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DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS
Chagas. Esta maravilhosa e fecunda idéa do serviço militar obrigatorio está hoje em execução não só em todas as grandes nações da Europa, á excepção da Inglaterra, mas tambem nos paizes de segunda ordem. Creio que a unica nação que se tem recusado ao serviço obrigatorio é a Belgica, cuja neutralidade está reconhecida pelo tratado.
Na Hollanda ainda não existe tambem o serviço obrigatorio, mas a esta idéa já quatro ou cinco ministros da guerra têem sido sacrificados. Na Hespanha ainda imperam os quintos e nós temos o recrutamento. Portanto, o serviço pessoal obrigatorio é urgentissimo que se traduza em factos. Se é preciso que se organise um verdadeiro exercito; se é preciso que os cidadãos portuguezes vão assentar praça e praticar na vida soldadesca, e portanto exercitarem-se para estarem aptos e promptos para a defeza da patria quando corra risco, creia o nobre ministro que só se alcançará com o serviço pessoal obrigatorio.
Passemos porém a outras considerações. A nossa lei eleitoral carece de reforma. (Apoiados.)
Devo dizer a v. ex.ª e á camara, como já o disse no seio da commissão a que tenho a honra de pertencer, e como o disse n'uma conversação particular ao nobre presidente do conselho da situação transacta, o sr. marquez d'Avila e de Bolama, que approvo os principios consignados na proposta de lei que está submettida ao exame e deliberação d'esta camara, porque o sr. marquez d'Avila e de Bolama não fez senão consignar n'essa sua proposta de reforma, da lei eleitoral os principios que tinham sido approvados na commissão e que eu havia defendido. (Apoiados.) Portanto eu approvo em principio aquella reforma. Mas agora pergunto: será possivel que o actual ministerio, onde vejo o meu dilectissimo amigo o sr. Thomás Ribeiro, a quem congratulo, congratulando o paiz, porque o sr. ministro da marinha symbolisa um elevadissimo caracter, (Apoiados.) um coração generoso (Apoiados), um caracter aberto a todas as nobres aspirações, que levantam a humanidade (Apoiados.); e s. ex.ª que foi relator da commissão de reforma eleitoral sobre que de accordo com a maioria se approvaram os principios consignados n'aquella proposta do lei; pergunto, será possivel que o governo que, actualmente se senta nas cadeiras do poder, queira renegar estas idéas recusando o seu assentimento á proposta de reforma da lei eleitoral? Não quero acredital-o. Os deveres de coherencia são muito fortes, e por isso espero que esta reforma se realisará. Mas é necessario mais. Eu peço não só a reforma da lei eleitoral, mas tambem a construcção do caminho de ferro da Beira Alta (Apoiados); e ainda n'este intuito invoco em meu auxilio os srs. Thomás Ribeiro e Lourenço de Carvalho. (Apoiados.)
A construcção do caminho de ferro da Beira Alta é exigida pelos interesses publicos (Apoiados); satisfaz a uma aspiração justa d'este paiz (Apoiados), e é uma necessidade impreterivel da civilisação. (Apoiados.)
É preciso começar a construcção dos caminhos de ferro das Beiras, que são as arterias por onde se engorgila o sangue do paiz, e por consequencia é necessario attentar seriamente neste problema que tacitamente está mais que resolvido.
A linha ferrea da Beira Alta está estudada por modo tal que seria já ridiculo, que alguem se lembrasse de pedir tempo para novo estudo. (Apoiados.)
Outra questão ha que será conveniente resolver, tal é a instituição do registo civil. (Apoiados.)
Nós temos o codigo civil que muitas vezes tem sido apresentado como um dos brazões do partido regenerador, e se o registo civil não existe é porque, está dependente de um regulamento. Escuso de defender a necessidade e a utilidade do registro civil (Apoiados.) só digo que a não existencia d'elle é uma vergonha para o paiz. (Apoiados.)
Muitos outros pontos eu podia citar, mas as minhas idéas são conhecidas. Nunca as sophismei, nunca as encobri, nunca as calei, sempre que é opportuno apresento-a sem toda a evidencia e verdade. Para mim os homens são os instrumentos executivos da idéa.
V. ex.ª e a camara sabem que não faço politica de pessoas, faço politica de idéas e de convicções. (Apoiados.)
Comprehendo perfeitamente que quando um homem politico está alistado em um partido, tem muitas vezes de fazer calar a voz da consciencia, nos casos em que não ha uma opposição absoluta entre a consciencia individual e a partidaria. Eu não sou partidario; sou simplesmente democrata e a minha benevolencia depende do modo por que as minhas idéas forem acceitas e realisadas.
Portanto todas as vezes que o governo actual se approximar e traduzir em factos não só as idéas que acabo de expender, senão tambem outras que são conhecidas, creia o governo que não só o louvarei, como lhe prestarei sincero e leal apoio; mas se porventura o governo estiver em opposição ás minhas idéas e deixar de as traduzir em factos, se se afastar d'ellas, creia que não lhe pouparei a censura, nem deixarei de o combater na liça parlamentar, na imprensa, no comicio, em toda a parte onde se trave a luta legal. Não dou apoios incondicionaes, sirvo idéas e não sirvo homens. Quero o progresso e a liberdade, que são os fundamentos da democracia.
Se o ministerio trilhar a boa vereda, conte com o meu auxilio ou pelo menos com a minha boa vontade, senão, não.
Vozes: — Muito bem, muito bem.
O sr. Ministro da Justiça. (Barjona de Freitas): — Direi algumas palavras em resposta ao illustre deputado e meu amigo o sr. Osorio de Vasconcellos, que acaba de fallar, e lisonjeia-me a esperança de ver quebrada uma certa separação em que se achava o illustre deputado de todos os partidos.
Diz s. ex.ª que todo aquelle governo que tender a realisar as suas aspirações ha de merecer a sua confiança.
O governo espera que uma parte d'ellas serão satisfeitas, e assim poderemos contar com o voto do sr. deputado n'esta casa.
S. ex.ª referiu-se ao registo civil. Devo dizer que nestas cadeiras sentado e interrogado por um deputado da opposição, ha um anno ou anno e meio, respondi que não tinha duvida alguma em tratar de estudar uma proposta para a installação definitiva do registo civil que está consignado no nosso codigo civil. E, eu não costumo faltar aos meus compromissos em qualquer parte e sobre qualquer assumpto que seja. Por consequencia, não tem o governo repugnancia alguma á installação do registo civil. E isto não implica cousa alguma com o registo ecclesiastico. São duas cousas differentes.
A sociedade ecclesiastica precisa ter o seu registo ecclesiastico e a sociedade civil precisa ter tambem o seu registo civil.
Não tenho pois duvida alguma em declarar ao illustre deputado, por parte do governo, que hei de forcejar para que no praso o mais breve possivel se realise e generalise a creação do registo civil, trazendo á camara as propostas que para esse fim forem necessarias.
N'este ponto, portanto, parece-me que satisfaço mais uma tendencia e que serão satisfeitas as aspirações do illustre deputado.
S. ex.ª fallou tambem na reforma da lei eleitoral. Nem o illustre deputado, nem ninguem ignora que já n'uma outra occasião, apresentando aqui este governo uma proposta para a reforma da carta, tinha consignado n'essa proposta o principio de alargamento do suffragio popular, creio que vem exactamente formulado na proposta de lei apresentada a esta camara pelo ministerio transacto, e este alargamento ía até admittir que votassem todos os que soubessem ler e escrever, e fossem chefes de familia.
Portanto devia haver o producto de dois factores — o da capacidade e o do interesse da causa social. O da capacidade estava representado pelo elemento da instrucção e o
Sessão de 30 de janeiro de 1878