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SESSÃO DE 31 DE JANEIRO DE 1888
Presidencia do exmo. sr. José Maria Rodrigues de Carvalho
Secretarios os exmos. srs.
Francisco José de Medeiros
José Maria de Alpoim de Cerqueira Borges Cabral
SUMMARIO
Dois officios do ministerio das obras publicas. - Segunda leitura e admissão de um projecto de lei do sr. Francisco Machado. - Duas representações mandadas para a mesa pelo sr. Julio de Vilhena e uma pelo sr. Abreu Castello Branco. - Requerimento do interesse publico apresentado pelo sr. Franco Castello Branco. - Requerimentos de interesse particular apresentados pelos srs. Ruivo Godinho, Francisco José Machado o Eduardo Villaça. - Justificações de faltas dos srs. Simões Ferreira, Tavares Crespo e Gomes Neto. - Resolve-se que sejam publicadas no Diario do governo duas representações mandadas para a mesa na sessão anterior pelo sr. Julio de Vilhena. Apresenta um parecer da commissão de fazenda o sr. Lobo d'Avila. - O sr. Pedro Monteiro participa a constituição da commissão de instrução primaria e secundaria. - O sr. José de Azevedo Castello Branco refere se a um facto de violação de correspondencia, accusado por um jornal do Porto. - O sr. Abreu Castello Branco chama a attenção do governo para alguns assumptos de interesse para os Açores. - A requerimento do sr. Arouca suspende-se a sessão até que compareça o sr. ministro da fazenda. - Reaberta a sessão, entra-se na
Ordem do dia: lê-se na mesa e é admittida a proposta do sr. Arroyo, apresentada na sessão anterior. - A requerimento do sr. Eça de Azevedo julga-se, sufficientemente discutida a generalidade do projecto. - É rejeitada a proposta do adiamento feita pelo sr. Julio de Vilhena. - O sr. Vicente Monteiro requer e a camara approva, que as emendas vão á commissão. - Apresenta quatro propostas de lei o sr. ministro da fazenda, em nome do sr. ministro do reino. - E approvada a generalidade do projecto em votação nominal, requerida pelo sr. Arroyo. - São rejeitadas as moções dos srs. Moraes Carvalho, Arroyo e Ruivo Godinho. - O sr. presidente participa que está nomeada a commissão de redacção. - Entra em discussão o artigo 1.° do projecto de lei n.° 6, e usa em primeiro logar da palavra o sr. Arouca, que combate o artigo, e apresenta uma moção de ordem. Responde-lhe o sr. relator Alves da Fonseca, seguindo-se o sr. Avellar Machado, que tambem apresenta uma moção, e; respondo a algumas considerações feitas pelo sr. ministro da fazenda em uma das sessões anteriores. - Levanta-se a sessão.
Abertura da sessão - Ás tres horas e um quarto da tarde.
Presentes á chamada 63 srs. deputados. São os seguintes: - Alfredo Brandão, Alves da Fonseca, Sousa e Silva, Antonio Castello Branco, Oliveira Pacheco, Antonio Villaça, Hintze Ribeiro, Augusto Pimentel, Augusto Ribeiro, Bernardo Machado, Lobo d'Avila, Eduardo de Abreu, Feliciano Teixeira, Firmino Lopes, Francisco de Barros, Castro Monteiro, Francisco Machado, Francisco de Medeiros, Frederico Arouca, Sá Nogueira, Pires Villar, João Pina, Franco de Castello Branco, Souto Rodrigues, Dias Gallas, João Arroyo, Vieira do Castro, Teixeira de Vasconcellos, Rodrigues dos Santos, Sousa Machado, Alfredo Ribeiro, Correia Leal, Silva Cordeiro, Oliveira Valle, Oliveira Martins, Simões Ferreira, Amorim Novaes, Alves de Moura, Barbosa Collen, José Castello Branco, Pereira de Matos, Ruivo Godinho, Abreu Castello Branco, José de Napoles, Ferreira Freire, José Maria do Andrade, Rodrigues de Carvalho, José de Saldanha (D.), Simões Dias Pinto Mascarenhas, Santos Moreira, Julio Graça, Julio de Vilhena, Poças Falcão, Luiz José Dias, Manuel José Correia, Matheus de Azevedo, Miguel Dantas, Pedro Monteiro, Pedro Victor, Estrella Braga e Visconde de Silves.
Entraram durante a sessão os srs.: - Albano de Mello, Mendes da Silva, Alfredo Pereira, Anselmo de Andrade, Baptista de Sousa, Campos Valdez, Antonio Centeno, Gomes Neto, Pereira Borges, Tavares Crespo, Antonio Maria de Carvalho, Mazziotti, Jalles, Pereira Carrilho, Barros e Sá, Simões dos Reis, Santos Crespo, Angusto Fuschini, Miranda Montenegro, Barão de Combarjua, Conde de Castello de Paiva, Conde de Villa Real, Eduardo José Coelho, Elvino de Brito, Elizeu Serpa, Emygdio Julio Navarro, Gomes Pinto, Madeira Pinto, Mattoso Santos, Fernando Coutinho (D.), Freitas Branco, Almeida e Brito, Francisco Beirão, Francisco Mattoso, Fernandes Vaz, Lucena e Faro, Soares de Moura, Severino de Avellar, Gabriel Ramires, Sant'Anna e Vasconcellos, Cardoso Valente, Izidro dos Reis, Menezes Parreira, Alves Matheus, Joaquim da Veiga, Jorge de Mello (D.), Jorge O'Neill; Avellar Machado, Eça de Azevedo, Dias Ferreira, Elias Garcia, Pereira dos Santos, Figueiredo Mascarenhas, Barbosa do Magalhães, Oliveira Matos, Abreu e Sousa, Julio Pires, Lopes Vaz, Manuel d'Assumpção, Brito Fernandes, Pinheiro Chadas, Marçal Pacheco, Marianno de Carvalho, Marianno Prosado, Miguel da Silvara, Pedro de Lencastre (D.), Sebastião Nobrega, Dantas Baracho e Vicente Monteiro.
Não compareceram á sessão os srs.: - Moraes Carvalho, Serpa Pinto, Antonio Candido, Ribeiro Ferreira, Antonio Ennes, Guimarães Pedroso, Moraes Sarmento, Fontes Ganhado, Victor dos Santos, Conde de Fonte Bella, Estevão de Oliveira, Francisco Ravasco, Guilherme de Abreu, Guilhermino de Barros, Casal Ribeiro, Candido da Silva, Baima de Bastos, Scarnichia, Santiago Gouveia, Joaquim Maria Leite, Ferreira Galvão, Ferreira de Almeida, Laranjo, Guilherme Pacheco, Vasconcellos Gusmão, Alpoim, José Maria dos Santos, Santos Reis, Mancellos Ferraz, Vieira Lisboa, Bandeira Coelho, Manuel Espregueira, Manuel José Vieira, Visconde de Monsaraz, Visconde da Torre, Wenceslau de Lima e Consiglieri Pedroso.
Acta - Approvada.
EXPEDIENTE
Officios
Do ministerio das obras publicas, satisfazendo no requerimento feito na sessão de 30 de janeiro corrente pelo sr. deputado João Franco Castello Branco.
A secretaria.
Do mesmo ministerio, remettendo nota das distancias kilometricas entre diversos pontos, pedidas em officio de 10 do corrente.
A secretaria.
Segunda leitura
Projecto de lei
Senhores. - Sendo a hierarchia militar, e a antiguidade dentro do mesmo posto, uma das principais se não a principal base em que se funda a disciplina dos exercitos, convem que desde os postos inferiores os individuos que seguem a gloriosa carreira das armas vão educados n'esses principios. Tem sido esse systema seguido e respeitado em todas as organisações que se têem dado ao exercito portuguez, até que, pelo decreto com força de lei de 30 de outubro de 1884, se preferiram essas formulas, em prejuizo da disciplina e do respeito do inferior para com o supeior.
Os sargentos ajudantes dos corpos das diversas armas
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eram até essa epocha feitos por nomeação do ministro da guerra, recaindo no primeiro sargento do exercito mais antigo, que pelas suas informações annuaes estivesse no caso de passar no posto de alferes, e eram considerados ou chefes da corporação dos officiaes inferiores nos corpos onde serviam.
Foi quasi sempre da classe dos sargentos ajudantes que saiam os bons ajudantes dos regimentos, que, como sabeis, são os encarregados de coadjuvar os majores no serviço de escripturação da secretaria geral, da guarda, arrumação e classificação do archivo, alem do servido de detalhe, e outros muitos, que os regulamentos, lhes incumbem, e têem por coadjuvante n'estes trabalhos os sargentos ajudantes.
Em todas as reuniões de campanhas ou baterias, para paradas ou serviço de guarnição, são os sargentos ajudantes os primeiros que o regulamento determina que devem apresentar se a receber a força entregue pelos sargentos de dia ou primeiros sargentos, e o mesmo regulamento os considera para, isso chefes dos officiaes inferiores, devendo-os guiar e instruir nas suas attribuições, vigial-os no suu procedimento, cimentar entre elles a concorda, e presidir á mesa no rancho dos mesmos inferiores, a fim de manter a decencia.
Ora, determinando o artigo 184.° do citado decreto de 1884 que as funcções d'este cargo sejam desempenhadas por im primeiro sargento, escolhido pelo coronel, entre as pragas da mesma classe que, em concurso, obtenham a approvação para o cargo e nivelarem melhor aptidão puni a disciplina e serviço da secretaria, é preterida a base fundamental da disciplina, porque o indivíduo escolhido, não deixando por isso de ser, para os effeitos da promoção ao posto de official, primeiro sargento, póde ser o mais moderno n'este posto e ser, portanto, o chefe da classe, com todos os deveres e attribuições de superior para com inferior. Isto é, não só contrario á disciplina como tambem concorre para que o respeito não seja mantido no grau devido na classe dos officiaes inferiores. Fundado n'estes princípios, tenho a honra do apresentar o seguinte projecto de lei:
Artigo 1.º O posto de sargento ajudante no exercito será provido no primeiro sargento mais antigo da sua arma, quando pelas suas informações annuaes esteja nas circumstancias de passar ao posto de alferes, na conformidade das leis em vigor.
§ unico. A promoção é de nomeação do ministro da guerra, devendo os commandantes dos corpos fazer as necessarias communicações logo que se der alguma vacatura.
Art. 2.° Fica revogado o artigo 181.° e seus paragraphos do decreto com força de lei de 30 de outubro de 1884, que reorganisou o exercito.
Sala das sessões da camara dos senhores deputados, em 30 de janeiro de 1888. - Francisco José Mavhado.
Lido na mesa, foi admittido e enviado á commissãi de guerra.
REPRESENTAÇÕES
De um comicio realisado em Vizeu, pedindo a revogação da lei e regulamento da cobrança da contribuição industrial por meio de licenças.
Apresentada pelo sr. deputado Julio de Vilhena, enviada á commissão de fazenda e mandada publicar no Diario do governo.
De um comicio realizado em Arruda dos Vinhos protestando contra a transferencia para Sobral de Monte Agraço, da séde do antigo concelho de Arruda.
Apresentada pelo sr. deputado Julio de Vilhena, enviada á commissão de fazenda e mandada publicar no Diario do governo.
De empregados menores do lyceu nacional de Angra do Heroismo, pedindo se lhes conceda, a titulo do gratificação, o augmento do terço dos seus ordenados.
Apresentada pelo sr. deputado Abreu Castello Branco e enviada á commissão de fazenda, ouvida a de instrucção secundaria.
REQUERIMENTOS DE INTERESSE PUBLICO
Requeiro que, pelo ministerio da fazenda, seja com a maior urgencia enviado a esta camara o processo relativo ao concurso o adjudicação do monopolio das loterias.
Requeiro que, pelo ministerio do reino, seja enviado á camara um extracto do parecer do conselho superior de instrucção publica, relativo aos professores provisórias do lyceu da Guarda.
Que seja igualmente enviado o officio remettido ao governo pelo reitor do mesmo lyceu. = José de Azevedo Castello Branco.
Mandou-se expedir.
REQUERIMENTOS DE INTERESSE NPARTICULAR
Dos majores reformados, Martinho da Conceição, António Joaquim de Sousa e José Carlos Gomes Pereira, pedindo que seja approvado por esta camara o projecto de lei apresentado na camara dos dignos pares pelo exmo. sr. D. Luiz da Camara Leme, em sessão do 9 do corrente, tendente a melhorar o soldo dos officiaes reformados anteriormente á lei de 22 de agosto do anno findo.
Apresentadas pelo sr. deputado Ruivo Godinho e enviados ás commissões de guerra e de fazenda.
Do tenente coronel reformado, José Maria do Couto Aragão, dos majores, Anselmo José de Lima Mello Alvim, José Fernandes, António Ferreira de Almeida, Frederico Augusto de Abreu Castêllo Branco, do capitão reformado José Maria Pereira Pinto e dos alferes reformados João Carlos Correia Maximiano e Costa e José António Ledo, no sentido dos antecedentes.
Apresentadas pelo sr. deputado Francisco José Machado e enviados ás commissões de guerra e de fazenda.
Dos majores reformados Manuel Joaquim da Silva, António Leopoldino Ribeiro da Silva, João Augusto Guedes Linhares, Fernando Pereira Cardoso, João Theodoro Correia, Francisco de Brito Freire, Antonio José Ventura, José Antonio Ramos e barão de Mesquita, no sentido dos antecedentes.
Apresentadas pelo sr. deputado Eduardo Villaça e enviados ás commissões de guerra e de fazenda.
JUSTIFICAÇÕES DE FALTAS
Declaro que faltei á sessão de hontem e a todas as da semana anterior por falta de saude. = Joaquim Simões Ferreira, deputado.
Participo a v. exa. e á camara que, por motivos justificados, não me foi possível assistir a algumas das sessões d'este mez. = Antonio Lucio Tavares Crespo.
Participo a v. exa. que faltei a algumas sessões da camara por motivo justificado. = A. J. Gones Neto, deputado por Almada.
Para a secretaria.
O sr. Presidente: - O illustre deputado o sr. Julio de Vilhena mandou hontem para a mesa duas representações; e pediu que fossem publicadas no Diário do governo. Consulto a camara.
Resolveu affirmativamente.
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O sr. Carlos Lobo d!Ávila (por parte da de fazenda): - Mando para a mesa o parecer da commissão de fazenda, sobre a concessão de uma pensão á sra. condessa de Lavradio.
A imprimir.
O sr. Pedro Monteiro: - Pedi a palavra para mandar para a mesa a seguinte participado:
"Tenho a honra de participar a v. exa. e á camara, que se acha constituida a commissão de instrucção primaria e secundaria, tendo sido eleito presidente o sr. José Simões Dias e eu secretario, havendo relatores especiaes. = O secretario da commissão, Pedro Monteiro."
Par a acta.
O sr. José de Azevedo Castello Branco: - Sr. presidente, pedi a palavra para mandar para a mesa um requerimento, pedindo alguns documentos por diversos ministerios.
Aproveito a palavra, sr. presidente, o lamento não estar presente o sr. ministro das obras publicas, para perguntar a s. exs. se porventura tinha procedido a averiguação para saber até que grau de exactidão chega o facto acetinado n'uma carta para o Jornal do Porto, e de que signatario é o sr. Albano Coutinho, residente e proprietario em Mogofores.
Lê-se no Commercio do Porto o seguinte:
"A ambulancia norte 3 mais uma vez, nos privou de uma correspondencia, fazendo com que tenha de ser publicada com o atraso de um dia. Não estranhámos este facto; e mais uma confirmação da justiça das nossas repetidas reclamações sobre o serviço d'esta ambulancia, serviço que não podemos classificar molhar do que continuando a chamar lhe vergonho-o. O que estranhâmos, e contra o que protestâmos energicamente, e a violação d'essa correspondencia. Este facto criminoso deu-se com a primeira das correspondencias do nosso solicito correspondente de Mogofores, publicadas em outro logar, a qual vinha encerrada n'um enveloppe, que trazia, manifestos signaes de ter sido aberto e depois novamente fechado.
"Aquelle nosso prezado collega confirma-nos que a sua correspondencia fora expedida perfeitamente fechada e não foi n'esse estado que nos chegou ás mãos. O enveloppe apresenta signaes evidentes de ter sido aberto."
Sr. presidente, para honra do todos nós, parece me conveniente que v. exa. communicasse ao sr. ministro das obras publicas que ou tinha chamado a attenção do governo para este fado o tinha pedido providencias e que se fizesse um inquerito rigoroso sobre a violação da correspondencia, pois isto é um symptoma da nossa anarchia e um dos mais graves. (Apoiados.)
O sr. Ruivo Godinho: - Mando para a mesa tres requerimentos de officiaes reformados, pedindo que seja approvado o projecto de lei apresentado na outra casa do parlamento pelo sr. Luiz da Camara Leme.
Tiveram o destino indicado nos respectivos extractos a pag. 272.
O sr Abreu Castello Branco: - Mando para a mesa uma representação dos empregados menores do lyceu de Angra, que declaram se associam aos bens collegas do continente no pedido de melhoria do vencimento.
Não está presente o sr. ministro das obras publicas, nem o sr. ministro do reino; todavia pelo extracto da sessão vêem que eu cha,ei a sua attenção para alguns assumptos de grave importancia, o portanto não deixarei de aproveitar esta occasião para fazer a respeito d'elles algumas breves considerações.
Vem a ser a primeira a necessidade, urgentissima do apresar quanto possivel a construcção dos pharoes nas ilhas dos Acures.
Ainda não ha muitos dias que eu noticiei n'esta camara que, em rasão de não estarem illuminadas as costas d'aquellas ilhas, tinha naufragado uma barca perecendo da tripulação dez pessoas, e já agora pelo paquete tive noticias de que na ponta dos Rosaes tinha naufragado uma outra barca, perecendo vinte e cinco pessoas. Estamos constantemente a receber noticias d'esta natureza, e é realmente muito para lamentar que se estejam perdendo vidas, e muitas vidas, por ainda não se terem illuminado as costas d'aquellas ilhas.
Eu sei que está incumbida a um engenheiro muito habil, illustrado o intelligente a confecção dos projectos de pharoes e dos respectivos orçamentos.
Mas consta-me, que esse engenheiro o doente, ou ha muitos mezes está doente, por isso não póde trabalhar, ou por outro qualquer motivo nada se tem feito. O que é certo é que ha nove mezes se está fazendo o projecto de um pharol e ainda não está concluido.
Ora em nove mezes havia bastante tempo para uma gestação regular, e comtudo ainda não veiu á luz cousa alguma; portanto eu queria pedir ao sr. ministro das obras publica que, se aquelle engenheiro não está, pelo seu mau estado de saude, em circumstancias do poder prosseguir n'aquelles trabalhos, entregue a commissão a outro que tenha saude, porque, sendo valido e não trabalhando, já tenho motivo para o censurar; assim, a um homem doente não posso irrogar censura.
Desejava alem d'isso chamar a attenção do sr. ministro das obras publicas para um outro assumpto que prendo com este: a construcção da doca da Terceira, cujo projecto chegou ha poucos dias e está affecto á junta consultiva de obras publicas. Havendo pharoes, já se evitam grandes prejuizos, mas não havendo a doca, muitos prejuizos de igual natureza se hão de dar tambem; por isso, queria pedir a s. exa. que activasse quanto possivel a conclusão d'estas obras.
Alem dos grandes temporaes que têem assolado os Açores, aquella ilha está ainda flagellada por uma epidemia de variola. Essa epidemia dura ha mais de quatro mezes, e não tinha decrescido até aos ultimos dias.
Por isso, seria muito conveniente que não só o sr. ministro das obras publicas mandasse reconstruir algumas obras de arte que ficaram destruidas pelos temporaes, accedendo assim ao pedido que lhe foi feito pela auctoridade administrativa e pelo director de obras publicas; mas que tambem, pelo ministerio do reino, se visse se era possivel acudir com uma esmola qualquer, porque, embora a caridade particular se tenha incumbido de suavisar os males que affligem os povos d'aquella ilha, não ha muito quem disponha do grandes meios para que possa acudir a todos os pedidos que só fazem, por isso, seria conveniente que por parte do governo se fizesse tambem alguma cousa.
Não está presente nenhum sr. ministro, mas pelo extracto da sessão terão conhecimento dos assumptos a que me referi, e que são urgentissimos.
Um outro assumpo igualmente urgente, sobre que desejava fallar, o cabo sub marino; mas, emquanto a essa obra, ainda que é de absoluta necesssidade, creio que tem havido motivos serios o muito graves, que obstam a que qualquer companhia tome essa empreza; reservo, por isso, para outra occasião dizer o que julgar conveniente a tal respeito.
A representação teve destino indicado no respectivo extracto a pag. 272.
O sr. Eduardo Villaça: - Mando para a mesa nove requerimentos dos majores reformados Manuel Joaquim da Silva, Antonio Leopoldino Ribeiro da Silva, João Augusto Guedes Quinhones, Bernardo Taveira Cardoso, João Theodoro Correia, Francisco de Brito Freire, Antonio José Ventura, José Antonio Ramos e barão de Mesquita.
Todos os requerentes pedem que seja approvado, quando venha a esta camara, o projecto de lei apresentado na camara dos dignos pares, em sessão de 9 de janeiro, pelo sr. D. Luiz da Camara Leme.
Os requerimentos tiveram o destino indicado no respectivo extracto a pag. 272.
O sr. Francisco Machado: - Mando tambem para a mesa os seguintes requerimentos: de José Maria Pereira
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Pinto, major reformado; Anselmo José de Lima Mello Alvim, major reformado; José Fernandes, major reformado; [...] Maximino e Costa, alferes reformado; Antonio Ferreira de Almeida, major reformado; José Maria de Couto Aragão Pimenta, coronel reformado; Frederico Augusto de Abreu Castello Branco, major reformado, e José António Ledo, alferes reformado.
Todos estes officiaes pedem a approvação do projecto de lei do se. Camara Leme.
Tiveram o destino indicado a pag. 272.
O sr. Presidente: - Está esgotada a inscripção; vae passar-se á ordem do dia, que é a discussão do projecto de lei n.º 6, se a camara entender que se póde discutir na ausencia do sr. ministro da fazenda.
O sr. Arouca: - Peço a v. exa. que tenha a bondade de consultar a camara sobre se concorda em que se interrompa a sessão até comparecer o sr. ministro da fazenda, entrando-se na ordem do dia só depois de estar presente s. exa.
Consultada a camara assim se resolveu.
Eram tres horas e trinta cinco minutos da tarde.
Sendo tres horas e qquarenta minutos, entrou o sr. ministro da fazenda, reabrindo-se logo a sessão.
ORDEM DO DIA
Continuação da discussão do projecto de lei n.º 6 sobre contribuição industrial
O sr. Presidente: - Vae ler-se a moção mandada para a mesa pelo sr. Arroyo na ultima sessão.
Leu-se a seguinte:
Moção de ordem
A camara, reconhecendo que é indispensavel regularisar a situação constitucional do governo e estudar maduramente os meios de melhorar a situação das classes trabalhadoras, continua na ordem do dia = João M. Arroyo.
Foi admittida.
O sr. Eça de Azevedo: - Peço a v. exa. se digne consultar na camara sobre se acha sufficientemente discutida a generalidade do projecto n.º 6.
Resolveu-se affirmativamente.
O sr. Presidente: - Estão na mesa duas propostas de adiamento apresentadas, uma pelo sr. Julio de Vilhena e outra pelo sr. Ruivo Godinho. São as primeiras que se votam. Vae ler-se a do sr. Julio de Villena.
Leu-se. É a seguinte:
Proposta
Proponho que a illustre commissão de fazenda, de accordo com o governo, proceda immediatamente á organização de um projecto de lei sobre a contribuição industrial, ouvindo as associações commerciaes dos interessados, de modo que os onteresses do fisco se harmonisem com as legitimas condições de exercicio do trabalho e da industria. = Julio de Vilhena.
Foi rejeitada.
Leu-se a do sr. Ruivo Godinho. É a seguinte
Proposta
Considerando e confessando o governo e commissão de fazenda, que o projecto, que se discute, tem por fim acabar com as resistencias, protestos o reclamações que têem apparecido no paiz;
Considerando e notando o governo, que taes resistencias e protestos não provêem principalmente d'aquelles a quem eram pedidas as licenças, o que mostra que não são só nem principalmente as licenças que provocam os protestos e resistencias;
Considerando que com effeito as resistencias e protestos, que têem apparecido, não provêem das licenças, mas do augmento que os impostos tem tido ultimamente, e do receio de terem de augmentar ainda mais pelas excessivas despezas, que se estão fazendo;
Considerando que, querendo-se modificar qualquer medida com o fim de acabar com as resistencias, que ella provoca, não é logico modifical-a só em beneficio d'aquelles que não são os que principalmente resistem, e não a modificar em relação aos que resistem principalmente; e
Considerando que o projecto, propondo se ostensivamente beneficiar algumas industrias, não favorece realmente quasi nenhuma:
Proponho que o projecto volte á commissão para ser modificado do modo que attenda todos os reclamantes e produza benefícios reaes para o contribuinte, e que para serem modificadas no mesmo sentido sejam revistas as leis da contribuição de renda de casas, da contribuição sumptuaria e da decima de juros, ultimamente votadas; e que se eleja uma commissão para elaborar um projecto de lei, que reduza os quadros dos empregados públicos a proporções restrictamente indispensaveis, que regule a admissão de empregados addidos, que obste ao abuso que se tem feito das aposentações, e restrinja a casos raros e bem precisos a faculdade dos ministros darem gratificações á custa do thesouro. = Ruivo Godinho.
Foi rejeitada.
O sr. Presidente: - Ha tres propostas de emendas a diversos artigos do projecto de lei. Serão submettidas á votação da camara na occasião em que o projecto for discutido na especialidade.
O sr. Vicente Monteiro: - Peço a v. exa. consulte a camara, sobre se concorda em que essas propostas de emendas ou substituições vão á commissão para que sobre ellas dê o seu parecer.
Foi resolvido affirmativamente.
O sr. Ministro da Fazenda (Marianno de Carvalho): - Mando para a mesa, por porto do meu collega do reino, quatro propostas do lei; a primeira orçando em cada uma das escolas medico-cirurgicas de Lisboa e Porto uma cadeira do anatomia geral e histologia; e na escola medico-cirurgica de Lisboa um curso de pathologia e clinica de molestias de olhos.
A segunda, creando um logar de ajudante do chefe dos trabalhos praticos do laboratorio chimico da universidade de Coimbra, com o ordenado annual de 300$000 réis.
A terceira, auctorisando as juntas geraes dos districtos, das ilhas adjacentes, onde os impostos indirectos municipaes se cobram, quanto aos importados, no acto do despacho pelas respectivas alfandegas, a substituir os impostos a que se referem os artigos 58.° n.º 5.° e 59.° do codigo administrativo por derramas distribuidas ás camaras municipaes, não podendo porém as mesmas derramas exceder em cada anno a somma em que importariam os referidos impostos dentro do máximo para elles fixado nos termos do § 1.° do citado artigo 59.°
A quarta proposta auctorisa o governo a concorrer com o subsidio annual de 4:000$000 réis para as despezas da policia civil no districto do Funchal.
Pedi tambem a palavra para declarar que o sr. ministro das obras publicas não póde vir hoje á camara para responder ao sr. Fuschinii, acerca da questão das aguas em Lisboa, porque tem de estar na camara dos dignos pares, mas que virá logo que lhe seja possível. Tambem s. exa. me incumbiu de declarar que se acha habilitado para responder á interpellação do sr. Franco Castello Branco ácerca da ampliação da mata do Bussaco.
As propostas de lei vão publicadas no fim da sessão a pag. 279.
O sr. Presidente: - Vae ler-se o projecto de lei n.° 6, para ser votado na generalidade.
(Leu-se.)
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O sr. Arroyo: - Peço a v. exa. que consulte a camara, sobre se concorda em que a votação seja nominal.
A camara resolveu affirmativamente.
Feita a chamada.
Disseram aprovo os srs.: Albano do Mello, Alfredo Brandão, Mendes da Silva, Alfredo Pereira, Anselmo de Andrade, Alves da Fonseca, Oliveira Pacheco, Eduardo Villaça, Pereira Borges, Tavares Crespo, Antonio Maria de Carvalho, Mazziotti, Simões dos Reis, Augusto Montenegro, Augusto Ribeiro, barão de Combarjua, Bernardo Homem Machado, Carlos Lobo d'Avila, conde de Castello de Paiva, conde de Villa Real, Eduardo Abreu, Eduardo Coelho, Elvino de Brito, Eliseu Serpa, Goes Pinto, Feliciano João Teixeira, Fernando Coutinho, Almeida e Brito, Veiga Beirão, Francisco Campos, Castro Monteiro, Castro Mattoso Corte Real, Fernandes Vaz, Lucena e Faro, Gabriel Ramires, Henrique de Sá Nogueira, João António Pires Villar, João Augusto de Pina, João Cardoso Valente, Dias Gallas, Menezes Parreira, Vieira de Castro, Sousa Machado, Alfredo da Silva Ribeiro, Correia Leal, Alves Matheus, Silva Cordeiro, Joaquim Veiga, Oliveira Valle, Oliveira Martins, Simões Ferreira, Alvos de Moura, Barbosa Colon, Pereira de Matos, Eça de Azevedo, Abreu Branco, Lemos e Napoles, José Maria de Andrade, Barbosa de Magalhães, Oliveira Matos, José de Saldanha, Simões Dias, Pinto Mascarenhas, Santos Moreira, Faria Graça, Julio Pires, Poças Falcão, Luiz José Dias, Manuel José Correia, Brito Fernandes, Marianno de Carvalho, Marianno Prezado, Pedro Monteiro, Pedro de Lencastre, Sebastião Nobrega, Vicente Monteiro, Estrella Braga, Visconde de Silvos, Francisco José Machado, Francisco de Medeiros, Rodrigues de Carvalho.
Disseram rejeito os srs.: Sousa e Silva, António de Azevedo Castello Branco, Arthur Hintze Ribeiro, Augusto Pimentel, Fidelio de Freitas Branco, Firmino Lopes, Severino de Avellar, Frederico Arouca, Franco Castello Branco, Souto Rodrigues, Arroyo, Teixeira do Vasconcellos, João Pinto dos Santos, José Novaes, Avellar Machado, José de Azevedo Castello Branco, Ruivo Godinho, José Elias Garcia, Pereira dos Santos, Figueiredo Mascarenhas, Ferreira Freire, Julio de Vilhena, Manuel d'Assumpção, Marçal Pacheco, Matheus Azevedo, Miguel Dantas, Pedro Victor, Dantas Baracho.
O sr. Presidente: - Está, portanto, approvado o projecto na generalidade, por 81 votos contra 28.
Estão sobre a mesa duas moções de ordem. Vão ler-se.
Leu-se a do sr. Moraes Carvalho.
É a seguinte:
Moção de ordem
A camara resolve nomear uma commissão que inquira das condições economicas das classes operarias e da influencia que n'essas classes exercem as actuaes leis fiscaes, e continua na ordem do dia. = Moares Carvalho.
Foi rejeitada.
Leu se a do sr. Arroyo.
É a seguinte:
Moção de ordem.
A camara reconhece que é indispensavel regularisar a situação constitucional do governo, estudar maduramente os meios de melhor a situação das classes trabalhadoras, e continua na ordem do dia. = João Arroyo.
Foi rejeitada.
O sr. Presidente: - Participo á camara que a mesa nomeou para fazerem parte da commissão de redacção os srs. deputados Pereira Carrilho, Antonio Ennes, Lobo d'Avila, Simões Ferrara e Eduardo José Coelho.
Passa-se á especialidade do projecto do lei n.º 6.
Leu-se o artigo 1.º
É o seguinte:
Artigo 1.º Ficam isentos da contribuição industrial os indivíduos abaixo designados, inscriptos como collectaveis na tabella de 3 de junho de 1880.
1.º N.º 303. - Mercadores por mundo de legumes, quando para o seu commercio não usem de cavalgaduras ou quaesquer vehiculos.
2.º N.º 306. - Vendedores de leite nas condições no numero anterior e que não tenham animaes que o produzam.
3.° N.º 483. - Vendedores ambulantes de carne, azeite, vinagre e outros objectos ou generos alimenticios e os de combustivel vegetal nas condições do n.º 1.º
O sr. Arouca: - (O discurso será publicado quando s. exa. o restituir.)
Leu-se na mesa o seguinte:
Moção de ordem
A camara, considerando que o sr. ministro da fazenda affirma no seu relatorio que o lançamento e cobrança da contribuição industrial se achavam em estado anarchico antes da lei de 15 de julho de 1887;
Considerando que o sr. ministro pretendeu pôr termo a este estado de cousas, fazendo cobrar parte da contribuição industrial por meio de licenças;
Considerando que, contra este meio de cobrança, se levantaram protestos e reclamações, segundo confessa o illustre commissão de fazenda no seu relatorio;
Considerando que a mesma commissão confessa que alguns industriaes não poderiam e não deveriam pagar imposto industrial pelas difficuldades com que luctam, reconhecendo que alguns industriaes devem por isso ser isentos no pagamento da contribuição industrial, reconhece tambem a necessidade de estudar mais largamente o assumpto, e por isso, adoptando o projecto do illustre deputado sr. Julio de Vilhena, passa á ordem do dia. = F. Arouca.
Foi admittida.
O sr. Alves da Fonseca: - (O discurso será publicado na integra quando s. exa. o restituir.)
O sr. Avellar Machado (sobre a ordem): - A minha moção de ordem é a seguinte:
"A camara, reconhecendo que é necessario proceder a um largo estudo que proveja ás necessidades e satisfaça ás condições de vida das classes operarias e dos pequenos industriaes, continua na ordem do dia."
Antes de começar a expor os diferentes argumentos com que tenciono sustentar e defender a minha moção de ordem, permitta-me v. exa., sr. presidente, que eu peça venia ao illustre deputado e meu amigo o sr. Alves da Fonseca, para não responder ás largas considerações puramente juridicas que s. exa. acaba de apresentar, tentando rebater, sem o que lograsse conseguir (na minha opinião as fundadas conclusões a que chegou o meu amigo e habil jurisconsulto o sr. Arouca, ácerca da inconstitucionalidade dos decretos do sr. ministro da fazenda, principalmente na parte em que applicava a pena de prisão aos infelizes que não possuíssem os indispensaveis meios para tirarem licença para o exercicio da sua profissão ou industria.
Não é, pois, por menos consideração pelo illustre deputado que mo precedeu no uso da palavra, que eu não entro na sabbatina com s. exa., mas simplesmente porque me reconheço incompetente para discutir jurisprudencia com quem quer que seja. Confesso, portanto, como aliás o fez tambem o sr. ministro da fazenda, a minha ignorancia nas sciencias juridicas, e sirva-me esta confissão franca e sincera de desculpa á falta que commetto para com o meu il-
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lustrado amigo o sr. Alves da Fonseca, não discutindo com s. exa. o artigo 672.º da novissima reforma judiciaria, e não sei qual do codigo do processo civil.
Dito isto, conceda-me v. exa., sr. presidente, que em breves palavras eu refute uma asserção completamente erronea e absolutamente falsa que aqui foi feita pelo sr. ministro da fazenda, o que ao mesmo tempo levanto uma insinuação dirigida por s. exa. a alguem que eu não trato de indagar, nem quero saber quem seja.
Protesto comtudo e protestarei sempre com toda a energia contra o systema das insinuações, o principalmente quando estas partem dos bancos do poder. (Apoiados.)
Disse, s. exa. que as municipalidades do Sardoal e Mação haviam representado a esta camara contra os interesses dos seus municipes, e que, portanto, alguem os enganara.
Protesto, repito, com a maior vehemencia contra a insinuação que o sr. ministro da fazenda pretendeu fazer, (Apoiados) sem mesmo curar de saber qual a pessoa que s. exa. tinha em mente ferir quando soltou tão inconveniente expressão. (Apoiados.)
S. exa. tem o antigo sestro de, em todas as discussões em que entra, quer n'esta tribuna, quer n'outra onde tem um lugar importante, dirigir biscas a todos, permitta-me v. exa., sr. presidente, o plebeismo da palavra.
Que o digam as victimas, desde os mais altos funccionarios, até aos infimos operarios e industriaes; que o digam os seus mais intimos amigos e correligionarios, como são os srs. José Luciano, conde de Valbom, Oliveira Martins, Correia de Barros, etc., e os seus mais intransigentes adversarios, taes como Pinheiro Chagas, Julio de Vilhena, etc. Todos, emfim, têem sido mais ou menos mimoseados por s. exa. com as mais aceradas biscas, e tal é a força do habito que difficilmente o perderá. (Apoiados.)
Mas quer v. exa. ver o inconveniente das suas insinuações?
Suppunhâmos, por um instante, que era exacto o facto de haverem as camaras municipaes de Mação e Sardoal representado ao parlamento contra os interesses dos seus municipes. Quem auctorisou s. exa. a dizer que alguem os enganara?
Ora se effectivamente estas representações fossem contra os interesses dos povos, não teria mais curial concluir que o procedimento de tão respeitaveis corporações provinha antes de uma má interpretação das leis, de uma falsa applicação dos principios de economia politica e social, do que a conclusão que s. exa. tirou? (Apoiados.)
Quer ver, sr. presidente, a situação do sr. ministro da fazenda, se eu applicar a s. exa. os mesmos raciocinios que s. exa. quiz applicar ás honradas e zelosas municipalidades a que me refiro?
Eu lh'a mostro.
Ninguem ignora que foi o sr. Marianno de Carvalho que apresentou á camara uma proposta do lei para ser auctorisado a fazer algumas alterações no systema de cobrança da contribuição industrial.
Foi s. exa. que, em virtude d'essa auctorisação, e exorbitando d'ella, estabeleceu o odioso systema das licenças, com todos os vexames de que houve por bem fazel-as acompanhar.
S. exa. defendeu com o maior calor e com uma energia digna do melhor causa, não só no parlamento, mas tambem na imprensa, que era este, o systema mais vantajoso não só para o contribuinte, mas tambem para o thesouro.
Não foi s. exa. o proprio que sustentou à outrance que o systema das licenças era o mais conveniente e o unico que satisfazia aos interesses do contribuinte, e aos do estado? É um facto.
Mas que fez s. exa. depois?
Veiu a esta camara apresentar uma representação contra essa mesma proposta. (Apoiados.)
Portanto, poderia eu também perguntar quem é que enganou s. exa. (Apoiados.)
E se eu fosse dado a represalias poderia responder foi o receio de que as manifestações populares contra s. exa., obrigassem o sr. presidente do conselho a alijal-o. (Riso.) Não vejo outra rasão. (Apoiados.)
Já vê, pois, s. exa. o inconveniente de fazer insinuações, e principalmente quando não ha absolutamente nenhuma rasão para as fazer. (Apoiados.)
E note s. exa. que eu quero crer que mio foi illudido por ninguem, e que a sua reconsideração proveiu de se ter convencido que os principios em que se baseiava a sua famosa lei das licenças não oram os mais consentaneos os interesses do paiz.
Estando a camara já inteirada das rasões que me assistiam para repellir as asseverações do sr. ministro da fazenda, passarei a demonstrar que os desejos formulados, pelas municipalidades do Sardoal e Mação, nas representações enviadas a esta casa do parlamento, são perfeitamente justas e rasoaveis, e no interesse dos municipes.
Vou provar á camara que as representações d'aquellas corporações são completamente justas, e que ellas não fizeram mais que defender os altissimos interesses que lhes estão confiados. (Apoiados.)
As representações a que me refiro estão publicadas n'um dos Diarios do governo da semana passada; todos as podem ver, e verificar o que n'ellas só pode ao parlamento:
1.° Que revogue o decreto de 15 de julho de 1807, e faça suspender todos os diplomas ministeriaes que n'elle se filiaram.
2.º Que vote um conjuncto de medidas que dêem remedio rapido e efficaz aos males de que enferma a nossa agricultura, atalhando assim a temerosa crise que a assoberba.
Oh! sr. presidente, não terão por ventura as camaras municipaes de Mação e Sardoal cumprido com o seu dever, e defendido os interesses dos povos, representando contra o decreto que obrigava os operários e os pequenos industriaes a tirarem licença para trabalhar, ou para exercerem a sua industria, decreto contra o qual se levantou o paiz em massa, e como um só homem? (Apoiados.) E não foi o sr. ministro da fazenda o proprio que reconheceu que o paiz tinha rasão, vindo apresentar aqui uma proposta de lei tornando facultativas às licenças, e eliminando da lei a pena de prisão? (Apoiados.)
Por consequencia, as camaras municipaes a que me refiro, tinham completo direito, e o restricto dever, de representar no sentido em que o fizeram para zelarem os interesses dos seus municipes. (Apoiados.)
Na segunda parte das representações, as mesmas camaras pedem que se acuda com prompto remedio aos males que enfermam a agricultura.
É ou não exacto que o paiz, está atravessando uma crise agricola gravissima, como não ha exemplo de nenhuma outra tão medonha, entre nós? (Apoiados.) Não é, infelizmente, mais do que verdadeira a existencia de uma temorosa crise agricola no districto de Santarém? (Apoiados.) Não vimos nós todos aqui, ainda o anno passado, representações n'este sentido, da real associação de agricultura portugueza, da sociedade agricola do districto de Santarem, e de uma infinidade de camaras municipaes, e de outras corporações administrativas? (Apoiados.)
E todas essas corporações, completamente alheias á politica, apresentaram ao parlamento o misero sudario da nossa lavoura, e descreveram com as devidas cores os males que a agricultura está soffrendo.
Não foi o proprio sr. ministro que já este anno confessou que existia, e, com os symptomas de maior gravidade, uma crise agricola no paiz, declarando comtudo s. exa., e os lavradores que lh'o agradeçam, que não sabia, por ora, quaes os remedios que havia de receitar para tratamento da doença, emquanto não tivesse na sua mão os relatorios do inquerito agricola a que só está procedendo? (Apoiados.)
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Se a agricultura tiver de esperar pela conclusão do inquérito para que se dê satisfação aos seus justissimos clamores, está arranjada (Apoiados.)
Pois não sabe o sr. ministro da fazenda a maneira como na maior parto do paiz têem sido recebidos os inquiridores?
Ignora s. exa. que este inquerito está de facto suspenso, e que em quasi todos os districtos têem sido queimados os boletins respectivos, o corridos á pedra os inquiridores? (Apoiados.)
Dizer portanto s. exa. que espera pela conclusão do inquerito agricola para propor á camara algumas das providencias que tão reclamadas estão sendo pelo paiz, equivale a dizer que não quer fazer cousa alguma a favor da agricultura nacional (Apoiados.)
Se os srs. ministros esporam pelos resultados do inquerito agricola para proporem ao parlamento um conjuncto de medidas que provejam do remedio ao estado em que se encontra a agricultura, podem os lavradores perder a esperança do qualquer auxilio.
A crise agricola é tão temerosa que não póde permittir que se esteja á espera que passem dois ou tres annos, ou, quem sabe, que numero de anuos, para se fazer o inquerito agricola como devo ser, para produzir alguma cousa util.
Sei que o sr. ministro da fazenda não é poeta; eu tambem não o sou; mas repare s. exa. que á agricultura portugueza se podem applicar com mais exactidão aquellas palavras que o nosso grande epico poz na boca da princeza D. Maria, filha do nosso D. Affonso IV, quando esta veiu pedir ao pae que soccorresse o rei do Castella seu marido, contra as hostes sarracenas:
Acude e corre, pae, que se não corres,
Pode ser que não aches quem soccorres.
Creia v. exa., sr. presidente, que o que os lavradores pedem é promptas e energicas providencias que, acudam á miseria que os afflige. Pedem isso, e não attentados á liberdade do trabalho e da industria, que outra cousa não são as licenças; (Apoiados.) pedem isto, e não a elevação extraordinaria do valor cullectavel das matrizes, nem o aggravamento das pautas, nem o augmento da decima de juros, (Apoiados.) nem a taxa militar. (Apoiados.)
Foram estes os dois unicos pedidos leitos por essas camaras ao parlamento, e parece-me ter demonstrado á saciedade que eram de todo o ponto justas e fundadas essas representações, o portanto, absolutamente falsas as affirmativas do sr. ministro da fazenda. (Apoiados.) Mas, entre as differentes considerações apresentadas pelas camaras municipaes a que me refiro, para mostrar quão precaria era a situação dos povos d'aquelles concelhos, citava-se a grande elevação do valor collectavel da propriedade em as novas matrizes, justamente no momento de uma crise violenta, e quando a propriedade decresce successivamente do valor.
Isto deu no goto ao sr. ministro da fazenda, e se s. exa. ousou affirmar que, longe de serem prejudicados, eram, ainda pelo contrario, beneficiados os concelhos representantes. Pois Deus livre s. exa. de ter lá por casa taes beneficios. (Riso. - Apoiados.)
Lembra se sem duvida a camara que a argumentação de s. exa. era a seguinte:
Pelas antigas matrizes as 139 Freguezias do districto de Santarem, em que se acha concluida a revisão, tinham de rendimento collectavel 1.550:000$000 réis, numeros redondos pelas novas matrizes esse valor passou a ser de 2.400:000$000 réis, tambem numeros redondos. Ora, dizia s. exa., como em virtude de, tal augmento, e em harmonia com a lei, se passa do systema de repartição para o de quota fixa, e sendo a percentagem actual para o districto de Santarem de 17 por cento, e a quota a applicar do futuro 10 por cento, segue-se, que essas 139 freguesias que até aqui pagavam mais de 260:000$000 réis do imposto, passarão a pagar 240:000$000 réis, sendo portanto antes beneficiadas que prejudicadas. Logo, concluiu s. exa., as camaras de Mação e Sardoal representavam contra os interesses dos seus municipes!
Dando de barato que sejam exactos os calculos do sr. ministro da fazenda, sempre desejava saber qual foi o Genuense que o auctorisou a concluir que, pelo facto dos concelhos do districto, no seu conjuncto, serem beneficiados, e eram portanto todos os concelhos, e que não poderia haver alguns A, B, C, por exemplo, que passagem os beneficios feitos aos concelhos D, E, F. (Apoiados.) Qual foi o Genuense que, auctorisou s. exa. a concluir que pelo facto da media do imposto predial não augmentar n'um concelho, não foram as freguezas A, B, etc., obrigadas a contribuir para alliviar as freguezias C e D?
E em que tratado de logica aprendeu s. exa. a tirar a condição de que, pelo facto de n'uma freguezia, senão no seu conjuncto, elevado o imposto predial, que os proprietarios A, B, C, não tenham sobeja rasão de se queixarem de haverem sido sacrificados aos proprietários D, E, F, etc.? (Apoiados.)
Pois foi justamente o que aconteceu no districto de Santarem.
Os beneficios feitos a alguns concelhos foram pagos á custa de outros, e especialmente por aquelles que eu tenho a honra de representar em côrtes.
O sophisma de s. exa. foi demasiado transparente e teve apenas a duração dos fogos do artificio; e parece me apropriada a imagem e muito do agrado de s. exa. que já em tempos se dedicou á pyrotechnia (Riso.) com grande, proveito. (Apoiados.)
Mas quer a camara ver o que o sr. ministro da fazenda diz e o que s. exa. faz? Eu lh'o mostro.
Ha poucos dias foram postas em reclamação as matrizes no concelho do Thomar, que consta, de treze freguezias, já incluidas nas cento e trinta e nove a que s. exa. aqui se referiu.
O rendimento collectavel do propridade n'este concelho era pelas antigas matrizes de 95:000$000 réis, numeros redondos, e pelas novas passou a ser de 195:000$000 réis, isto é, teve um augmento de 104 por cento approximadamente.
Immediatamente se reuniram a camara municipal e os principaes proprietarios, sem distincção de côr politica, para effectuar um grande comicio a fim de protestar energicamente contra tão grande vexame.
Julga v. exa. que o sr. ministro da fazenda lhes mandou dizer que não sabiam o que pediam, que alguem os enganara, e que; de tal elevação, só lhes poderiam porvir beneficios, visto que as treze freguezias do concelho pertencem ao conjuncto das cento e trinta e nove beneficiadas, segundo o argumento de s. exa.? Pois não senhor. A resposta de s. exa. foi que não era necessario fazer comicios; que estavam suspensas as novas matrizes e que ia mandar proceder a outras mais justas e equitativas. (Muitos apoiados.)
E eu louvo s. exa. pela sua resolução que foi justa, não me importando para nada com a contradição entre as suas palavras e os seus actos. (Apoiados.)
E quer a camara saber se os povos de Thomar tinham ou não rasão, e até de mais? Suppondo que effectivamente se passava do systema de repartição para o de quota aquelle concelho que hoje paga do contribuição predial 16:000$000 réis, passaria a pagar pelas novas matrizes 19:000$000 réis, isto só para o estado. Que tal era o beneficio?
Pelo que aconteceu em Thomar, que é um concelho, não direi dos mais estimados pelo sr. ministro da fazenda, mas pelo menos que não está no index, póde v. exa. sr. presidente, avaliar o que irá por aquelles que me elege-
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ram, sem auctorisação de s. exa., e até mesmo contra sua vontade. (Apoiados.)
Para beneficiar os concelhos dilectos de s. exa., que são alguns dos do districto de Santarem, por onde s. exa. fez eleger os seus dois bralos, e que lhe escreve as cartas (Riso.) e o que lhe manipula as reformas (Riso.), quer o sr. Marianno de Carvalho obrigar os concelhos com quem não sympathisa, a serem os bodes expiatorios da sua munificencia.
O augmento projectado no valor collectavel da propriedade nos concelhos de Abrantes, Sardoal, Mação e ainda mesmo no de Constancia, o brutal e intoleravel, chegando para algumas freguezias a ser de mais 300 por cento!
Quer v. exa. dois simples exemplos, mas frisantes, do modo porque estão sendo revistas as matrizes ali? Eu lh'os apresento. No concelho do Abrantes, e na minha aldeia, vive em casa propria um meu particularissimo amigo, e vice-presidente da camara municipal. Sabe v. exa. qual foi o rendimento collectavel que deram os louvados ao prédio? 1:000$000 réis (Riso.) Eu perguntarei a v. exa. e á camara se fóra de Lisboa e Porto, não direi já nas villas e aldeias, mas até mesmo nas cidades, conhecem alguma casa particular de habitação pela qual haja quem dê um 1:000$000 réis de renda. (Apoiados.)
Mas ha mais. A pouco mais de 1 kilometro da minha aldeia existe em plano campo uma propriedade com 3 hectares de vinha phylloxerada, tendo uma casa de habitação onde vive o caseiro que a administra por conta do proprietario, que é tambem meu particularissimo amigo, e presidente da camara municipal. Quer v. exa. saber qual foi o rendimento collectavel que lhe attribuiram? 250$000 réis! (Riso.)
Sr. presidente, conheço em Lisboa directores geraes e altos funccionarios que habitam em casas de valor collectavel, inferior ás que habitam no campo os caseiros dos meus amigos.
(Interrupção do sr. Vicente Monteiro.)
Não é a v. exa. que eu me refiro, porque v. exa. foi apenas director geral, como foi embaixador, inpartibus. (Riso. Apoiados.)
Esta desigualdade flagrante, este, vexame directo feito de proposito a cavalheiros dignissimos, não póde tolerar-se. (Apoiados.)
O sr. ministro da fazenda não deve nem póde permittir que prevaleçam matrizes feitas d'este modo, e eu allianço a v. exa. que se nos restantes concelhos do reino ellas foram feitas da maneira que se estão fazendo n'aquelles que citei, nunca s. exa. logrará vel-as em execução. (Apoiados.)
A rasão d'estes factos é obvia. Quando caiu o ministerio regenerador em 1886, estavam quasi concluidas as matrizes no concelho de Abrantes, e iam começar no de Sardoal. Essas matrizes haviam sido feitas com o maior escrupulo, por louvados compelontissimos e honestissimos sob, a direcção do sr. Augusto Cezar de Gouveia Homem, então delegado do thesouro, que se houve de tal modo n'este serviço que mereceu do sr. Hintze Ribeiro duas portarias de louvar, sob proposta de um funccionario de tal ordem, como era e é o sr. Pedro de Carvalho. (Apoiados.) O proprio sr. ministro da fazenda prestou homenagem ao zelo e talento d'este funccionario, nomeando em commissão especial para organisar as matrizes no segundo districto do reino, o do Porto.
Pois as matrizes assim feitas, com os louvados mais competentes, sendo directamente fiscalisado o serviço, quer no campo, quer no gabinete, pelo sr. Gouveia Homem, foram immediatamente pontas do parte, sem que ao menos se soubesse se contra ellas haveria ou não numerosas reclamações! Mas o que se pretendia era apenas fazer pressão sobre os proprietarios, ameaçando-os com as maiores violencias e arbitrariedades se não votassem com o governo.
No concelho do Sardoal nem ao menos deixaram funccionar o pessoal nomeado, e tratavam immediatamente de o substituir por pessoas que obedeciam mais ou menos cegamente ás ordens das auctoridades.
E quer a camara saber de que ordem foi o pessoal nomeado pelos delegados do sr. ministro da fazenda para procederem a uma revisão de matrizes? Eu lh'o digo.
Vozes: - Deu a hora, deu a hora.
O Orador: - Não desejava levar a palavra para casa, e ainda que eu tenha de fallar n'outro artigo concluirei, se a camara me der licença, muito brevemente as minhas reflexões.
Vozes: - Falle, falle.
O Orador: - Quero corresponder á benevolencia da camara e vou, portanto terminar por hoje.
Como ia dizendo, os peritos que fizeram as novas matrizes na villa de Abrantes eram dois dos melhores mestres do obras do concelho, com officio respectivamente do carpinteiro e pedreiro, e o secretario, um arbitrador do juizo, com larga experiencia de avaliar propriedades urbanas.
Quer v. exa. saber qual foi o pessoal com que o sr. Marianno do Carvalho, desprezando o trabalho assim feito, mandou fazer outro de novo?
Um ferreiro, um ferrador, um hortelão e uma praça de prot do exercito! (Riso.) Podem todos estes individuos ser muito peritos nas suas especialidades, e creio que o são, mas para avaliadores de predios urbanos, creio que não seria facil a s. exa. encontrar ninguem mais incompetente. (Apoiados.)
E a proposito da praça de pret, disse s. exa. no outro dia que capitães haveria menos illustrados do que simples soldados. E de facto assim póde acontecer, porque conheci já simples soldados bachareis em mathematica; mas apesar de não saber só s. exa. queria dirigir alguma ironia ao capitão mais conhecido n'esta camara, o meu honrado amigo e camarada o sr. Machado, (Riso.) porque não seria a primeira, eu affirmo a s. exa. que a referida praça de pret, de que vi a nota de assentamento, apenas sabe ler e escrever, o tendo entrado para o serviço militar na idade minima admissivel rios regulamentos, não foi no quartel que aprendeu a arte das construções. Mas se elle era filho de, um regedor progressista, que melhor diploma se lhe poderá exigir? (Riso. - Apoiados.)
Vou terminar, porque já ha muito deu a hora, e a camara deve estar fatigada de tão longa sessão. N'outra occasião sustentarei desenvolvidamente a minha moção. Fallando, porém, com toda a seriedade, registo mais uma vez a declaração feita ha dias pelo sr. ministro da fazenda lio que, caso lhe dessem conhecimento de quaesquer irregularidades ou injustiças em as novas matrizes, se compromettia a providenciar nem demora, para que fossem corrigidas. E o que novamente peço a s. exa., e á boa paz me rogo que ponha de parte mesquinhas exigencias dos seus correligionarios que o compromettem, e que cumpra o que prometteu á camara, isto é de providenciar devidamente acerca do todas as reclamações dos povos, que forem justificadas.
Termino por hoje, reservando me o direito de usar novamente da palavra em qualquer dos outros artigos do projecto.
Vozes: - Muito bem, muito bem.
O sr. Presidente: - A ordem do dia para ámanhã o a continuação da que estava dada.
Está levantada a sessão.
Eram mais de seis horas da tarde.
Propostas de lei apresentadas n'esta sessão pelo sr. ministro da fazenda por parte do sr. ministro do reino
Proposta de lei n.° 10-A
Senhores. - Ao chefe doa trabalhos praticos do laboratorio chimico da universidade pertence ministrar o ensino
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pratico aos alumnos do curso do 1.° e 2.º anno da faculdade de philosophia e do curso de pharmacia, e alem d'isso auxiliar o lente da chimica nas demonstrações da aula durante as prelecções, coadjuvar o director do laboratorio e os lentes nas investigações o estudos scientificos que elles entenderem, e fazer os ensaios, preparações e trabalhos que lhe forem requisitados pelos lentes ou determinados pelo conselho da faculdade.
Não póde um só homem, por melhor que seja a sua boa vontade, e por mais extraordinaria que seja à sua actividade, vigiar e dirigir tão avultado numero de alumnos, e desempenhar-se das suas outras obrigações, e terá muitas vezes de distrahir-se de algum d'esses serviços. Acresce que, quando, por motivo de molestia, ou por qualquer outro justificado, não possa comparecer no laboratorio, ficarão sem ensino pratico os alumnos da faculdade de philosophia, e terão de interromper-se os cursos do 1.° e 2.º anno de pharmacia.
Por estas rasões tem a faculdade de philosophia podido com instancia a creação de, um logar de ajudante, do chefe dos trabalhos praticos do laboratorio, e o conselho superior de instrucção publica consultou-a, favoravelmente, nas suas sessões de 1886 e 1887.
O governo, compenetrado da justiça da alludida pretensão, tem a honra de propor-vos o seguinte projecto de, lei:
Artigo 1.° É creado um logar de ajudante do chefe dos trabalhos praticos do laboratorio chimico da universidade de Coimbra, com o ordenado animal de 300$000 réis.
Art. 2.º Fica revogada a legislação cm contrario.
Secretaria d'estado dos negocios do reino, em 31 de janeiro de 1888. = José Luciano de Castro.
Ás commissões de fazenda e instrucção superior.
Proposta de lei n.° 10-B
Senhores. - A importancia que tem conquistado a histologia, base fundamental, com a anatomia e a physiologia, do toda a sciencia medica, e a impossibilidade de se dar ao ensino d'estas disciplinas, actualmente accumulado com o de outras era diversas cadeiras do quadro das escolas medico-cirurgicas do Lisboa e Porto, o desenvolvimento de que não póde prescindir-se sem desdouro d'estes institutos, e prejuizo da mais util e completa habilitação dos seus alumnos, que n'esta parte se acham em condições inferiores aos da faculdade de medicina da universidade, de Coimbra, não consentem que por mais tempo se adie a croacio da cadeira a que se refere o artigo 1.° da presente proposta do lei, e que tem sido repetidas vezes solicitada pelos respectivos conselhos escolares, e recommendada pelo conselho superior de instrucção publica nos seus relatorios dos tres ultimos annos.
É certo que não se limitam á cadeira indicada as providencias que têem reclamado ultimamente os conselhos escolares e o conselho superior para o aperfeiçoamento dos estudos medicos no paiz. Muitas das disciplinas que boje constituem o quadro d'esses estudos carecem, como o está exigindo o progresso da sciencia, de ser separadas de outras a que andam ligadas para a cada qual se dar o tempo indispensavel ao seu melhor estudo e mais util desenvolvimento. Por outro lado, o exemplo das nações mais adiantadas, e as vantagens que tem produzido para os enfermos, para a sciencia o para o ensino, a cultura das especialidades clinicas, requerem a instituição de cursos correspondentes nas nossas escolas.
Quizera o governo attender desde já a todos estes melhoramentos, cuja necessidade reconhece; mas não lhe sendo licito fazel-o porque as forças do thesouro publico não comportam as avultadas despojas que elles demandariam, e porque tambem o justo considerar e satisfazer algumas solicitações, essas fundamentadas, de outros estabelecimentos de instrucção superior, restringe-se por agora á creação da cadeira e do curso sobre que versa a proposta de lei, que tenho a honra de submetter á vossa [...] apreciação.
Com referencia ao curso de pathologia e clinica de molestia de olhos, o governo entendeu conveniente estabelecel-o só na escola de Lisboa emquanto se não habilitem especialistas que mais tarde possam reger e dirigir iguaes cursos com proveito publico nas demais escolas do reino. E n'esta deliberação foi de grande peso para o governo a circumstancia, que felizmente se offerece, de puder aproveitar a reconhecida competencia e notoria reputação de um nosso compatriota que occupa um logar distincto entre os mais eminentes especialistas da oculista, e exerço dignamente o magisterio n'uma universidade da Allemanha, o dr. Gama Pinto.
Taes são em resumo os fundamentos da seguinte proposta de lei:
Artigo 1.° É creada em cada uma das escolas medico-cirurgicas de Lisboa e Porto uma cadeira de anatomia geral e histologia.
Arr. 2.º É creado na escola medico-cirurgica, de Lisboa um curso de pathologia e clinica de molestia de olhos.
§ 1.º Para a regencia d'este curso haverá um professor e um ajudante ou chefe de clinica.
§ 2.° O primeiro provimento do logar de professor será feito por nomeação do governo em individuo do competencia especial e provada reputação n'este ramo de ensino. O primeiro provimento do logar de ajudante ou chefe de clinica será temporario por dois ou tres annos, e deverá recair cm pessoa de reconhecida aptidão, contratada em paiz estrangeiro.
§ 3.° O professor do curso terá os vencimentos, honras e prerogativas dos lentes da escola. O ajudante ou chefe de clinica terá o vencimento e categoria igual ao demonstrador.
Art. 3.º Fica revogada a legislação em contrario.
Secretaria d'estado dos negocios do reino, em 31 de janeiro de 1888. = José Luciano de Castro.
As commissões de fazenda e de instrucção superior.
Proposta de lei n.º 10-C
Senhores. - No districto do Funchal acham-se em divida, desde o mez do agosto ultimo, os vencimentos do corpo da policia civil, a cujo pagamento não se tem podido satisfazer por falta de meios, por isso que a junta geral d'aquelle districto, não tendo recorrido aos addicionaes os contribuições directas do estado para o anuo de 1887, não podia tambem receber as derramas que votara no imperio do codigo administrativo de 1878, e deixou da mesma sorte de votar orçamento para o corrente anno civil.
Devera-se no anno findo ter procedido a um orçamento supplementar, para sanar aquella falta, e, porque não se lançou mão d'este expediente, ordenou o governo os tramites necessarios para supprir a omissão da junta geral nos termos do artigo 71.º do codigo administrativo, o que igualmente, determinou pelo que toca ao orçamento districtal para o anno corrente.
É n'este que hoje deveria ser attendida a mencionada divida, pois que não foi possivel concluir o orçamento supplementar no anno a que respeitava; a difficuldade, porém, do prompto pagamento por parle do districto, a situação dos funccionarios a quem se devem aquelles vencimentos, e as anormaes circumstancias da agricultura e da industria na ilha da Madeira, persuadem o governo do que é indispensavel mais breve e radical providencia, que não se haja de nottar o actual embaraço, mas previna futura molestia.
Com approvação da junta geral foi pela respectiva commissão delegada dirigida ao governo uma representação expondo a conveniencia de ser supprimido o corpo de policia civil, por não parecer justo que se mantenha esta in-
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stituição, que representa a mais avultada despeza a cargo de todo o districto, punido a maior parte d'elle não gosa dos seus beneficios, pois que a policia civil, fora do concelho do Funchal, mui extraordinariamente presta qualquer serviço.
Posto que a esta consideração não sejam inteiramente estranhou os outros districtos, o que sem duvida se deverá attender n'uma futura organisação policial, é certo que no districto do Funchal se accentua ainda, mais, e as condições especiaes da ilha da Madeira exigem que desde já se tome alguma salutar providencia n'este assumpto.
Parece ao governo que para este fim se poderá com vantagem adoptar expediente analogo ao da lei do 7 de maio de 1878, com referencia ao districto de Coimbra, concorrendo o estado com um subsidio animal para a manutenção do corpo da policia civil do Funchal, solvendo desde já os vencimentos que a este se devem, e ficando o resto da despeza a cargo dos concelhos na proporção dos serviços que elle lhes presta.
Calculando-se a totalidade do encargo em 7:428$000 réis, poderá o estado conceder o subsidio animal de réis 4:000$000, devindo a junta geral distribuir a restante despeza, na devida proporção, pelas camaras municipaes dos concelhos a que mais interessar o serviço policial, o que de resto vae já em harmonia com a proposta do governo, para nas ilhas adjacentes se auctorisar a substituição dos impostos districtaes directos pelas derramas.
Com estas medidas e, solvendo o estado por adiantamento, cuja importancia até ao fim de dezembro ultimo parece justo que seja ainda paga pelas camaras municipaes, os vencimentos da policia que se deverem na data em que para este effeito for concedida a necessaria auctorisação, cremos que com justiça e equidade se terá attendido n'esta parte da administração publica as circumstancias em que se acha, e aos embaraços economicos, com que lucta, a ilha da Madeira.
Por estes fundamentos pois temos a honra de submetter á vossa approvação a seguinte proposta de lei:
Artigo 1.° É auctorisado o governo a concorrer com o subsidio annual de 4:000$000 réis para as despezas da policia civil do districto do Funchal.
Art. 2.° A restante despeza para satisfação do encargo anual com a policia civil será pela junta geral do districto distribuida ás camaras municipaes dos concelho do mesmo districto na proporção dos serviços que respectivamente lhes prestar o corpo de policia.
Art. 3.º É auctorisado o governo a fazer adiantamento per conta do subsidio, a que se refere o artigo 1.º, da quantia que for necessaria para só pagarem os vencimentos que se acham em divida ao corpo da policia civil do Funchal, e cuja importancia até ao fim de dezembro ultimo a junta geral haverá das camaras municipios dos concelhos do mesmo districto.
Art. 4.° Fica revogada a legislação em contrario.
Secretaria d'estado dos negocios do reino, 31 de janeiro de 1888. = José Luciano de Castro = Marianno [...] de Carvalho.
As commissões de fazenda e administração publica.
Proposta de lei n.º 10-D
Senhores. - É de todos assás conhecida a menos vantajosa situação economica das ilhas adjacentes, especialmente pelo que toca ao districto do Funchal, onde o definhamento dos respectivos recursos, resultante das causas que têem affectado as suas principaes fontes de receita, a cultura da vinha e da canna de assucar, e da difficuldade, em liquidar os outros, aliás escassos, productos pela concorrencia dos productos estrangeiros, reclama, que em seu beneficio se adaptem providencias excepcionaes.
Esta medida não é porém uma novidade nas nossas leis administrativas, que sempre mais ou menos attenderam a differença de condições em que em relação aos districtos do continente, do reino se acham os das ilhas adjacentes.
D'este facto dão documento os artigos 126.° do codigo do 1878 e 159.° do codigo actual, por onde os impostos indirectos votados nos orçamentos municipaes são cobrados quanto aos generos importados no acto do despacho e pelas respectivas alfandegas.
O exame da administração e da fazenda dos corpos administrativos das ilhas adjacentes aconselha a que para estas se acrescente o citado artigo com mais uma providencia, especial, modificando-se o § 1.° do artigo 58.° do codigo administrativo na parte em que revogou o n.° 5.° do § 1.º do artigo 59.° do codigo do 1878.
Com effeito nos concelhos dos alludidos districtos a mais importante, e n'alguns a unica receita municipal, deriva dos impostos indirectos, o que não só é acceito sem repugnancia, mas tem a muito importante vantagem de alliviar o contribuinte de addicionaes ás contribuições do estado predial, industrial, sumptuaria e de renda de casas, cujo pagamento na precaria situação, a que me tenho referido, seria muitas vezes difficil e até violento.
Não se incluindo, porém, nas receitas dos districtos, os impostos indirectos, será forçoso recorrer-se aos addicionaes ás contribuições directas do estado, só não lhes acudir uma providencia legislativa que remova aquelles embaraços.
N'este proposito, pois que os addicionaes importam em maior gravame para o contribuinte nos indicados districtos, tenho a honra de submetter á vossa approvação a seguinte proposta de lei:
Artigo 1.° Nos districtos das ilhas adjacentes, onde os impostos indirectos municipaes se cobram, quanto aos generos importados, no acto do despacho, pelas respectivas alfandegas, são auctorisadas as juntas geraes a substituir os impostos, a que se referem os artigos 58.° n.° 5.º e 39.º do codigo administrativo, por derramas distribuídas ás camaras municipaes, não podendo, porém, essas derramas exceder em cada anno a somma em que importariam os referidos impostos dentro do maximo para elles, fixado nos termos do § 1.° do citado artigo 59.°
Art. 2.º Do producto dos impostos municipaes, cobrados na conformidade do artigo 159.° do codigo administrativo, será entregue mensalmente á junta geral do districto a parte correspondente das derramas distribuídas ás camaras minicipaes.
§ unico. A parte do imposto a que se refere este artigo poderá ser entregue pela alfandega directamente á junta geral do districto, havendo para esse effeito accordo com as camaras municipaes.
Art. 3.º Fica revogada a legislação em contrario.
Secretaria d'estado dos negocios do reino, em 31 de janeiro de 1888. = José Luciano de Castro.
As commissões de administração publica e fazenda.
Discursos proferidos pelo sr. presidente do conselho de ministros José Luciano de Castro, na sessão de 23 da janeiro e que se deviam ler-se respectivamente, a pag. 218, col. 2.ª, pag. 220, col. 1.ª, e pag. 221, col 1.ª
O sr. Presidente do Conselho de Ministros e Ministro do Reino (Luciano de Castro): - Se bem ouvi, o illustre deputado, parece-me que s. exa. se referiu a uma carta particular que recebêra de Braga, na qual se dizia que estava annunciado um comicio para amanhã, e que havia receio de ser perturbada a ordem n'esse comício por parte dos agentes da auctoridade.
Eu não tenho noticia alguma de que se realise amanhã qualquer comicio em Braga, e portanto não sei que fundamentos possam ter as informações que foram dadas a s. exa. O que posso porém, assegurar, como já assegurou o sr. ministro dos negócios estrangeiros é que o governo está resolvido a manter em toda a sua plenitude o direito de reu-
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nião, e a não tolher do nenhum modo a qualquer cidadão o direito que tem de emmittir livremente a sua opinião a respeito de todos os actos do governo. (Muitos apoiados. - Vozes: - Muito bem.)
Portanto já s. exa. sabe que o governo está disposto a dar ao governador civil de Braga as instrucções neccessarias para que por parte dos agentes da auctoridade seja inteiramente, mantido o direito de reunião.
Emquanto a este ponto nada mais tenho a dizer. S. exa. referiu-se tambem ao facto, a que já ha poucos dias tinha alludido, de terem sido apprehendidos dois supplementos a jornaes de Braga e perguntou se isto era verdade e se tinham sido presos alguns dos distribuidores.
As informações que tenho do governador civil de Braga, são de que por motivo de ordem publica, s. exa. entendeu que devia mandar proceder á apprehensão dos dois supplementos porque os julgou verdadeiramente incendiarios e provocadores da desordem, mandando ao mesmo tempo levantar os competentes autos e remetter tudo ao ministerio publico, nos termos da lei.
Emquanto aos distribuidores, o sr. governador civil affirma que nem foram presos nem sofreram o menor incommodo.
Pelo que respeita ás observações do illustre deputado, devo dizer a s. exa. que a disposição da lei em que o sr. governador civil de Braga se fundou para proceder á apprehensão dos ditos supplementos, ou pelo menos a disposição em que podia fundar-se, foi a do artigo 218.º do codigo administrativo que auctorisa os governadores civis a tomarem as providencias necessarias para manter a ordem publica.
Emquanto á apprehensão...
(Interrupções.)
Os illustres deputados hão de permittir-me que eu tenha, ao menos o direito de expor uma opinião; (Muitos apoiados.) e, de mais, eu nem estava a expor a minha opinião, estava apenas indicando a disposição da lei em que poderia fundamentar-se o sr. governador civil, para proceder, como procedeu; mas os illustres deputados nem isso permittem; não querem ouvir as rasões que a seu favor pude allegar a auctoridade superior de Braga.
Evidentemente o governo é quem ha de apreciar os actos do seu delegado, e sobre os actos do governo é que ha de recair a apreciação do parlamento, que tem de examinar se se realisaram as condições do ordem publica que tornaram necessario e justificaram o procedimento do governador civil.
Mas é incontestavel que em face da lei, os governadores civis têem o direito de adoptar as providencias necessarias para evitar a perturbarão da ordem publica.
É expressa a disposição citada do codigo administrativo.
Emquanto á apprehensão dos supplementos aos jornaes, eu devo dizer a s. exa. que o regulamento de policia e o codigo administrativo auctorisam expressamente os administradores do concelho e os agentes da auctoridade a apprehenderem os jornaes que incitarem á revolta o possam promover alteração na ordem publica, levantando autos do investigação, inquerindo testemunhas e colligindo os documentos, necessarios para se instaurar o processo.
É minha opinião, em face da legislação actual e da imprensa que não devem ser apprehendidos serão os numeros dos jornaes necessarios para se poderem colligir as provas que fundamentem o procedo criminal.
N'este sentido eu tenho tenção de dar ordens expressas não só ao governador civil de Braga, mas a todos os governadores civis para que não façam apprehensões em casos semilhantes, senão dos jornaes necessários para se formar o processo.
É isto o que está auctorisado no codigo administrativo e em todos os regulamentos de policia.
Repito, a auctoridade de Braga, ordenou a apprehensão, e levantado o auto respectivo foi tudo enviado ao poder judicial, ao qual computo conhecer só houve fundamento para essa apprehensão, e se o processo deve continuar ou archivar se.
Em conclusão, eu considero justificavel o procedimento do governador civil, porque elle se fundou em motivos do ordem publica, entendendo que, em vista da excitação que reinava na cidade de Braga, devia tomar aquella medida, para que a tranquillidade não fosse altera-la, por isso que se procurava desfigurar uma proposta de lei apresentada á camara pelo governo, tentando-se provocar á revolta; e tanto os regulamentos de policia, como o codigo administrativo mandam que em taes circumstancias se lavrem os autos da investigação necessarios, e se apprehendam tantos numeros quantos sejam precisos para se instaurar o processo. Procedeu, portanto, correctamente o sr. governador civil.
Por agora nada mais direi, mas se forem precisos mais esclarecimentos não terei duvida em pedir novamente a palavra.
O sr. Presidente do Conselho de Ministros (Luciano de Castro): - O illustre deputado não protestou contra a minha doutrina, protestou contra a doutrina da lei. A doutrina que eu expux á camara está claramente expressa no artigo 218.º do codigo administrativo, que dá competencia aos governadores civis para tomarem as providencias que julgarem necessarias á manutenção da ordem.
O sr. Marçal Pacheco: - Mas em conformidade com as leis.
O Orador: - Mas esta é que o a lei, não ha outra. (Apoiados.)
Ora eu respeito muito a opinião dos illustres sabios da opposição; bem sei que sabem muito mais do que eu, mas hão-me permittir-me que n'este ponto tambem tenha a vaidade de ter uma opinião. E de resto a discussão não tem outro fim. É para que cada um apresente a opinião que tem, de outro modo nada se aproveitava em discutir.
O que eu disse é justamente, o que diz o codigo administrativo: "Todas as providencias necessarias para manter a ordem".
Ora, eu pergunto qual é a disposição que prohibe ou não permitte aos administradores de concelho usarem d'estas attribuições. Onde existe uma disposição qualquer que limite esta faculdade ás auctoridades administrativas?!
O sr. Marçal Pacheco: - É a lei de imprensa.
O Orador: - Lá chegaremos.
Aqui ha duas questões; uma é a da apprehensão dos jornaes, para se formar o processo criminal; e sobre este ponto já eu disse ao illustre deputado, que estava perfeitamente conforme em que não se devia fazer senão a apprehensão dos jornaes necessarios para aquelle fim.
N'esse sentido darei as instrucções necessarias, tanto ao governador civil do Brazil, como aos dos outros districtos; mas ha outra questão, que é a da ordem publica: e n'este ponto é que as attribuições dos governadores civis são mais largas, embora sempre subordinadas á responsabilidade do uso ou abuso que d'ellas fizerem; porque é o governo e o parlamento que hão de julgar se elles exhorbitaram ou não, se adoptaram ou não quaisquer providencias extraordinarias, sem que fossem determinadas pela necessidade de manter a ordem publica.
Esse é que é o limite; é o direito que o governo tem de fiscalisar os actos dos governadores civis, ver se elles, em nome da ordem publica, e abusando na interpretação da lei, praticaram algumas violencias ou algumas arbitrariedades que não fossem necessarias para esse fim. Esse acto do governo é depois fiscalisado pelo parlamento, a quem tem de dar contas do bom ou mau procedimento das auctoridades administrativas. (Apoiados.)
Pois s. exa. queria que os governadores civis ou os
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administradores de concelho, diante de uma necessidade urgentissima de acudir á ordem publica, tivessem outra limitação que não fosse a da sua responsabilidade pelos abusos que possam commetter?
O governo tem sempre o direito do exigir a responsabilidade aos governadores civis pelos actos por elles praticados, e elle, bem como o parlamento, é que são os competentes para julgar se porventura só deram ou não circumstancias de ordem publica que justificassem esses actos.
É este o unico limite, repito. (Apoiados.)
Esta é que o a doutrina em toda a parte e sempre foi assim. Não é nova; é a doutrina do todos os escriptores e de todos os publicistas. (Apoiados.)
Mas o sr. governador civil de Braga entendeu que, por necessidade de manter a ordem publica, lho era indispensavel apprehender aquelles jornaes que eram verdadeiras proclamações á revolta, (Apoiados.) verdadeiras proclamações incendiarias; entendeu que a ordem publica perigava se se permittisse que fossem distribuidos e publicados aquelles supplementos, que eram, repito, verdadeiras provocações á revolta. (Apoiados.)
Procedeu bem o sr. governador civil?
Se effectivamente se deram as circumstancias a que s. exa. se referiu; se effectivamente, como elle affirma, a ordem publica podia ser perturbada, creio que aquella auctoridade cumpriu o seu dever. (Apoiados.)
As informações que tenho são estas; são de que a distribuição d'aquelles supplementos podia desvairar a opinião o produzir graves perturba-los na ordem publica.
Se a apprehensão evitou que a ordem publica fosse perturbada, a auctoridade cumpriu o seu dever. (Apoiados.)
E quanto ao numero de exemplares apprehendidos, o que eu disse e repito o que a apprehensão deve ser unicamente d'aquelles que forem necessarios para se instruir o processo judicial.
As ordens que dei são n'este sentido e em conformidade do codigo administrativo, artigo 242.°, n.ºs 20.° e 23°.
Ora o governador civil mandou apprehender os jornaes, mandou levantar os autos respectivos, e mandou remetter tudo ao ministerio publico, como determina o codigo, e portanto não faltou aos preceitos da lei.
Tambem eu me prezo de ser liberal. Posso dizer ao illustre deputado que a lei de imprensa a que s. exa. se referiu, se deve principalmente á minha iniciativa, (Apoiados) porque fui eu que apresentei n'esta camara o projecto (Apoiados.) e fui eu o encarregado pelo sr. Barjona de Freitas, estão ministro da justiça, de preparar a proposta que se converteu na lei que hoje existe. Por consequencia não posso ser suspeito de menos liberal, quanto á lei da imprensa.
Na imprensa nasci, e o pouco que valho a ella o devo. Como podia eu, portanto, associar-me, a quaesquer tentativas que importassem uma restricção das formalidades concedidas pela lei ao jornalismo?
O que não posso é levar o meu amor pela liberdade de imprensa até no ponto de permittir que as auctoridades cruzem os braços diante do verdadeiros pasquins, (Apoiados.) de verdadeiras proclamações, provocando o povo á rebellião; (Apoiados.) incitando o povo a levantar-se contra as leis e contra as auctoridades constituidas. (Apoiados.)
Se me fosse necessario praticar qualquer acto que eu julgasse não permittido pelas leis, não duvidaria n'essas circumstancias vir declarar francamente ao parlamento que as leis tinham sido violadas, mas que me absolvesse porque tinham sido salvos os intersses publicos. (Apoiados.)
É o que por ora tenho a dizer.
Vozes: - Muito bem, muito bem.
(S. exa. não reviu.)
O sr. Presidente do Conselho de Ministros (Luciano de Castro): - Sr. presidente, eu não disse que aos governadores civis era permittido fazer crimes! (Muitos apoiados.) Eu não disse que para manter a ordem era permittido aos agentes da auctoridade praticar actos, que as leis prohibissem. Não disse isto.
E pergunta-me o sr. Pinheiro Chagas se um govenador civil póde suspender a carta, fazer crimes, roubar, matar? Não, senhor, não póde; e por uma rasão muito simples, é que esses actos a que s. exa. se referiu são crimes, que nenhuma auctoridade, como nenhum particular, póde traticar. Essa heresia não a pronunciei eu! E tanto não a pronunciei, que, respondendo a um aparte do sr. Lopo Vaz, eu perguntei qual era a lei que prohibia que a auctoridade podesse praticar o acto que o sr. governador civil de tinha praticado! Os governadores civis podem praticar qualquer acto que não seja prohibido por lei. Evidentemente não podem roubar, não podem matar, não podem attentar contra os direitos dos cidadãos garantidos na carta. É claro que não.
O que eu digo o que, se um administrador do concelho, se um governador civil, no exercicio das suas attribuições, exorbitar, a sua responsabilidade e perante o governo como este tem a sua responsabilidade perante o parlamento. Se as auctoridades praticarem um attentado contra as leis o offenderem os direitos e garantias marcados na constituição, e o governo não proceder contra elles é para o parlamento que se deve appellar, assim como antes se appellar das auctoridades para o governo. (Vozes: - Muito bem).
Não disse, portanto, repito, não affirmei, não avancei a doutrina que o illustre deputado me attribuiu.
Podiam as auctoridades adoptar todas as providencias que julgassem necessarias; mas é claro que não podiam praticar aquillo que a lei prohibe.
Como podia eu dizer que as auctoridades podiam praticar crimes mesmo em nome da ordem publica? (Apoiados.)
De certo que não podia dizer similhante cousa.
Aponte-me s. exa. qual o a disposição legal que declara que a apprehensão de supplementos, que são uma verdadeira proclamação incendiaria, uma excitação á revolta, em nome da ordem publica, é prohibida, ou que a liberdade das auctoridades administrativas n'esse ponto é limitada por alguma disposição legal.
Diga-me o illustre deputado qual é a lei que prohibe os administradores de concelhos ou os commissarios de policia do praticarem taes apprehensões por motivos de ordem publica.
Por certo que nenhuma poderá apontar.
Portanto a minha doutrina não é a que o illustre deputado me attribue. A minha doutrina o que para manter a ordem publica é permittido aos administradores do concelho e a todos os agentes da auctoridade adoptarem as providencias que julgarem indispensaveis; mas este direito não chega ao ponto de poderem praticar actos que são crimes. (Apoiados.)
Pedi a palavra para dar esta explicação, não obstante me parecer que não seria preciso; em todo o caso as palavras do illustre deputado podiam, por serem muito auctorisadas, fautor acreditar a quem as tinha ouvido, que eu tinha affirmado uma doutrina que estava tão longe das minhas intenções como das minhas palavras.
Vozes: - Muito bem.
(S. exa. não reviu as notas tachygraphicas.)
Redactor = S. Rego.