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SESSÃO DE 31 DE JANEIRO DE 1885 329

Discurso proferido pelo sr. deputado Henrique de Barros Gomes, na sessão de 24 de janeiro, e que devia ler-se a pag. 247, col. 1.º, lin. 4.ª

O sr. Barros Gomes (sobre a ordem): - Respeitando e prestando obediencia ás prescripções da nossa lei interna passo a ler a minha moção do ordem, que é a seguinte:

«A camara, lamentando que no decurso das negociações, que precederam o tratado de 26 de fevereiro de 1884, o governo se não mostrasse inspirado por um conhecimento exacto da situação politica geral da Europa, faz votos para que do tal facto não resultem acontecimentos, importando ameaça para os nossos direitos seculares, e offensa á dignidade nacional.»

Sr. presidente, justificada assim a minha inscripção sobre a ordem, espero eu da muita benevolencia de v. exa. e da camara que me será consentido preceder o discurso, que tenho de proferir sustentando a minha moção, com algumas palavras e considerações em resposta ao meu collega o sr. Arroyo que acaba de revelar perante a camara o seu talento e illustração. Antes que tudo, porém, permitta-se-me igualmente que eu manifeste a s. exa. o prazer com que o ouvi, identico ao que a todos nos causou o discurso do sr. deputado Carlos Lobo d'Avila. A ambos felicito cordialmente, e creio não errar fazendo-o em nome de toda a camara, (Apoiados.) porque não póde deixar de ser origem de satisfação para todos os membros d'ella, o ver entrar na arena politica novos luctadores, que ao terçarem as primeiras armas desde logo mostram tanta e tão gentil galhardia.

Mas, sr. presidente, se de algum argumento se carecesse ainda para justificar o procedimento politico do partido progressista na presente conjunctura, encontrava-se elle precisamente no valor mui diverso das duas partes do discurso que acabâmos de ouvir pronunciar ao sr. Arroyo. A primeira, firmada na convicção, por isso mesmo mais alevantada, mais energica e eloquente; a segunda, filha da conveniencia politica da posição do orador, produzindo argumentos hesitantes e cuja falta de base se evidenciaria á mais perfunctoria analyse.

Emquanto o illustre deputado, que me precedeu no uso da palavra, se limitou a referir-se ás qualidades eminentes, ás virtudes por todos os motivos respeitaveis dos homens que ennobreceram o antigo partido progressista; emquanto punha em parallello as glorias de outr'ora com a situação presente e as qualidades pessoaes dos membros de hoje d'esse partido, notando a inferioridade d'estes, o que de cerio lhe não será disputado nem pelos mais graduados d'entre nós, o verbo corria lhe inflammado e brilhante; mas logo que s. exa. passou a defender os actos do governo, atacando ou querendo ferir rudemente o partido progressista, os seus argumentos tornaram-se, como disse, pallidos e hesitantes, e a sem rasão do illustre deputado transparecia nas proprias palavras com que dava fórma ao seu pensamento.

Sr. presidente, não mu cumpre a mim entrar largamente na discussão do que foi o accordo; não tomei parte n'elle, achando-me então como é sabido fóra da camara. É certo, porém, que na qualidade de membro da commissão executiva do partido progressista fui ahi chamado a dar o meu voto sobre esse pacto politico, e essa circumstancia habilita-me a assegurar a v. exa. que elle foi apresentado á commissão nos precisos termos em que o sr. Braamcamp o definiu perante a camara. Limitava-se por nossa parte o compromisso tomado á votação da generalidade do projecto das reformas politicas já apresentado pelo governo, contra a acceitação de uma reforma eleitoral importando uma verdadeira garantia para todos os partidos, embora mais immediatamente aproveitavel para nós, por nos acharmos militando na opposição.

Nem outro podia ser o nosso compromisso, abrangendo como só quer figurar a approvação da generalidade do projecto que teria do ser apresentado perante a camara constituinte, pois ninguem de boa fé se poderia obrigar a dar o seu voto a um projecto que desconhecia. (Apoiados.)

Mas, disso o sr. Fontes; se eu suppozesse que o accordo era isto e só isto, por certo que não o teria acceitado.

Ora eu vou dizer a s. exa. avivando lhe a memoria, quaes foram as vantagens importantes que do accordo se derivaram desde logo para o sr. presidente do conselho.

N'essa epocha o partido progressista sentia-se profundamente acabrunhado pela adversidade que tão constante se mostrava para com elle; suppunha, talvez com fundamento, que já do nada lhe valia a lucta no campo legal; por esse tempo os membros do partido, que faziam parte das commissões eleitoral e de reformas politicas, haviam deixado, como é sabido, do comparecer no seio d'ellas. O sr. Fontes via-se ameaçado de se encontrar a sós com os seus amigos na prosecução dos seus planos politicos, que por tal fórma perdiam toda a consistencia e auctoridade, e se apresentavam perante o paiz privados do prestigio que só uma ampla discussão em uma e outra casa do parlamento lhes podia garantir.

Foi a esta gravissima situação que o accordo veiu pôr um termo, e tal foi tambem a unica mas grandissima vantagem que, nos seus termos strictos, elle desde logo assegurou ao sr. Fontes.

O partido progressista obrigando-se por seu lado a approvar na generalidade o projecto de revisto constitucional apresentado pelo gabinete regenerador, não renegava por isso as suas idéas, e de fórma alguma se inhibia de proclamar bem alto. na primeira opportunidade que para isso se lhe offerecesse, a necessidade de avançar ainda mais no caminho das reformas, de accordo com o seu ideal politico, e com o lemma inscripto na sua bandeira.

De momento arredava-se, porém, pelo accordo, um problema que as circumstancias especiaes da nossa politica haviam transformado em um gravissimo embaraço para todos os invernos, o viu desde logo permittia, com vantagem do paiz, entrar com desassombro na resolução e no estudo de outros problemas administrativos e financeiros, que inadiavelmente se impunha á attenção dos poderes publicos.

Accusou o sr. Fontes perante a camara a desharmonia, existente entre as declarações do sr. Braamcamp e o modo de ver no nosso collega e meu amigo Emygdio Navarro, bem como o procedimento da imprensa progressista na maneira de interpretar as clausulas e o valor do accordo. Por minha parte mal posso descortinar onde existe uma sombra sequer de similhante desharmonia que tanto fere a s. exa.

O accordo fôra honrada e completamente respeitado o cumprido por nossa parte.

É certo, porém, que entre as linhas d'elle estava, como natural corollario da situação e das conveniencias publicas a que ha pouco alludi, uma certa benevolencia para com os actos e projectos do reforma do governo, benevolencia que de modo algum constituia já uma obrigação, mas que voluntariamente podia ser prestada, se o procedimento do governo houvesse sido sempre correcto e tivesse ido de accordo com a constituição.

Uma tal benevolencia tornara-a, porém impossivel desde logo, para muitos, o acto inqualificavel da dictadura que o sr. Antonio Candido com sobrada, rasão declarou mais affrontosa ainda, do que a de 10 de maio de 1870; rendendo-se á evidencia da impossibilidade de manter qualquer attitude de transigencia com o governo os poucos que ainda a sustentavam, na presença d'esse outro erro que se chama o adiamento de umas côrtes constituintes.

Sr. presidente, exprimo uma convicção profunda, afirmando que em paiz algum da Europa, regido pelo systema representativo, vejo a possibilidade de se praticar attentado similhante ao da. ditadura de 19 do maio de 1884.

Não seria elle possivel nem em Hespanha sob a direcção