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N.° 21

SESSÃO DE 5 DE FEVEREIRO DE 1896

Presidencia do exmo. sr. Antonio José da Costa Santos

Secretarios - os exmos. srs.

Amandio Eduardo da Motta Veiga
José Eduardo Simões Baião

SUMMARIO

Approvada a acta, o sr. presidente dá conhecimento á camara de uma representação que lhe foi entregue. - Tem segunda leitura um projecto de lei do sr. Santos Viegas. - Proposta de aggregação apresentada pelo sr. Mendia. - Considerações do sr. Carneiro de Moura sobre a necessidade de se dar trabalho em larga escala aos operarios, e de se lhes facultar a emigração para a Africa. Resposta do sr. ministro da justiça. - Proposta de aggregação apresentada polo sr Magalhães Lima - Considerações do sr. Teixeira Gomes sobre o mau estado da viação no Algarve e sobre o regulamento da contribuição industrial. Resposta do sr. ministro da justiça. - Parecer apresentado pelo sr. Fratel. - Renovação de iniciativa do sr. Teixeira de Vasconcellos.

Na ordem do dia continúa em discussão o projecto n.º 8, reforma do regimento interno da camara. - São approvados os artigos 69.° a 106 °, tomando parte na discussão de muitos d'elles, alem do sr. relator, os srs. João Arroyo e Marianno de Carvalho, que apresentaram propostas, algumas d'ellas acceitas pelo sr. relator. - Um requerimento de interesse particular e justificações de faltas.

Abertura da sessão - Ás tres horas e um quarto da tarde.

Presentes á chamada, 61 srs. deputados. São os seguintes: - Aarão Ferreira de Lacerda, Abilio Augusto de Madureira Beça, Alberto Antonio de Moraes Carvalho (Sobrinho), Albino de Abranches Freire de Figueiredo, Alfredo de Moraes Carvalho, Amandio Eduardo da Mota Veiga, Antonio de Almeida Coelho de Campos, Antonio Augusto Correia da Silva Cardoso, Antonio d'Azevedo Castello Branco, Antonio Barbosa de Mendonça, Antonio de Castro Pereira Côrte Real, Antonio Hygino Salgado de Araujo, Antonio José da Costa Santos, Antonio Ribeiro dos Santos Viegas, Antonio Teixeira de Sousa, Antonio Velloso da Cruz, Arthur Alberto de Campos Henriques, Augusto Cesar Claro da Ricca, Augusto Dias Dantas da Gama, Bernardino Camillo Cincinnato da Costa, Carlos de Almeida Braga, Conde de Pinhel, Conde de Villar Secco, Diogo José Cabral, Diogo de Macedo, Francisco José Patricio, Guilherme Augusto Pereira de Carvalho de Abreu, Henrique da Cunha Matos de Mendia, Jayme de Magalhães Lima, João Alves Bebiano, João José Pereira Charula, João Lopes Carneiro de Moura, João da Mota Gomes, João Pereira Teixeira de Vasconcellos, Joaquim do Espirito Santo Lima, Joaquim José de Figueiredo Leal, José Antonio Lopes Coelho, José Bento Ferreira de Almeida, José Coelho Serra, José Correia de Barros, José Eduardo Simões Baião, José Luiz Ferreira Freire, José Marcellino de Sá Vargas, José Mendes Lima, José Pereira da Cunha da Silveira e Sousa Junior, José dos Santos Pereira Jardim, José Teixeira Gomes, José de Vasconcellos Mascarenhas Pedroso, Luiz Filippe de Castro (D.), Luiz Osorio da Cunha Pereira de Castro Manuel de Bivar Weinholtz, Manuel Bravo Gomes, Manuel Joaquim Ferreira Marques, Manuel Joaquim Fratel Manuel José de Oliveira Guimarães, Marianno Cyrillo de Carvalho, Miguel Dantas Gonçalves Pereira, Theodoro Ferreira Pinto Basto, Thomás Victor da Costa Sequeira Visconde de Leite Perry e Visconde do Palma de Almeida.

Entraram durante a sessão os srs.: - Adolpho Alves de Oliveira Guimarães, Adolpho da Cunha Pimentel, Agostinho Lucio e Silva, Antonio José Lopes Navarro, Jacinto José Maria do Couto, João Ferreira Franco Pinto Castello Branco, João Marcellino Arroyo, João Maria Coreia Ayres de Campos, José Dias Ferreira, José Freire Lobo do Amaral, José Joaquim Aguas, José Joaquim Dias Gallas, Luciano Affonso da Silva Monteiro, Luiz Maria Pinto do Soveral, Luiz de Mello Correia Pereira Medello, Polycarpo Pecquet Ferreira dos Anjos, Quirino Avelino de Jesus, Visconde do Ervedal da Beira e Visconde da Idanha.

Não compareceram á sessão os srs.: - Adriano Augusto da Silva Monteiro, Amadeu Augusto Pinto da Silva, Antonio Adriano da Costa, Antonio Candido da Costa, Antonio José Boavida, Augusto Victor dos Santos, Conde de Anadia, Conde de Jacome Correia, Conde de Tavaredo, Conde de Valle Flor, Eduardo Augusto Ribeiro Cabral, Tidelio de Freitas Branco, Francisco Xavier Cabral de Oliveira Moncada, Ignacio José Franco, Jacinto Candido da Silva, Jayme Arthur da Costa Pinto, Jeronymo Osorio de Castro Cabral e Albuquerque, João Rodrigues Ribeiro, José Adolpho de Mello e Sousa, José Gil Borja Macedo e Menezes (D.), José Maria Gomes da Silva Pinheiro, Julio Cesar Cau da Costa, Licinio Pinto Leite, Luiz Augusto Pimentel Pinto, Luiz de Sampaio Torres Fevereiro, Manuel Augusto Pereira e Cunha, Manuel Francisco Vargas, Manuel Pedro Guedes, Manuel de Sousa Avides, Manuel Thomás Pereira Pimenta de Castro, Romano Santa Clara Gomes, Visconde do Banho, Visconde de Nandufe, Visconde de Tinalhas e Wenceslau de Sousa Pereira de Lima.

Acta - Approvada.

EXPEDIENTE

Segunda leitura

Projecto de lei

Senhores. - As necessidades de ordem moral, a que deve acudir-se com efficazes e energicos remedios, fazem sentir-se e avolumam-se tanto mais, quanto maior é a civilisação de um povo. Assim o ensinam todos os pensadores e assim o praticam todas as nações.

Portugal, que no exercicio da sublime virtude da caridade, tem ido sempre na vanguarda, ufana-se de haver creado institutos de beneficencia onde educar os pobres de fortuna, e distribuo soccorros ás variadas miserias que affligem a sociedade.

Continuando as suas tradições gloriosas, a villa de Barcellos por tantos titulos nobre, creou ha pouco um asylo para a infancia, desvalida denominando-o Recolhimento e asylo de infancia desvalida do Menino Deus, estabelecido no edificio que tinha o nome de Recolhimento do Menino Deus ou das Beatas, que havendo sido util á religião e á patria em tempos findos, não o era, ha pouco tempo ainda,

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nem á sociedade nem á religião, reclamando profunda reforma.

Alguns cavalheiros d'aquella localidade, a quem presto aqui a homenagem do meu respeito, convencidos da necessidade de remediar e prevenir os males que vem da falta do educação moral, deram áquelle recolhimento uma organisação conforme o fim a que o destinaram, alimentando, instruindo e educando ali creanças do sexo feminino, agasalhando-as e dando-lhes os meios precisos para serem uteis a si o á sociedade.

Funcciona desde 1893 e está este instituto legalmente constituido com estatutos approvadoa pela auctoridade competente.

Nasceu da iniciativa particular esta instituição, que a caridade publica tem sustentado, e o governo de Sua Magestade, por mais de uma vez tem subsidiado, concorrendo assim para a educação e morigeração das desgraçadas creanças, que ali recebem o pilo do corpo e do espirito.

Succede, porém, que a casa onde existe o recolhimento, igreja, cerca e dependencias não pertencem á administração do asylo, mas ao estado, e assim não gosa este instituto das garantias de segurança emquanto lhe não pertencerem de facto e do direito.

Por este motivo, o porque o estado deve proteger e auxiliar a acção benefica de instituições d'esta natureza, tenho a honra de submetter á vossa consideração e exame o seguinte projecto de lei:

Artigo 1.° São concedidos ao asylo de infancia desvalida do Menino Deus, legalmente estabelecido na villa de Barcellos, districto de Braga, o edificio, igreja, cerca e mais dependencias, onde actualmente se acha installado, e que pertenciam ao antigo recolhimento do Menino Deus da mesma villa.

Art. 2.° Fica revogada a legislação em contrario.

Sala das sessões da camara dos senhores deputados, 4 de fevereiro de 1896. = O deputado pelo districto de Braga, Santos Viegas.

Lido na mesa, fui admittido e enviado ás commissões de administração publica e de fazenda reunidas.

O sr. Presidente: - Não ha mais expediente.

Participo á camara que fui procurado por uma commissão, delegada da associação dos fabricantes de pão, que mo entregou uma representação, em que pede algumas modificações no regimen actual da producção o commercio de trigos. Esta representação vae ser remettida ás commissões de fazenda e de commercio e artes.

O sr. Henrique de Mendia: - Mando para a mesa, por parte da commissão de agricultura, a seguinte:

Proposta

Proponho que sejam aggregados á commissão de agricultura os srs. deputados Miguel Dantas Gonçalves Pereira o Manuel Bravo Gomes. = O deputado, Henrique de Mendia.

Peco que seja considerada urgente.

Consultada a camara, foi admittida a urgencia e seguidamente approvada a proposta.

O sr. Carneiro de Moura: - Sr. presidente, ha poucos dias pedi a palavra para lembrar ao governo, para lhe dizer em meu nome, como membro d'esta casa do parlamento, que o melhor meio de evitar o progresso da reacção revolucionaria dos trabalhadores é procurar-lhes trabalho no ultramar.

Disse-o ha poucos dias, e repito-o hoje: é preciso dar ao operariado a protecção necessaria, para o desviar do estado moral perigoso em que se encontra n'esta capital, n'uma formentação anarchica.

Deu-se hontem um facto deveras lamentavel, derivado naturalmente das correntes anarchicas da Europa culta, cujos effeitos se repercutem no nosso paiz.

Devemos desenvolver o trabalho, a fim de desviar o operariado d'essas idéas tormentosas, e para isso me levantei ha poucos dias no proposito de chamar a attenção do governo para a situação do operariado nacional, e com o mesmo proposito me levanto hoje, dizendo ao governo que se convença da necessidade de dar a maior protecção ao operariado nacional, favorecendo os centros de producção nas nossas colonias, desviando assim os espiritos da obcecação de leituras perniciosas facilmente suggestivas.

Ainda ha pouco tempo succedeu um facto summamento lamentavel e triste. O Chefe do estado, que não cuida senão no bem publico, foi aggredido injustamente; hontem foi alvejado um homem por dizer o que a sua consciencia scientica lhe dictou! É preciso, repito, desenvolver o trabalho no ultramar, a fim de que o operariado nacional sáia d'este meio deprimente em que se encontra, assim como é tambem preciso que o operariado só convença que não é por meios violentos que se modifica o modo de ser das sociedades, porque a dynamite o que póde dar é a anarchia, e da anarchia vem o despotismo cruel que tanto ha de ferir o operario como o capitalista. Não creio no emtanto que isto venha a succeder, porque as forças vivas da nação o hão de impedir, e porque a civilisação é bastante poderosa para seguir a sua marcha fatal progressiva.

Sr. presidente, eu não venho aqui pedir ao governo impossiveis, assim como devo tambem declarar que não tenho a mais pequena dose de medo ou de receio. Entenda v. exa., a camara e o governo que estou fallando como cidadão portuguez, e que n'esta situação digo com desassombro a minha opinião. Penso que é um perigo estar aqui a manter na capital uma massa de operarios, suggestionados por idéas subversivas, que vão fermentando dia a dia n'um crescendo perigoso. Desviemol-os d'aqui!

Combato-os pelas idéas que propagam, n'um supposto antagonismo entre capital e trabalho.

O capital é trabalho accumulado, e não representa um privilegio. Pugnam os operarios pela igualdade economica? Já a têem, porque a igualdade economica consiste na falta de privilegios de capitalisação. Existe a igualdade politica, ninguem o nega, e no emtanto nem todos são politicamente de igual valor. Os anarchistas convenceram-se de que o estado é uma ficção social, e pensam que as sociedades modernas protegem a plutocracia, que amesquinham o operario. Não é verdade! A sociedade actual não a fizemos nós, ninguem a fez! É producto das leia inilludiveis do progresso, e só a fatalidade da vida explica a miseria. Debellal-a é a nossa missão; fal-o-hemos, e eu ponho a minha acção ao serviço da beneficação operaria, mas reconhecerei sempre a injustiça dos que se revoltam contra a ordem constituida. Não se persegue ninguem! Ninguem se odeie! A miseria? Mas não fomos nós que a fizemos.

E já que o mal existe, sr. presidente, já que no nosso meio infelizmente vegeta essa corrente de revolta anarchista, debellemol-a, demos-lhe remedio. E a tempo! Felizmente que ninguem melhor que nós poda ainda dar remedio á crise que affecta o mundo inteiro. A nossa indole, a relativa facilidade da vida do operariado nacional, a nossa situação colonial, simplificam para nós o problema. E emquanto é tempo! Arredemos d'aqui essa população de revoltados! É este o remedio.

Protesto contra a guerra que se vem fazendo ao capital, sobretudo no nosso paiz, porque em Portugal póde haver anomalias, mas não conheço esse capital odiado, não sei que alguem viva calcando outrem.

Diz-se que se quer a igualdade economica, alem da igualdade politica. Pois bem! Reflicta-se que assim como a igualdade politica não envolve o reconhecimento de iguaes aptidões civicas, assim tambem não se dirá que não existe a igualdade economica, por nem todos terem igual valor capitalistico. A igualdade economica existe desde que a todos está aberto o trabalho. Se nem todos capitalisam por

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igual, essa differença está na natureza: é que ou não souberam ou não quizeram progredir os vencidos.

Mas é uma atrocidade o facto lamentavel que vem de acontecer.

Attenta-se contra a vida de um cidadão trabalhador, que a final tambem é um proletario, d'esse proletariado scientifico que vae luctando na vida com resignação e consciencia.

Pois o medico não é um operario? Não trabalha como todos nós? Trabalha, e se lucra mais é por uma legitima consequencia do seu esforço. O actual governo ahi está a abrir escolas. Estão ellas a todos abertas; a todos está aberto o campo de acção para o trabalho e para a riqueza.

Que pretendem os anarchistas?

Querem elles que se lhes dê igualdade economica no sentido da liquidação de um quociente individual da riqueza collectiva?

Pois nós temos culpa de que alguem se deixe vencer, que seja infeliz ou ainda que por uma fatalidade organica ou cosmica fique n'um plano inferior da vida economica?

A nossa culpa seria não cuidar do desenvolvimento da riqueza publica. Abram-se novos centros de trabalho, vão á Africa, vão aos novos continentes conhecer como a civilisação é extraordinaria, observada serenamente, longe dos centros da actividade europêa. Lá reconhecerão os que aqui se sentem mal, quanto a civilisação é util e boa, verão quantos beneficios se gosam no meio d'ella.

No campo social eu não conheço distincções privilegiadas; mas offender-me a mim porque tive a felicidade de ganhar dia a dia alguma cousa, offender um medico porque póde capitalisar, trabalhando, ou porque sustenta uma opinião scientifica, isso é impossivel e contra isso protesto!

Termino, dizendo que o primeiro dever dos poderes do estado e fazer publico que o operariado tem a protecção do estado portuguez. Dê-se trabalho, como se está fazendo, mas reprimam-se tambem as aberrações do operariado.

Os crimes dos anarchistas revelam uma seita que uma terrivel nevrose alenta.

O operario portuguez, impressionista e facilmente suggestionavel, como é, póde ceder á propaganda anarchista.

Previnamos esse mal, evitemos em Lisboa essa população que communica idéas rancorosas, idéas que vão fermentando desalentos e crimes. Reprimamos e castiguemos os delinquentes anarchistas por meios adequados e não por meios violentos. Ha exemplos na historia: sempre que se reprimem idéas fixas por meios violentos, levanta-se logo a reacção, creando a idéa contrariada grande numero de proselytos, que naturalmente desenvolvem uma grande actividade revolucionaria, prejudicando a economia publica e constituindo uma fatalidade para o bem geral.

É preciso, portanto, reprimir a idéa anarchista por meios adequados, que, creio, serão do facil execução, porque essa idéa não é espontanea do genio do nosso povo, é derivada da propaganda de leituras perniciosas que vão influir nos espiritos.

Preparemos a educação physica, moral e intellectual do operariado, e façamos diffundir a sua actividade pelos nossos dominios coloniaes, e assim teremos resolvido, o problema.

Hoje, mais do que nunca, estou convencido d'isto.

Depois evitemos a propaganda.

A imprensa é uma instituição que tem as minhas sympathias, mas devo reconhecer que nem sempre tem procedido segundo as suas graves responsabilidades. Não venha ateiar os espiritos, lançando-os na anarchia, não lisongeie os miseraveis só para o fazer, diga-lhes a verdade, não os illuda com a mentira.

Em Lisboa ha inquestionavelmente um fóco anarchista. Para que não continue tal facto, é necessario que se desenvolva o trabalho nacional e se desenvolvam os centros de producção nas colonias, livrando assim, os operarios das leituras perniciosas, e abrindo-lhes novos horisontes, em favor da civilisação. Não procedendo assim, este estado anormal proseguirá.

Todos nós somos amigos dos operarios, e, em vez de estarmos a alimentar este estado de cousas e adiar a resolução d'este problema, tratemos de o prover de remedio. Vão os operarios para as nossas colonias procurar trabalho, em vez de propagarem systemas revolucionarios, que não fazem senão prejudicar a economia do paiz e manchar a civilisação. É em nome da civilisação, da economia publica o do interesse do operariado que protesto contra a propaganda anarchista pelo facto.

Tenho dito.

O sr. Ministro da Justiça (Azevedo Castello Branco): - Pedi a palavra, não para tratar agora do acontecimento a que se referiu o illustre deputado, e que muito impressionou toda a cidade, como impressionou também, creio eu, o animo de todos os membros d'esta camara, (Apoiados.) mas para rebater uma asserção, que parece inferir-se do discurso de s. exa., isto é, que a aggressão de que ha dias foi victima El-Rei e o acontecimento que hontem se deu, provém de não ter havido da parte do governo a maior solicitude para com os operarios portuguezes, o que é, como todos sabemos, uma perfeita injustiça.

Ninguem ignora que ha annos se alimenta em Lisboa uma população de operarios, que se compõe de alguns milhares, e que estão produzindo um pesadissimo encargo no orçamento do estado.

Quem passear a cidade verá em quasi todos os edificios publicos obras em que se emprega um numeroso pessoal. Alem d'isso, todos os dias se dirigem ao governo civil, pedindo trabalho, differentes grupos de operarios, a quem se dá todo o auxilio para que possam desenvolver a sua actividade e tirar d'ella os elementos necessarios para prover á sua sustentação e á de suas familias. (Apoiados.)

Portanto, o facto da aggressito a Sua Magestade El-Rei e o occorrido hontem não podem explicar-se pelo abandono em que esteja a classe operaria.

Era unicamente isto que eu queria frisar, porque não desejava que lá fora estes factos, estes phenomenos, para me servir da linguagem physiologica que s. exa. empregou, se explicassem por nevroses produzidas pela fome, filha do supposto abandono da classe operaria.

Dito isto, e como não quero alongar-me em considerações a respeito dos factos alludidos, termino louvando os sentimentos altruistas do illustre deputado, mas não o posso acompanhar n'esses sentimentos até ao ponto de pretender que fiquem sem punição aquelles que a merecem.

(S. exa. não reviu as notas d'este discurso.)

O sr. Magalhães Lima: - Mando para a mesa uma proposta para que peço urgencia.

Leu-se na mesa a seguinte:

Proposta

Da parte da commissão do ultramar proponho que sejam aggregados á mesma commissão os deputados Francisco Marques e conde de Valle Flor. = Jayme de M. Lima.

Admittida a urgencia, foi em seguida approvada.

O sr. Teixeira Gomes: - Pedi a palavra especialmente para chamar a attenção do governo para o estado em que se encontra a viação publica no districto de Faro. Este districto é incontestavelmente rico pela fertilidade do seu solo, abundancia da sua costa e muito principalmente pela sua industria, que nos ultimos annos tem tomado extraordinario desenvolvimento. Infelizmente, porém, tem sido sempre tratado pelos poderes do estado como enteado, e no largo banquete dos melhoramentos publicos, em que especialmente compartilharam as provincias do norte, foram-lhe apenas reservados os ossos. Um d'elles foi o caminho de ferro do sul, vulgarmente conhecido pelo caminho de ferro do Algarve, mas propriamente caminho de

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ferro de Faro, porque é esta a unica povoação de certa importancia que elle serve, pois é de notar que a provincia do Algarve é atravessada pelo caminho de ferro na sua parte, mais esteril e que toda a região que comprehendo os concelhos do Silves, villa Nova de Portimão e Lagos não têem viação accelerada.

O parlamento, compenetrado da necessidade de dotar esta parte do Algarve com caminho de ferro, ha já bastantes annos que n'uma lei decretou a construcção de um ramal que, partindo de S. Bartholomeu de Messines, termine em Villa Nova de Portimão.

Infelizmente os poderes publicos têem dormido sobre a realisação d'este importante melhoramento, que representa a satisfação do uma urgente necessidade.

Ser-me-ía facil demonstrar que a demora na construcção do mencionado ramal é um gravissimo erro economico, principalmente porque estando o governo subsidiando largamente uma empreza de navegação para o Algarve, tal subsidio terminaria, e o capital que lhe corresponde daria para uma boa parte da construcção, que aliás é baratissima.

Mas, sr. presidente, pedindo a palavra não me propuz tratar este assumpto, o que me reservo fazer n'outra occasião; por agora pretendo apenas chamar a attenção do governo sobre a viação ordinaria no Algarve.

O que ali ha não são estradas, mus fitas do lama, no inverno, e de poeira, no verão, salpicadas do covas, verdadeiras sepulturas abertas aos transeuntes que por ellas se arriscam.

Posso, sr. presidente, para confirmação do que deixo dito appellar para o testemunho dos meus collegas n'esta camara, deputados pelo districto de Faro, e elles que digam se ali as estradas velhas não são recordadas com verdadeira saudade. Tal é o estado das chamadas novas!

Nem. outra cousa seria natural, porque ha annos que estas não soffrem reparos.

Bem sei que o governo, infelizmente, não dispõe de elementos para fazer os melhoramentos que de toda a parte do paiz lhe reclamam. Mas a verdade é que os povos que largamente contribuem para o thesouro publico têem o incontestavel direito de pedir que as suas necessidades mais urgentes sejam satisfeitas.

Estou, portanto, seguro que o governo ha de empregar todos os esforços no sentido de evitar que este estado de cousas continue, e ha de empregal-os rapidamente, porque quanto mais tarde se fizerem os melhoramentos, maior será a despeza com elles.

Já que estou com a palavra, permitta me v. exa. e a camara que me refira a outro assumpto, que é de interesse multo mais geral.

Ha dias votou esta camara o bill, e eu acompanhei-a n'essa votação, concorrendo com o meu voto para a absolvição do governo, absolutamente convencido de que praticava um bom serviço e satisfeito com a minha consciencia; porque na verdade, para mim os actos dictatoriaes praticados pelo governo estilo sobejamente justificados pelas circumstancias anormaes em que o paiz se encontrava quando o governo assumiu a dictadura, e muito particularmente pelo espectaculo verdadeiramente vergonhoso que uma minoria turbulenta offereceu ao paiz na ultima sessão legislativa. O governo correndo sobre elle o panno correspondeu, pelo seu acto de energia, ás aspirações geraes.

Se a dictadura tem plena justificação, no meu espirito, se a fórma por que o governo a exerceu merece o meu applauso no que respeita ás reformas eleitoral, administrativa e camara dos dignos pares no que ellas têem de fundamental, se, n'uma palavra, eu faço justiça ás intenções manifestamente patrioticas que dictaram todos os diplomas com providencias legislativas promulgadas pelo governo, é certo que entre estes ha alguns que reformaram importantes ramos da administração publica, com os quaes não posso concordar, e por isso opportunamente os discutirei quando vierem a esta casa do parlamento.

Percorrendo os decretos de natureza legislativa, promulgados pelo governo, e que n'uma sessão passada foram distribuidos á camara, eu notei que entre elles não se encontrava o regulamento da contribuição do registo, e isto talvez porque o governo entendeu que, promulgando aquelle regulamento, estava perfeitamente dentro das funcções executivas.

No emtanto devo declarar á camara que o mencionado regulamento contém disposições que, segundo o meu modo de ver, são de natureza legislativa.

Não está presente, é verdade, o sr. ministro da fazenda, a quem especialmente este negocio mais diz respeito, no entretanto estão presentes os srs. ministros da justiça e das obras publicas, e a elles rogo se dignem transmittir s. exa. as breves considerações que vou fazer.

Vou, pois, mostrar á camara que effectivamente o regulamento da contribuição de registo comprehende disposições que têem caracter absoluta e completamente do natureza legislativa.

Pelo decreto dietatorinl de 10 de janeiro do anno passado revogaram-se, algumas disposições da lei de 1880 sobre contribuição de registo; regulamentando, porém, esta lei e aquelle decreto, o governo consignou no regulamento, approvado pelo decreto de 1 de julho de 1895, disposições que importam verdadeiras modificações aos diplomas cuja execução pretendeu regular, e, o que é mais, alterou o que na nossa legislação formularia se acha estabelecido, com relação a sentenças transitadas em julgado.

Um breve exame de algumas disposições do citado regulamento convencerá v. exa. e a camara da verdade do que deixo dito.

No § 5.° do artigo 69.°, que aliás não é o que mais chama a minha attenção, encontro o seguinte.

(Leu.)

Note a camara que por esta disposição regulamentar a contribuição do registo respectiva a licitações e tornas deve ser paga no praso de trinta dias da data da sentença que julga as partilhas, e que a falta de pagamento dentro d'este praso importa o não poder ser executada a sentença, a qual não produz effeitos juridicos afim que a transmissão seja validada no praso de sessenta dias pelo pagamento da contribuição devida, aggravada com mais 50 por cento e juros de móra, devendo, passados que sejam noventa dias da data da sentença sem ter sido paga a contribuição, o ministerio publico intentar logo a acção necessaria para ser imposta a pena de nullidade.

Ora, nem na lei de 1880, nem no decreto dictatorial de 10 de janeiro de 1895, se encontra estabelecida esta penalidade, e antes no codigo do processo civil claramente se preceitua, no artigo 148.°, que uma sentença transitada em julgado só póde ser annullada nos casos que n'elle se acham taxativamente designados, entre os quaes se não conta o consignado na disposição regulamentar que estou analysando.

Logo o governo estabelecendo outros casos, alem d'aquelles que estão fixados na lei, para a annullação de uma sentença, com transito em julgado, excedeu as attribuições do poder executivo.

Mas isto seria para mim, um descrente dos immortaes principios, uma circumstancia meramente secundaria, se visse que d'estas disposições resultava alguma vantagem, quer para o thesouro publico, quer para a sociedade. Com effeito, nenhuma vantagem resulta d'ahi para o thesouro, porque ferindo-se de nullidade a sentença da partilha não se assegura com mais vantagem para a fazenda nacional o pagamento da contribuição, pois que com aquelle facto nada lucra o antes se collocou imprevidentemente na mão dos herdeiros descontentes com a partilha uma perigosa arma de que podem usar para a fazer annullar.

Se o governo queria estabelecer uma multa pelo facto

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de não se ter feito o pagamento da contribuição no praso legal, estabelecesse-o muito embora, mas sem prejuizo da disposição do artigo 148.° do codigo do processo civil.

O pagamento da contribuição do registo por titulo oneroso antes do julgamento da partilha, em seguida ao mappa, era um principio consignado no anterior regulamento e que no interesse do thesouro publico devia conservar-se, embora com duras penalidades em que na propria sentença da partilha o juiz condemnasse o contribuinte remisso. Assim não se daria nunca a hypothese possivel d'este contribuinte poder auferir vantagens do não pagamento da contribuição, e por isso não a pagar, e o ministerio publico ficaria com a propria sentença do inventario habilitado a executar o devedor pela contribuição, multa e juros de móra.

Isto seria pratico e aproveitavel.

Para a sociedade tambem a disposição do § 5.° do artigo 69.° do regulamento não traz vantagens, porque é manifestamente injusta.

Um interessado n'um inventario licitou em bens que mais tarde reconheceu que não lhe convinham ou arrependeu-se de ter acceitado o encabeçamento de um prazo, mas como tem de pagar uma contribuição de registo por titulo oneroso, contribuição que bem póde ser de valor insignificante, não a paga, deixa correr os prasos do § 5.° do artigo 69.° do regulamento e espera que o ministerio publico intente a acção para annullação da partilha. Intentada esta, confessa-a para não se sujeitar a contas maiores, e seguidamente tendo pago apenas a contribuição de registo, com a multa de 50 por cento concorre a uma nova partilha, da qual sómente tem a pagar custas na proporção do que recebeu.

Ahi estão, pois, os demais interessados que não estavam sujeitos a contribuição, ou se estavam, a pagaram, obrigados ás custas de um novo inventario com todos os seus incommodos.

Diga-me a camara se isto não é manifestamente injusto! Uma pena que póde representar uma vantagem para o remisso ou delinquente e que fere sempre innocentes! Alem do devedor remisso a quem, como dito fica, póde aproveitar algumas vezes - e tal não foi, por certo, a intenção do legislador - esta disposição aproveita ainda aos funccionarios judiciaes e aproveita-lhes especialmente agora, depois da nova tabella de emolumentos e salarios judiciaes, que, contra toda a espectativa, veiu mostrar que a anterior era verdadeiramente suave; tabella, aliás feita nos melhores intuitos, mas que, seja dito de passagem, converteu os officios de justiça em verdadeiras conezias.

Ora, o facto de aproveitar aos empregados judiciaes não me parece que seja a justificação mais racional que uma penalidade possa ter.

Mas não param aqui as irregularidades que se notam no regulamento da contribuição do registo.

No paragrapho seguinte lê-se o seguinte:

(Leu.)

Aqui está outra disposição em que o governo foi alem do que lhe permittia a lei de 1890 e do que lhe permittia o decreto dictatorial. porque nem n'um nem noutro diploma se estabelece que a contribuição do registo por titulo oneroso deve recaír sobre mobiliencos; e no entretanto o governo claramente estabeleceu no § 6.° d'este artigo que a contribuição do registo ha de incidir sobre mobiliencos.

Ainda não ha muito tempo que se deu com um meu constituinte o seguinte caso em virtude do § 6.°

Concorria elle a um inventario com mais dois herdeiros; a herança era no valor de 6:000$000 réis; 3:000$000 réis era o valor dos immobiliarios a partilhar e 3:000$000 réis nominaes representavam dividas incobraveis, sem valor algum, e que o cabeça do casal apenas descrevêra no cumprimento do encargo que a lei lhe impunha.

Licitou o meu constituinte em immoveis no valor de 2:000$000 réis, que era precisamente o que lhe pertencia na herança. Mas, como o codigo civil ordena n'um artigo, que não me recordo agora, que os bens sejam segundo a sua natureza igualmente divididos pelos interessados, este interessado teve de ir buscar uma quota parte nas dividas incobraveis, o succedeu que, sommados os 2:000$000 réis que lhe tinham pertencido em moveis com o que lhe pertencia das dividas incobraveis, coube-lhe no mappa réis 3:000$000; e applicando-lhe o pagamento da contribuição do registo, veiu elle a pagar 100$000 réis, sobre dividas que não tinham valor algum!

Ora, esta não é por certo a fórma mais equitativa de lançar a contribuição de registo.

Mas no regulamento ha ainda mais e melhor. Eu estou talvez a fatigar a camara, mas O assumpto é tão importante que não posso deixar de chamar para elle a sua attenção.

No artigo 96.°, diz-se.

(Leu.)

Encerra este artigo a novidade de chamar o ministerio publico aos inventerios para intervir, como se fosse herdeiro nos actos que enumero.

Ora, eu começo por não comprehender a rasão por que o ministerio publico ha de intervir em todos os inventarios. Se os inventarios são do menores ou pessoas equiparadas, lá está o curador geral dos orphãos que por dever de orneio intervem nos mesmos para exercer acção fiscalisadora. Ir chamar outra entidade, o ministerio publico assistir tambem para fiscalisar, parece-me perfeitamente escusado, pois a lei não póde nem deve suppor em dois funccionarios, de igual graduação, com habilitações identicas, com funcções que em regra são accumuladas no mesmo indivuduo, independencia, isenção e imparcialidade em graus diversos.

Se no inventario intervém o curador geral dos orphãos, basta a sua fiscalisação para evitar que haja conluios e que se pratiquem actos prejudiciaes aos interesses da fazenda nacional.

Isto veiu para o caso figurado de o inventario ser de menores ou pessoas a elles equiparadas, porque sendo de maiores, as licitações, os encabeçamentos e sobretudo os interesses encontrados dos herdeiros são a melhor garantia para a fazenda nacional de que os bens hão de ser partilhados segundo o seu valor real, notando-se que a fiscalisação que pela vista final assegurada no codigo do processo o ministerio publico exerce sobre todos os processos é ainda uma garantia para a fazenda, sem aggravamento de custas pela escusada intervenção d'este funccionario em todos os actos enumerados no artigo 96.°

Mas o que é mais exquisito no regulamento, e foi isso o que chamou mais particularmente a minha attenção, é o § 1.º d'este artigo, que diz.

(Leu.)

Ora, veja a camara isto. Basta apenas que o ministerio publico argua qualquer divida para que ella não possa, ser descontada para o effeito da contribuição de registo - quer dizer, o ministerio publico de parte que é, converte-se em juiz, porque julga em primeira e ultima instancia sem recurso. Apresenta-se um titulo authentico, uma escriptura, uma sentença mesmo, de onde conste uma divida, o ministerio publico por má disposição em que esteja, ou emfim, por inimisade com os interessados, oppõe-se a que a divida seja descontada para o effeito da contribuição de registo, e tanto basta para que o seja; a sua opposição vale nos termos do regulamento uma sentença passada em julgado. Ora, isto representa uma verdadeira invasão de attribuições judiciaes: é a anarchia dos poderes.

São estas as considerações a que mais particularmente dá logar o regulamento da contribuição de registo e sobre as quaes desejava chamar a attenção do governo.

Repito, não está presente o sr. ministo da fazenda a quem mais de perto este negocio interessa: no entretanto

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208 DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS

rogo a qualquer da srs. ministros que transmitia a s. exa. estas considerações, que me parecem opportunas n'este momento, visto que a camara vae em breve occupar-se do decreto dictatorial relativo á contribuição de registo, pois que, segundo dizem os jornaes, a respectiva commissão já se reuniu para dar o seu parecer sobre elle. No regulamento que o governo depois fizer, é rasoavel, é justo é conveniente, pede o interesse de toda a gente que se elimine esta disposição, que não tem rasão de ser.

Tenho dito.

O sr. Ministro das Obras Publicas (Campos Henriques): - Pedi a palavra para responder em breves termos ao illustre deputado que acaba de fallar.

S. exa. referiu-se a varios assumptos, sendo o primeiro com respeito á viação ordinaria no Algarve.

É certo que o districto de Faro, como em alguns outros, districtos do continente do reino, o estado das estradas ordinarias deixa alguma cousa a desejar; mas tambem é certo que, da parte do governo, ha o mais ardente e sincero desejo de acudir de prompto a esse mal, tendo empregado n'esse intuito, dentro dos limites do seu orçamento, os maiores esforços e diligencias.

E para evitar que as pequenas verbas orçaraentaes, visto que o orçamento se não tem discutido ha tres annos, e por consequencia se conservem ainda as mesmas verbas votadas em 1892 e 1893, para evitar, digo, que essas pequenas verbas se distribuissem por muitas obras, determinou o governo, em dezembro do anno passado, que toda a verba orçamental destinada a estradas fosse unicamente consumida nas reparações das que mais carecessem d'ellas, evitando-se a construcção de novas estradas. E n'estes termos foi distribuida toda a verba d'este anno, com a maxima igualdade, por todos os districtos do continente.

O mesmo se fará com relação ao orçamento que tem de ser discutido e votado esto anno; mas, se a camara entender na sua alta sabedoria que a verba, consignada no orçamento para reparação de estradas deve ser augmentada, eu terei n'isso verdadeira satisfação, podendo s. ex. estar certo de que com igual solicitude eu procurarei occorrer ao mal que s. exa. apontou.

Mas, repito, todos os esforços tem sido empregados para melhorar este estado de cousas, com respeito a viação, tanto no districto de Faro, como em todos os districtos do reino.

E permitta-me s. exa. que lhe diga que o Algarve não é para o governo um enteado; o Algarve soffreu apenas as consequencias, como soffreram todos os outros districtos, do nosso mau estado financeiro.

Disse tambem s. exa. que approvára o bill ao governo, porque entendera que elle tinha procedido com rasoavel fundamento, mas que não podia ainda assim concordar com muitas das providencias que foram promulgadas.

Devo dizer ao illustre deputado que o pensamento e o desejo do governo é que as providencias que tomou dictatorialmente sejam devidamente apreciadas pela camara, para que da sua discussão saiam tão perfeitas e completas quanto possa ser.

Referiu-se s. exa. especialmente á lei de contribuição de registo, ao seu respectivo regulamento e ainda á tabella judiciaria.

A lei de contribuição de registo deve ser brevemente apresentada ao parlamento o dada para ordem do dia.

S. exa. terá então ensejo de expor as considerações que tiver por conveniente, e o que pouso desde já assegurar ao illustre deputado é que o sr. ministro da fazenda, a quem communicarei com muito prazer as suas considerações, as tomará na devida conta, e procurará remediar quaesquer inconvenientes, se elles existem.

E o que disse com relação á lei da contribuição de registo, digo-o tambem com relação á tabella judiciaria.

É essa tambem uma das providencias que tem de ser á apreciação da camara, e o empenho do governo é que ellas fiquem tão perfeitas quanto os interesses do paiz legitimamente reclamam.

(S. exa. não reviu as notas d'este discurso.)

O sr. Fratel: - Por parte da commissão do bill mando para a mesa o parecei- relativo ao decreto de 25 de dezembro, que alterou e reformou a camara dos dignos pares.

(A imprimir.)

O sr. Presidente: - A hora está muito adiantada; vae passar-se á ordem dia. Os senhores deputados que tiverem papeis a mandar para a mesa, podem fazel-o.

ORDEM DO DIA

Continuação da discussão do projecto n.° 3

(Regulamento interno da camara)

Leu-se o:

Artigo 69.º A camara dos deputados constitue-se em sessão secreta:

1.° Por indicação da mesa;

2.º Em virtude de proposta de um deputado assignada por mais cinco e approvada pela mesa, á qual serão confiados os motivos da proposta;

3.° Por proposta do governo feita á mesa.

Approvado.

(Seguidamente foram approvados sem discussão os artigos n.ºs 70.°, 71.°, 72° e 73.°)

Leu-se o

Artigo 74.° Na acta da sessão publica se mencionará o nome do deputado que apresentou a proposta para a sessão secreta, e os dos cinco que a assignarem, ou, segundo o caso foi, se a sessão secreta teve logar por indicação da mesa, ou em virtude do proposta do governo.

O sr. Teixeira de Sousa: - Mando para a mesa uma emenda a este artigo por parte da commissão.

Leu-se a seguinte

Emenda

Artigo 74.° "indicação da mesa, iniciativa da ou proposta do governo". = Teixeira de Sousa.

Foi approvado o artigo com esta emenda.

Em seguida foi approvado sem discussão o artigo 15°

Entrou em discussão o

Artigo 76.° O livro reservado, de que traia o artigo antecedente, será lacrado e sellado com o sêllo da camara, e rubricadas pela mesa as cintas que o fecharem.

§ unico. Quando algum deputado quizer examinar as actas das sessões secretas, dirigir-se-ha para este fim ao presidente, que abrirá o livro, fechando-o depois de feito o exame pedido, e lacrando-o novamente com as solemnidades acima prescriptas.

O sr. Arroyo: - Pedi a palavra simplesmente para perguntar ao sr. relator, se no espirito do § unico está que, alem do livro ser aberto pelo presidente, a leitura se faça na sua presença?

Se é este o pensamento da commissão, como creio, bom seria que assim fosse declarado, porque no artigo não está expresso.

O sr. Teixeira de Sousa (relator): - Tomo nota da observação do illustre deputado que será considerada na ultima redacção do projecto.

Fui approvado o artigo salva a redacção e seguidamente foram aprovados sem discussão os artigos 77° e 78,°

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SESSÃO N.º 21 DE 5 DE FEVEREIRO DE 1896 209

Lê-se o

Artigo 79.° Ás commissões permanentes da camara em cada sessão legislativa serão as seguintes:

1.ª Administrativa da casa;
2.ª De fazenda;
3.ª De administração publica;
4.ª Do ultramar;
5.ª Do orçamento;
6.ª De legislação civil;
7.ª De instrucção publica superior e especial;
8.ª De instrucção primaria e secundaria;
9.ª De legislação criminal;
10.ª Ecclesiastica;
11.ª De marinha;
12.ª De guerra;
13.ª De obras publicas;
14.ª De negocios estrangeiros e internacionaes;
15.ª De regimento e disciplina;
16.ª De petições;
17.ª De estatistica;
18.ª De commercio;
19.ª De agricultura;
20.ª De artes e industrias;
21.ª De saude publica;
22.ª De recrutamento;
23.ª De redacção.

§ 1.° A commissão administrativa da casa será composta do presidente da camara e do primeiro secretario e de mais tres deputados eleitos pela camara, nos termos do artigo 81.°

§ 2.° As commissões de fazenda, administração publica e ultramar serão formadas por onze membros; as do orçamento, de legislação civil, de instrucção publica superior é especial, instrucção primaria e secundaria, legislação criminal, ecclesiastica, de marinha, de guerra, de obras publicas e de negocios estrangeiros e internacionaes, de nove; as do regimento e disciplina, infracções, petições, estatistica, agricultura, commercio, artes e industrias, saude publica e recrutamento, de sete: a de redacção, de cinco

O sr. Presidente: - Está em discussão.

O sr. Teixeira de Sousa: - Mando para a mesa uma emenda ao artigo e uma substituição ao § unico.

Leu-se a seguinte

Emenda

Artigo 79.° "10.ª de negocios ecclesiasticos. = Teixeira de Sousa.

Admittida.

Leu-se a seguinte

Proposta

Substituição ao § 2.°, artigo 79.°

As commissões de fazenda, administração publica, do ultramar e de agricultura serão formadas por onze membros; as restantes commissões permanentes serão formadas por nove, com excepção da administrativa e da de redacção, formadas por cinco. = Teixeira de Sousa.

Admittida.

O sr. Presidente: - Ficam em discussão juntamente com o artigo.

O sr. Marianno de Carvalho: - Antigamente havia uma commissão que podia ter alguma utilidade; a de pescarias; pois essa commissão foi supprimida; mas ficou a de estatistica que eu, em vinte e seis annos de parlamento, não me lembro que tivesse servido para cousa alguma.

Não seria melhor substituil-a pela de pescarias?

Lembro isto ao sr. relator.

O sr. Teixeira de Sousa: - Não vejo inconveniente em que no regimento figure a commissão de estatistica, mas não tenho tambem duvida em acceitar a idéa do sr Marianno de Carvalho para que se restabeleça a commissão de pescarias.

O sr. Salgado de Araujo: -Parece-me que uma das cousas que melhor devemos aproveitar é o tempo, que é de tudo o mais precioso, e que, portanto, devemos proceder á eleição das commissões por fórma a não gastarmos com esse trabalho quatro ou seis sessões.

Consegue-se isto, desde que se resolva que podem ser eleitas simultaneamente seis commissões.

N'este sentido mando para a mesa uma proposta.

Podem dizer-me que a demora é util, porque se dá tempo a que as commissões produzam algum trabalho que sirva de materia para discussão na ordem do dia; mas eu penso que no artigo 61.° se encontra o bastante para se poder parar esse golpe. Diz-se n'esse artigo o seguinte:

"Artigo 61.° Se antes da ordem do dia se tiver levantado discussão sobre qualquer assumpto de interesse publico geral, e for requerido que sobre elle se abra inscripção especial, o requerimento será submettido pela mesa á deliberação da camara, a qual poderá n'esse caso, se deferir, resolver que o assumpto se considere de ordem, seguindo-se discussão n'estes termos, até final liquidação."

Assim, mesmo sem haver ordem do dia, antecipadamente estabelecida, póde apparecer assumpto que sirva para discussão geral durante uma sessão. Temos, portanto, esse recurso.

Mas dado mesmo o caso de não haver assumpto para discussão, fecha-se a sessão, dando-se assim tempo a que as commissões possam trabalhar com mais assiduidade, e, por consequencia, produzir obra de que a camara possa occupar-se.

Desde que se estabeleça que a eleição das commissões se faça por grupos de seis, havendo para isso na mesa as urnas precisas com as competentes designações, é claro que em menos tempo se elegem e mais rapidamente se constituem.

Já tive occasião de ouvir dizer aqui a um illustre deputado, que pertencia a uma commissão já constituida, sem que todavia o soubesse. Não sei se poderei dizer o mesmo a respeito de alguma a que eu pertença, porque nunca fui convidado para nenhuma reunião.

Repito, o que desejo é que a eleição das commissões se faça mais rapidamente, em vez de estarmos aqui a conversar um pouco como que em familia, levantando-nos de quando em quando para lançar uma vista de olhos á urna, quasi pro forma.

(S. exa. não reviu.)

Leu-se na mesa a seguinte:

Proposta

As eleições d'essas commissões far-se-hão por grupos de seis, havendo na mesa as urnas precisas com as respectivas designações. = Salgado de Araujo.

Foi admittida.

O sr. Arroyo: -Infelizmente, não posso concordar com as considerações feitas pelo sr. Salgado de Araujo.

A eleição de commissões, n'uma camara, com a importancia d'esta, é cousa muito seria que não deve fazer-se a trouxe-mouxe.

N'uma eleição ha um grande numero de condições, de circumstancias especiaes a attender, como são, por exemplo, os predicados individuaes e outras que precisam ser cuidadosamente estudadas.

Uma eleição rapida daria como consequencia, conter a obra, resultante do trabalho parlamentar, muitos erros e imperfeições.

Direi mais, tenho já sufficiente pratica parlamentar para saber que esses trabalhos marcham sempre de perfeita harmonia entre a mesa da camara, ou junta, e o governo. Essa mesma pratica diz-me que a constituição definitiva

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210 DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS

da camara, a eleição e os trabalhos da commissão, marcham mais ou menos depressa conforme as necessidades da administração.

N'estes termos, sr. presidente, não voto a mais pequena alteração á fórma estabelecida para a eleição das commissões.

Posso até dizer ao illustre deputado que acaba de fallar, que quando o governo quer constituir depressa uma camara, para entrar rapidamente no exame de pareceres, sabe bem os meios de que deve usar para esse fim, assim como sabe indicar-lhe, no começo de qualquer discussão sobre assumpto de caracter politico, a necessidade ou conveniencia de a demorar.

Deixe-se, pois, ficar como está a prescripção regimental, que póde evitar o emprego de meios mais prejudiciaes ou, pelo menos, inconvenientes.

Não reviu.

O sr. Teixeira de Sousa (relator): - Por parte da commissão não concordo com qualquer alteração feita sobre este artigo, por me parecer desnecessaria. Peço, portanto, a v. exa. que ponha á votação o artigo 79.° com a substituição que tive a honra de mandar para a mesa.

Foi lido e, approvado o artigo, conjunctamente com a proposta de emenda mandada para a mesa pelo sr. relator.

É tambem approvada a substituição ao § unico.

O additamento do sr. Salgado foi rejeitado.

Seguidamente são approvados sem discussão os artigos 80.°, 81.º e 82.º

Lê-se o

Artigo 83.º. Compete ás commissões o conhecimento e exame de todas as propostas e projectos de lei que versaram sobre os assumptos da sua especialidade e lhes hajam sido enviados pela mesa.

§ unico. A commissão de fazenda será sempre ouvida sobre as propostas e projectos de lei que importem despega não auctorisada por lei ou diminuição de receita.

O sr. Presidente: - Está em discussão.

O sr. Marianno de Carvalho: - Sobre o artigo 83.° tenho apenas que perguntar ao sr. relator se concorda num additamento ao § unico.

Eu acho a disposição boa e vem já no antigo regimento; mas não é sufficiente. Para pessoas que, como nós, não estejam iniciadas na sciencia dos orçamentos, a phrase - não auctorisada por lei - é mais que sufficiente; mas para os que têem profundado os mysterios orçamentaes, o caso é mais importante do que se julga, porque - despezas não auctorisadas por lei - nem sempre são despezas que não estejam n'estas condições; umas vezes entende-se que são aquellas que não estão auctorisadas pelo orçamento, mas que o estão por lei especial; outras vezes são despezas que não estão auctorisadas por lei, mas que estão auctorisadas no orçamento; de modo que para evitar que de futuro se levantem quaesquer questões sobre este assumpto, dadas as varias interpretaç5es que a referida sciencia lhe tem dado, parece-me necessario que no artigo se diga - auctorisada por lei ou no orçamento.

Com este additamento talvez fiquem acauteladas todas as hypotheses.

O sr. Teixeira de Sousa (relator): - Declaro a v. exa. que concordo com o additamento indicado pelo sr. Marianno de Carvalho.

Foi approvado o artigo n'esta conformidade.

Lê-se o

Artigo 84.° Cada uma das commissões examina e discute as propostas e projectos de lei, conforme lhes for indicado pelo seu presidente, e, findo o exame e discussão, nomeia de entre os seus membros um relator especial, que apresentará o parecer fundamentado á camara.

§ 1.º Nenhum parecer ou projecto de qualquer commissão poderá ser impresso, distribuido, nem dado para discussão, sem estar assignado pela maioria dos vogaes da commissão, e especificado o relator.

§ 2.° Na falta de declaração do relator, entende-se ser o ultimo assignado.

§ 3.º No relatorio se fará menção de ter sido adoptado o parecer de accordo com o governo; faltando esta declaração, entende-se que não existe o accordo, ou que o governo não foi ouvido.

O sr. Presidente: - Está em discussão.

O sr. Teixeira de Sousa (relator): - Mando para a mesa a seguinte:

Emenda

Artigo 84.º ... "indicado pelo seu presidente ou deliberado por elle".= Teixeira de Sousa.

Lida na mesa, foi admittida.

O sr. Arroyo: - A uma das observações que eu tinha a fazer já respondeu a emenda mandada para a mesa pelo sr. relator; mas tenho a lembrar ainda a s. exa. a conveniencia de se eliminarem as palavras - findo o exame e discussão.

O relator não é nomeado no fim da discussão dos pareceres; em geral é escolhido antes de começar a discussão no seio da commissão. Algumas vezes mesmo o relator é escolhido durante a discussão, de modo que me parece mais conveniente dizer só:

"Cada uma das commissões examina e discute as propostas e projectos de lei, conforme lhes for indicado pelo seu presidente, e nomeia de entre os seus membros um relator, etc., etc."

Relativamente ao § 1.° julgo necessario acrescentar aã palavras - se tiver sido enviado para a mesa - antes das palavras - sem estar assignado.

O illustre relator sabe que mais de uma vez se tem mandado para a mesa pareceres que não têem as assignaturas dos vogaes da commissão, chegando a ser impressos e distribuidos.

O sr. Marianno de Carvalho: - Têem até entrado em discussão.

O Orador: -Disso não me recordo, mas acredito desde que s. exa. o affirma. Mais tarde terá de abrir-se novo de bato por faltarem assignaturas. Espero, portanto, que o sr. relator acceite a minha indicação.

O sr. Teixeira de Sousa (relator): - Não tenho duvida em acceital-a, como acceito tambem a outra indicação de s. exa. em relação ao artigo.

Foi approvado n'esta conformidade, e com a emenda do sr. relator.

Leu-se o

Artigo 85.° Os membros das commissões que discordarem, na generalidade, dos projectos de lei ou pareceres approvados pelas maiorias das mesmas commissões, assignarão esses documentos como vencidos; os que, porém, só discordarem, na especialidade, de alguns dos artigos ou de algumas das partes, assignarão com declarações, expondo uns e outros summariamente as rasões do seu voto em pareceres separados, que serão impressos e distribuidos juntamente com os da maioria.

O sr. Presidente: - Está em discussão.

O sr. Teixeira de Sousa (relator): - Mando para a mesa o seguinte:

Additamento

Depois da palavra "expondo", acrescentar "querendo" .= Teixeira de Sousa.

Foi approvado o artigo com este additamento.

Em seguida lê-se na mesa e é approvado sem discussão o artigo 86.°

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SESSÃO N.° 21 DE 5 DE FEVEREIRO DE 1896 211

Leu-se o

Artigo 87.° Os pareceres e projectos de lei apresentados pelas commissões deverão ser sempre assignados por todos os seus membros, que não estiverem legitimamente impedidos, e os que não assignarem, antes d'elles serem impressos e distribuidos á camara, não poderão tomar parte na sua discussão.

§ unico. Os membros das commissões que, sem impedimento legitimo, tiverem faltado a todas as sessões das mesmas commissões, quando se tenha tratado de uma determinada materia sujeita ao seu exame, ficarão inhibidos de assignar quaesquer pareceres - ou projectos de lei emanados das mesmas commissões e que digam respeito a essa materia.

O sr. Presidente: - Está em discussão.

O sr. Marianno de Carvalho: - Pedi a palavra para dizer a v. exa. que, a meu ver, as restricções feitas por este artigo são excessivas e que d'ellas não se tira nenhuma utilidade - pratica; antes podem dar logar a alguns inconvenientes.

Em primeiro logar pretende-se que os membros da commissão que não comparecerem, sem impedimento justificado, e que não tenham assignado os pareceres, não possam tomar parte na discussão; mas todos sabem que os impedimentos têem-se justificado sempre por uma simples declaração.

Por outro lado, se se começar a exigir excessivo rigor de justificações, não admittindo senão as de impedimentos physicos, irão crear-se dificuldades sem vantagem alguma. V. exa. comprehende quantas circumstancias se podem dar, em que haja impedimento real, mas que senão possa demonstrar com documentos. Logo, a justificação não tem valor nenhum, e a disposição do artigo só serve para impedir que um deputado, que póde illustrar a camara e que por qualquer motivo não assignou o parecer, tome parte na discussão.

A pratica muito seguida n'esta camara é a seguinte: discutidos - e votados os pareceres das commissões se, todos estão concordes, são apresentados na camara aos deputados que os têem de assignar. Elles assignam e os pareceres são então mandados para a mesa. É cousa que se faz todos os dias e não tem inconveniente.

Por outro lado tambem o § unico me parece altamente severo. Um exemplo: na commissão de fazenda discute-se hoje a contribuição industrial. Eu, por qualquer motivo, não posso comparecer; mais tarde torna outra vez a discutir-se a contribuição industrial, a que é necessario fazer uma modificação; mas eu estou inhibido de tomar parte na discussão d'esse assumpto, porque da primeira vez não pude comparecer! Vê-se, pois, que esta disposição não acautela cousa nenhuma e só serve para incommodar.

Peço, portanto, que, se o sr. relator concordar, ella se elimine do regimento, porque não corresponde a nenhuma necessidade real e só póde trazer inconvenientes.

(S. exa. não reviu.)

O ar. Teixeira de Sousa (relator): - Ha pouco ponderou o sr. Arroyo, que podem resultar muitos inconvenientes de serem mandados para a mesa pareceres de commissões, sem terem o numero de assignaturas marcado no regimento.

Para obviar a esses inconvenientes é que a commissão incluiu no projecto a disposição penal que o sr. Marianno de Carvalho indicara. E não vejo outro meio de obrigar os membros da commissão a assistirem á sessão e a assignarem os pareceres, senão estabelecendo uma penalidade para os que não comparecerem.

Com este fundamento é que foi redigido o artigo em discussão; mas depois das considerações feitas pelo sr. Marianno de Carvalho, não tenho duvida em concordar com a eliminação do mesmo artigo e seu paragrapho,

Consultada a camara, assim foi resolvido. I

Leu-se o

Artigo 88.° Depois de eleitas as commissões permanentes ou especiaes, não é permittido aggregar-lhes novos membros, a não ser por proposta das mesmas commissões.

O sr. Presidente: - Está em discussão.

O sr. Arroyo: - Concordo plenamente com a disposição do artigo 88.°, mas parece-me ser preciso especificar quaes os membros da commissão, que têem direito de fazer propostas de aggregação.

Parece-me que devem ser os presidentes ou os secretarios, e isto deve ficar consignado no regimento, para não serem feitas as propostas de aggregação por qualquer outro membro da commissão.

O sr. Teixeira de Sousa: - O illustre deputado sabe muito bem que frequentemente se abusa com as propostas de aggregação de deputados às differentes commissões, e isto, por vezes, com grande prejuizo, pois que por essa forma se vae perturbar o voto e a decisão d'essas mesmas commissões.

Por este motivo entendi que devia redigir o artigo 88.° de forma que as aggregações nunca podessem ser propostas sem que as commissões assim o tenham deliberado.

Dizer, como se diz no artigo: "... não é permittido aggregar-lhes novos membros, a não ser por proposta das mesmas commissões e, é presuppor que ellas deliberam primeiro, e depois disso é que vem a proposta á camara.

D'este modo não é licito a qualquer membro da commissão fazer propostas de aggregação por iniciativa propria.

(S. exa. não reviu.)

O sr. Arroyo: - Ainda assim, não fica bem claro, se a proposta deve ser apresentada pelo presidente, ou pelo secretario, e no meu entender é conveniente e necessario que só por estes possa ser feita.

Sabem o que acontece?

E que passado tempo qualquer membro da commissão que não seja o presidente ou o secretario interpretando á letra o texto do artigo, apresenta uma proposta de aggregação, quando eu entendo que só o presidente ou o secretario, numa palavra, a mesa, é que o póde fazer.

(S. exa. não reviu.)

O sr. Teixeira de Sousa (relator): - Lembro ao illustre deputado que póde haver necessidade ou conveniencia de aggregar um deputado a uma commissão, e todavia dar-se qualquer impedimento por parte do presidente, ou do secretario, para apresentar a respectiva proposta.

Parece-me, pois, que se podem conciliar as cousas, estabelecendo-se que a proposta possa ser feita por qualquer membro da commissão em nome d'ella, mandando para a mesa conjunctamente com essa proposta a deliberação da commissão a esse respeito.

(S. exa. neto reviu.)

O sr. Arroyo: - Se há parecer ou deliberação da commissão é porque ha mesa; não ha parecer sem ella se ter reunido.

O sr. Teixeira de Sousa: - Póde ficar então d'esta maneira: "Por proposta da commissão, apresentada por algum dos membros da mesa".

O sr. Arroyo: - Perfeitamente.

Posto a votação o artigo 88.° foi approvado n'esta conformidade.

Seguidamente foram lidos e approvados em discussão os artigos 89.°, 90.°, 91.°, 92.° e 93.°

O sr. Presidente: - Vae ler-se o artigo 94.° para entrar em discussão.

Leu-se e é o seguinte:

Artigo 94.° É prohibida aos deputados a apresentação á camara de petições individuaes.

§ unico. Para a recepção das petições dirigidas á camara haverá, patente ao publico, uma caixa n'uma das salas do edificio da camara.

Página 212

212 DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS

O sr. Arroyo: - Ha n'este artigo uma palavra que, no meu entender, precisa de esclarecimentos; é a palavra - individuaes.

O que quer dizer petição individual?

É a que respeita ao individuo só ou ao deputado que a apresenta?

O sr. Teixeira de Sousa: - A que respeita ao individuo só.

O ar. Arroyo: - O artigo diz:

"É prohibida aos deputados a apresentação á camara de petiçõos individuaes."

E eu suppunha que esta prohibição é com respeito às petições dos proprios deputados. Foi isto que me pareceu; de outra forma o artigo contraria o que se tem feito sempre.

O sr. Teixeira de Sousa: - Com a redacção d'este artigo o que se quiz foi acabar com a grandissima quantidade de requerimentos que diariamente são aqui apresentados, com o caracter de verdadeiras petições individuaes.

S. exa. como deputado mais antigo do que eu, sabe bem que nas escadas da camara ha verdadeiros assaltos aos deputados para que se encarreguem de apresentar na camara requerimentos de interesse particular, vendo-se elles na necessidade de pedir a palavra antes da ordem do dia para fazer a apresentação desses requerimentos.

É este o pensamento do artigo. Os interessados que lancem os seus requerimentos na caixa das petições que terão depois o devido seguimento.

(O orador não reviu.)

O sr. Marianno de Carvalho: - Este artigo, como está redigido, póde entender-se de diversos modos. Petição individual póde ser uma petição assignada por um só individuo; mas por ser uma simples petição não se segue que ella não possa versar sobre o mais importante de todos os negocios; póde, embora assignada por um só individuo, dizer respeito a interesses geraes. Também poderá entender-se por petição individual a que diga respeito só a interesses individuaes de quem a assigna; e finalmente ainda póde respeitar a interesses do próprio deputado que a apresenta.

Ora, em qualquer das hypotheses eu acho a disposição inutil ou prejudicial. Se diz respeito a interesses particulares de outrem, é certo que a nova disposição livra-nos do incommodo apontado pelo sr. relator; mas traz-nos em troca dois outros; o primeiro é termos de deitar a petição na caixa propria para esse fim; o segundo é termos de chamar para ella a attenção da camara, ou de defendel-a, visto que o artigo não prohibe que os reqxierimentos sejam defendidos e só prohibe que sejam apresentados.

Ora, parece-me que o mal que resulta da apresentação das petições não é tão grande que precise de disposições tão rigorosas. E a não ser que se prohiba tambem a defeza desses requerimentos, não vejo que se ganhe muito com este artigo.

(O orador não reviu.)

O sr. Teixeira de Sousa (relator): - Pela redacção do artigo 94.° vê-se bem que se trata apenas das petições de individuos estranhos á camara, e o fim que se teve em vista foi, como já disse, impedir o assalto constante aos deputados para se encarregarem da apresentação desses requerimentos que podem e devem ser lançados na respectiva caixa, porque do mesmo modo serão submettidos á apreciação das respectivas commissões.

Não posso, portanto, deixar de manter toda a redacção do artigo 94.º

Não havendo mais ninguem inscripto foi posto á votação e approvado o artigo 94.°

Em seguida foram lidos e votadas sem discussão os artigos 95.º e 96,°

Leu-se o

Artigo 97.° Qualquer commissão poderá, se o julgar conveniente, pedir o parecer de outra ou outras. A mesma proposta ou projecto de lei poderá também, por indicação da mesa ou resolução da camara, ser commettida ao exame de mais de uma commissão, reunidas ou separadamente.

§ 1.° Os pareceres das commissões, que concluirem pela remessa a outras commissões, poderão ser a estas enviados pela mesa, sem dependencia de leitura, nem de votação da camara.

§ 2.° Todas as commissões poderão do mesmo modo, sem preceder auctorisação da camara, solicitar do governo, por qualquer dos ministérios, e por intermédio da mesa, esclarecimentos a respeito dos trabalhos de que se acham encarregadas.

O sr. Presidente: - Está em discussão.

O sr. Arroyo: - Da leitura deste artigo não se vê claramente se o exame do projecto que tem do ser feito ou separadamente por cada uma das commissões, ou em reunião de todas, pertence á iniciativa da commissão ou á deliberação da mesa.

Deve entender-se que as palavras por indicação da mesa ou resolução da camara, se applicam ao facto do exame de determinado projecto ser commettido a uma determinada commissão, ou ao facto d'esse exame ser commettido às commissões reunidas por indicação da mesa ou resolução da camara?

D'aqui resulta a conveniência de se redigir este para-grapho de maneira que não se levantem duvidas.

Não havendo mais ninguem inscripto, foi votado o artigo 97.°

Em seguida foi votado sem discussão o artigo 98.º

Leu-se o

Artigo 99.° A commissão, á qual for commettido o exame de alguma proposta de lei, apresentada pelo governo, convertel-a-ha em projecto de lei, se julgar conveniente a sua adopção; mas a proposta do governo na sua integra acompanhará o relatório da commissão, que deve preceder o projecto de lei.

§ unico. Do mesmo modo só procederá relativamente aos projectos de lei ou propostas apresentadas pelos deputados.

O sr. Presidente: - Está em discussão.

O sr. Marianno de Carvalho: - Parece-me que haverá alguma cousa de útil em modificar-se a redacção d'este artigo por forma a evitar que uma commissão, arbitrariamente, deixe de dar parecer sobre qualquer proposta ou projecto de lei.

O artigo diz assim:

"A commissão, á qual for commettido o exame de alguma proposta de lei do governo, convertel-a-ha em projecto de lei, se julgar conveniente a sua adopção.

De modo que se uma commissão quizer que uma proposta do governo não venha á camara, facilmente o consegue; não julga conveniente convertel-a em projecto de lei e deixa de apresentar o projecto, e não ha meio de o poder conseguir. O artigo como está redigido não acautela esta hypothese.

O governo apresenta propostas de lei; vão á commiss3o, e se ella não quer convertel-as em projecto, essa commissão, sem consultar a camara, arvora-se puramente em dictadora, e não deixa chegar á camara nem uma só proposta do governo, convertida em projecto de lei.

Parece-me, pois, necessario modificar a redacção deste artigo de modo que não se possa dar similhante hypothese. Bastará para isso que depois da commissão tomar a resolução de não converter em projecto a proposta do gover-

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SESSÃO N.° 21 DE 5 DE FEVEREIRO DE 1896 213

no, venha trazer á camara um parecer nesse sentido para que a camara resolva se o deve approvar ou não. Mas deixar ao arbitrio da commissão o abafar ou não qualquer proposta de lei do governo, não me parece conveniente.

O sr. Teixeira de Sousa: - Realmente póde dar-se o facto de não concordar a commissão com a proposta do governo e não dar parecer algum, mas póde dar-se tambem o caso de não poder a commissão deliberar por não se reunir.

O sr. Marianno de Carvalho: - Marque-se um praso.

O Orador: - Concordo. Pôde marcar-se um praso, dentro do qual as commissões deliberem e declarem quaes as propostas de lei com que não concordam.

O sr. Arroyo: - Não me parece conveniente, nem eu adopto o alvitre de se impor desde logo á commissão um praso fatal para apresentação do parecer. Vou dizer o que me parece rasoavel.

O governo apresenta uma proposta de lei á camara, como qualquer deputado póde apresentar um projecto de lei. Proposta do projecto de lei é submettido á commissão, e esta ou traz o parecer ou não. O que póde e deve ficar sempre salvo ao deputado, assim como a qualquer dos membros do governo, é o direito de denunciar á camara o procedimento da commissão que propositadamente adiar por uma forma indefinida o seu parecer.

Tambem deve ficar assente que a partir de um certo numero de sessões, desde aquella em que foi apresentada a proposta de lei ou o projecto de lei, a commissão tem de apresentar o seu parecer.

O sr. Teixeira de Sousa (relator): - Conciliando o que disse o sr. Marianno de Carvalho com o que disse o sr. Arroyo, parece-me que a disposição a adoptar-se é áquella pela qual a commissão fique obrigada a trazer o parecer sobre a proposta de lei ou projecto de lei, dando-se a qualquer deputado ou a qualquer membro do governo a faculdade de vir denunciar á camara o procedimento da commissão, marcando então a camara um praso para que a commissão dê o seu parecer.

O sr. João Arroyo: - E applicar tambem aos projectos de lei, a que se refere o § unico, o principio que assim ficar regulando para as propostas de lei.

O sr. Teixeira de Sousa (relator): - Em harmonia com o que disse, formulei e mando para a mesa a seguinte:

Proposta

Proponho que no artigo 99.° se consigne que quando a commissão não concorde com proposta do governo ou projecto de lei, ella fique obrigada a fazer o parecer nesse sentido, podendo a camara marcar praso para apresentação desse parecer sobre proposta. = Teixeira de Sousa.

Foi admittida.

O sr. Presidente: - Não havendo quem mais peça a palavra, vae votar-se o artigo 99.°, com a modificação proposta pelo sr. relator, salva a redacção.

Foram approvados n'esta conformidade.

Leu-se, e foi approvado sem discussão o artigo 100.°

Leu-se o

Artigo 101.° Nenhum deputado nem ministro d'estado poderá fallar na camara, sem ter pedido ao presidente a palavra, e este lha ter concedido.

§ unico. Todos os oradores dirigirão o seu discurso ao presidente ou á camara, e poderão fallar do seu logar ou da tribuna collocada na sala para este fim, mas em qualquer dos casos conservar-se-hão de pé.

O Sr. Presidente: - Está em discussão.

O sr. Teixeira de Sousa (relator): - Mando para a mesa a seguinte proposta de

Eliminação

Artigo 101.°- § 1.°

Eliminar as palavras "ou á camara" .= Teixeira de Sousa.

Foi admittida.

O sr. Marianno de Carvalho: - Não me repugna, nem me impressiona bem nem mal o additamento proposto pelo sr. relator. Eu queria lembrar uma circumstancia que ainda se não deu, mas que póde dar-se.

A regra estabelecida no § unico é que o orador falle do seu logar ou da tribuna, mas ha de ser de pé. A regra é boa e salutar. Póde, porém, haver casos em que se deva fazer uma excepção. Imaginemos o homem mais talentoso, o maior genio, cheio de conhecimentos especiaes sobre a materia que se discute, mas que por effeito de uma enfermidade não se póde conservar de pé. Ha de ficar privado de tomar parte nos debates?

Desejaria, por isto, que no paragrapho se dissesse salvo concessão especial da camara, por motivos physicos"

O sr. Teixeira de Sousa (redator): - Não posso concordar com a modificação indicada pelo sr. Marianno de Carvalho. Quem está nas condições lembradas pelo illustre deputado tem impossibilidade physica, e, portanto, é inelegivel.

O sr. Marianno de Carvalho: - Já se deu o caso com o sr. Arroyo.

O sr. Arroyo: - Efectivamente o caso já succedeu commigo. Uma vez, ao passar por uma rua, torci um pé, tendo que estar alguns dias de cama; mas logo que pude, vim assistir aos trabalhos parlamentares.

O sr. ministro do reino ha de lembrar-se que n'esse tempo éramos nós camaradas em luctas ardentes, em trabalhos que já lá vão.

Ha de lembrar-se s. exa. que durante largas sessões eu combati o governo, que então occupava as cadeiras do poder, apoiado a uma bengala. (Riso.)

Fiz para isso um grande esforço; custou-me immenso; houve dias em que soffri muito por estar de pé para poder fallar.

Assim, afigura-se-me muito sensata a lembrança do sr. Marianno de Carvalho; em primeiro logar, porque a excepção só aproveitaria no caso especial de doença que impossibilite o deputado de fallar em pé; em segundo logar, porque, alem de ninguem ter vontade de fallar aqui sentado, não haveria a receiar tendencias, para se abusar de uma excepção tão justa, determinada por motivo imperioso de saude.

S. exa., que é um medico, deve dar o devido valor a esta consideração.

Não reviu.

O sr. Teixeira de Sousa (relator): - Se o caso se desse com o illustre deputado o sr. Arroyo, que tem tanto talento e tão notáveis qualidades parlamentares; se s. exa. tivesse a infelicidade de não poder estar de pé quando fallasse, estou convencido que não era preciso que no regimento houvesse uma disposição especial para que a camara consentisse que s. exa. fallasse sentado.

Não me parece, pois, que haja conveniencia alguma em estabelecer similhante excepção.

Em seguida foi approvado o artigo 101.º, com a eliminação proposta pelo sr. relator.

Leu-se o

Artigo 102.° Os deputados têem o direito de apresentar propostas, moções de ordem e projectos de lei, representações, petições e requerimentos; de fazer declarações de voto, annunciar e realisar interpellações aos ministros d'estado; tomar parte em todas as discussões que se suscitarem na camara, e durante ellas propor additamentos, emendas e substituições.

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§ 1.° É permittido a qualquer deputado mandar propostas para a mesa, quando, antes de se dar por discutida a matéria, tenha pedido a palavra para esse fim.

§ 2.° Depois de encerrada a discussão, só em virtude de resolução expressa da camara poderá a mesa admittir propostas de deputados que não estejam inscriptos.

§ 3.° Os projectos de lei e as propostas já discutidas e votadas não podem ser renovadas na mesma sessão annual, quando versarem sobro o mesmo assumpto.

O sr. Presidente: - Está em discussão.

O sr. Teixeira de Sousa (relator): - Mando para a mesa a seguinte:

Proposta

Artigo 102.º Eliminar a palavra "petições" e additar no corpo do artigo "eliminações". = Teixeira de Sousa.

O sr. Marianno de Carvalho: - Como póde isso ser, se só são prohibidas as petições individuaes?

O sr. Teixeira de Sousa (relator): - As petições que contêem mais de uma assignatura são verdadeiras representações.

A proposta foi admittida.

O sr. Arroyo: - Pedi a palavra para lembrar a conveniência de se acrescentar às expressões "apresentar propostas í aã seguintes

O sr. Teixeira de Sousa (relator): - No artigo 136.° § unico está bem accentuado que essas moções de ordem só se podem apresentar em casos restrictos. Não vejo, por isso, grande necessidade do introduzir neste artigo o additamento indicado pelo illustre deputado; mas ainda assim não tenho duvida em acceital-o.

O sr. Marianno de Carvalho: - Poucas palavras apenas. O meu fim unico é que fique consignada na acta uma explicação do sr. relator da commissão; porque a opinião dos relatores das commissões serve como elemento interpretativo das leis, e por conseguinte do regimento interno, que é a lei da camara.

Parece-me que s. exa. disse, que toda a petição assignada por mais de uma pessoa se considerava representação.

Quando s. exa. propoz que se eliminasse a palavra petição, disse eu: não póde ser, porque as unicas prohibidas são as individuaes, e s. exa. ponderou que as outras são representações.

Não protesto. O que desejo é que fique consignado, que petições assignadas por mais de um individuo são representações.

De maneira que os paizanos podem fazer as petições que quizerem.

Fique isto bem accentuado.

O que desejo agora é chamar a attenção do sr. relator para um assumpto mais importante, o do § 3.°, que diz assim:

"Os projectos de lei o as propostas já discutidas e votadas não podem ser renovadas na mesma sessão annual, quando versarem sobro o mesmo assumpto."

Devo dizer que sempre considerei perigosa esta disposição, que vem já dos antigos regimentos. O § 3.° joga com o § 3.° do artigo 13õ.° e com o artigo 151.°

E claro que o § 3.° do artigo em discussão se refere às propostas approvadas, porque das rejeitadas se falla adiante.

O § 3.° do artigo 13õ.° diz:

"§ 3.° As propostas e os projectos de lei adiados indefinidamente não podem ser trazidos á discussão na mesma sessão annual"

O artigo 151,° diz:

"Artigo 151.° As propostas ou projectos de lei rejeitados não poderão ser renovados na mesma sessão annual." Esta disposição já vem do regimento antigo, e eu comprehendo o fim que com ella se teve em vista. Foi em parta para assegurar a estabilidade das resoluções parlamentares e em parto porque é difficil obrigar uma assembléa como que a reconsiderar. Estes dois motivos, que eu não posso deixar de confessar que tcem valor, podem, todavia, estar submettidos a questões superiores de ordem publica, que são em geral muito attendiveis.

Supponhâmos, por exemplo, que nós votámos amanhã uma lei de contribuição de registo, e que dois mezes depois, estando a camara ainda aberta, se levantam questões de ordem publica do altíssima importancia que nos obrigam a considerar de novo aquella materia. Pois não se póde fazer, porque ella já foi approvada, adiada ou rejeitada!

Que perigue a ordem publica ou não, que sejam sacrificados interesses importantes ou não, não se lhe póde mexer, porque já foi approvada, rejeitada ou adiada! Qual é neste caso o remedio a empregar? Um unico: é em nome da ordem publica o governo assumir a dictadura.

Ora esta hypothese é que não se deve prever.

Parece-me, pois, que seria conveniente que esta disposição não fosse tão absoluta, o que houvesse uma excepção, cercada de todas as formalidades e cautelas por forma a não poder ser sophismada, para os casos em que altos interesses de ordem publica exigem que na mesma sessão se possa tratar de um assumpto sobre que já recaiu uma decisão da camara.

O sr. Teixeira de Sousa: - O § 3.° do artigo 102.° tem com effeito relação com o § 3.° do artigo 135.° e com o artigo 151.°, mas analysando esses artigos, eu não vejo conveniencia em os modificar.

Com relação ao artigo 151.° que estabelece que as propostas ou projectos de lei rejeitados não pousam ser renovados na mesma sessão annual, não só não vejo que haja conveniencia em modifical-o, mas pelo contrario que essa modificação podia trazer grandes inconvenientes.

Com relação ao adiamento indefinido a que se refere o § 3.° do artigo 135.°, tambem não vejo que haja conveniencia em voltar á discussão, na mesma sessão, o projecto adiado.

Discutir e votar hoje um projecto de lei, trazel-o daqui a quinze dias novamente á discussão, tornar a approval-o, e, passados oito ou dez dias, ter-se de fazer a renovação sob pretexto de que novas necessidades publicas assim, determinam, passando-se assim o tempo som se ter approvado definitivamente qualquer projecto, é dar logar a grandes abusos. Mantenho por isto, por completo, a doutrina estabelecida no § 3.° do artigo 102.°

Não havendo quem mais pedisse a palavra, foi o artigo posto á votação e approvado com a eliminação proposta pelo sr. relator.

Seguidamente foi lido e approvado sem discussão o artigo 103.°

Leu-se o

Artigo 104.° Haverá duas inscripções geraes:

1.ª Para antes da ordem do dia, podendo o deputado, quando lhe for concedida a palavra, apresentar representações, petições, propostas ou projectos de lei, annunciar interpellações, fazer requerimentos, nos termos do § unico do artigo 61.°, pedir verbalmente esclarecimentos ao governo, ou chamar-lhe a attenção para assumptos de interesse publico depois de feita a prevenção nos termos do § unico do artigo 59.°

2.º Para tomar parte na discussão da matéria dada para ordem do dia.

§ unico. No primeiro caso pedir-se-ha a palavra depois da approvação da acta e leitura do expediente, a convite da presidencia; no segundo caso, só depois do presidente declarar que se vae passar á ordem do dia.

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O sr. Teixeira de Sousa (relator): - mesa a seguinte:

Proposta de eliminação

Mando para a

Artigo 104.°:

1.ª Eliminar a palavra "petições" e "pedir verbalmente ou por escripto". = Teixeira de Sousa.

Foi admittida.

O sr. Arroyo: - Parece-me que neste artigo ha muito mais a emendar.

Não concordo com a proposta do sr. relator para eliminação da palavra "petições", pela mesma rasão por que não concordei com a proposta identica, ha pouco approvada; mas, emfim, a camara é soberana nas suas resoluções, e eu acato-as.

Chamo agora a attenção do sr. relator para a observação que vou fazer em referencia ao artigo 104.°

Este artigo, no seu n.° 1.º, parece-me que está em absoluta contradicção com a jurisprudencia que fixámos no § unico do artigo 09.° Neste paragrapho estabelecemos o principio do que para se interrogar um membro do governo é necessario um aviso previo, feito com a antecedencia de vinte e quatro horas. Agora no artigo 104.° dizemos que para antes da ordem do dia haverá duas inscripções, podendo o deputado, quando lhe for concedida a palavra, apresentar representações, annunciar interpellações, fazer requerimentos nos termos do § unico do artigo 61.°, pedir verbalmente esclarecimentos ao governo, etc.

Pergunto, pois: em que jurisprudencia ficâmos? Na do artigo 104.°, que permitte pedir verbalmente esclarecimentos ao governo, sem dependencia do aviso previo, com a antecipação de vinte e quatro horas, ou no regimen do artigo 59.°, que exige esse aviso previo?

Parece-me que o que deve ser permittido pelo artigo 104.° é o tratar-se de qualquer assumpto de interesse geral na discussão antes da ordem do dia, e que aquellas palavras "pedindo verbalmente esclarecimentos ao governo" têem de ser substituídas por outras em virtude das quaes fique salvo ao deputado, em primeiro logar. o direito de tratar quaesquer assumptos de interesse geral antes da ordem do dia; em segundo logar, o de pedir por escripto esclarecimentos ao governo, e por ultimo o de chamar a sua atenção para os assumptos de interesse publico, nos termos do § unico do artigo 59.°

Relativamente ao § unico do artigo 104.°, entendo que elle torna possível o estorvar, com um grandíssimo numero de complicações, os trabalhos parlamentares.

Quem tiver uma larga pratica dos negocios e dos trabalhos parlamentares sabe que uma das maiores difficuldades que se dá na camara é com a inscripção, tanto para antes da ordem do dia, como para se tomar parte na discussão da materia dada para ordem do dia. Nascem às vezes pequenos conflictos que, apesar de não darem origem a scenas desagradaveis, produzem, todavia, semsaborias para quem dirige os trabalhos parlamentares, como tenho tido variadissimas occasiões de presencear.

Ora, para o primeiro caso está bem redigido o § unico do artigo 104.°, mas já não succede assim para o segundo caso, porque nos termos d'esse paragrapho a palavra só póde ser pedida depois do presidente declarar que se vae passar á ordem do dia. Deus nos livre que se faça assim!

V. exa. comprehende que um deputado, quando quizer usar da palavra antes de qualquer outro, estará attento á espera de que o sr. presidente declare que a discussão se vae iniciar e pedirá immediatamente a palavra. Eu explico, exemplificando.

Supponha-v. exa. que está em discussão uma das propostas que foram ultimamente á commissão de guerra e que por lá andam perdidas, por mares muito encapelados e tenebrosos. Supponha v. exa. que um dos pareceres relativo a qualquer d'essas propostas vem á discussão parlamentar.

(Interrupção do sr. relator que não se percebeu.)

Creia o sr. Teixeira de Sousa que estou a fallar em difficuldades reaes, dificuldades que se têem dado. Eu n5o desejo crear difficuldades a s. exa.: estou a accentuar factos.

Como ia dizendo, discute-se esse parecer da commissão de guerra. O sr. presidente diz "que vae entrar-se na ordem do dia", e um ou mais deputados, a quem s. exa. havia communicado previamente que poria em discussão o tal projecto, pedem logo a palavra.

Mais tarde declara s. exa. que começa ou continúa a discussão do projecto tal, e outros srs. deputados pedem a palavra. Surge então um conflicto: os segundos pretendem usar primeiro da palavra por entenderem que só a podiam pedir desde que fosse indicado pela mesa o assumpto que ia entrar em discussão; os primeiros, porque fundando-se na disposição final do § unico do artigo 104.º do regimento, tinham sido os primeiros a inscrever-se.

Para obviar a este inconveniente é que, no meu entender, se deve fazer um additamento á ultima parte d'aquelle paragrapho, ficando assim redigido.: "no segundo caso, só depois do presidente declarar que se vae passar á ordem do dia e ter indicado o assumpto ou projecto que vae ser discutido.

O sr. Teixeira de Sousa (relator): - Certamente pela insufficiencia da minha intelligencia, não me foi possível perceber as duvidas que o sr. Arroyo apresentou á redacção do n.° 1.° do artigo 104.°.

Vejamos o que diz esse n.° 1.° Começa assim:

o Para antes da ordem do dia, podendo o deputado, quando lhe for concedida a palavra, apresentar representações, propostas ou projectos de lei."

Creio que a este respeito não ha duvida nenhuma. Diz mais: "fazer requerimentos, nos termos do § único do artigo 61.°". Também está claro; nenhuma duvida póde dar-se. Continua o paragrapho: "Pedir por escripto esclarecimentos ao governo". Onde póde haver aqui duvidas, depois de ter a camara decidido que se podem pedir esclarecimentos ao governo ou chamar-lhe a attenção para assumptos de interesse publico, comtanto que se tenha feito a prevenção com antecipação de vinte e quatro horas?

O sr. Arroyo: - Insisto pela minha observação, porque é um ponto capital.

Tratando-se de uma transformação completa no regimen até agora adoptado, é preciso redigir o texto do novo regimento com extremo cuidado. O que peço é que o n.° 1.° do artigo 104.° seja posto em harmonia com o § unico do artigo 59.°

Approvando o texto deste paragrapho, adoptámos que podíamos pedir esclarecimentos por escripto ao governo. Perfeitamente de accordo; agora acrescente-se no artigo 104.° § 1.°, que o deputado, depois de pedir esclarecimentos ao governo, póde tratar de qualquer assumpto de interesse, publico ou geral, como se diz no § unico do artigo 59.° É necessario que em relação ao pedido verbal de esclarecimentos se estabeleça no artigo 104.º absolutamente o mesmo que está no artigo 59.° É isto o que eu pretendo e o que deve ser.

O sr. Teixeira de Sousa (relator): - Depois das palavras "pedir verbalmente esclarecimentos ao governo", está virgula.

O Orador: - Pois tire v. exa. a virgula depois da palavra governo. Como temos de acrescentar alguma cousa que falta, o direito de usar da palavra para tratar qualquer assumpto de interesse publico antes da ordem do dia, é escusada uma redundância de phrase. Temos uma phrase mais curta no § unico do artigo 59.°, que diz o mesmo; é esta: "interrogar algum dos ministros, se para este fim, etc."

Em summa, o que peço, é que o artigo fique redigida de maneira que se entenda: 1.° que o deputado póde pá-

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dir por escripto esclarecimentos ao governo; 2.° que póde tratar do qualquer assumpto de interesse publico; 3.° que póde interrogar o governo nos termos do § único do artigo 59.º

De outra forma parece-me um poucochinho da salada russa.

O sr. Teixeira de Sousa: - O que é conveniente é que se diga que o deputado não póde usar da palavra para chamar a attenção do governo sem a prevenção das vinte e quatro horas; mas eu não tenho duvida em modificar a redacção do maneira que fique claramente estabelecido que antes da ordem do dia não se podem pedir esclarecimentos ao governo nem chamar a sua attenção para assumptos de interesse publico, senão nos termos do § único do artigo 59.° isto é, com a prevenção de vinte e quatro horas.

O sr. Marianno de Carvalho: - O que eu quiz dizer é que ha umas poucas de idéas differentes néste paragrapho.

O que é que se quiz restringir?

Foi o direito de dirigir perguntas de surpreza aos ministros, obrigando-os a responder.

Acautelou-se essa hypothese, e ainda mais do que estava acautelado no projecto, com a proposta do sr. Arroyo; mas vem aqui uma nova redacção que eu não desejo que vingue.

O que estava resolvido era que, quando se quizesse dirigir perguntas ao governo, elle devia ser prevenido por escripto com vinte e quatro horas de antecipação.

Juntou-se a isto que o ministro podia responder elle proprio ou por intermedio da seus collegas, verbalmente ou por escripto. Mas não se tinha imposto até agora restricção nenhuma de chamar a attenção do governo para um assumpto qualquer.

Por exemplo: um illustre deputado pelo Algarve, e que fallou muito bem, chamou ha pouco a attenção do sr. ministro das obras publicas para o mau estado era que se encontram as estradas no Algarve; mas isso não obrigava o sr. ministro a responder; se o fez foi por cortezia. O que fez o illustre deputado não foi dirigir perguntas ao governo; foi chamar a sua attenção para um determinado aasumpto.

Pergunto: para isto tambem querem a prevenção de vinte e quatro horas?

Entendo que esta prevenção deve applicar-se aos que interrogarem e não aos que chamarem a attenção do governo, o que é uma cousa differente.

Eu, por exemplo, chamo a attenção do sr. ministro do reino para um ponto qualquer, e s. exa. responde-me, se quer.

O sr. Ministro do Reino (Franco Castello Branco): - Se está presente.

O Orador: - Se esta presente e se quer, responde-me; mas se não está presente, o collega que estiver diz: "eu communicarei ao sr. ministro do reino o que o sr. deputado disse"; e elle quando comparecer, responde se quer, e se não quer, não responde.

Mas, quando ha um interrogatorio que obrigue o ministro a responder, então sim, então seja prevenido com vinte e quatro horas de antecipação.

E isto que até agora se não votou, e que me parece conveniente que se vote. E se o sr. relator me dá licença, eu indico uma redacção simples; e a mesma do artigo 59.°, que permitte antes da ordem do dia chamar a attenção do governo para assumptos de interesse publico geral.

O sr. Teixeira de Sousa (relator): - Parece-me que tudo se poderá harmonisar, ficando o artigo redigido nos termos da seguinte:

Proposta

Artigo 104.° Haverá duas inscripções geraes:

1.ª Para antes da ordem do dia, podendo o deputado, quando lhe for concedida a palavra, apresentar representações, propostas ou projectos de lei, annunciar interpellações, chamar a attenção do governo para assumptos de interesse publico, pedir por escripto esclarecimentos ao governo, que poderá responder por qualquer dos seus membros, ou verbalmente depois de feita a prevenção noa termos do § único do artigo 58.°

2.ª Para tomar parte na discussão da materia dada para ordem do dia.

§ unico. No primeiro caso pedir-se-ha a palavra depois da approvação da acta e leitura do expediente, a convite da presidência; no segundo caso, só depois do presidente declarar que se vae passar á ordem do dia. = Teixeira de Sousa.

Posto á votação o artigo 104.º com a emenda do sr. relator foi approvado.

Seguidamente foi approvado sem discussão o artigo 105°

Leu-se o

Artigo 106.° A palavra pedida para antes da ordem do dia será concedida, segundo a antiguidade da inscripção, salvo o disposto no § unico do artigo 59.°

§ unico. O deputado que não podér usar da palavra quando lhe competir na ordem da inscripção, precisa inscrever-se novamente, excepto no caso previsto no § unico do artigo 59.°

O sr. Teixeira de Sousa (relator): - Mando para a mesa uma emenda a este artigo.

Leu-se na mesa.

É a seguinte:

Proposta

Artigo 106.° "o disposto na ultima parta do § único do artigo 59.°" = Teixeira de Sousa.

Foi admittida.

O sr. Arroyo: - Este artigo precisa ser muito esclarecido. Posso assegurar a v. exa. que se elle ficasse nos termos em que está redigido, num período de lucta partidaria, eu sosinho compromettia-me, pela minha parte, a não deixar fallar mais ninguem antes da ordem do dia.

Pergunto: em que relação fica, segundo o artigo 106.°, a inscripção antes da ordem do dia, com o resultante da applicação do artigo 59.°?

Vou explicar melhor o meu pensamento.

Vários senhores deputados, supponhamos, com a antecipação das vinte e quatro horas, avisara um ou mais membros do governo, por intermédio da mesa, ficando assim satisfeita a formalidade prescripta do artigo 59.°.

§ unico. Logo na primeira sessão parlamentar, como é costume, differentes membros da camara podem a palavra para antes da ordem do dia. O artigo 106.° dispõe que a palavra, n'esta occasião, seja concedida, segundo a antiguidade da inscripção, salvo o disposto no § unico do artigo 59.°

Como se interrompe a ordem, antes da ordem do dia, para dar logar às perguntas que foram annunciadas com a antecipação das vinte e quatro horas?

Este é o primeiro caso a regular. Eu considero este ponto muitíssimo delicado, porque assim o presidente difficilmente poderá dirigir os trabalhos.

Vamos ao § unico, onde lambem ha alguma cousa que ò preciso emendar.

O deputado que não poder usar da palavra, quando lhe competir na ordem da inscripção, em que situação fica?

Em que situação ficam os dois deputados, um que se limitou a pedir a palavra para usar d'ella antes da ordem do dia e o outro que a pediu tambem para antes da ordem do dia, mas tendo feito o aviso previo, com as vinte e quatro horas de antecedencia?

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O que se limitou a pedir a palavra para usar d'ella antes da ordem do dia e não usou quando Ihe competia na ordem da inscripção, já sabe que fica inscripto no fim, mas o que preveniu com vinte e quatro horas de antecedência e não usou da palavra? Em que situação fica?

Quando póde usar da palavra? Fica para o fim da inscripção dos que fizeram o aviso com a antecedência das vinte e quatro horas, ou só fica para o fim da inscripção, respeitante aos deputados que fizeram o mesmo aviso nesse mesmo dia?

É necessario resolver este ponto, para, que o presidente não se veja em serias difficuldades na direcção dos trabalhos d'esta casa do parlamento. Não me refiro á actual sessão, porque n'esta as discussões correm perfeitamente serenas e cordatas, e a opposição é fisica e de forças muito debilitadas; mas n'um momento de lucta, acredite v. exa., que não, ha presidente que se entenda com tal regimento.

Terminando e resumindo, direi em primeiro logar: que é necessario que se estabeleça uma disposição ou disposições, que regulem as relações que existem entre a inscripção de antes da ordem do dia e a inscripção dos que avisam com vinte e quatro horas de antecedencia, nos termos do artigo 59.°

Em segundo logar, que no § unico do artigo 106.° se regule a situação dos deputados, que não usarem da palavra, tendo feito aviso previo, nos termos do artigo 59.°, por forma que fiquem sabendo em que altura lhes cabe a palavra, harmonisando-se esta ordem da inscripção com a que compete áquelles, que pedem a palavra durante a sessão.

Não sei se o sr. relator terá pensado em todas estas hypotheses. No caso affirmativo, já s. exa. poderá dizer o que entende de rasoavel; e como este assumpto é muito delicado, eu lembro que, visto não terminar hoje a discussão do projecto, melhor será ficar adiada a discussão deste artigo, havendo assim tempo para serem devidamente estudados todos estes detalhes.

S. exa. não reviu.

O sr. Teixeira de Sousa (relator): - Não foi intenção minha, nem da commissão, ao redigir o artigo 106.º e a ultima parte do § unico do artigo 59.° d'este projecto, dar preferencia na inscripção aos deputados que pedissem a palavra antes da ordem do dia, para interrogarem o governo; e não podia ser essa a nossa intenção, porque, comprehende-se, não haveria nada mais subversivo, nem mais proprio para perturbar a marcha regular dos trabalhos parlamentares, do que uma disposição que tal permittisse.

O que se quiz fazer, traduza-o eu do modo seguinte:

Inscreveram-se, por exemplo, antes da ordem do dia os srs. deputados A, B, C e D.

O deputado B, inscreveu-se para quando estivesse presente o sr. ministro dos estrangeiros, tendo feito a devida prevenção com vinte e quatro horas de antecedencia.

Depois de fallar o deputado A, o sr. presidente dá a palavra ao deputado B, inscripto nas condições que acabo de indicar; mas como n'esta occasião não está presente o sr. ministro dos estrangeiros, o presidente dá a palavra ao deputado C. Depois d'este ter fallado, se já está presente o sr. ministro dos estrangeiros, não se dá a palavra ao deputado D, mas ao deputado B, que a tinha pedido, para quando estivesse presente esse ministro.

Foi este o pensamento da commissão, e assim interpretado o artigo, parece-me que não póde haver motivo para questões, nem ha logar a perturbar-se a marcha dos trabalhos parlamentares, como succederia, se se desse preferencia na discussão antes da ordem do dia aos deputados que pediram a palavra para interrogar os ministros.

(S. exa. não reviu).

O sr. João Arroyo: - Creio que não me fiz entender bem. Eu não fallei em preferencia; o que disse é que, sob pena de só estabelecerem complicações em que ninguem se entenderia, não podemos deixar redigido nos termos em que está este artigo do regimento. E se elle for assim approvado, s. exa. terá a prova plena do que digo dentro de poucos dias.

Não ha presidente, por mais habil que seja, nem mesmo v. exa., que é habilissimo, que possa sair da complicação que prevejo.!

Repito, eu não trato da preferencia entre as duas ordens de inscripto; não sustento nem deixo de sustentar que os individuos que pedem a palavra, em virtude da disposição do artigo 59.°, devem ter a preferencia sobre os que se inscrevem para a discussão antes da ordem do dia; o que disse, e o que repito, é que é necessario relacionar estas duas inscripções de maneira que se saiba a ordem por que o sr. presidente deve conceder a palavra.

Torno a exemplificar. Ha dois ou tres deputados que pedem a palavra para quando estiver presente um determinado membro do governo; chega-se á sessão em que esse deputado deve usar da palavra e está presente esse membro do governo, mas varios deputados pedem a palavra antes da ordem do dia; pergunto, quem falla primeiro?

O sr. Teixeira de Sousa: - O que o sr. presidente entender que pediu a palavra primeiro.

O Orador: - Mas é preciso que não se deixe ao presidente essa liberdade de entender que é um ou outro.

O sr. Teixeira de Sousa: - São essas as difficuldades da inscripção.

O Orador: - Pois não devem haver.

O sr. Teixeira de Sousa: - Eu não considero a prevenção ao ministro como inscripção.

O Orador: - Então a declaração feita ao ministro por escripto, de que o desejam interrogar sobre um determinado assumpto, não é um pedido de palavra?

O sr. Teixeira de Sousa: - A commissão não póde acceitar essa interpretação. Com o artigo 59.° o que se quiz foi simplesmente significar que o ministro não é obrigado a responder sem ser prevenido com vinte e quatro horas de antecipação.

O Orador: - De forma que um deputado avisa o ministro com vinte e quatro horas de antecipação de que tem a fazer-lhe uma pergunta; mas, apesar disso, se o presidente o não inscrever logo no começo, fica privado do direito de usar da palavra!

Se eu soubesse que era essa a idéa da commissão, declarava a v. exa. que não teria concordado com o aviso previo.

Eu pensava que o aviso previo era unicamente uma formula facil, familiar, digâmol-o assim, diária de se tornar exequivel e pratico o exercicio do direito de interpellação, e neste sentido o votei, mas não o acataria se soubesse que se tratava apenas de uma vantagem para o governo, sem de ahi resultar a mais pequena garantia para o deputado.

Talvez a votação da camara fosse como se afigura ao espirito do sr. relator. Não me parece; mas emfim, está votado. E assim interpretado o artigo, as duvidas que apresentei, deixam de ter rasão de ser. Mas é contra essa interpretação que eu voto.

Reconheço nos membros do governo o direito de exigir o aviso prévio das vinte o quatro horas. (Jue eu saiba, não existe este direito em nenhum regimento parlamentar. É necessario estabelecel-o para modificar os defeitos e vicios do nosso systema parlamentar De accordo, e por isso me colloquei ao lado da commissão e do sr. João Franco, digo João Franco, porque nesta discussão B. exa. não é o ministro do reino. Mas, o que se vê é que tornámos facil ao governo o exercicio do direito da interpellação, dando-lhe a garantia das vinte e quatro horas, para a final ficar dependente o uso da palavra da circumstancia de ser o deputado interrogante inscripto mais alto ou mais baixo,

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218 DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS

pelo presidente! É uma jurisprudencia que, sob nenhum aspecto, se justifica.

Repito, o aviso previo das vinte e quatro horas não existe em regimento algum parlamentar, que eu saiba; votei-o, por entender que era absolutamente necessario cercar o poder executivo d'essa garantia; mas entendi tambem, e entendo ainda, que a garantia da inscripção deve ser mantida pela ordem da antiguidade, reservada ao deputado que faz a prevenção nos termos do artigo 59.°

Como já declarei a v. exa., eu considero delicadissima, da mais grave e alta importancia, a materia do artigo 106.°, e por isso convidei o sr. relator a propor elle mesmo o adiamento, a fim de madura e reflectidamente s. exa. poder formular todas as hypotheses que podem apresentar-se contra e elaborar uma proposta detalhada a este respeito. Mas desde que s. exa., depois de ter estabelecido no § unico do artigo 59.°, que já votámos, o aviso prévio das vinte e quatro horas, declara que isso não altera em cousa alguma a generalidade da inscripção, só tenho a lamentar-me de haver ido atrás das suas idéas o ter collaborado na votaçiio do paragrapho do artigo 59.° e mais ainda de ter apertado o principio que n'elle se fixara.

S. exa. não reviu.

O sr. Teixeira de Sousa (relator): - Requeiro que seja adiada a discussão do artigo 106.° do projecto em discussão, para a primeira sessão.

Consultada a camara, assim se resolveu.

O sr. Ministro dos Negócios Estrangeiros (Luiz de Soveral): - Mando para a mesa os documentos, relativos ao meu ministério, que foram pedidos pelo sr. conselheiro Arroyo.

Para a secretaria.

O sr. Abilio Beça: - Mando para a mesa a seguinte:

Participação Participo a v. exa., por parte da commissão de legislação criminal, que se acha constituida esta commissão, tendo sido eleito presidente o sr. Adolpho Pimentel e secretario o sr. Cabral Moncada. = Abilio Beça.

Para a acta.

O sr. Presidente: - Ámanhã ha trabalhos em commissões. Á ordem do dia para sexta feira é a continuação da que estava dada para hoje.

Está levantada a sessão

Eram seis horas da tarde.

Documentos apresentados nesta sessão

Requerimento de interesse particular

Do contra-almirante reformado João Peregrino Leitão, pedindo que lhe seja concedida melhoria de reforma no posto de vice-almirante.

Apresentado pela sr. deputado ferreira Marquei, e enviado á commissão de marinha, ouvida a de fazenda.

Justificação de faltas

Declaro que não pude comparecer às sessões de 3 e 4 do corrente por motivo justificado. = O deputado pelo circulo de Santarém, Joaquim José de Figueiredo Leal.

Para a secretaria.

Declaro a v. exa. e á camara que faltei a algumas sessões por motivo justificado. = Carlos Braga.

Para a secretaria.

Communico a v. exa. e á camara que o exmo. sr. conde de Valle Flor não tem comparecido a algumas sessões por motivo justificado. = Luciano Monteiro.

Para a secretaria.

O redactor = Lopes Vieira.

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