SESSÃO N.º 21 DE 17 DE FEVEREIRO DE 1898 349
ellas a dois pontos: o primeiro diz respeito ao modo como é feito o serviço nos julgados municipaes; o segundo é relativo ao exercicio de funcções que pertencem aos escrivães dos juizos de paz e que são exercidos pelos escrivães dos juizes de direito.
Deseja s. exa. obter esclarecimentos para se habilitar a tratar desenvolvidamente d'estes factos..
Com respeito ao primeiro creio que já alguns foram enviados a esta, camara, e relativamente, ao segundo, como s. exa. foi o proprio a reconhecer, ha de ser difficil obter documentos com os elementos necessarios para satisfazer às perguntas de s. exa.
O que posso é prometter empenhar todos os meus esforços para procurar conseguir que lhe sejam enviados esses esclarecimentos.
(S. exa., não reviu.)
O sr. Teixeira de Sousa: - Não vae tratar de um assumpto de interesse geral, mas sim referir-se a um abuso e grave injustiça praticada contra o sr. Antonio Alves Callado, seu dedicado amigo.
Refere que no dia 11 ou 12 d'este mez foi preso n'uma feira em Alijó um homem a quem foram encontradas notas falsas.
Levantado o auto o preso foi remettido ao poder judicial, e o juizo entendeu que o devia pronunciar com fiança. O accusado pertence a uma freguesia que é inteiramente affecta a elle, orador, e que é representada, perante elle, por aquelle seu amigo, cavalheiro honestissimo, cheio de virtudes, e dos mais ricos de Douro, o sr. Antonio Alves Callado, que, exactamente por lhe ser affecto, tem sido victima de perseguições, movidas por adversarios politicos. Agora offereceu-se-lhes ensejo para uma vingança crudelissima.
Aquelle cavalheiro estava no Porto, e, a pedido do accusado, prestou-se a affiançal-o. Tanto, bastou para que a administrador do concelho de Alijó requisitasse a sua prisão e uma busca no hotel onde estava.
Elle, orador, tem tido sempre o proposito de não pronunciar no parlamento uma só palavra desagradavel para quem quer que seja, o que não quer dizer que não seja capas de a pronunciar, e que pronunciando-a não tenha a coragem de a sustentar. N'este momento não tem duvida em dizer que o procedimento do administrador de Alijó foi infame.
O sr. presidente do conselho, a quem procurou, prometteu-lhe fazer justiça, e por isso só elogios tem a dirigir-lhe. S. exa., porém, parece que nada póde fazer.
Em seguida lê o orador os seguintes trechos de jornaes do Porto;
«Notas falsas - Como noticiámos hontem, foi preso em Alijó o negociante João Fernandes Andréas, a quem foram apprehendidos sessenta e uma notas de 1$000 réis, falsas.
«Por causa do mesmo assumpto, o sr. administrador do concelho de Alijó telegraphou hontem ao sr. commissario geral de policia, pedindo-lhe que mandasse proceder a buscas em uma hospedaria da rua de Sá Noronha; que capturasse o proprietario d'ella, bem como um individuo que ali devia estar hospedado, proprietario e negociante em Alijó, e ainda outro sujeito de quem dava os signaes. Indo a policia judiciaria da 1.ª divisão á alludida hospedaria, procedeu a essa busca, e nada encontrou que se relacionasse com o caso em questão. Foram presos o dono e o negociante; o outro indigitado não appareceu.
O negociante, que é muito conhecido n'esta cidade, e mantém transacções com importantes casas commerciaes, nega por completo ter qualquer cumplicidade no caso sujeito. Declarou que, a pedido, escrevêra a dois amigos seus que intercedessem junto do sr. juiz de Alijó a fim de ser benevolo com o preso Andréas, para que este podesse prestar fiança. Nada mais soubera, pois teve que vir para o Porto liquidar com uma casa ingleza um negocio de vinhos na importancia de 3:400$000 réis, tendo ainda na carteiro, quando foi preso, cerca de 2:000$000 réis, em notas de 20$000 réis. A prisão, portanto, só podia attribuil-a ao facto de se interessar pelo Andrés, ou, o que lhe parece mais provavel, a vingança politica do administrador, com quem anda de mal.
«Tanto o negociante como o dono da hospedaria foram recolhidos ao Aljube, e vão hoje para Alijó, a fim de ser entregues ao administrador d'aquelle concelho.»
«Caso de notas falsas. - No sabbado, 12 do corrente, foi preso na feira mensal de Alijó o negociante ambulante João Francisco Andréas, por andar ali a passar notas falsas de 1$000 réis, de typo antigo, mas perfeitas.
«Na occasião da captura, que foi no fim da feira, foram-lhe apprehendidas dez notas falsas.
«Por mandados do sr. administrador de Alijó foram hontem presos n'esta cidade um negociante de vinhos d'ali e o dono de uma hospedaria da rua Sá de Noronha, para averiguações
Foram recolhidos ao Aljube, devendo seguir hoje no comboio da manhã para Alijó, a fim de serem entregues aos requisitantes.»
Continuando, diz o orador que hontem, quando se dirigiu ao sr. presidente do conselho, suppunha que o seu respeitabitissimo amigo tinha sido remettido para a comarca de Alijó, e por isso pediu a s. exa. que desse instruções ao sr. governador civil de, Villa Real, para que apressasse as averiguações, a fim de que desapparecesse o mais depressa possivel este enxovalho em que só queria envolver um homem de bom.
O facto, porém, é que, no momento em que elle chegava á gare de Campanhã, recebeu o commissario de policia do Porto um telagramma do administrador do Alijó, dizendo-lhe que o retivesse preso á ordem do sr. juiz veiga, de Lisboa.
Não ha palavras para classificar um tal abuso, e se não lhe chama outra cousa, é pelo muito respeito que tem pela presidencia.
Declára, porém, que está disposto a arriscar a vida por aquelle cavalheiro, e que tambem, muitas vezes, elle tem arriscado a sua pela do orador.
Narra depois alguns factos para mostrar que aquelle funccionario não tinha auctoridade para proceder como procedeu, acrescentando que nem quer dizer a que profissão elle se entrega, para ser agradavel ao sr. presidente do conselho.
No districto de Villa Real tem-se dado factos sobre os quaes podia assentar uma interpellação, mas não o tem querido fazer, continuando assim a dar, como tem dado sempre, provas da mais absoluta cordura. Parece-lhe por isso que tem direito a esperar uma reparação por parte do sr. presidente do conselho; pede a s. exa., em nome do principio da auctoridado, que demitia immediatamente aquelle funccionario.
(O discurso será publicado na integra, quando s. exa. devolver as notas tachygraphicas.)
O sr. Ministro da Justiça (Francisco Beirão): - Em resposta ao illustre deputado, direi que não tenho duvida em communicar ao sr. presidente do conselho as considerações que s. exa. acaba de fazer.
S. exa. começou por dizer que tinha tido uma conferencia com o sr. presidente do conselho, na qual lhe tinha exposto todos os aggravos que julgava ter contra a auctoridade a que se referia, e que o nobre presidenta do conselho lhe tinha promettido proceder, a respeito do assumpto, de modo tal, que o illustre deputado, com o seu espirito justiceiro, não duvidava declarar á camara que s. exa. havia, procedido n'esse caso, como em todos os outros, honradisimamente, e que por consequencia não tinha senão a tecer-lhe elogios.
(Interrupção do sr. Teixeira de Sousa.)