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SESSÃO DE 29 DE JANEIRO DE 1879
Presidencia do ex.mo sr. Francisco Joaquim da Costa e Silva
Secretarios - os srs.
Antonio Maria Pereira Carrilho
Augusto Cesar Ferreira de Mesquita
SUMMARIO
Declarações ácerca dos trabalhos da commissão de inquerito á penitenciaria e approvação de uma proposta para que seja eleita uma commissão de quinze membros a fim de continuar o exame e syndicancia. - Approvação da proposta do ministerio da guerra, para que os deputados que exercem funcções n'este ministerio as accumulem com as legislativas. — Eleição das commissões de obras publicas, negocios externos e recrutamento. — Approvação do parecer sobre a eleição do circulo n.º 130 (Ponta do Sol).
Abertura — Ás duas horas e um quarto da tarde.
Presentes á chamada 68 srs. deputados.
Presentes á abertura da sessão — Os srs.: Adriano Machado, Fonseca Pinto, Silva Fevereiro, Tavares Lobo, Sousa Leitão, Alberto Carneiro, Gonçalves Crespo, Sá Brandão, A. J. d'Avila, Barros e Sá, A. J. Teixeira, Carrilho, Ferreira de Mesquita, Pereira Leite, Victor dos Santos, Zeferino Rodrigues, Avelino de Sousa, Barão de Ferreira dos Santos, Serpa Pimentel, Sousa Carvalho, Sanches de Castro, Conde da Foz, Diogo de Macedo, Moreira Freire, Costa Moraes, Hintze Ribeiro, Firmino Lopes, Vieira das Neves, Mesquita e Castro, Francisco Costa, Pavão, Van-Zeller, Arouca, Palma, Paula Medeiros, Freitas Oliveira, Brandão e Albuquerque, Scarnichia, Barros e Cunha, Sousa Machado, Joaquim Neves, Almeida e Costa, J. J. Alves, Tavares de Pontes, Laranjo, Pereira da Costa, Figueiredo de Faria, Namorado, Rodrigues de Freitas, José Luciano, Ferreira Freire, Teixeira de Queiroz, J. M. Borges, J. M. dos Santos, Sá Carneiro, Barbosa du Bocage, Julio de Vilhena, Luiz de Lencastre, Bivar, Garrido, Manuel d'Assumpção, Pires de Lima, Rocha Peixoto (Manuel), Mota Veiga, Alves Passos, Souto Maior, Aralla e Costa, Nobre de Carvalho, Mariano de Carvalho, Tudella de Sousa Napoles, Rodrigo de Menezes, Visconde da Aguieira, Visconde de Andaluz, Visconde de Balsemão, Visconde de Moreira de Rey, Visconde de Sieuve de Menezes.
Entraram durante a sessão — Os srs.: Adolpho Pimentel, Osorio de Vasconcellos, Rocha Peixoto (Alfredo), Anselmo Braamcamp, Pereira de Miranda, Pedroso dos Santos, Pinto de Magalhães, Telles de Vasconcellos, Neves Carneiro, Saraiva de Carvalho, Emygdio Navarro, Goes Pinto, Filippe de Carvalho, Francisco de Albuquerque, Monta e Vasconcellos, Fonseca Osorio, Gomes Teixeira, Guilherme de Abreu, Silveira da Mota, Jayme Pinto, Anastacio de Carvalho, Melicio, Ferrão Castello Branco, Ornellas, Sousa Gomes, Dias Ferreira, Sousa Monteiro, Lopo Vaz, Lourenço de Carvalho, Luiz de Macedo, Freitas Branco, Faria e Mello, Correia de Oliveira, Pinheiro Chagas, Marçal Pacheco, Miranda Montenegro, Gonçalves Pereira, Pedro Augusto Correia da Silva, Pedro Barroso, Jacome Correia, Visconde da Arriaga, Visconde do Rio Sado, Visconde de Villa Nova da Rainha.
Não compareceram á sessão — Os srs.: Carvalho e Mello, Arrobas, Augusto de Mendonça, Jeronymo Pimentel, Gomes de Castro, Matos Correia, Guilherme Pacheco, Mello Gouveia, Carvalho e Menezes, Joaquim Gomes, Pedro Carvalho, Pedro Roberto, Julio Ferraz, Thomás Ribeiro, Visconde da Azarujinha.
Acta — Approvada.
EXPEDIENTE
Officios
1.° Do ministerio do reino, acompanhando os processos relativos á eleição que ultimamente se realisou nos circulos n.ºs 146, Mapuçá (2.°), e 147, Margão (3.º).
A commissão de poderes.
2.° Do mesmo ministerio, acompanhando copia do auto de investigação complementar de que fôra ordenado, ácerca da eleição do deputado pelo circulo n.º 126, Silves.
Enviado á secretaria.
3.° Do ministerio da marinha, acompanhando copia do requerimento feito por Francisco de Salles Ferreira Irmãos & C.ª, e bem assim copia da informação da repartição com o respectivo despacho.
Enviado á, secretaria.
SEGUNDAS LEITURAS
Representação
1.ª De alguns habitantes da provincia do Minho, pedindo que seja annullado por illegal e perigoso o decreto de 26 de dezembro de 1878.
Apresentada pelo sr. deputado Braamcamp, e enviada á commissão do ultramar.
2.ª Da camara municipal e cidadãos do concelho de Tabuaço, no mesmo sentido.
Apresentada pelo mesmo sr. deputado á mesma commissão.
3.ª Do comicio de Villa Real, no mesmo sentido. Apresentada, pelo mesmo sr. deputado á mesma commissão.
O sr. Presidente: — O sr. deputado Braamcamp quando hontem mandou para a mesa estas representações, requereu que ellas fossem publicadas no Diario do governo. Vou consultar a camara a este respeito.
Resolveu-se afirmativamente.
Projecto de lei
Senhores. — Está o Douro ameaçado por tão assustadora e tremenda crise vinicola, que facilmente a sua industria, o seu commercio e a sua agricultura - sem duvida os seus unicos elementos de vida — podem em pouco tempo desfazer-se em completa ruina.
Foram alteradas sensivelmente as condições agricolas e economicas do Douro. A abundancia, regular dos seus vinhos diminuiu desde a vindima de 1870, a ponto de que as duas ultimas colheitas mal abonaram aos lavradores as despezas dos grangeios.
É que, alem de outras causas irremediaveis, o phyloxera vae ameaçando, debilitando, destruindo com espantoso prejuizo e extraordinaria rapidez, a melhoria dos seus vinhedos, ou quasi todos os seus vinhedos — de certo o recurso mais efficaz do commercio nacional e a fonte mais valiosa das nossas riquezas publicas.
Na louvavel intenção de examinar e combater os effeitos do phyloxera, o governo de Sua Magestade escolheu e nomeou, por decreto de 7 de agosto de 1878, uma commissão de homens technicos, proprietarios, e outros membros de provada competencia scientifica; mas já de sobejo se reconhece que nem a sciencia nem os esforços da commissão conseguisse retardar a marcha da nova molestia, e restituir ás propriedades do Douro a riqueza da sua lavoura e as epochas da sua antiga prosperidade.
Segundo a crença geral, por espaço de alguns annos ficarão ali todas as vinhas reduzidas a montanhas incultas, agrestes, a collinas abandonadas e sem valia, como se fossem açoitadas pelo látego de destruição ou devoradas pelas chammas de um incendio.
Nem se reconheceu a inefficacia das providencias decre-
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tadas e a impreficuidade dos esforços o meios empregados até hoje no sentido de a combater e extinguir a phyloxera: por isso cumpre e urge acudir ás regiões vinhateiras do Douro com mais seguras iniciativas, com medidas de mais favoravel resultado, com expedientes, providencias de mais pratico interesse.
Convirá substituir a plantação da videira por outras culturas equivalentes em rendimento, decidindo-se todos os lavradores pela escolha e preferencia da cultura da herva santa, da cultura do algodão e ainda de outras especies de boa producção agricola.
Presume-se que só as rendas provenientes da plantação do tabaco podem poupar á miseria os proprietarios e garantir aos jornaleiros o trabalho remunerador da lavoura.
Esta cultura, porém, continuou a ser prohibida no continente do reino pela carta de lei de 13 de maio de 1864 e pelas disposições do artigo 5.° do regulamento de 22 do dezembro do mesmo anno.
Tal prohibição deriva naturalmente das conveniencias economicas do thesouro nacional, porque do imposto aduaneiro que sobrecarrega o tabaco em folha ou em rolo, e o tabaco manipulado se alimenta uma das principaes receitas do paiz.
Observa o relatorio, que precede a proposta de lei de 19 de janeiro de 1864:
«É facto averiguado e fóra de toda a discussão, que para se assegurar um bom credito de tabaco, permittida a liberdade do seu fabrico e venda, se torna indispensavel prohibir a cultura, porque se esta fosse permittida, á proporção que pelo seu desenvolvimento se abastecia o mercado interno, alem de prejudicar outros ramos de cultura, iria diminuindo o producto dos direitos de entrada, sendo assim desfalcado este rendimento sem possibilidade de se supprir o desfalque pelo imposto sobre a cultura ou producção do tabaco, que, como a experiencia mostra, é pouco rendoso e de muito difficil e dispendiosa cobrança. É por estes motivos que nos estados em que se aufere essa grande renda do tabaco, existe a prohibição da cultura...»
Este o mais poderoso argumento em desfavor da liberdade da plantação da herva santa na metropole. Argumento realmente poderoso e que sempre se deverá attender em todas as occasiões normaes.
Todavia convem lembrar que a liberdade da cultura do tabaco não é facto novo entre nós. Já foi permittida por alvará de 23 de agosto de 1642, pagando então o cultivador 30 réis por arratel, ou 1$280 réis por cada arroba.
Não se reconheciam então as circumstancias precarias e os tempos excepcionaes do hoje. O espirito das liberdades agricolas contentava-se com significar uma parcella de progresso, um elemento de civilisação.
Em nada influiram as imposições da necessidade publica. Permittia-se a cultura do tabaco do mesmo modo que qualquer outro genero de cultura.
Significando um acto de governação favoravel ao desenvolvimento da lavoura e sympathico ao povo portuguez, concorria menos mal para que D. João IV fosse, pouco a pouco, accentuando essa administração liberal e popular, em desabono das leis mais ou menos oppressivas dos dominadores castelhanos. Por isso a permissão da cultura de tabaco logrou poucos annos de existencia, sendo logo contrariada pelo alvará de 10 de maio de 1649, com o fundamento de desfalque na renda.
Este fundamento prevaleceu em todo o seu vigor durante mais de dois seculos, até que se decretou a mesma cultura para os Açores e Madeira, em virtude da carta de lei de 13 de maio de 1864 e respectivo regulamento de 22 de dezembro do mesmo anno.
«A cultura do tabaco (desde 1 de janeiro de 1865 em diante) é livre nos districtos administrativos do Funchal, Ponta Delgada, Angra e Horta.»
Fundamentou-se a necessidade d'esta lei nas rasões de que se crearia assim uma nova fonte de riqueza para as ilhas «que poderia compensar a falta de producção vinicola e fornecer tabaco nacional em concorrencia com o estrangeiro...»
«Pelo que respeita ás ilhas adjacentes (acrescentava ainda o relatorio de 19 de janeiro de 1864), o governo, accedendo ás reclamações de ha muito feitas por aquelles povos, e querendo experimentar outro regimen que cria uma nova fonte de riqueza publica sob o ponto de vista agricola, propoz que ali se estabelecesse a liberdade de cultura...»
Assim conseguintemente se reconhece que, não obstante as vantagens da prohibição, casos extraordinarios ha em que se admitte como resolução necessaria e indispensavel a livre cultura do tabaco. Tornou-se indispensavel na Madeira e nos Açores para compensar a falta da producção vinicola.
É que para grandes males, grandes remedios. As considerações dos rendimentos aduaneiros não devem ser de um rigor absoluto, não devem circumscrever-se a um circulo de ferro. Haverá desfalque, mas considere-se tambem que o desfalque experimentado nos primeiros tempos, póde mais tarde supprir-se vantajosamente pelas receitas ordinarias da contribuição predial.
Boa copia de argumentos de serio caracter e de igual importancia seria facil adduzir ainda; mas como de todos os srs. deputados é bem conhecida a situação decadente e precaria das propriedades vinícolas do Douro, bastará submetter singelamente á vossa apreciação o seguinte
PROJECTO DE LEI
Artigo 1.° É livre a cultura do tabaco nos terrenos phyloxerados dos concelhos do Peso da Regua, Santa Martha, Villa Real, Sabrosa, Alijó, Pesqueira e Lamego.
§ unico. Esta cultura ficará igualada a qualquer outra para o pagamento da contribuição predial.
Art. 2.° Os terrenos vinicolos que não aproveitam a cultura do tabaco, situados na área dos concelhos a que se refere o artigo antecedente, ficam isentos por cinco annos da contribuição predial designada no artigo 2.° do decreto de 31 de dezembro de 1852 e mais legislação correlativa.
Art. 3.° É auctorisada o governo a despender até réis 500:000$000 na applicação de remedios insecticidas ou em adubos, tratamento e beneficiação das vinhas do Douro.
Art. 4.° Fica revogada a legislação em contrario.
Sala das sessões, 28 de janeiro de 1879. = Diogo de Macedo = Manuel d'Assumpção = Adolpho Pimentel = Carlos de Mendonça = Manuel Correia de Oliveira = Francisco Antonio Pinheiro da Fonseca Osorio.
Foi admittido e mandado á commissão de fazenda, ouvida a de agricultura.
O sr. Visconde de Sieuve de Menezes: - Mando para a mesa os seguintes requerimentos
1.°, de José Maria Bettencourt, tenente coronel reformado, pedindo melhoria de reforma.
2.°, do tenente de infanteria José Maria da Fonseca, pedindo para lhe ser contado o tempo de seis mezes que lhe falta para ser promovido ao posto immediato.
3.°, da junta de parochia da matriz de Santa Catharina da villa da Calheta, pedindo augmento da congrua do seu parocho.
4.°, dos habitantes do Norte Grande da ilha de S. Jorge, pedindo a creação de um juiz ordinario n'aquella freguezia.
5.°, do padre Francisco Borges do Rego, parocho da freguezia das Lages, concelho da Praia da Victoria, pedindo augmento de congrua.
E o ultimo, de Florinda Candida de Oliveira, viuva de um tenente de caçadores, pedindo que se lhe pague o monte pio ou a pensão mensal de 15$000 réis em vez de 7$000 réis que actualmente recebe.
Peço a v. ex.ª que lhes mande dar o competente destino.
Forem remettidos ás commissões competentes.
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O sr. Bivar: —A declaração, que na sessão de hontem fez o illustre deputado o meu amigo o sr. Van-Zeller, de que se achava dissolvida a commissão parlamentar do inquerito ás obras da penitenciaria central de Lisboa, impõe o dever, colloca-me na rigorosa necessidade de dar a esta assembléa explicações sobre os motivos que me determinaram a não continuar a tomar parte nos trabalhos da mesma commissão desde o dia 21 do corrente.
Eu teria dado hontem mesmo essas explicações se o sr. Van-Zeller não fizesse a sua declaração no momento em que v. ex.ª já tinha annunciado que se passava á ordem do dia.
Peço a v. ex.ª e á camara que tenham a paciencia de ouvir algumas palavras, poucas serão ellas, que tenho a dizer para justificar o meu procedimento; e prometto não abusar da sua benevola attenção.
Na sessão do anno passado, a requerimento do illustre deputado, e meu nobre amigo, o sr. Osorio de Vasconcellos, a camara transacta elegeu a commissão de syndicancia ás obras da penitenciaria, e eu tive a honra de ser para ella eleito.
Motivos imperaram na minha consciencia que me determinaram a solicitar, em acto continuo, a escusa; comtudo não me foi ella concedida, e eu, respeitando e acatando a decisão da camara, e entendendo que em certas e determinadas condições a suspeição denota uma certa fraqueza de animo, acceitei o encargo, e desde esse momento entendi que era um dever de dignidade não declinar qualquer responsabilidade, e sujeitar-me ás consequencias, quaesquer que ellas fossem, que de ahi podessem resultar. (Apoiados.)
A commissão de inquerito depois de constituida viu-se em algumas dificuldades quanto ao modo e melhor ordem que devia dar ao seu trabalho; depois resolveu dividir-se em sub-commissões e distribuir por ellas as questões que estavam submettidas ao seu exame e apreciação.
Assim ficou encarregada a primeira sub-commissão de estudar alguns assumptos technicos; a segunda, de examinar os contratos relativos a fornecimentos de materiaes; a terceira, da escripturação e contabilidade; e a quarta, do exame do processo judicial, investigação policial e todos os outros contratos.
Estas sub-commissões ainda sub-dividiram os seus trabalhos por cada um dos seus membros.
Depois a commissão passou a ouvir varias pessoas, umas que se prestaram voluntariamente a informal-a, outras que foram interrogadas a requerimento dos diversos relatores. Estas e outras diligencias a que a commissão teve de proceder levaram muito tempo.
E agora invoco eu o testemunho dos meus illustres collegas que foram da commissão para a declaração que passo a fazer.
Sempre dei conta dos trabalhos de que fui encarregado, tanto quanto a minha curta e limitada inteligência o permittiu e só a uma das nossas sessões faltei. (Apoiados.) Succedendo que muitas vezes, e n'essa occasião andava doente e bastante doente, depois de tres ou quatro horas de serviço no tribunal, ía tomar parte nos trabalhos da commissão, pelo espaço de cinco e seis horas. Sinto descer a estes detalhes, mas tenho necessidade d'isso.
No exercicio do meu cargo de juiz, se alguma vez tiver a infelicidade de ser accusado por erro do officio, hei de responder perante o tribunal competente; dos meus actos como deputado entendo que só devo dar contas a esta assembléa, que é a dos representantes do paiz (Apoiados.), e aos eleitores do circulo n.º 124, os quaes, livre e espontaneamente, sem opposição de qualidade alguma, me conferiram, ainda esta vez, tão honroso mandato. (Apoiados.)
Respeito e amo a imprensa como uma das mais bellas e esplendidas instituições do systema liberal, mas não estou disposto, nem o tenho feito, a recorrer a ella para justificar os meus actos da vida publica ou particular. (Apoiados.)
Da parte de todos os vogaes da commissão houve assiduidade no desempenho da tarefa que lhes foi confiada; a commissão funcionou sempre regularmente, mas o que é certo é que só no mez de dezembro foram apresentados os pareceres definitivos.
Isto explica-se; é porque todos elles dependiam do exame de muitos documentos, e de outras averiguações, e demandaram bastante estudo.
Áquelles dos illustres deputados que tiveram assento na camara transacta, devem estar lembrados de que a commissão de inquerito, logo depois de constituida, ainda no mez de fevereiro, trouxe á camara, a exemplo do que fez uma commissão identica de inquerito ás repartições do ministerio da marinha, em 1854, uma consulta ácerca da natureza e duração dos seus poderes.
Eu peço licença á camara para ler essa consulta.
(Leu.)
Esta consulta foi enviada pela camara á commissão de legislação, e esta deu o seguinte parecer. (Leu.)
Como eu disse, não obstante a assiduidade e grande zêlo da parte de todos os meus illustres collegas da commissão em se desempenharem dos trabalhos de que estavam encarregados, só no mez de dezembro foram apresentados os pareceres definitivos. Alguns d'esses pareceres só foram distribuidos no mez de janeiro, outros ainda estão a imprimir e outros não chegaram a ser enviados para a imprensa.
Na sessão de 24 de dezembro chamei a attenção da commissão sobre as duvidas que se offereciam quanto á prolongação dos seus poderes alem do dia 2 do janeiro, visto que n'esse dia deixava de existir a camara de que a commissão era uma delegação.
Os meus illustres collegas, levados e animados pelo desejo de se desempenharem tão digna e cabalmente da missão de que estavam incumbidos, quanto fosse possivel, resolveram que se dessem por terminadas as funcções propriamente de syndicancia ou investigação no dia 31 de dezembro, mas tambem entenderam não haver inconveniente em que a commissão, com o fim de coordenar os seus trabalhos e até que esta camara se constituisse, procedesse á discussão e resolução dos differentes pareceres! E devo observar, sr. presidente, que eram exactamente estas attribuições de discutir e resolver os pareceres que eu achava as mais difficeis, serias, importantes o graves da commissão. (Apoiados.) Comtudo, eu estava tão empenhado como qualquer dos meus illustres collegas na conclusão dos trabalhos, e era certo que não podia conhecer do seu resultado, nem adoptar ou tomar alguma providencia ácerca da sua continuação a junta preparatoria d'esta camara, por isso conformei-me com a resolução da commissão.
No dia 21 do corrente mez, quando a camara estava já para se constituir, levantaram-se as mesmas duvidas n'essa sessão e a commissão manteve a sua anterior resolução.
Sr. presidente, dois escrupulos assaltaram então o meu espirito: por um lado, tinha a intima convicção de que a commissão não podia continuar a funccionar legalmente, entendia que os seus poderes tinham caducado, não comprehendia que ao lado d'esta camara podesse estar funcionando uma commissão da camara transacta, sem que os seus poderes lhe fossem renovados, e quando não estava completa; visto que quatro dos seus mais distinctos vogaes não eram já deputados e não queria por fórma alguma incorrer em qualquer responsabilidade legal ou moral; por outro lado continuava a ter o maior empenho em que a commissão podesse trazer a esta camara o resultado completo dos seus trabalhos!
Um alvitre lembrou n'essa occasião, que me parecia muito rasoavel, que conciliava todas as opiniões, removia quaesquer duvidas, e nenhum inconveniente podia offerecer: consistia em vir a esta camara dar conta do estado das
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cousas, da situação em que se achava a commissão, das dificuldades e embaraços era que ella se encontrava para que a camara na sua alta sabedoria resolvesse o que entendesse justo e conveniente. Este alvitre, porém, não foi approvado! Resolvi então sr. presidente, com bastante sentimento, porque tenho a satisfação de que sempre conservei a melhor harmonia com todos os meus collegas, resolvi despedir-me da commissão.
Mas sr. presidente, tinha ficado pendente da discussão o assumpto mais grave, a questão mais importante das que estavam affectas á commissão: era a questão Ferraz e Choque.
Sr. presidente, ainda que seja o ultimo dos membros da magistratura portugueza, d'esta magistratura, que ainda hoje apesar da pobrissima situação a que se acha reduzida se distingue e continuará sempre a distinguir-se pela sua honradez e independencia (Apoiados.), não queria que ninguem podesse suspeitar de que eu pretendia, como já vi n'algum jornal, fugir á responsabilidade, e que só procurava um pretexto para não emittir o meu voto sobre a questão mais grave de que a commissão se tinha occupado, questão que eu nunca considerei politica, mas sim de moralidade e justiça.
Foi então n'essas circumstancias, que no dia 24 d'este mez, quando esta camara já se achava constituida e a commissão tornou a reunir, que resolvi ir entregar nas mãos do digno ex-presidente da commissão o sr. conselheiro Mello Gouveia, a quem todos prestam a homenagem que s. ex.ª merece pelos altos dotes que o distinguem (Apoiados.), duas declarações; a primeira, de qual era o meu voto na questão Ferraz e Choque, a segunda, dos motivos que me impediam de continuar a tomar parte nos trabalhos.
Não sei se o meu procedimento está justificado, não sei se as rasões que singelamente acabo de expor, porque singela é sempre a linguagem da verdade, me poderão justificar perante a camara e perante o paiz, elles me julgarão, mas a minha consciencia está perfeitamente tranquilla e com ella fico em paz.
Vozes: — Muito bem.
O sr. Mariano de Carvalho: — Peço a v. ex.ª que consulte a camara sobre se me concede tambem dar algumas explicações a respeito do meu procedimento, como membro da commissão parlamentar de inquerito á penitenciaria.
O sr. Presidente: — A camara acaba de ouvir o pedido do illustre deputado.
Vozes: — Falle, falle.
O sr. Presidente: — Tem a palavra.
O sr. Mariano de Carvalho: — (O sr. deputado não restituiu o seu discurso a tempo de ser publicado n'este logar.)
O sr. Presidente: — Tem a palavra sobre a ordem o sr. visconde de Sieuve de Menezes.
O sr. Francisco de Albuquerque: — Peço tambem a palavra sobre a ordem. Hontem pedi-a para um requerimento, e não me foi dada.
O sr. Presidente: — Hontem, quando o illustre deputado pediu a palavra para um requerimento, já eu tinha declarado que se ía passar á ordem do dia. O regimento permitte que se façam duas inscripções, sendo uma sobre a ordem. O sr. visconde de Sieuve pediu a palavra sobre a ordem e por isso tem preferencia.
O sr. Visconde de Sieuve de Menezes: — Mando para a mesa a seguinte proposta. (Leu.)
Peço a urgencia.
É a seguinte:
Proposta
Proponho que seja eleita uma commissão de quinze membros para continuar o exame e syndicancia ás obras da penitenciaria. = Visconde de Sieuve de Menezes.
Foi declarado urgente e entrou em discussão.
O sr. Francisco de Albuquerque (sobre a ordem): — Eu realmente estranho o que se tem passado este anno no parlamento! Vejo praticas novas, direito novo.
O sr. Presidente: — V. ex.ª dá licença? O regimento manda que quando um deputado falla sobre a ordem, comece por apresentar a sua moção.
O Orador: — A minha moção de ordem é a que passo a ler, mas seja-me permittido que antes d'isso lamente que v. ex.ª esteja auctorisando um procedimento que me parece não tem precedentes n'esta casa: é haver palavra sobre a ordem, onde nunca houve ordem.
A minha proposta é a seguinte:
(Leu.)
Sr. presidente, eu supponho que n'este momento não vou de encontro ao pensamento do illustre deputado que acaba de mandar para a mesa a proposta que está em discussão, porque é impossivel que s. ex.ª queira, que da commissão que propõe, façam parte novos membros, os quaes tenham de proceder a novos estudos, quando os da commissão que até aqui funccionou já têem os trabalhos quasi todos feitos ou completos...
O sr. Visconde de Sieuve de Menezes: — A minha idéa não é excluir os cavalheiros que fazem parte da commissão. (Apoiados.)
O Orador: — Se s. ex.ª dá licença, direi que a minha proposta completa o seu pensamento. A minha proposta diz que fique auctorisada a mesa a completar a commissão, por isso que alguns membros d'ella não fazem hoje parte d'esta camara, e a mesa completa esse numero conforme o julgar mais conveniente.
Ora se este é o pensamento do illustre deputado, dispenso-me de dizer mais cousa alguma.
Sr. presidente, se v. ex.ª me conserva a inscripção que tinha, cedo da palavra, porque depois de ser acceite esta proposta não tenho mais nada a dizer sobre este assumpto.
O sr. Presidente: — Conservo, nem posso deixar de conservar, a inscripção que o sr. deputado tinha antes de pedir a palavra sobre a ordem; mas para justificar o meu procedimento permitta-me v. ex.ª que leia o artigo 90.° do regimento, que diz assim:
«Artigo 90.° Alem das inscripções geraes de que trata o artigo 86.° haverá outras para se apresentarem requerimentos, propostas de urgencia e moções de ordem.»
Por consequencia eu cumpri o meu dever. (Apoiados.)
O Orador: — A respeito da doutrina que v. ex.ª está estabelecendo, permitta-se-me fazer uma pequenissima observação.
Isto é na melhor boa paz, e creio que a maioria não m'o levará a mal.
Se v. ex.ª tinha esse artigo no regimento, como é que hontem me negou a palavra para um requerimento?
Se a doutrina é verdadeira, e a meu ver não é, v. ex.ª não me podia ter hontem negado a palavra para um requerimento. (Apoiados.)
Parece-me que nunca no parlamento, e pelo menos assim o posso dizer em relação ao tempo durante o qual tenho tido aqui logar, se interpretou o regimento d'esta maneira.
Antes da ordem do dia nunca se concedeu a palavra nem sobre a ordem, nem para requerimento.
Se v. ex.ª quer estabelecer essa pratica, estimo isso muito; e declaro a v. ex.ª que pedirei sempre a palavra sobre a ordem.
Mando a minha proposta.
Proposta
Proponho que fique auctorisada a mesa a completar o numero de membros da commissão de inquerito á penitenciaria, substituindo os que não fazem hoje parte do parlamento. = O deputado, Francisco e Albuquerque.
Foi admittida e ficou em discussão conjunctamente.
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O sr. Presidente: — Eu nada posso acrescentar nem tirar ao que o regimento diz. Para mostrar toda a imparcialidade com que tenciono dirigir os trabalhos da camara, procurarei sempre cingir-me ás disposições do regimento. (Muitos apoiados.) Quando a camara entender que procedo mal, deliberará como melhor lhe parecer.
Vozes: — Muito bem.
O sr. Luciano de Castro (para um requerimento): — O meu requerimento é para que v. ex.ª me diga se já vieram da commissão de syndicancia parlamentar ás obras da penitenciaria todos os documentos e papeis, que, segundo a deliberação tomada por aquella commissão, devem vir para esta camara.
O sr. Presidente: — Até este momento não chegou á mesa officio algum com respeito á questão da penitenciaria.
O Orador: — N'esse caso tenho a pedir a v. ex.ª a bondade de me reservar a palavra para antes de terminar a sessão, porque, se durante ella chegarem os papeis a que me refiro, desejo fazer o requerimento que desde já annuncio, e é para que a camara, quaesquer que sejam as deliberações que haja de tomar sobre este assumpto, resolva dar publicidade aos trabalhos já realisados pela commissão.
Declaro a v. ex.ª e á camara que, pela minha parte, se os meus collegas me quizerem tornar a honrar com os seus votos para continuar nos trabalhos da commissão de syndicancia, eu faço depender qualquer resolução que haja de tomar a este respeito, da deliberação que a camara adoptar sobre dar ou não publicidade a estes documentos.
Eu entendo que nós temos rigorosa obrigação de dar conta ao paiz do que temos feito, e portanto julgo que a camara não deve tomar a deliberação de entregar os trabalhos a uma nova commissão sem publicar o que já está feito.
Torno a dizer: se acaso durante a sessão chegarem os documentos, rogo a v. ex.ª o favor de me conceder a palavra para renovar o requerimento.
O sr. Presidente: — Tomo nota do pedido do sr. deputado.
O sr. Mariano de Carvalho (sobre a ordem.): — Começo por ler a minha moção de ordem:
(Leu.)
Agora permitta-me v. ex.ª que sustente a minha moção.
A pratica invariavel seguida n'esta camara desde que tenho a honra de ser membro d'ella, tem sido que, antes da ordem do dia, a palavra sobre a ordem ou para requerimento, não tem preferencia alguma. Repetidas vezes se tem aqui travado contestação sobre este ponto e sempre se tem resolvido não alterar a pratica seguida.
O novo regimento não alterou em cousa alguma esta pratica. No artigo 86.° estabelece o novo regimento o seguinte:
«Haverá duas inscripções geraes:
«1.ª Para antes da ordem do dia, podendo o deputado, quando lhe for concedida a palavra, apresentar quaesquer representações, propostas ou projectos de lei, ou mandar para a mesa notas de Interpellação;
«2.ª Para tomar parte em qualquer discussão.»
Aqui estão as duas inscripções geraes. Alem d'isso diz v. ex.ª, e é exactissimo, ha inscripções especiaes.
O artigo 90.° diz que alem das inscripções geraes, de que trata o artigo 86.°, haverá outras para se apresentarem requerimentos, propostas de urgencia e moções de ordem.
Mas o artigo 145.° define os casos em que é permittido apresentar moções de ordem tendo preferencia sobre a materia.
Esse artigo diz o seguinte: (Leu.)
Portanto, para se acceitar uma moção de ordem, é precizo que haja materia em discussão e que esteja em ordem do dia.
Era esta a interpretação que se deu ao regimento, e a este respeito tenho uma certa auctoridade, porque fui membro da commissão que redigiu o regimento, e tem sido esta a pratica invariavelmente seguida. Se, porém, a camara quer estabelecer uma nova pratica, eu acceito-a, devendo comtudo dizer a v. ex.ª para esclarecimento da votação e para ter a honra de ver a minha proposta rejeitada, que o dar-se a palavra sobre a ordem de preferencia antes da ordem do dia a quem assim a pede, é muito mais vantajoso para a opposição do que para a maioria. Portanto, desejo muito que o precedente fique, para ter o prazer de ver poucos momentos depois de se votar uma cousa, votar-se o contrario.
Em summa mando para a mesa a minha moção de ordem, e declaro que não peço a urgencia, porque desde o momento em que tratando-se de qualquer questão se apresente uma moção de ordem, não é preciso pedir a urgencia d'essa proposta, é urgente de sua natureza; mas se é preciso, peço-a.
É a seguinte:
Proposta
Proponho que como addicionamento ao regimento se inclua a seguinte disposição:
«Antes da ordem do dia a palavra sobre a ordem tem a preferencia sobre a palavra pedida sem designação.
«Sala das sessões 29 de janeiro de 1879. = Mariano de Carvalho».
O sr. Presidente: — Não posso considerar urgente esta proposta, porque não tem relação com a questão que se discute.
O sr. Mariano de Carvalho: — Eu disse a v. ex.ª que se a proposta não fosse urgente por sua natureza, como eu a reputava, pedia então a sua urgencia. V. ex.ª consultará a camara.
Consultada a camara não considerou urgente a proposta, que ficou para segunda leitura.
O sr. Ministro das Obras Publicas (Lourenço de Carvalho): — Pedi a palavra para fazer á camara em nome do meu collega o sr. ministro da guerra o pedido que passo a ler.
Proposta
Senhores. — Em conformidade do disposto no artigo 3.° do acto addicional á carta constitucional da monarchia, o governo pede á camara dos senhores deputados da nação para que os seus membros abaixo mencionados accumulem, querendo, o exercicio das funcções legislativas com o das suas commissões:
José Paulino de Sá Carneiro, general de brigada, director do real collegio militar.
José Frederico Pereira da Costa, coronel de artilheria, chefe do estado maior e da primeira repartição da direcção geral de artilheria.
José Joaquim Namorado, coronel inspector de engenheria na primeira divisão militar.
Caetano Pereira Sanches de Castro, coronel do batalhão de engenheria e membro da commissão de defeza de Lisboa e seu porto.
Visconde de Villa Nova da Rainha, major de cavallaria, membro da commissão districtal de recrutamento, em Lisboa.
Alberto Osorio de Vasconcellos, capitão de engenheria, membro da commissão de defeza de Lisboa e seu porto.
José Maria Borges, auditor especial junto do ministro.
Sala das sessões da camara dos senhores deputados, em 29 de janeiro de 1879. = Antonio Maria de Fontes Pereira de Mello.
Foi approvada.
O sr. Presidente: — Vae votar-se a proposta do sr. visconde de Sieuve de Menezes.
O sr. Francisco de Albuquerque (sobre o modo de propor): — Não sei se o meu amigo e collega o sr. visconde de Sieuve de Menezes declarou que acceitava a minha proposta...
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O sr. Visconde de Sieuve de Menezes: — Dá-me licença? Não fiz declaração alguma ao illustre deputado, nem a posso fazer.
O Orador: — Mas pergunto a s. ex.ª se o pensamento da sua proposta é o que lá está? (Riso.)
Uma voz: — Não póde ser outra cousa.
O Orador: — Não sei como consideram a minha proposta; eu apresentei-a como emenda, e como emenda deve ter preferencia na votação.
O sr. Presidente: — A mesa considera a proposta do sr. deputado como additamento á proposta do sr. visconde de Sieuve de Menezes (Apoiados.); e como tal tem de ser votada depois.
O sr. Francisco de Albuquerque: — Por consequencia, vota-se a proposta do sr. visconde de Sieuve de Menezes, sem prejuizo da votação da minha proposta?
O sr. Presidente: — Sim, senhor.
Posta á votação a proposta do sr. visconde de Sieuve de Menezes, foi approvada.
O additamento do sr. Francisco de Albuquerque foi rejeitado por 72 votos contra 36.
O sr. Rodrigues de Freitas: — Peço a v. ex.ª, sr. presidente, que, se não me chegar a palavra na ordem da inscripção para antes da ordem do dia, m'a conceda para um negocio urgente, e se for preciso declararei immediatamente qual é.
O sr. Francisco de Albuquerque: — Peço a palavra para um requerimento antes de se passar á ordem do dia.
O sr. J. J. Alves: — Mando para a mesa um requerimento do sr. Joaquim Antonio da Encarnação, capitão reformado, o qual, julgando-se prejudicado na sua reforma, pede a sua promoção a major.
Confio em que a commissão a que tem de ser submettido este requerimento, attendendo ás rasões allegadas, fará a justiça que o supplicante diz assistir-lhe.
O sr. J. M. dos Santos: — Mando para a mesa o diploma do sr. deputado eleito pelo circulo de Mapuçá.
O sr. Francisco de Albuquerque: — Pedi a palavra para um requerimento antes da ordem do dia.
O sr. Presidente: — Não prefere na inscripção.
O sr. Francisco de Albuquerque: — Mas sobre a ordem prefere!
O sr. Presidente: — Tem a palavra o sr. Rodrigues de Freitas, na ordem da inscripção.
O sr. Rodrigues de Freitas: — O negocio urgente para que pedi a palavra é a solicitação que se diz feita pelo governo inglez ao governo portuguez para que por Lourenço Marques entrem tropas que vão fazer guerra aos zulus: pelo menos um jornal publicado hoje falla d'este pedido.
Como hontem, não está hoje presente o sr. ministro da marinha, mas, como hontem, está presente o sr. ministro das obras publicas, e hoje tambem o sr. ministro da justiça.
A s. ex.ªs peço explicações. O jornal a que me refiro, certamente melhor informado sobre negocios tão graves do que o parlamento portuguez, no qual ainda hontem o sr. ministro da marinha dizia que nas regiões diplomaticas se estava tratando este assumpto.
Sendo assim, qualquer que seja a resolução que o governo houver de tomar, quer para negar o que se lhe pede, quer para o conceder, tem de recorrer aos representantes da nação.
Desejo saber o que ha a este respeito. Se de o contar não resulta inconveniente para as negociações diplomaticas, seja o negocio desde já patente ao parlamento em sessão publica; se ha inconveniente que de tal modo se trate, desejava que a camara se constituisse em sessão secreta.
Sou deputado republicano, sou deputado pertencente á opposição, mas não julgue a maioria que eu desejo que as instituições se estraguem, e que o parlamento se desacredite. Sou simplesmente evolucionista, e esta phrase muito usada hoje, resumo bem a minha opinião. As palavras que acabo de proferir, querem dizer que nas preguntas que faço aos srs. ministros não ha a intenção a que em Portugal e lá fóra tantas vezes se chama politica.
Eu faço politica de certo; mas considero-a missão nobre; não voto nem suscito questões, por confiança ou desconfiança politica, tomadas estas palavras no sentido em que tantas vezes são empregadas no parlamento e fóra d'elle.
A questão de que se trata é muito grave; é uma questão de que o parlamento portuguez se deve occupar quanto antes, e ácerca da qual o governo deve dar n'esta casa todas as explicações. (Apoiados.)
Eu vejo que na camara alta, o sr. ministro dos negocios estrangeiros, cuja elevada intelligencia muito respeito e cujos serviços a este paiz, sem duvida, tem sido grandes (Apoiados.), vejo, repito, que o sr. Andrade Corvo tem a maior predilecção pela alliança com a Inglaterra, e vejo que a respeito da questão da Zambezia disse que deviamos cooperar com a Inglaterra para civilisar a Africa.
Uma voz: — Apoiado.
O Orador: — Apoiado... Mas lembrae-vos da nossa pequenez, do papel, certamente muito infeliz, que temos desempenhado modernamente na Africa, e das pretensões da Inglaterra n'esse continente.
Lembremo-nos de que a nossa missão, como companheiros de uma nação tão grande, é certamente uma missão muito difficil, e que se póde tornar um grave perigo para esta terra; é por isso que eu desejo que o parlamento trate quanto antes d'este assumpto, e que saibamos bem o que é a cooperação da Inglaterra.
A Inglaterra trata de estender o seu commercio na Africa; procede como lhe cumpre; mas não nos illudamos com o que póde ser a sua collaboração.
A Gran-Bretanha deseja que as tropas inglezas, segundo diz um jornal, que passa por bem informado, entrem em Lourenço Marques, para irem fazer guerra a um dos povos mais importantes de uma parte da Africa.
Creio que o governo portuguez deu ordens terminantes e muito acertadas para que por aquelle ponto da Africa não entrassem munições de guerra, que fossem armar tal povo contra o inglez; cumpriu muito bem o nosso governo o seu dever; mas antes de tomar qualquer deliberação que permitta a entrada das tropas inglezas, parece-me que deve pensar muito maduramente, a fim de que depois esse povo, ácerca de cuja força o sr. ministro dos negocios estrangeiros recentemente fez observações muito sensatas, não se torne nosso irreconciliavel inimigo.
Desejo portanto que qualquer dos tres ministros dêem a este respeito, as explicações que julgar mais acertadas e prudentes.
Os outros assumptos a que tinha de me referir, embora menos graves do que aquelle de que acabo de fallar, são tambem importantes.
Está presente o sr. ministro das obras publicas. Passo a tratar de questões puramente economicas, não levanto umas phrases hontem proferidas por s. ex.ª ácerca dos meus deveres para com o governo.
Acredito que s. ex.ª as proferiu julgando que eu tinha offendido o governo em logar de ver que tinha unicamente exercido o meu direito de deputado (Apoiados), exclusivamente esse direito.
A amisade com que s. ex.ª me tem honrado, faz-me crer que não teve pensamento ofensivo.
Julgo que o sr. ministro das obras publicas tem o maior desejo de que o caminho de ferro da Regua seja prolongado até á fronteira de Hespanha.
Não sei, porém, se s. ex.ª apresentará á camara alguma proposta para que um melhoramento tão importante se realise.
Não sei mesmo se o governo portuguez tem já partici-
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pado ao governo hespanhol, que estão nomeados os engenheiros que com os de Hespanha estudam qual é o ponto mais conveniente para a ligação do caminho de ferro da Regua á fronteira, com o caminho de ferro de Salamanca a Portugal.
Posso assegurar que pelo governo hespanhol foi participado ao seu representante em Lisboa, que estavam já nomeados os respectivos engenheiros por parte d'aquelle paiz.
Desejo saber se estão já nomeados os que têem de representar Portugal.
O sr. ministro das obras publicas, engenheiro distincto, conhece perfeitamente este assumpto: s. ex.ª sabe os altos interesses que estão ligados ao prolongamento da linha ferrea do Douro. O que sinto é que, se de uma nota que vinha no orçamento apresentado o anno passado se podia concluir que no começo do anno economico de 1878-1879 o caminho de ferro até o Pinhão estaria completo, ainda agora não está concluido, apesar de passados seis mezes depois que da nota orçamental se podia concluir que tal caminho estaria aberto á circulação.
Esta obra tem relação íntima com a do porto de Leixões; e ambas são de grande importancia (Apoiados.), não só para a cidade do Porto, de que sou um dos representantes, como tambem para o paiz. E sobre isto offerece-se dizer algumas palavras ácerca de Portugal e da Hespanha.
Nós costumâmos festejar no 1.° de dezembro, com foguetes e Te Deum, o anniversario de uma revolução que deu novamente a Portugal a sua independencia (Apoiados.)
Não digo que antipathise com as manifestações que o patriotismo portuguez julga n'essa occasião convenientes; mas o que importa é que os homens publicos e todos os cidadãos contribuam quanto estiver ao seu alcance para que Portugal desenvolva por tal modo as suas forças economicas, que não vá a Hespanha progredir a ponto de ficarmos demasiadamente atrazados. (Apoiados.)
Muitas pessoas estão habilitadas a considerar a Hespanha como uma nação muito atrazada, mas parece-me que a esse respeito se enganam profundamente. (Apoiados.)
Não será erro dizer que nem nas sciencias, nem nas artes, nem na litteratura, nem na industria, em nenhuma d'estas manifestações da actividade humana, o confronto entre Portugal e a Hespanha será muito lisonjeiro para nós.
Parecerá improprio de um deputado da nação portugueza fallar assim, mas eu entendo que é extremamente necessario não nos alimentarmos de illusões.
Não é com ellas que a nossa patria se mantem, pelo contrario, estudemos e vejamos francamente o que somos e o que podemos ser. (Apoiados.)
Não é com vãs demonstrações de patriotismo que a patria mantem a sua independencia. (Apoiados.)
Sr. presidente, ha em Portugal dois portos, um dos quaes já hoje tem grande importancia, e outro que póde vir a tel-a muito maior. Refiro-me ao de Lisboa e ao do Douro, mas este segundo de certo não servirá aos altos fins economicos, a que parece destinado, em quanto se não construir um porto de abrigo, que é tambem necessario para a navegação desde a fronteira de Hespanha, no Minho, até Lisboa, porque em nenhum ponto d'esta extensão existe um bom ponto de abrigo, nem sequer para as embarcações pequenas.
Não venho aqui dizer que o porto de Leixões seja a obra que melhor satisfaça aos fins que desejamos conseguir, mas o que peço ao governo é que quanto antes mande estudar todos os projectos que ha a este respeito, a fim de que a navegação para o Douro satisfaça, tanto quanto possivel, ás necessidades de todas as provincias do norte.
N'isto ha um grande interesse para as provincias do norte, mas não menos para os rendimentos nacionaes.
As linhas do Douro e do Minho pertencem ao estado.
A prolongação do caminho de ferro do Douro e o melhoramento da navegação para o Douro são obras muito necessarias, para que n'estes caminhos se dê todo o movimento a que podem servir.
Se descurarmos estas obras, veremos Vigo crescer consideravelmente de importancia, até á custa do caminhos de ferro nossos.
Em Hespanha interessam-se muito pelo caminho de ferro de Salamanca até ao Douro. Ha commissões de ha muito organisadas para que essa linha seja continuada até á fronteira de Portugal; ainda recentemente um deputado tratou esta questão no congresso hespanhol; não a esqueçamos nós.
Se esperarmos que se construa, ou antes complete, o caminho de ferro de Salamanca por Bejar, Cárceres o Sevilha até Cadiz, veremos desviar-se grande movimento commercial que podia vir a Lisboa, emquanto que se tivermos construido já a linha da Beira Alta e a do Douro (e não discuto agora se seria mais conveniente a linha da Beira Baixa do que a da Beira Alta), tiraremos grandes vantagens do movimento commercial hespanhol.
A sessão está adiantada. (Uma voz; — Apoiado.)
Não quero de maneira nenhuma (principalmente para obedecer á parte altamente benevola de um collega nosso, que disse que a sessão estava adiantada) abusar da paciencia da camara; eu não costumo fazer interrupções equivalentes a este comprimento o mais amavel; (Riso) mas peço no sr. ministro das obras publicas se digne dar, nos termos mais breves, as explicações necessarias, e digo mais breves, para que satisfaça a alguns membros da maioria, benevolos e sinceros amigos de s. ex.ª
O sr. Ministro das Obras Publicas (Lourenço de Carvalho): — Não desconheço a importancia do assumpto, e agradeço ao illustre deputado que usou da palavra, o proporcionar-me occasião de dizer alguma cousa a respeito da questão que levantou.
Com relação ao preceito de laconismo, eu aprendi alguma cousa nas obras de Horácio, e folgo muito que s. ex.ª venha em reforço d'esse grande poeta. E isto não é mais do que uma rasão para satisfazer aos desejos da camara e obedecer aos illustres deputados que pedem se passe á ordem do dia.
Em primeiro logar, permitta-me o illustre deputado que lhe diga, com aquella franqueza com que costumo sempre fallar, que nas palavras que hontem proferi n'esta casa, não houve a menor intenção aggressiva. Não fiz mais do que defender os meus collegas do que me pareceu ser uma aggressão, suppondo-se que elles desconheciam os deveres que tinham a cumprir para com o parlamento.
Nada mais. Foi apenas politica defensiva. (Apoiados.)
Não procurei, repito, nem estava isso no meu espirito, dirigir ao illustre deputado a mais pequena aggressão.
Com respeito ao assumpto a que s. ex.ª se referiu, que é de natureza diplomatica e internacional, não me considero habilitado a dar as explicações que solicitou.
Não sei, e ainda mesmo que soubesse alguma cousa a esse respeito, nada diria; porque s. ex.ª e a camara sabem perfeitamente que estes negocios são de natureza muito reservada, e não podem ser presentes ao parlamento senão depois de findos (Apoiados.) e sempre com a reserva reconhecida na legislação fundamental do estado, podendo ser discutidos em sessão secreta. (Apoiados.)
O sr. Rodrigues de Freitas (interrompendo, o orador): — S. ex.ª diz que o governo não póde dar explicações a respeito d'este assumpto, senão com toda a reserva; mas o sr. ministro sabe perfeitamente que a carta constitucional não permitte ao poder executivo conceder ou negar a entrada de tropas estrangeiras em territorio portuguez, e só confere essas attribuições ao parlamento.
Assim comprehende v. ex.ª que o governo não póde deixar de dar explicações á camara, e de lhe apresentar o pedido do governo inglez.
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Ainda mais. Eu disse que sendo este um negocio grave, se porventura o governo não julgasse conveniente dar explicações em sessão publica, as desse em sessão secreta; e, portanto, parece-me que pela minha parte fui bastante benevolo, não fazendo pedido algum que não devesse ser attendido. (Apoiados.)
O Orador: — Não discuto agora quaes são as disposições contidas na carta constitucional a respeito do assumpto da que se trata; mas a doutrina que eu expuz é a que se tem praticado constantemente. (Apoiados.) Nem podia deixar de ser assim. E ainda mesmo que não fosse uma prescripção obrigatoria, eu não me julgava habilitado a dar á camara informações sobre o assumpto, a ponto tal que ella ficasse completa e inteiramente esclarecida.
Por esta occasião permitta-me o sr. deputado que eu note o ter-se estranhado hontem que eu dissesse isto mesmo com respeito a um negocio dependente de um ministerio que não está a meu cargo.
Posso estar mais ou menos informado ácerca de quaesquer assumptos pela leitura dos jornaes, ou ainda por me terem sido communicados por algum dos meus collegas, mas não é bastante para que eu me considere habilitado para dar explicações tão categoricas e completas como o ministro da repartição competente. (Apoiados.)
Todavia tomo nota do que disse o illustre deputado, para fazer sciente o meu collega dos negocios estrangeiros do assumpto a que s. ex.ª se referiu, e que tem relação com aquelle ministerio.
E dito isto passo a responder aos outros pontos que dizem respeito a questões que correm pelo ministerio a meu cargo.
Relativamente ao prolongamento do caminho de ferro do Douro, começo por declarar que não posso deixar de me mostrar reconhecido a s. ex.ª pela justiça que me fez, quando assevera ter eu sempre pugnado não só pela construcção d'aquelle caminho até onde elle está decretado por lei, como pelo seu prolongamento em direcção a Hespanha a entroncar com o de Salamanca.
Hei de apresentar n'esta sessão uma proposta de lei tendente a auctorisar o governo a proceder á construcção d'esse caminho.
Emquanto á nomeação dos engenheiros que hão de fazer os estudos necessarios para se determinar o ponto de ligação na fronteira, posso assegurar a s. ex.ª que estão nomeados os engenheiros por parte do governo portuguez, e que se solicitou a nomeação dos engenheiros por parte do governo da nação vizinha. É por consequencia negocio que tem seguimento e que espero em breve estará completamente terminado e resolvido pelos dois governos.
O sr. Rodrigues de Freitas: — Desejava que o sr. ministro me dissesse se já houve alguma reunião dos engenheiros.
O Orador: — Não estou tanto ao facto dos detalhes do assumpto, que n'este momento possa informar o illustre deputado, mas posso fazel-o logo que esteja para isso habilitado, se s. ex.ª o desejar. Relativamente ao porto de Leixões e ao de Lisboa o discurso da corôa está bem claro. O governo ha de apresentar a este respeito as propostas que entender convenientes.
O illustre deputado reconheceu a importancia tanto das obras necessarias para o melhoramento do porto de Lisboa, como do estabelecimento de um porto de abrigo ao norte do paiz.
Concordo com s. ex.ª e acceito o seu modo de ver a respeito da importancia e do futuro d'este porto, e como sendo um elemento de prosperidade para o paiz.
E eu direi a s. ex.ª e á camara que não considero aquelle porto artificial só com relação á cidade do Porto, mas tambem á provincia do norte, assim como á vastissima região da Hespanha. (Apoiados.)
Portanto, o governo ha de apresentar ao parlamento a proposta tendente a resolver este importantissimo assumpto, e n'essa occasião se apreciará a questão na altura correspondente á sua importancia, que sou o primeiro a reconhecer.
Por agora parece-me que tudo o que se disser a tal respeito será prematuro e incompleto. (Apoiados.)
Vozes: — Muito bem, muito bem.
O sr. Barros e Cunha: — Peço a v. ex.ª que me conceda a palavra quando estiver presente qualquer dos srs. ministros, o da marinha ou o dos negocios estrangeiros.
Leu-se na mesa um officio do ministerio do reino.
O sr. Presidente: — A hora está muito adiantada, e por isso vae passar-se á primeira parte da ordem do dia.
O sr. Rodrigues de Freitas: — Peço a palavra.
O sr. Pires de Lima: — Peço a palavra para um requerimento.
O sr. Presidente: — Tem a palavra para um requerimento.
O sr. Pires de Lima: — V. ex.ª acaba de me dar a palavra para um requerimento; mas como não quero de modo algum prejudicar o sr. Rodrigues de Freitas, que levantou uma questão importante, e que não póde julgar-se satisfeito com as explicações que deu o sr. ministro das obras publicas, parecia-me mais regular, salvo o respeito devido a v. ex.ª, e ao modo como dirige os trabalhos, que se concedesse a palavra ao sr. Rodrigues de Freitas para responder ao sr. ministro.
O sr. Presidente: — Convido o sr. deputado a formular o seu requerimento, para que tinha pedido a palavra.
Vozes: — Ordem do dia, ordem do dia.
O sr. Pires de Lima: — Antes de fazer o meu requerimento, peço a v. ex.ª que consulte a camara sobre se consente que o incidente continue, dando-se a palavra ao sr. Rodrigues de Freitas.
O sr. Presidente: — Eu já tinha annunciado que se passava á ordem do dia, quando o sr. deputado pediu a palavra para um requerimento, e como o seu requerimento não é sobre a ordem do dia, não posso submettel-o á votação da camara.
O sr. Pires de Lima: — Peço a v. ex.ª que ponha á votação o meu requerimento, porque, apesar de eu respeitar muito a v. ex.ª, e de reconhecer que dirige bem os trabalhos, póde ser que a camara não esteja de accordo com a opinião de v. ex.ª, e decida que se conceda a palavra ao sr. Rodrigues de Freitas.
O sr. Presidente: Não posso pôr á votação o requerimento do sr. Pires de Lima, porque não desejo estabelecer um precedente de que qualquer sr. deputado possa servir-se n'uma occasião em que se deva manter a ordem dos trabalhos.
Vozes: — Ordem do dia, ordem do dia.
O sr. Rodrigues de Freitas: — Peço a palavra para um negocio urgente.
Vozes: — Ordem do dia.
O sr. Rodrigues de Freitas: — Votem o que quizerem; eu peço a palavra para um negocio urgente.
O sr. Presidente: — Segundo o regimento eu não lhe posso dar a palavra para um negocio urgente, sem que o sr. deputado tenha o incommodo de subir á mesa e dizer-me o assumpto que quer tratar.
(O sr. deputado Rodrigues de Freitas, em virtude do convite do sr. presidente, foi dar parte á mesa do assumpto sobre que queria fallar).
O sr. Presidente: — Peço licença á camara para lhe ler o artigo 77.° do regimento.
«Art. 77.° Nos casos dos n.ºs 2.°, 3.° e 4.° do artigo 73.°, a camara resolverá em vista dos motivos expostos, se a sessão deverá continuar a ser secreta ou se o objecto d'ella ha de ser tratado em publico.»
«N.° 3.°, art. 73.° Em virtude de proposta de um deputado, apoiada por mais cinco e approvada pela mesa, á qual serão confiados os motivos que tiver o proponente.»
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Agora vou submetter á decisão da camara a urgencia do pedido do sr. Rodrigues de Freitas.
Vozes: — Qual é o assumpto?
O sr. Presidente: — A mesa não tem obrigação de o declarar á camara.
Vozes: — Como é que a camara póde votar?
Consultada a camara sobre a urgencia, foi esta rejeitada por 69 votos contra 27.
1.ª PARTE DA ORDEM DO DIA
Eleição de commissões
O sr. Presidente: — Vae ler-se uma proposta mandada para a mesa pelo sr. visconde de Sieuve de Menezes.
O sr. Visconde de Sieuve de Menezes: — Peço a urgencia da minha proposta.
Leu-se na mesa e é a seguinte:
Proposta
Proponho que seja de onze membros cada uma das commissões, de obras publicas, guerra, ultramar e do recrutamento. = Visconde de Sieuve de Menezes.
Foi approvada a urgencia e entrou em discussão.
O sr. Pires de Lima: — Eu tinha pedido a palavra para um requerimento.
O sr. Presidente: — Tem a palavra para um requerimento o sr. deputado, visto estar em discussão a proposta.
O sr. Pires de Lima: — V. ex.ª tinha-me dado a palavra, quando se entrou na ordem do dia, para um requerimento. Eu não o mandei para a mesa porque entendi que era melhor tratar-se do assumpto importante sobre o qual o sr. Rodrigues de Freitas tinha chamado a attenção do governo.
O requerimento que mando para a mesa, e que entendo que deve ser votado antes d'essa proposta, é o seguinte:
(Leu.)
Esse parecer diz respeito á eleição de um collega nosso, contra a qual não se apresentou objecção alguma séria; e eu entendo que a camara não póde adiar por mais tempo a entrada d'esse nosso collega n'esta sala. Esta questão é preferivel a todas as outras.
Mando pois para a mesa este requerimento.
É o seguinte:
Requerimento
Requeiro que na ordem do dia se comece pela discussão do parecer n.º 62. = Pires de Lima.
Vozes: — Isso não é um requerimento.
O sr. Presidente: — O requerimento que o sr. deputado mandou para a mesa não póde ser considerado como tal, mas sim como uma proposta. (Apoiados.)
O sr. Pires de Lima: — Se v. ex.ª considera o meu requerimento como proposta, eu peço a urgencia d'ella.
Consultada a camara sobre a urgencia da proposta, não foi approvada.
Posta á votação a proposta do sr. visconde de Sieuve de Menezes, foi approvada.
O sr. Presidente: — Convido os srs. deputados a formarem as suas listas para as commissões de obras publicas, estrangeiros e recrutamento.
O sr. Presidente: — Vae proceder-se simultaneamente á eleição das commissões do obras publicas, negocios externos e recrutamento.
Na sala ao lado direito da presidencia foram collocadas duas mesas.
Fez-se a chamada, e concluida ella disse
O sr. Presidente: — Nomeio para presidente da primeira mesa o sr. visconde de Sieuve de Menezes, para secretario os srs. Zeferino Rodrigues e Barroso e para escrutinadores os srs. conde da Foz e Neves Carneiro.
Para a segunda, presidente o sr. Bivar, secretarios os srs. Neves e Garrido e escrutinadores os srs. Ferreira Freire e Pedroso.
Corridos os escrutinios, verificou-se terem entrado na urna para a commissão de obras publicas 67 listas, sendo 3 brancas, e saíram eleitos:
“Ver Diario Original”
Para a commissão de negocios externos entraram na urna 67 listas, sendo 4 brancas, e saíram eleitos
“Ver Diario Original”
Para a commissão de recrutamento entraram na urna 66 listas, sendo 2 brancas, e saíram eleitos
“Ver Diario Original”
O sr. Fonseca Pinto: — Tenho a honra de mandar para a mesa o parecer relativo aos processos eleitoraes dos circulos n.ºs 24 e 28, Regua e Bragança; e 1 e 2, Monsão e Valença.
A commissão conclue por declarar vagos as circulos n.ºs 28, Bragança; e 2, Valença.
Peço a v. ex.ª que consulte a camara sobre, se dispensando o regimento, permitte que entrem desde já em discussão estes pareceres.
Consultada a camara decidiu afirmativamente.
Leu-se na mesa o seguinte
Parecer
Senhores. — A vossa commissão de verificação de poderes examinou os processos eleitoraes relativos aos circulos n.º 1 (Monsão) e n.º 2 (Valença), pelos quaes foi eleito deputado o cidadão conselheiro Luiz de Freitas Branco, que já foi proclamado.
Mostram os processos e as respectivas actas das assembléas de apuramento, que o deputado eleito obteve ao círculo de Monsão 5:265 votos e no de Valença 3:128. E porque não é natural de nenhum d'aquelles circulos, nem tinha residencia em nenhum d'elles ao tempo da eleição, deve representar na camara o circulo de Monsão, aonde obteve maior numero de votos, nos termos prescriptos no artigo 106.° do decreto eleitoral de 30 de setembro de 1852.
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N'estes termos a vossa commissão é de parecer que se considere vago o logar de deputado pelo circulo n.º 2 (Valença), mandando-se proceder á respectiva eleição em conformidade com o disposto no artigo 110.° do citado decreto.
Sala da commissão de verificação de poderes, 29 de janeiro de 1879. = Visconde de Sieuve de Menezes = Luiz de Lencastre = Antonio Telles de Vasconcellos = José Maria Borges = Agostinho José da Fonseca Pinto.
Foi approvada sem discussão.
Leu-se na mesa o seguinte
Parecer
Senhores. — Á vossa commissão de verificação de poderes foram presentes os processos eleitoraes relativos ao circulo n.º 24 (Peso da Regua) e n.º 28 (Bragança), pelos quaes foi eleito deputado o cidadão Lourenço Antonio de Carvalho, que foi proclamado.
Mostram os processos e as respectivas actas das assembléas de apuramento, que o deputado eleito obteve no circulo do Peso da Regua 4:979 votos e no de Bragança 2:623.
E porque não é natural de nenhum d'aquelles circulos, nem tinha residencia em nenhum d'elles ao tempo da eleição, deve representar na camara o circulo do Peso da Regua, aonde obteve o maior numero de votos, nos termos da provisão consignada no artigo 106.° do decreto eleitoral de 30 de setembro de 1852.
N’estes termos, a vossa commissão é de parecer que se considere vago o circulo n.º 28 (Bragança), mandando-se proceder á respectiva eleição, em conformidade com o disposto no artigo 110.° do citado decreto.
Sala da commissão, 29 do janeiro de 1879. = Visconde de Sieuve de Menezes = Luiz de Lencastre = Antonio Telles Pereira de Vasconcellos = José Maria Borges = Agostinho José da Fonseca Pinto.
Foi approvado sem discussão.
O sr. Pires de Lima (para um requerimento): — Eu insto novamente pelo meu pedido.
Ha pouco fiz um requerimento pedindo que na primeira parte da ordem do dia se discutisse o parecer n.º 62.
A camara rejeitou esse meu requerimento, mas creio que está agora com uma severidade menos draconiana para attender ao requerimento que vou apresentar.
Agora mesmo um collega nosso mandou para a mesa alguns pareceres, cuja impressão pediu fosse dispensada. E creio que a camara votou que esses pareceres entrassem immediatamente em discussão.
Eu peço agora que o parecer n.º 62, que já está impresso e distribuido, mas não dado para ordem do dia, entre desde já em discussão, dispensando-se o regimento.
A hora creio que vae adiantada, apenas faltam dez minutos, e julgo que v. ex.ª tinha dado para a segunda parte da ordem do dia a discussão da eleição pelo circulo de Belem.
Não é necessario ser propheta para conjecturar que essa discussão ha de ser larga, e pelo adiantado da hora não poderá terminar hoje.
Portanto, peço que se discuta desde já o parecer n.º 62, porque realmente não sei com que direito esta camara ha de conservar fóra do recinto d'ella um collega nosso que, como a illustre commissão reconhece, tem tanto direito como nós para estar aqui. (Apoiados.)
Esta camara, que foi para com elle muito severa, tem dado larguissimas provas de uma indulgencia, que eu talvez ousasse taxar de reprehensivel, se este termo não fosse muito forte.
O sr. visconde de Moreira de Rey, quando fallava da eleição de Castello Branco, pediu apenas vinte e quatro horas para virem documentos importantissimos que mostravam que a eleição estava insanavelmente nulla.
A camara foi benevolentissima para com a eleição de Castello Branco, e reserva toda a sua severidade, toda a sua ira e toda a sua indignação para a eleição de Ponta do Sol, cujo processo está regularissimo! (Apoiados.)
N'estes termos peço a v. ex.ª que trato de pôr desde já em discussão o parecer n.º 62.
O sr. Presidente: — Este parecer não estava dado para ordem do dia, e por consequencia é preciso que o illustre deputado requeira a dispensa do regimento.
O Orador: — Peço desculpa, a v. ex.ª Os tres pareceres que ainda agora foram votados, não estavam impressos nem dados para ordem do dia. (Apoiados.)
O sr. deputado que me precedeu fez um requerimento verbal, a camara approvou-o, e aqui não póde haver duas leis.
Vozes: — Pediu a dispensa do regimento. (Susurro.)
Vozes: — Ordem, ordem.
O Orador: — Repito, aqui não póde haver duas leis (Apoiados.)
Não vim para aqui ao collo dos cabos de policia, vim porque o povo me elegeu.
Vozes: — Os outros vieram do mesmo modo.
O Orador: — Fallo de mim. Vim aqui com o direito incontestavel de representar a vontade do povo, e não admitto que ninguem dentro d'esta casa, tenha mais direitos do que eu. (Muitos apoiados.)
Um meu illustre collega apresentou tres pareceres que nem estavam impressos, e foram logo submettidos á discussão e votados!
Eu requerendo que entre já em discussão o parecer n.º 62, peço que se dispense o regimento; por consequencia para que serve esta formula banal?...
O sr. Presidente: — O sr. Fonseca Pinto, por parte da primeira commissão de verificação poderes, apresentou esses pareceres a que o illustre deputado se refere, e requereu logo a dispensa do regimento para entrarem em discussão.
Eu submetti esse requerimento á discussão da camara, e ella decidiu afirmativamente.
O requerimento de v. ex.ª era tendente a entrar immediatamente em discussão o parecer n.º 62, e eu sómente, em respeito ao regimento, solicitei, pedi e roguei a v. ex.ª que quizesse requerer a dispensa do regimento para assim proceder em virtude d'elle; nada mais, nada menos. (Apoiados.)
E permitta-me v. ex.ª que lhe diga, que não quiz estabelecer duas praticas.
Eu sómente, pela muita consideração que tenho por v. ex.ª, indiquei qual era o caminho pelo qual, sem faltar ao preceito do regimento, podia mostrar a disposição em que estava para annuir aos desejos de v. ex.ª (Apoiados.)
O Orador: — Para satisfazer ao pedido de v. ex.ª mando para a mesa o seguinte
Requerimento
Requeiro se consulte a camara sobre se quer que se dispense o regimento para entrar desde já em discussão o parecer n.º 62, que foi impresso e que não estava dado para ordem do dia.
Foi approvado este requerimento.
O sr. Presidente: — Vae ler-se o parecer n.º 62.
É o seguinte:
Parecer n.º 62
Senhores. — A vossa primeira commissão de verificação de poderes examinou com a attenção e cuidado, que lhe merecia a importancia do assumpto, o processo eleitoral relativo ao circulo n.º 130, Ponta do Sol, do districto administrativo do Funchal.
Estava affecto o exame d'este processo á vossa terceira commissão (já dissolvida, por se ter constituido definitivamente a camara), a qual não pôde elaborar o respectivo parecer, porque o processo eleitoral não vinha instruido com os documentos legaes, faltando a esta assembléa prima-
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DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS
ria de Fajã da Ovelha, documento importante, que podia influir na validade da eleição.
Ao zêlo, porém, e diligencia que a respectiva commissão empregou para obter a prompta remessa do alludido documento, no muito louvavel empenho de não demorar a apresentação do parecer, correspondeu a solicitude do governo, que por via telegraphica pediu, e, em officio de hontem, mandou para a mesa o fallado documento, habilitando assim a vossa commissão a dar o seu parecer fundamentado e consciencioso, o qual tem a honra de submetter á vossa illustrada apreciação.
Mostra o processo que o circulo n.º 130, Ponta do Sol, se compõe de nove assembléas eleitoraes, a saber:
Camara de Lobos, Campanario, Ribeira Brava, Ponta do Sol, Calheta, Fajã da Ovelha, Porto de Moz, Seixal e Canhas.
Mostra-se mais que na assembléa de Canhas não houve eleição, como consta de uma acta, assignada pelo presidente e auctoridades locaes, por se não terem apresentado eleitores com que se podesse constituir a mesa.
Mostra-se ainda que na assembléa de Campanario foi apresentado um protesto assignado por seis eleitores, contra a validade da eleição, com o fundamento de não terem sido rubricadas as listas, e de terem continuado as operações eleitoraes depois do sol posto, com manifesta violação do artigo 14.º e § 1.° do decreto eleitoral de 30 de setembro de 1852.
Mostra-se, por ultimo, que o numero total das listas que entraram na urna, nas oito assembléas em que se verificou o acto eleitoral, foi de 4:013, obtendo o conego Alfredo Cesar de Oliveira 3:037 votos, D. Luiz da Camara Leme 1:874 votos, e o conde de Carvalhal 1 voto, havendo uma lista branca; e
Considerando que a falta da eleição na assembléa de Canhas, pelo motivo de não comparecerem os eleitores, não póde invalidar a eleição geral a que se procedeu em todas as outras assembléas do circulo;
Considerando que os fundamentos do protesto, confirmados em parte pelas declarações constantes da acta, comquanto affirmem a preterição de algumas formalidades legaes, ainda que fossem substanciaes do processo, e de natureza a invalidar o acto eleitoral na assembléa de Campanario, não podiam por fórma alguma influir no resultado da eleição, attenta a pequena votação n'aquella assembléa, que foi apenas de 145 votos para o deputado proclamado e de 164 votos para o seu adversario, tendo o primeiro obtido em todo o circulo a maioria de 1:163 votos;
Considerando que nas outras assembléas, com excepção da de Canhas, em que não houve eleição, o acto eleitoral correu com a maxima regularidade, não havendo reclamações nem protestos;
Considerando que o deputado proclamado obteve a maioria absoluta de votos:
A vossa commissão é de parecer que seja approvada esta eleição, e proclamado deputado o conego Alfredo Cesar de Oliveira, que apresentou o seu diploma em devida fórma.
Sala da primeira commissão de verificação de poderes, 25 de janeiro de 1879. = Visconde de Sieuve de Menezes = Luiz de Lencastre = Manuel Correia de Oliveira = Antonio Telles de Vasconcellos = José Maria Borges = Agostinho José da Fonseca Pinto, relator.
Foi approvado sem discussão.
O sr. Presidente: — Proclamo deputado da nação o sr. Alfredo Cesar de Oliveira. Vozes: — Deu a hora.
O sr. Presidente: — A ordem do dia para ámanhã é a eleição das commissões de guerra e de marinha, e a continuação da que estava dada.
Está levantada a sessão.
Eram cinco horas da tarde.
Sessão de 29 de janeiro de 1879.