamento de fazer desapparecer as vozes falsas, com que a maior parte das vezes se desvirtuam as melhorem intenções dos parlamentos e dos governos.
(S. exa. a não reviu as notas tachygraphicas.)
O sr. Hintze Ribeiro: - Sr. presidente, pedi a palavra para mandar para a mesa uma representação da parceria proprietaria da fabrica de tabacos michaelense, em que péde uma indemnização pelos prejuizos que lhe causou a lei de 18 de agosto de 1887.
Peço ao sr. ministro da fazenda para attender á justiça d'esta representação, a fim de lhe ser dada devida satisfação. Antes da lei de 15 de julho o tabaco insulano pagava á sua entrada no continente o direito de procedente de paiz estrangeiro. Esta lei, porém, modificou esta disposição, limitando o imposto só á materia prima, e libertando o fabrico ou manipulação, equiparando assim a industria michaelense á do continente, principio este de toda a justiça.
Para usufruir as vantagens concedidas por esta lei a fabrica reclamante teve de fazer grandes despezas com estudos, que importaram, segundo a mesma representação diz, em cerca de 16:000$000 réis; e mais a construcção de varios barracões para seccadouros, que teve de fazer, cujo custo excedeu a 6:000$000 réis.
A lei de 18 de agosto de 1887 veiu inutilisar todos esses esforços, e fez com que a fabrica ficasse com grande empate de tabacos, cuja quantidade e qualidade é muito superior á que actualmente exige o consumo.
É sabido que n'aquella ilha o principal consumidor é o rural, e esse gosta do tabaco mais barato; ao passo que o tabaco preparado na fabrica, destinado ao continente, é de superior qualidade, e pequena extração tem nas ilhas. D'aqui provem um grande empate do capital para esta fabrica.
Portanto, parece me de toda a justiça que o governo attenda ao que se péde n'esta representação.
O sr. José de Novaes: - Desejava ouvir o sr. ministro da justiça, sobre negocio da maior importancia, e da maxima urgencia. Como s. exa. não está presente, pedia a v. exa. a fineza de o mandar prevenir de que eu desejava ouvil-o ainda hoje sobre assumpto grave; e peço a v. exa. que me reserve a palavra, para logo que s. exa. comparecer.
O sr. Firmino João Lopes : - Mando para a mesa os requerimentos dos majores José Rufino de Almeida Figueiredo, Martinho José Teixeira Homem, Manuel Taveira de Magalhães e Thomás Antonio Cardoso de Novaes, pedindo que seja approvado o projecto apresentado na camara dos dignos pares, na sessão de 9 do corrente, pelo sr. D. Luiz da Camara Leme, para melhor o soldo dos
officiaes reformados, anteriormente á lei de 22 de agosto do anno passado. Peço a v. exa. que da a estes requerimentos o destino competente.
O sr. Arroyo: - Nas sessões de 11 e 13 d'este mez; enviei para a mesa requerimentos, pedindo documentos relativos á questão dos tabacos; e na sessão de 17 pedi os documentos relativos aos contratos de divida lluctuante, e compra de letras sobre estrangeiro. Tambem pedi esclarecimentos sobre os escrivães de fazenda addidos é outros empregados de fazenda.
A maior parte d'estes documentos eram de prompta expedição; mais até hoje não me foi entregue, um unico documento. V. exa. comprehende, portanto, que diante d'este facto, verdadeiramente, inexplicavel; e não podendo eu prescindir d'esses esclarecimentos para dirigir varias perguntas ao sr. ministro da fazenda, e talvez até para formular notas de interpellação, não posso deixar de vir hoje instar pela remesssa.
O sr. Ministro da Fazenda (Marianno de Carvalho): - Eu posso assegurar ao illustre deputado, que tenho dado ordem no ministerio da fazenda para que seja demorada a remessa de nenhum documento, pedido por qualquer illustre deputado. O anno passado por exemplo, foi pedida n'esta camara uma relação dos empregados de fazenda, que estavam addidos, e na camara dos, pares, foi pedido igual documento, pelo sr. Vaz Preto. Ora, tendo eu mandado essa nota ao sr. deputado Avellar Machado; é claro que não quero sonegar a ninguem qualquer documento.
Repito, que tenho dado ordem para que todos os esclarecimentos sejam enviados sem demora, e lembro-me até, que já assignei um ou dois officios de remessa. Porém, á respeito de alguns documentos, a sua remessa ha de ser fatalmente demorada, qualquer que seja a minha boa vontade.
Por exemplo, o sr. Arroyo pediu esclarecimentos sobre os contratos de divida fluctuante, e compra de letras sobre o estrangeiro, e esses documentos podem vir com brevidade, e tenho á certeza de que em poucos dias chegarão á camara. Mas, por outro lado, o illustre deputado pediu a conta da administração dos tabacos da companhia nacional, e não sei se da brigantina, e da companhia das barreira de Xabregas, que estão sob á administração do estado.
Quanto á companhia de Xabregas não posso dar explicações, porque não ha contas nenhumas, porque a fabrica, está fechada.
Sobre as companhias nacional e brigantina, o illustre deputado é muito intelligente para comprehender que documentos que dizem respeito ao apuramento de contas do anno não é facil remettel as para a camara com brevidade. Eu faço todos os esforços para que essas contas se liquidem, e logo que estejam liquidadas os documentos virão á camara.
Repito, o illustre deputado deve comprehender que contas de administração durante mezes e anno não se podem fazer de um momento para o outro.
(Interrupção do sr. Arroyo)
Todos aquelles que poderem ser mandados immediatamente, eu darei ordem para que o mais depressa possivel sejam enviados a esta camara.
O illustre deputado que o anno passado desejou ir ver á secretaria da fazenda os documentos sobre a divida fluctuante, sabe muito bem que não se lhe escondeu cousa alguma; se s. exa. este anno quizer seguir o mesmo processo, a secretaria está á sua disposição.
Não tenho interesses em demorar a remessa d'esses documentos; antes pelo contrario, tenho desejo de os remetter.
O sr. José Novaes: - Eu li no jornal Campeão das provindas uma carta que contém uma injuria para os membros do poder legislativo.
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Esta carta é assignada pelo sr. dr. Alexandre Seabra, sogro do sr. presidente do conselho.
Envolvendo essa carta expressa e terminantemente uma injuria aos membros do poder legislativo, o individuo que a assigna está incurso n'um crime previsto e punido pela nossa lei penal.
Pergunto ao sr. ministro da justiça se o procurador geral da corôa já deu ordem ao respectivo delegado a fim de proceder contra a injuria do signatario da carta, ou se tenciona dar ordens para que o delegado competente proceda como é de lei.
Espero a resposta do sr. ministro, e peço a v. exa. que me reserve a palavra para depois da resposta de s. exa.
O sr. Ministro da Justiça (Francisco Beirão): - Em primeiro logar tenho a dizer ao illustre deputado que só n'este momento fui previnido, achando-me na camara dos dignos pares, de que na camara dos senhores deputados era reclamada a minha presença para se me fazerem algumas perguntas; em vista d'esse aviso aqui estou, como era do meu dever, para dar as explicações que me forem pedidas pelos illustres deputados.
Vejo que o illustre deputado o sr. José Novaes se refere a uma carta de que só hoje tive noticia por a ver transcripta n'um jornal da capital.
S. exa. alludindo a essa carta e fazendo sobre ella as considerações que lhe pareceram convenientes, perguntou se eu já dei ordem ao competente representante do ministerio publico para intentar qualquer processo contra o signatario da carta.
O illustre deputado sabe que eu desejo ser logico com os principios que estabaleça, S. exa. não póde ignorar que ha uma circular que fiz expedir ao procurador geral da corôa e fazenda, para ser distribuida por todos os agentes do ministerio publico, circular que teve larga publicidade, pois não saiu no Diario no governo, em que se recommendava muito particularmente a todos os representantes do ministerio publico que para promoverem dentro dos termos legaes, a repressão dos crimes, não houvessem de esperar instrucções espyciaes com respeito a determinados processos. Ficaram, pois, avisados de que quando entendessem que haveria crime, em que tivessem competencia para intervir, deviam sempre proceder independentemente de qualquer instrucção ou ordem, do governo.
Era esta a minha opinião ha muito tempo, antes de entrar nos conselhos da corôa.
E, como tinha visto algumas vozes em duvida, se os gentes do ministerio publico poderiam promover, especialmente d´aquelles assumptos que mais directamente diziam respeito aos chamados crimes politicos, sem ordem superior, eu fiz expedir esta circular, em que me fundamento precisamente na conveniencia de afastar do governo em certos casos, a suspeita de dar o caracter do actos politicos a determinados processos.
Os meus principios são os que se acham estabelecidos n'aquella circular, aos quaes hei do sempre obedecer.
Sem, pois, fazer consideração alguma, relativamente á carta que appareceu, e do que não tive conhecimento senão pela transcripção, que repito, vi hoje n'um jornal da capital, direi unicamente ao illustre deputado, que aguardo o que o agente do ministerio publico da circumscripção competente, entender dever fazer, o se a opinião que elle seguir for conforme á minha, hei de sustental-a como de empregado da confiança do governo; e, no caso que elle proceda por modo, que entenda contrario á minha opinião, eu hei de fazer-lh'o sentir, o tomar as convenientes providencias.
Espero as necessarias informações; hei de saber o que se pasmou; e n'esta ponto, declaro ao illustre deputado, que, e o modo porque esse magistrado haja de proceder, for conforme a minha opinião, n'este caso, por elle hei de responder inteiramente perante o parlamento. (Muitos apoiados.)
O sr. Presidente: - O sr. José Novaes pediu novamente a palavra, mas é preciso que s. exa. requeira que eu consulte a camara para lhe dar a palavra.
( sr. José Novaes: - Então faço esse requerimento a v. exa.
Consultada a camara resolveu que fosse dada a palavra.
O sr. José Novaes: - É extraordinario que O sr. ministro da justiça appelle para a sua coherencia! S. exa. disse: "que passou uma circular aos representantes do ministerio publico para que elles procedessem, sem ordem do governo, quando entendessem que era conveniente proceder!"
Mas nós vimos que ha dois mezes o governo deu ordem aos representantes do ministerio publico em Lisboa para procederem na questão dos titulos Hersent! (Apoiados.) E então não tinha já s. exa. publicado essa circular? De certo já. E é em nome d'essa coherencia que s. exa. demonstra, que deu ordem aos agentes do ministerio publico para que procedam n'este caso?
Não sei se a camara tem conhecimento da carta, que do mais a mais vem transcripta em todos os jornaes, inclusivamente n'um jornal de Lisboa, cuja direcção politica se diz que pertence ao sr. presidente do conselho.
N'essa carta diz-se o seguinte:
" Se os bandoleiros entenderem que estes attentados lhes servem para algum garoto nas camaras, ou algum escrevinhador de gazeta gritar que o sr. presidente do conselho perdeu mesmo a consideração que aqui lhe tributaram sempre os seus vizinhos, nada me incommoda que façam longas expandes da sua balofa rhetorica. A verdade é conhecida de todos."
É extraordinario que se diga isto! (Apoiados.) E tão extraordinario que se deu um crime previsto e punido pelo artigo 411.° do codigo penal, que diz assim:
Artigo 411.° Se os crimes declarados nos artigos 407.° e 410.° forem commettidos contra corporação, que exerça auctoridade publica, a pena será de prisão correccional até seis mezes, no primeiro caso, e a do artigo 407.°, no segundo caso.
"§ unico. Se forem commettidos contra alguma das camaras legislativas, a pena será a de prisão correccional até seis mezes e multa até um mez."
Admitte o supposto de que todos, uma parte ou, pelo menos um, é garoto, isto é uma offensa e constitue um crime, em que o delegado do ministerio publico não póde deixar de proceder, e o sr. ministro da justiça, em nome da coherencia, não póde deixar de dar ordem para se proceder contra quem não tem a coragem de dizer qual é o individuo a que se refere, acobertando-se talvez com os setenta annos de idade, que o tornam, irresponsavel mas nem por isso póde deixar de ser julgado, como é de justiça, em nome da coherencia e da lei.
Vozes: - Muito bem.
O sr. Ministro da Justiça (Francisco Beirão): - Salvo o muito respeito que me merece o illustre deputado, como eu disse que não podia n'este momento pronunciar-me sobre o facto, a que s. exa. alludiu, não posso, por isso, acceitar a discussão que s. exa. renova; mas apesar d'isso não devo deixar de fazer uma simples referencia ás observações de s. exa., e é que o signatario da carta a que s. exa. se referiu, é um homem dignissimo e que tem prestado relevantissimos serviços a este paiz. (Muitos apoiados.)
Nada mais com relação a este ponto.
Para defender a minha coherencia eu poderia simplesmente limitar-me a dizer que no tocante ao processo a que s. exa. se referiu, não lhe faltei por fórma alguma, allogando que não tendo o ministerio publico ainda entendido dever instaurar o processo, e não mo conformando eu com isso, mandei que se instaurasse o processo. Isto dito, é claro que estava, n'esse caso, na mesma situação, em que mo conservo hoje. Devo, porém, lembrando ao illustre depu-

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tado, ter s. exa. allegado que no caso presente havia um crime, dizer-lhe, que emquanto ao outro caso, a que s. exa. se referiu, se mandou instaurar processo judicial para se averiguar, pelos meios que a justiça tem ao seu alcance, de certos factos, para só apreciar a criminalidade que n'elles podesse haver. Portanto, não ha incoherencia da minha parte; por um lado, não havia ainda processo de investigação, e eu ordenei que se intentasse; hoje ainda não sei o que ha Aguardo, pois, os acontecimentos, hei de tomar uma resolução e responderei, repito, pelos meus actos perante a camara. Hoje, s. exa. comprehende-o perfeitamente, não posso, nem devo, passar d'aqui.
Vozes: - Muito bem.
O sr. Arouca: - Requeria a v. exa. que consultasse a camara sobre se annuia a que se abrisse uma inscripção especial sobre o assumpto.
O sr. Presidente: - V. exa. não tem a palavra senão quando lhe competir na altura da insenpção; se algum sr. deputado que se siga no uso da palavra quizer póde fazer o requerimento.
O sr. Ferreira de Almeida: - Usando da palavra na inscripção que estava aberta para antes da ordem do dia mando para a mesa uma nota do interpellação ao sr. ministro da fazenda.
(Leu.)
Já que estou no uso da palavra e conhecendo o desejo d'este lado da camara, peço a v. exa. que a consulte sobre se permitte que se abra uma inscripção especial sobre o incidente da carta do sr. dr. Alexandre de Seabra relativamente a phrase que se julga offensiva da dignidade parlamentar. (Apoiados.)
Consultada a camara resolveu negativamente.
O sr. Franco Castello Branco: - Manda para a mesa uma nota de interpellação acompanhada de um requerimento, que leu, pedindo á mesa que envide todos os esforços para que o documento requerido lhe seja enviado.
Que o anno passado tivera a honra de mandar para a mesa um requerimento, pedindo alguns documentos que lhe eram indispensaveis para interpellar o sr. ministro das obras publicas ácerca da variante do caminho de ferro da Beira Baixa, conhecida pelo nome de variante do tunnel da serra da Gardunha.
Que esta questão já tinha sido por elle levantada antes da ordem do dia por uma fórma que lhe parecia bastante para que o sr. ministro da obras publicas não fugisse a mandar esses documentos, que declarou indispensaveis para realisar uma interpellação.
É certo que s. exa. nunca os mandou, não podendo por isso realisar a sua interpellação.
Este anno, para que não succeda o mesmo, se o comportamento do sr. ministro se pautar pelo do anno passado, é que manda desde já a nota da interpellação para a mesa, porque sem documentos ou com documentos está resolvido a realisar a sua interpellação.
Visto que estava com a palavra, e pelo caminho que as cousas íam tomando, porque, em virtude da vontade que a maioria e o governo têem não é facil discutir com a largueza que é necessaria um incidente que tem importancia principalmente sob o ponto de vista moral e politico, ia referir se, ainda que muito brevemente, ao que disse o sr. ministro da justiça.
Que s. exa., respondendo ao sr. José Novaes, encerrou-se por assim dizer n'um absoluto non possumus, não querendo por fórma nenhuma manifestar a sua opinião, opinião que tem obrigação de manifestar sobre qualquer assumpto de administração ou negocio que corra pela sua pasta. (Apoiados.)
S. exa. encerrou-se n'um absoluto non possumus, dizendo que não podia n'este momento, nem expressar a sua opinião ácerca do conteudo da pergunta do sr. José Novaes, nem indicar o procedimento que vae ter com relação ao facto que por elle lhe foi posto era relevo.
Que não exigia muito do sr. ministro da justiça; mas, para bem do s. exa. e dignidade da camará, julgava-se constituido na obrigação e no direito do pedir s. exa. que expozesse os motivos por que, sendo interrogado no parlamento por negocios que correm directamente pela sua pasta, s. exa. se levanta para declarar ao deputados, que lhe faz uma pergunta, que não póde n'este momento acceitar discussão sobre este assumpto. (Apoiados )
S. exa. tem n'isto motivos pessoaes? Declare o á camara, porque póde ter a certeza de que os deputados da opposicão não têem duvida nenhuma em adiar para outra sessão, quando estes motivos tenham cessado, a continuação d'este incidente, porque creia o governo e a maioria que não é com uma votação da camara em negou os d'esta ordem que se póde tapar a bôca aos deputados da opposição. (Apoiados.)
Que aproveitava a occasião de o declarar perante o parlamento, que não se importava com qualquer injuria que seja feita collectivamente a um grupo a que pertença. As injurias ou os doestos não valem senão pela coragem como são feitos. (Apoiados.) Desde o momento em que pessoalmente lhe não dirijam uma injuria ou um doesto não tinha nada com isso. O resto é quichotesco.
Que não era Sancho Pansa, nem D. Quichote; procurava tomar o meio termo.
Que não se tratava individualmente de qualquer dos membros, quer da maioria, quer da opposição parlamentar, mas do parlamento portuguez. (Apoiados.) Não se tratava da camara dos deputados, nem da camara dos pares; tratava se de ambas. (Apoiados.)
Na camara dos pares, homens respeitabilissimos pelo seu caracter, pelo seu passado, pelo seu talento é pela sua isenção, fizeram considerações, dirigiram perguntas ao sr. ministro do reino sobre o acontecimento, que é por assim dizer o motivo principal da carta do sr. dr. Alexandre de Seabra. Que n'esta casa do parlamento, tambem alguns dos seus membros, e era um d'elles, dirigiram perguntas ao governo a este respeito, e o sr. ministro da fazenda, que, o estava ouvindo, o lhe dou a honra de lhe responder n'essa occasião, havia de estar lembrado do que acrescentara, que elle, assim como todos os membros da opposição parlamentar, sentiam muito que o facto só tivesse dado. (Apoiados.} E como só agradeceu isto ? Por aquella forma, do que provavelmente s. exa. e todos têem já conhecimento. Não se arrepende de o ter feito; cumpriana aquelle momento o seu dever, lamentando, como lamenta hoje, esse facto. Referia-se ao sr. dr. Alexandre de Seabra, por que era impossivel tratar d'isto sem se referir a elle. Não insultou nem o offendeu. S. exa. está n'aquella idade em que não póde dirigir offensas, nem ellas lhe podem ser dirigidas, é portanto podia referir-se ao seu nome.
Repete, lamenta que o acontecimento só desse. S. exa. julgou dever endereçar aquelle bilhete de agradecimento. Nada tinha absolutamente com isso. Comtudo, sob o ponto de vista da dignidade parlamentar e das relações em que aquelle cavalheiro estava para cora o chefe do gabinete, as suas palavras têem para com todos uma auctoridade muito diversa do que poderiam ter partindo de qualquer outro particular. (Apoiados.)
Encarada a questão d'esta fórma, crê que nem o sr. ministro da justiça, nem o governo, nem nenhum dos membros da maioria imaginam que ella póde ficar n'uma simples pergunta, muito legitima e muito justificada, feita por um deputado, e uma resposta do sr. ministro da justiça, de que nada sabe, nada quer dizer, aguardando os acontecimentos.
S. exa. vae guardando os acontecimentos, quando a dignidade do parlamento não é acatada nem respeitada, como é a honra do governo. Que ha mas de dois mezes que nos jornaes d'esta cidade, pertencentes a diversas fac-

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ções e cores politicas, a dignidade do governo tem, por assim dizer, sido espesinhada, atacada violentamente. Se s. exa. cuida que o parlamento ha de proceder da mesma fórma, está completamente enganado. (Apoiados.) S. exa., que é membro do governo, entende que aquelles direitos, aquellas criticas, aquellas apreciações que têem sido dirigidas aos membros do governo são justificadas, por isso não tem mandado instaurar processo. Isso era com s. exa., porque elle, orador, havia de ser mais papista que o papa. Que, desde que se trata da dignidade do parlamento e nem do governo, podia s. exa. ter a certeza de que, nem elle, nem os seus amigos se calam, e hão de tratar esta questão com firmeza, dignidade e a tranquillidade de quem tem confiança nos seus direitos, e está, por consequencia, constituido na obrigação de fazer cumprir aos outros os seus deveres. (Apoiados.)
E mais nada, visto que o sr. ministro da justiça não queria dizer a rasão do seu non postumus. Se era uma rasão pessoal, devia acatal-a ; se era uma rasão de ordem publica e administrativa, s. exa. não devia ter segredos para o parlamento; (Apoiados.) mas tinha obrigação de dar explicações ácerca dos negocios que correm pela sua pasta. Apresente s. exa. á camara essas rasões; se forem funda das e justificadas, não estão tão impacientes que não possam esperar. O que querem é que se faça justiça. Esperam pelo processo, e comtanto que elle seja mais efficaz, terá o seu apoio, e póde s. exa. ter a certeza que nada mais dirão a este respeito.
Vozes: - Muito bem.
O sr. Ministro da Justiça (Francisco Beirão): - Felizmente que o illustre deputado e eu estamos perfeitamente de accordo. Parece paradoxo, mas é verdade.
S. exa. diz que esta questão não póde deixar de ser tratada com toda a largueza e que póde ser adiada. É exactamente o que eu digo. (Apoiados.)
O governo responde pelos seus actos. (Apoiados.) Tenha s. exa. paciencia que não hade esperar muito por qualquer acto da minha parte positivo ou negativo, porque eu virei dar inteira satisfação d'elle, e discutiremos a questão com toda a largueza e amplitude, e eu, repito, tomarei completa, perante o parlamento, a responsabilidade dos actos que forem praticados pelos agentes do ministerio publico, que continuem a merecer a minha confiança. (Apoiados)
Portanto estamos perfeitamente de accordo em addiar este assumpto, e ainda quando eu quizesse discutil-o n'este momento, não o devia fazer porque me é absolutamente defeza pela votação da camara. (Apoiados.)
O outro ponto em que estamos de accordo é sobre o ficar a defeza da honra do governo a cargo d'elle proprio.
Muito bom. Saberemos defender a nossa honra, quando ella for atacada (apoiados) por fórma que nós entendamos carecer de tal defeza. Sempre que a nossa honra individual ou collectiva for offendida seremos os juizes do que devemos fazer. (Apoiados.) Esteja o illustre deputado tão descansado sobre este assumpto como o governo está.
Vozes: - Muito bem.
O sr. Presidente: - Passa-se á ordem do dia. Os srs. deputados que tenham quaesquer papeis a mandar para a mesa podem fazel-o.

ORDEM DO DIA

Continua a discussão do projecto n.º 6, sobre alterações a lei da contribuição industrial

O sr. Presidente: - Tem a palavra o sr. Arroyo.
O sr. Arroyo: - Continuando no uso da palavra que lhe ficara reservada da (ultima sessão, recapitulou os principaes argumentos do que se servira para combater o projecto que se discute, o disse que, ao terminar a sessão se occupava de demonstrar que em nenhum artigo da lei de 15 de julho de 1887 se encontrava uma só palavra ou phrase pela qual o sr. ministro só julgasse auctorisado a fazer uma transformação nas taxas, ou a estabelecer a pena de prisão na contribuição industrial, a qual pelo caracter especial da sua natureza devia ter uma regulamentação benigna, liberal e democratica.
A questão respectiva á pena de prisão era aquella que até certo ponto mais tem levantado a opinião publica, e a ella tinha de se referir com alguma largueza, por isso que, julgava necessario fazer uma inquirição completa do que se achava estabelecido, não só com relação á contribuição industrial, mas tambem n'outras contribuições, cujos diplomas o sr. ministro tinha ido buscar em seu auxilio.
Era preciso que se fizesse uma demonstração o mais lucida que fosse possivel, para se ficar conhecendo bem que fóra abusiva, illegal e despotica a maneira como o sr. ministro fizera uso da auctorisação que lhe foi concedida.
Disse que, tratando-se da contribuição industrial, era necessario não atacar as tradições implantadas na legislação patria, e era preciso que o proletario, o operario e o pobre fossem tratados, não só com toda a justiça, mas com toda a benignidade.
Era necessario que se não dessem a estes homens, que vivem do seu trabalho, que ganham dia a dia o seu sustento e o de suas familias, motivos suficientes para fazerem apressar o apparecimento da questão social, que lá fóra é tida em toda a consideração pelos governos e parlamentos. Parecia-lhe que era chegada a occasião de no parlamento portuguez se pensar muito seriamente da sorte d'esta classe.
Disse que o sr. ministro da fazenda assegurara que na lei de l5 de julho estava a auctorisação ao governo para applicar a pena de prisão ao contribuinte que não satisfizesse a multa, e na sua opinião tal auctorisação se não encontrava.
A lei de 15 de julho não dizia que, por meio de qualquer interpretação, uma tal pena podesse ser imposta. Era preciso que a lei, em que o regulamento se fundava, o declarasse positivamente.
O governo não podia legislar em materia penal sem auctorisação do parlamento, porque, se assim não fosse, a liberdade do cidadão ficava dependente da vontade dos ministros. E tendo o sr. ministro excedido os limites do codigo penal, e não se havendo referido ao diploma que o auctorisára a assim proceder, s. exa. exorbitára da auctorisação parlamentar.
Analysou a legislação que regula as contribuições de sêllo e de registo, no sentido de fazer ver que as penas estabelecidas no regulamento de contribuição industrial, não estavam auctorisadas, e que as penas de multa e de prisão só podiam ser fixadas pelo poder legislativo.
A este respeito fez largas considerações, declarando que, em face da lei, o governo carecia de um bill de indemnidade que o relevasse da responsabilidade em que incorrera.
Seguidamente passou a analysar a portaria de 24 de dezembro, dirigida pelos sr. ministro da fazenda ás diversas auctoridades e empregados fiscaes, aos quaes competia a execução do regulamento de 8 de setembro. Uma tal portaria parecia-lhe que era só por si uma dictadura tão grande como a que o governo fez em 1886, porque era contraria aos diplomas legaes estava em opposição com o que foi votado pela camara, e era contraria ao proprio regulamento.
Perguntava o que era que vigorava, se a portaria se o regulamento, por isso que a portaria revogava as disposições do regulamento, e as disposições d'este as da portaria. A qual dos textos tinham de obedecer os empregados fiscaes ?
Havendo contradições entre estes dois documentos, havia inconstitucionalidade.
Depois da portaria tinha vindo a suspensão do regulamento por meio de um edital do governador civil do Porto, antecipado por rima declaração official n'um periodico da provincia. O regulamento nada mais fazia do que dar uma fórma pratica cio execução á lei, e o sr. ministro suspen-

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dendo a execução do regulamento por meio de um edital, suspendera a execução da lei.
Tinha visto a este governo praticar a dictadura de 1886; tinha-o visto praticar dictadura contra o sr. deputado Ferreira de Almeida, mas fazer dictadura por meio de um edital do governador civil do Porto, só agora. E fizera-se mais: a dictadura fôra annunciada por um jornal, o qual se declarára auctorisado a annunciar que as multas não seriam cobradas emquanto o parlamento não tomasse uma decisão.
Isto era uma desordem nas praxes da administração, e uma falta de respeito que o governo tinha por si e pelo poder legislativo. Entrar em dictadura por uma declaração official de um jornal e depois por um edital, não sabia que melhores meios houvesse para desprestigiar um governo.
Aqui estavam os motivos ponderosos por que apoiava o bill de indemnidade ao governo, proposto pelo sr. Julio de Vilhena. Entendia que o governo estava n'uma situação anormal, e continual-o-ía a estar emquanto o parlamento não o relevasse da responsabilidade em que incorrêra, suspendendo a execução da lei de l5 de julho e do regulamento de 8 de setembro. E portanto, sendo inconstitucional o procedimento do governo, forçoso era votar-lhe um bill de indemmidade.
Tratou depois do projecto em si, atacando os atigmentos propostos da contribuição, e combatendo inteiramente o systema das licenças, na adopção da qual o governo tinha constantemente fugido é que havia de acabar de todo,
pois os contribuintes não a supportavam.
Depois de fazer uma analyse dos differentes artigos do projecto, disse que o sr. presidente do conselho declarara outro dia que o governo ficava. Estimava isso muito, mas não podia deixar de dizer que com o governo ficavam o testemunho da leviandade dos seus actos, os seus maus processos de administração, e todos os diplomas dictatoriaes que publicara.
Tinha o sr. presidente do conselho dito tambem outro dia que a opposição o que queria era subir ao poder; elle, orador, queria outro governo, fosse elle qual fosse, por entender que os actuaes srs. ministros já não estão em situação de fazer caminho direito; queria que viesse um governo qualquer, comtanto que administraste prudentemente e á luz do dia.
A opposição o que fazia era protestar, dentro dos limites do direito parlamentar, não só contra todo o passado politico de s. exa., mas tambem contra todo o seu proceder politico de hoje, que era cheio do erros e de, leviandades.
Não votava o projecto porque elle importava um augmento de encargos para as classes operarias, e porque se haviam pedido 2.000:000$000 réis de impostos, no momento em que no espirito publico não havia disposição para supportar um aggravamento de impostos.
O governo na questão das licenças recuara, e foi a commissão de fazenda que fizera com que, em logar de obrigatorias, fossem facultativas, isto porque a commissão previra que a opinião publica as mão acceitaria. Por consequencia, a commissão andára habilmente tornando ás licenças facultativas, mas o que lhe parecia que ella devia, ter feito era acabar com as licenças de vez.
Hoje a execução do systema de licenças dependia unicamente da boa vontade do contribuinte, porque se elle as não quizer tirar, não as tira, e por conseguinte o que se via era que o governo não teve força para sustentar a sua medida.
Apresentou ainda outras considerações e terminou dizendo que o governo, não querendo acceitar a proposta do sr. Julio de Vilhena, commettia um grave erro para si e para o paiz.
(O discurso será publicado na integra quando o orador restituir as notas tachygraphicas.)
O sr. Presidente: - A ordem do dia para ámanhã é a continuação da que estava dada para hoje e mais o projecto de lei n.º 8 relativo ao codigo commercial.
Está levantada a sessão.
Eram seis horas e dez minutos da tarde.

Redactor = Rodrigues Cordeiro.

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