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Sr. presidente, nós precisâmos n'estas questões de finanças ser muito impertinentes. E sabe v. ex.ª para quê? Para resistir contra a tendencia individual que ha em cada qual de fazer propostas que tendem a sobrecarregar o thesouro.

Se não formos nisso escrupulosos, como é que o governo póde resistir ás exigencias continuadas que de todos os lados se levantam para fazer este ou aquelle melhoramento, aliás plausivel; para se effectuar esta ou aquella despeza, aliás conveniente; para se dotar este ou est'outro serviço, aliás recommendavel?

Pois se dissermos — os emprestimos vão de melhor a melhor; depois do mais brilhante de todos ha outro melhor; os fundos subiram; a nossa posição é excellente; como ha de o governo collocar-se na situação de poder resistir a essas tendencias, de indeferir a essas reclamações, que trariam comsigo a necessidade de despender milhares de contos de réis?

Nas camaras de um paiz, onde o ser ministerial é mais alguma cousa do que apoiar ministros, porque é identificar-se com a dynastia, vejo que de todos os lados se diz ao governo economias, nada de emprestimos! E os ministros da fazenda dizem nós não recorremos ao credito senão na ultima extremidade.

Eu li ha pouco n'uma revista — que o ministro da fazenda deve ser um ministro da opposição. Não se assustem os illustres deputados que sustentam o ministerio (riso), porque eu não peço a cadeira do illustre ministro da fazenda para algum d'aquelles que combatem as suas medidas. Mas esta opinião não é de todo infundada, porque os ministros da fazenda têem de resistir a esta tendencia de despezas, muitas vezes justificaveis, sempre justificaveis, visto que é muito difficil não achar uma plausibilidade para sustentar uma despeza extraordinaria.

Se os ministros da fazenda não forem fiscalisados rigorosamente; se o parlamento lhes não pedir contas rigorosas dos meios de acudirem ás despezas que fazem (estes recursos continuados dos emprestimos para os emprestimos offerecem uma deglutição facil, mas uma digestão difficil) friso), mais temível é a posição dos individuos que estão sentados n'aquellas cadeiras (as do ministerio), porque de todos os lados lhes pedem despezas.

Conta-se que Colbert se impacientára muito contra o conselho que um homem d'estado dera a Luiz XIV de contrahir um emprestimo; e dissera: «Eu conhecia esse meio, porém não o quiz lembrar. Fiquem pois aquelles que o lembraram responsaveis pelas consequencias».

Bem sei que isto era um systema absoluto; mas se as camaras não forem rigorosas n'este ponto, a differença não é tão grande como se affigura.

Dizia eu — que o ministro da fazenda devia ser ministro de opposição no gabinete. A experiencia demonstra esta proposição.

Não ha muito tempo que o ministro da fazenda em Inglaterra n'um jantar publico, solemnidade que os inglezes escolhem para a manifestação das suas vistas politicas, dizia que era necessario que obrigassem o governo a fazer economias. Note a camara que um ministro da fazenda fez esta declaração. O resultado é que no anno passado a despeza foi no orçamento reduzida em 2.000:000 libras.

Ao ministro da fazenda da Prussia, o sr. Vonder Heydt, foi interceptada uma carta que elle escrevia ao ministro da guerra, dizendo-lhe: «Se por acaso não faz economias importantes no exercito, não nos podemos sustentar».

O ministro da fazenda de França, que é um distincto cavalheiro, e um banqueiro consideravel, e que, tratando-se de se fazer um emprestimo havia de sabe-lo fazer, manifesta desde 1861 uma completa aversão á continuação dos emprestimos; e cuida v. ex.ª que na occasião que aquelle ministro annunciou o ultimo emprestimo de 300.000:000 francos, que foi tão largamente debatido na tribuna franceza, se applaudiu de ter recorrido a este meio? Pelo contrario, dizia melancolicamente: «Julguei que não seria obrigado a abrir o grande livro da divida fundida; mas circumstancias mais fortes que a rainha vontade levaram-me a este ponto». Portanto já se vê que isto não era para engrandecer um acto que tinha adoptado; pelo contrario, era prestar homenagem a esta doutrina salutar, e tão conveniente para a economia das nações. E eis-ahi como, quando nós discutimos as condições de um emprestimo, discutimos sem duvida a questão de fazenda, e estamos no direito de cumprir o nosso dever (apoiados).

Se a camara se não occupasse extensa e pertinazmente d'esta questão, não sei se teria deixado de cumprir a parte mais importante da sua missão. E n'este ponto permitta-se-me dizer que a satisfação dos bons e verdadeiros principios do progresso é indispensavel para a existencia moral de uma sociedade; que hoje progressista; e conservadores, tudo, até os partidos, se tem alterado.

Quando tudo marcha e tudo progride era impossivel que a politica não progredisse tambem (apoiados). Não cuidem que hoje os partidos podem existir da mesma fórma que existiam ha trinta annos, em que homens os mais eminentes e auctorisados cuidavam só em ter uma constituição mais liberal do que a hespanhola (riso).

N'aquelle tempo era só isso, e hoje é mais do que isso. O progresso hoje é um estudo, é uma sciencia; está nos sentimentos, nas idéas e nas intelligencias dos individuos; e som as competencias da illustração as aspirações do progresso parariam (apoiados).

Eu pergunto: como é que se resolve pela invocação dos partidos a questão de saber qual é o algarismo mais elevado por que se contrahe um emprestimo de que tratámos? Perguntarei se isto não é desconfiar um pouco da questão? (Apoiados.)

Para que se diz, a proposito de algarismos, que houve homens que fizeram isto; que houve homens que fizeram est'outro; que houve homens que em determinadas epochas sustentavam estas idéas politicas e outros aquellas? Entendo que não foi para isto que Bezout escreveu a sua arithmetica (riso).

Vozes: — Muito bem.

O Orador: — A questão não é esta. Pois as questões, que já são difficeis de si, que precisam muita attenção, muito estudo, muita memoria e pouca imaginação (riso), para as estudar havemos assim de as ir difficultar mais ainda com o azedume da invocação ás nossas paixões politicas? Que triste meio de desembaraçar a questão das difficuldades que a cercam! (Apoiados.)

A questão pois não é esta. O sr. ministro é homem de intelligencia, não deve querer alcançar uma approvação financeira fundada n'uma adhesão politica. (Vozes: — Muito bem.) O que prova a adhesão politica n'uma questão financeira? Fez se este emprestimo que é o melhor de todos, porque é o emprestimo do nosso partido!!.. (Apoiados.) E depois é preciso mostrar que o emprestimo que hontem fez o nosso partido, o nosso mesmo sr. ministro da fazenda, não foi melhor do que este. O sr. ministro da fazenda dizia em portaria de 30 de julho de 1862, a respeito do emprestimo dos 5.000:000 libras, o seguinte: «O modo por que foi realisado o emprestimo de que se trata, offerecido pelo valor de 44 por cento, quando os nossos fundos se achavam por preço ainda inferior a 45 por cento, e o mercado em reconhecida apathia, é sem duvida o mais extraordinario acontecimento da nossa historia financeira».

Esqueçamo-nos por um momento das nossas dissensões politicas, e lembremo-nos bem d'este algarismo: é necessario isto (leu). Agora leia-se o relatorio do emprestimo celebrado em 1863.

Supponhamos que um esquecimento benefico fez com que não sejamos de nenhum partido no momento actual. Tenhamos pois estes dois documentos diante de nós, leiamo-los, tenhamos memoria e pouca imaginação, como já disse, e comparemo-los: «Sendo actualmente o preço do mercado 49 1/4 por cento é claro que o novo emprestimo portuguez, contratado a 48 por cento, apresenta uma differença tão diminuta como não acho em outros emprestimos estrangeiros levantados em Londres».

Este argumento já demonstrei que não é completamente exacto debaixo do ponto de vista da nossa historia financeira, nem da historia do actual sr. ministro da fazenda. Mas perguntarei agora a differença que vae da emissão de 48 a 49 1/4 preço da cotação, é inferior á differença que vae de 44 a menos de 45? (Riso. — Apoiados.) Se esta questão não se decide por esta fórma, não sei como se ha de decidir (apoiados). Mais tarde iremos para a politica, vamos logo. Fomos da regeneração; eu fui regenerador, approvei e combati projectos dos illustres ministros; mas parece-me que a nação não nos incumbe no momento actual de declarar que este emprestimo é mais vantajoso do que outros feitos, não por outros ministros, mas pelo mesmo ministro, pela mesma pessoa, com o mesmo caracter official n'uma portaria invocando o nome do Rei, e n'um relatorio á mesma real pessoa (apoiados).

Já se vê pois que não ha outro meio de discutir uma questão d'esta ordem. Por consequencia hei de mandar para a mesa uma emenda, que tem por fim restabelecer o paragrapho do projecto de resposta ao discurso da corôa apresentado pela commissão do anno passado, e assignado quasi pelas mesmas pessoas que assignaram o projecto de resposta d'este anno, paragrapho em que se diz:

«Na importancia das offertas com que a praça de Londres subscreveu para o emprestimo ali effectuado, o cujas condições serão opportunamente examinadas pela camara, folga esta de encontrar um lisongeiro indicio do credito do paiz, a cuja auctoridade e riqueza (do paiz), continuam rasgando novos horisontes a perseverança no systema de desamortisação, e os não interrompidos trabalhos de construcção de estradas e caminhos de ferro.»

A minha emenda ha de ser formulada n'estes mesmos termos, omittindo uma só cousa. No projecto da commissão passada dizia-se: «...a cuja auctoridade e riqueza (do paiz) continuam rasgando novos horisontes a perseverança no systema de desamortisação...»

Oh! sr. presidente! pois a desamortisação collectiva não será tão importante como a desamortisação individual? Pois a desamortisação collectiva, onde se tratava de certos e determinados estabelecimentos, não era objecto de um projecto de lei que foi apresentado n'esta camara ha dois annos? Não tenho eu por muitas vezes perguntado ao sr. ministro da fazenda se é sua opinião que esse projecto seja adoptado, e não tenho ouvido sempre a s. ex.ª dizer-me que sim? E pergunto á camara — e não terá resultado para a elevação do preço dos nossos fundos nenhuma vantagem de se ter adoptado essa medida? Elles que se elevaram até ao ponto que nós vemos, que apresentam o facto economico importante de terem um preço superior ao preço dos nossos 3 por cento em Londres? Um mercado que mostra uma tal tendencia para acquisição de titulos d'esta ordem, se se tivesse adoptado o projecto de desamortisação, a que me refiro, e que o sr. ministro tinha aceitado, os resultados não haviam de ser ainda mais vantajosos? (Apoiados.) Mas não foi só o sr. ministro que aceitou: o nosso agente financeiro em Londres, disse á commissão do Stock Exchange que = o governo tinha já adoptado medidas de desamortisação quanto aos bens dos conventos das religiosas, e que ía ampliar essas medidas, de que haviam de resultar grandes vantagens para o paiz =.

Ha mais. O Times, para animar os possuidores de titulos n'aquelle mercado, deu até essa medida como tendo sido já adoptada. E assim vê o illustre deputado que o Times, apesar de jornal muito serio e muito respeitavel, nem sempre é exacto. E o illustre relator da commissão sabe que alguem diz do Times tudo que o illustre deputado diz dos nossos jornaes; asserção que eu não adopto, porque não tomo parte na questão. Estou persuadido que o Times é um jornal muito lido e muito serio; mas o que é verdade é que pouco tempo antes de apparecer o artigo que nos era favoravel, appareceram alguns artiguinhos que nos eram muito desfavoraveis (apoiados). Eu leio muito o Money Market do Times, que é, se póde dizer, um curso de economia pratica; mas não quero dizer com isto que os seus editores não estejam sujeitos a variações de opiniões ás vezes extraordinarias (apoiados).

Disse-se que o outro emprestimo não tinha nada com o actual, que se tinha feito reviver a questão das 500:000 libras, quando de que se trata agora é do emprestimo de 1863. Sem duvida, mas quem fez reviver a questão do emprestimo de 1862 foi a illustre commissão da resposta ao discurso da corôa. Pois se a commissão diz que este emprestimo foi contratado em melhores condições do que o outro, não haviamos examinar como o outro se fez? Se a illustre commissão queria que se não fallasse no emprestimo de 1862 limitasse-se a dizer que este tinha sido feito em boas condições, mas não comparasse; a illustre commissão compara, e nós havemos de julgar sem examinar os termos de comparação! Não póde ser (apoiados).

Eu já disse ha pouco que a todos os momentos estão a ser mandados para a mesa documentos que variam a base da nossa discussão. O illustre deputado que me precedeu, declaro de novo e com muita satisfação, e a minha sinceridade abona a minha asserção, ainda que me parece que a sua oratoria o arrastou a ser injusto para com alguns individuos, não duvido declarar que o illustre deputado é um caracter para mim altamente sympathico. Mas o illustre deputado que já se julgou auctorisado a lançar a sua opinião ácerca da excellencia d'este emprestimo a respeito de outros, parece que não estava inteirado dos documentos que foram mandados para a mesa. Pois o illustre deputado jura na excellencia d'este emprestimo sem ter visto documentos que mudam as condições em que se nos disse que tinha sido contratado? Uma d'ellas, por exemplo, é a questão da preferencia. Eu declaro que entendo que os capitães não podem ser educados; confesso que não acredito muito n'esta divisão de capitães forçados, capitães nacionaes para a industria, capitães estrangeiros para emprestimos; não acredito n'isto. A pratica demonstra o contrario, e os documentos apresentados pelo sr. ministro provam que nos enganâmos neste ponto, e que os capitaes mandados para os mercados estrangeiros têem voltado para o nosso mercado com um preço mais elevado.

E peço perdão ao illustre deputado para lhe dizer — que elle foi injusto na apreciação dos factos economicos, que se passam na formação de estabelecimentos de credito n'uma das nossas cidades de maior iniciativa commercial. O illustre deputado cuidou que a formação de companhias commerciaes e estabelecimentos de credito se fazia sem agiotagem. É uma illusão. Pois em que paiz do mundo não ha as subscripções imaginarias, que o illustre deputado suppõe que têem logar no systema da formação dos bancos dessa cidade? Pois não lemos ha pouco tempo, no mesmo Times, creio eu (riso. — O sr. Sant'Anna: — Agora já serve o Times) que o anno passado 100 milhões de libras esterlinas se tinham destinado para differentes emprezas, mas que era preciso dar tempo para que sobrenadassem as operações serias? Isto acontece em toda a parte; suppor que se podem policiar os capitães evitando de todo a agiotagem foi credulidade coeva dos tempos em que se queria marcar o maximo permanentemente do juro dos capitães, em que se entendia que era necessario castigar a agiotagem para se promover a actividade commercial, e para castigo da agiotagem julgou-se que tudo eram usuras e elevações de juro, e todas as nações attendiam ao meio artificial de marcar o juro.

(Deu a hora.)

Eu não desejava transportar a palavra de sessão para sessão, mas tenho ainda algumas cousas que dizer, e por isso peço a v. ex.ª me reserve a palavra para outra sessão.

Vozes: — Muito bem, muito bem.

(O orador foi comprimentado por grande numero de pessoas.)

O sr. Presidente: — Fica reservada a palavra ao sr. deputado. A ordem do dia para ámanhã é a continuação da mesma.

Está levantada a sessão.

Eram quatro horas da tarde.