282 DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS
administradores de concelho, diante de uma necessidade urgentissima de acudir á ordem publica, tivessem outra limitação que não fosse a da sua responsabilidade pelos abusos que possam commetter?
O governo tem sempre o direito do exigir a responsabilidade aos governadores civis pelos actos por elles praticados, e elle, bem como o parlamento, é que são os competentes para julgar se porventura só deram ou não circumstancias de ordem publica que justificassem esses actos.
É este o unico limite, repito. (Apoiados.)
Esta é que o a doutrina em toda a parte e sempre foi assim. Não é nova; é a doutrina do todos os escriptores e de todos os publicistas. (Apoiados.)
Mas o sr. governador civil de Braga entendeu que, por necessidade de manter a ordem publica, lho era indispensavel apprehender aquelles jornaes que eram verdadeiras proclamações á revolta, (Apoiados.) verdadeiras proclamações incendiarias; entendeu que a ordem publica perigava se se permittisse que fossem distribuidos e publicados aquelles supplementos, que eram, repito, verdadeiras provocações á revolta. (Apoiados.)
Procedeu bem o sr. governador civil?
Se effectivamente se deram as circumstancias a que s. exa. se referiu; se effectivamente, como elle affirma, a ordem publica podia ser perturbada, creio que aquella auctoridade cumpriu o seu dever. (Apoiados.)
As informações que tenho são estas; são de que a distribuição d'aquelles supplementos podia desvairar a opinião o produzir graves perturba-los na ordem publica.
Se a apprehensão evitou que a ordem publica fosse perturbada, a auctoridade cumpriu o seu dever. (Apoiados.)
E quanto ao numero de exemplares apprehendidos, o que eu disse e repito o que a apprehensão deve ser unicamente d'aquelles que forem necessarios para se instruir o processo judicial.
As ordens que dei são n'este sentido e em conformidade do codigo administrativo, artigo 242.°, n.ºs 20.° e 23°.
Ora o governador civil mandou apprehender os jornaes, mandou levantar os autos respectivos, e mandou remetter tudo ao ministerio publico, como determina o codigo, e portanto não faltou aos preceitos da lei.
Tambem eu me prezo de ser liberal. Posso dizer ao illustre deputado que a lei de imprensa a que s. exa. se referiu, se deve principalmente á minha iniciativa, (Apoiados) porque fui eu que apresentei n'esta camara o projecto (Apoiados.) e fui eu o encarregado pelo sr. Barjona de Freitas, estão ministro da justiça, de preparar a proposta que se converteu na lei que hoje existe. Por consequencia não posso ser suspeito de menos liberal, quanto á lei da imprensa.
Na imprensa nasci, e o pouco que valho a ella o devo. Como podia eu, portanto, associar-me, a quaesquer tentativas que importassem uma restricção das formalidades concedidas pela lei ao jornalismo?
O que não posso é levar o meu amor pela liberdade de imprensa até no ponto de permittir que as auctoridades cruzem os braços diante do verdadeiros pasquins, (Apoiados.) de verdadeiras proclamações, provocando o povo á rebellião; (Apoiados.) incitando o povo a levantar-se contra as leis e contra as auctoridades constituidas. (Apoiados.)
Se me fosse necessario praticar qualquer acto que eu julgasse não permittido pelas leis, não duvidaria n'essas circumstancias vir declarar francamente ao parlamento que as leis tinham sido violadas, mas que me absolvesse porque tinham sido salvos os intersses publicos. (Apoiados.)
É o que por ora tenho a dizer.
Vozes: - Muito bem, muito bem.
(S. exa. não reviu.)
O sr. Presidente do Conselho de Ministros (Luciano de Castro): - Sr. presidente, eu não disse que aos governadores civis era permittido fazer crimes! (Muitos apoiados.) Eu não disse que para manter a ordem era permittido aos agentes da auctoridade praticar actos, que as leis prohibissem. Não disse isto.
E pergunta-me o sr. Pinheiro Chagas se um govenador civil póde suspender a carta, fazer crimes, roubar, matar? Não, senhor, não póde; e por uma rasão muito simples, é que esses actos a que s. exa. se referiu são crimes, que nenhuma auctoridade, como nenhum particular, póde traticar. Essa heresia não a pronunciei eu! E tanto não a pronunciei, que, respondendo a um aparte do sr. Lopo Vaz, eu perguntei qual era a lei que prohibia que a auctoridade podesse praticar o acto que o sr. governador civil de tinha praticado! Os governadores civis podem praticar qualquer acto que não seja prohibido por lei. Evidentemente não podem roubar, não podem matar, não podem attentar contra os direitos dos cidadãos garantidos na carta. É claro que não.
O que eu digo o que, se um administrador do concelho, se um governador civil, no exercicio das suas attribuições, exorbitar, a sua responsabilidade e perante o governo como este tem a sua responsabilidade perante o parlamento. Se as auctoridades praticarem um attentado contra as leis o offenderem os direitos e garantias marcados na constituição, e o governo não proceder contra elles é para o parlamento que se deve appellar, assim como antes se appellar das auctoridades para o governo. (Vozes: - Muito bem).
Não disse, portanto, repito, não affirmei, não avancei a doutrina que o illustre deputado me attribuiu.
Podiam as auctoridades adoptar todas as providencias que julgassem necessarias; mas é claro que não podiam praticar aquillo que a lei prohibe.
Como podia eu dizer que as auctoridades podiam praticar crimes mesmo em nome da ordem publica? (Apoiados.)
De certo que não podia dizer similhante cousa.
Aponte-me s. exa. qual o a disposição legal que declara que a apprehensão de supplementos, que são uma verdadeira proclamação incendiaria, uma excitação á revolta, em nome da ordem publica, é prohibida, ou que a liberdade das auctoridades administrativas n'esse ponto é limitada por alguma disposição legal.
Diga-me o illustre deputado qual é a lei que prohibe os administradores de concelhos ou os commissarios de policia do praticarem taes apprehensões por motivos de ordem publica.
Por certo que nenhuma poderá apontar.
Portanto a minha doutrina não é a que o illustre deputado me attribue. A minha doutrina o que para manter a ordem publica é permittido aos administradores do concelho e a todos os agentes da auctoridade adoptarem as providencias que julgarem indispensaveis; mas este direito não chega ao ponto de poderem praticar actos que são crimes. (Apoiados.)
Pedi a palavra para dar esta explicação, não obstante me parecer que não seria preciso; em todo o caso as palavras do illustre deputado podiam, por serem muito auctorisadas, fautor acreditar a quem as tinha ouvido, que eu tinha affirmado uma doutrina que estava tão longe das minhas intenções como das minhas palavras.
Vozes: - Muito bem.
(S. exa. não reviu as notas tachygraphicas.)
Redactor = S. Rego.