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320 DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS

governo a suppressão de algum dos muitos empregos inúteis, que por ahi se mantêem á custa do povo, é natural que encontrasse grandes obstaculos á realisação dos seus desejos. Mas para se empenhar não encontra de certo embaraços.

Não ha elementos publicados a respeito dos empréstimos para a parochia, para o municipio, e para o districto, para podermos avaliar qual é a sorte dos contribuintes em algumas freguezias.

Não ha, pois, elementos officiaes fornecidos pelo governo para apreciar a situação financeira das corporações administrativas.

Mas pelo que consta do ultimo relatorio da companhia de credito predial se póde já contar que ellas vão no mesmo caminho do governo!

Os emprestimos feitos ás camaras municipaes por aquella companhia até 31 de dezembro de 1883 já montam á somma de 2.400:000$000 réis, e os emprestimos feitos aos districtos, pela mesma companhia, e até á mesma data, já vão em 3.000:000$000 réis!

Os emprestimos, que se fizeram áquellas corporações por aquelle mesmo estabelecimento de credito desde 31 de dezembro de 1883 até hoje, não sei eu, assim como não posso saber as quantias que as mesmas estabelecimentos tomaram de emprestimo de outros individuos ou corporações, nem a importância das dividas que hoje oneram as parochias.

Deve ser muito grande o empenho das corporações administrativas.

No mesmo relatorio se declara, não sei com que fundamento, mas com a auctoridade que lhe dá a assignatura do sr. presidente do conselho, que a divida hypothecaria dos particulares anda por 40.000:000$000 réis!

Ora com o paiz em tão difficeis condições economicas e financeiras, corre ao governo o imperioso dever de pôr de parte, ao menos por momentos, o tal accordo, para indicar ás côrtes as medidas com que pretende occorrer aos perigos de uma situação tão melindrosa, e aquietar o espirito publico que está tão desasocegado.

Se para vencer e debellar as difficuldades da nossa situação economica e financeira for necessario dar cabo do accordo, de modo que elle morra de morte natural para sempre, todos farão de certo mais esse sacrificio patriotico para se chegar a tão grandioso resultado. (Apoiados.)

É preciso, não só pôr ponto no augmento de despezas, que não sejam urgentissimas e inadiaveis, mas estudar os meios de pagar as que já são effectivas, e as já votadas, que mais dia menos dia hão de vir avolumar os encargos do orçamento.

Tem-se gasto á larga. Até já se concedeu o direito de aposentação aos governadores civis, aos empregados dos governos civis, aos empregados das juntas geraes, aos empregados das camaras municipaes, e aos empregados das administrações dos concelhos.

Que o estado venha em soccorro do official militar, ou do magistrado judicial, que não podem dedicar-se a outra ordem de funcções, que precisam de larguissimas habilitações e de um grande aprendizado para desempenharem a sua alta missão, comprebende se e é rasoavel.

Mas collocar no mesmo pé de igualdade os empregados das administrações dos concelhos, e os amanuenses das camaras municipaes, para que ha pretendentes aos centos, e para que não são precisas outras habilitações a não ser a protecção de algum vereador influente, ou de algum magnate da terra, só o póde fazer uma nação que vive em tal abundância, que não snbf o que ha de fazer ao dinheiro.

Com esta larguissima faculdade de aposentações, dentro em poucos annos as corporações administrativas hão de ter que sustentar varias series de empregados, como hoje sustenta o estado, com grave perigo para a boa ordem das suas finanças.

Quem abre o orçamento não póde ver sem horror o que se gasta com as classes inactivas. Basta só ler o orçamento na parte relativa ao ministerio da guerra! Nenhum paiz, guardadas as devidas proporções, supporta tão avultada despeza!

Estou intimamente convencido de que os srs. ministros vivem na idéa de que o paiz está riquissimo, e de que o povo não sabe o que ha de fazer aos seus rendimentos.

O governo não conhece o paiz, e devia estudar a situação economica e financeira em que nos encontrâmos.

O sr. presidente do conselho já nos fallou das suas viagens pelo paiz; mas creio que pouco estudou, ou se alguma cousa estudou, nada aproveitou.

O sr. presidente do conselho já nos declarou que tinha viajado desde Bragança até Villa Real de Santo Antonio.

Mas como viajou?

Desfructando, de certo, todas as commodidades que se podem gosar, ou no caminho de ferro, ou nas estradas ordinárias; mas nunca presenciou, de certo, nem elle, nem os outros srs. ministros, como eu tenho presenciado muitas vezes, o almoço e o jantar do pobre trabalhador do campo, do pobre operário, que ás vezes nem o chamado caldo negro de Esparta tem para se alimentar. Se os srs. ministros fizessem idéa exacta da situação desgraçada em que vive o povo portuguez, estremeceria em presença da idéa de augmentar as despezas, e de aggravar os sacrificios. Em Lisboa mesmo, a maior parte da gente não faz idéa da situação penosa em que se encontra a maior parte dos habitantes da provincia.

Quantas vezes eu leio nos jornaes reclamações e queixas, pedindo providencias contra a má situação em que se encontram as classses pobres de Lisboa, que nem têem carne para comer.

Ora é tão verdade que uma grande parte dos habitantes da capital não come carne, como é verdade que raras são as pessoas que a comem nas provincias?

Na provincia só comem carne as pessoas abastadas. As classes pobres, que são as mais numerosas, comem carne por festa n'alguns dias do anno.

Quem nunca saiu de Lisboa, suppõe que nas províncias se vive em grande abundancia, que nas provincias ha sobras para todas as despezas creadas e em projecto, e engana-se redondamente.

O contribuinte porém fica sempre debaixo da ameaça de que lhe vão buscar sobras, e nunca se vê livre de ter pendente sobre a cabeça esta espada de Damocles. Mas, continuando na minha ordem de idéas, peço ao governo que, no interesse de socegar a nação e os capitães estrangeiros que parecem preocupados com a nossa situação economica e financeira, nos diga quaes são os meios com que tenciona occorrer ao deficit do futuro anno economico, que é enorme.

Com que meios conta tambem o governo para concluir os caminhos de ferro do Algarve, e do Douro, e o porto, de Leixões, e para subsidiar a construcção dos caminhos de ferro da Beira Baixa, de Vizeu, de Mirandella, de Alfarellos, e tambem a eonstrucção de um caminho de ferro em territorio estrangeiro. Não pesam já sobre o nosso orçamento todos os encargos, mas mais dia menos dia têem de ser inscriptas no orçamento as verbas indispensaveis para levarmos a cabo todos estes grandes commettimentos.

As providencias de augmento de impostos que o governo conta apresentar, para occorrer a todas estas despezas, é que eu não sei nem posso adivinhar; e preciso de sabel-o, não para satisfazer curiosidades, mas para socego do paiz, e para tranquillidade dos mercados estrangeiros.

Se o sr. presidente do conselho estivesse presente eu havia de convidal-o a declarar do modo mais positivo, e solemne, se as providencias já annunciadas, de augmento de despeza com obras grandiosas, quer no continente, quer no ultramar, haviam de ter seguimento sem embargo da baixa dos nossos fundos no mercado de Londres, e do silencio do governo ácerca das providencias que tencionava apresentar às cortes para occorrer às nossas necessidades financeiras, tanto de momento, como de futuro.