SESSÃO N.º 21 DE 17 DE FEVEREIRO DE 1898 353
um emprestimo de 10:000, 12:000 ou 16:000 pontos de réis modifica por completo, de repente, a situação, financeira do paiz.
Seria um trabalho tão improficuo como o de encher o tonel mythologico das danaides.
Quanto oiro atirassem para o paiz todo se escoava como a agua de uma repreza a que tirassem a adufa!
Depois ninguem sabe a quanto monta o emprestimo; outro mysterio do projecto. (Apoiados.)
Supponhamos mesmo que é um emprestimo larguissimo, aquelles celebrados 60:000 contos de réis, que eram o anno passado toda a esperança do governo, os resultados seriam os mesmos.
Diz s. exa. que desde o momento que deixe de haver procura por parte do governo das dividas estrangeiras, o agio desce immediatamente a metade. Mas nós ouvimos aqui hontem, e é verdade, a um illustre orador d'este lado da camara, que o governo ha proximamente um anno que não tem pesado no mercado com a compra de cambiaes, e não obstante isso o agio continua subindo, como de hontem para hoje aconteceu ainda.
Quando isto se dá, quando são multiplicados e não apenas de ordem interna os motivos d'este estado de cousas, quando o encargo cambial cresce e o agio do oiro é cada vez maior, os prognosticos do illustre deputado não merecem grande confiança e são infelizmente um devaneio de imaginação phantasiosa!
Se isto é o resultado do estudo das leis economicas e do conhecimento dos negocios financeiros, Deus nos livre então de taes economistas, (Apoiados.) vâmos antes com o ramerrão do bom senso, com os impulsos da propria consciencia, com o convencimento profundo da gravidade da crise que atravessamos, que exige o concurso de todos nós, não a cooperação e concurso para approvar um projecto que, com rasão, reputâmos a ruina de todo o paiz, (Apoiados.) mas cooperação e concurso que se dirigisse a uma remodelação completa dos nossos processos de governo e dos nossos processos de administração. (Apoiados.)
É preciso uma vida nova, que não seja de palavras, mas de factos e que, não sendo acanhada e estreita, podesse ser de conveniencia para o paiz. (Apoiados)
Uma cousa ha que não póde ser substituida pelo grande talento e pela brilhante intelligencia, é a honestidade de caracter, a honradez e seriedade que devemos todos transportar e trazer de nossas casas para as luctas e para as brigas da politica. Ser honrado é ser bom, e ser bom é ser util! (Apoiados.)
O illustre deputado teve ainda outra declaração curiosa; e permitta-me v. exa. e a camara que eu não perca estes pequenos pontos de referencia que me deixou o notavel discurso do orador que me precedeu.
Respondendo a um argumento do meu prezado amigo e um da mais brilhantes talentos d'esta camara e da minoria parlamentar, o sr. Luciano Monteiro, quando increpava a garantia que, em desproveito dos credores da divida interna, se ia dar exclusivamente aos portadores da divida externa, tinha o illustre deputado este argumento superior: «Alterâmos apenas o regimen da divida externa, porque não nos occupâmos da divida interna!»
Quando ouvi este argumento passou-me pelo espirito um episodio do celebre processo que se esta julgando em França.
Era interrogado um perito calligrapho, de nome Bertillon, que havia declarado sem de Dreyfus a letra da nota ou apontamento que era a frase de toda a discussão. Declarava elle que a letra não era de Esterhazy, e perguntando-lhe porque, dizia: Porque é de Dreyfus. E porque é de Dreyfus? Porque não é de Esterhazy!
Aqui é o mesmo caso. Porque dão só garantias á divida externa? Porque não tratâmos da divida interna! Porque não tratam da divida interna? Porque tratâmos só da divida externa.
É uma resposta, mau o que nunca será á um argumento do valor.
Eu creio que a maioria já acha longa esta discussão. O projecto que ella annunciou como sendo de tanto magnitude e de uma importancia tão decisiva e primaria para a causa nacional, no seu entender deve votar-se de pressa, porque não resistiria, com certeza, aos quatro dias de carnaval!
O sr. Laranjo: - Peço a palavra para um requerimento.
O Orador: - O illustre leader da maioria, meu preclaro professor, ornamento d'esta casa, tendo dado em toda a sua vida constantes demonstrações do seu valor intellectual e do brilhantismo do seu espirito, tem já o apagador engatilhado precisamente no mesmo momento e em flagrante contraste com o empregado que entra e começa de accender as luzes d'esta sala. (Riso.)
É precisamente quando a luz se accende que se apaga a discussão do projecto. É preciso que assim seja! (Apoiados.)
Apaga se a discussão para consolo e alegria da maioria, a quem o encargo já pesa e esmaga, o isto apesar do illustre ministro da fazenda haver desde o principio declarado que considerava esta questão uma questão aberta.
Uma voz: - É que está outra na forja.
O Orador: - Ha porventura algum projecto em que houvessem de definir se mais rigorosamente os termos, em que mais cuidados devam ser as auctorisações? (Apoiados.)
Por mais esclarecida que seja a opinião de todos nós, ha alguem, a não ser o governo, que saiba o que se deva prometter, visto que só elle sabe o que póde integralmente cumprir-se? E quando só elle conhece os termos das negociações, o limite dos exigencias dos credores, as possibilidades do convenio a fazer, quando só elle póde precisar com rigor e determinar com exactidão até onde podem ir os nossos compromissos, é o governo que vem dizer-nos que isto é uma questão aberta! (Apoiados.)
Como explicar esta especie de desinteresse do governo n'um assumpto em que todos vêem que é mister o maximo cuidado e a maxima reserva? (Apoiados.)
Isto é, a meu ver, a demonstração da errada orientação seguida pelo governo e do como longo de ter em vista fazer uma obra de regeneração nacional e financeira, mira apenas a poder conseguir a sua commodidade de occasião, não se importando em transformar o futuro do paiz em negros dias de miseria e de amargura. (Apoiados.) É o emprestimo!
Questão aberta para nós, questão aberta para os credores a quem se darão todas as garantias, todas as consignações, todas as hypotheses, sujeitando-nos a todos os sacrificios, a todas as humilhações! (Apoiados.)
Emprestem-nos dinheiro, dêem-nos dinheiro para que possamos viver vida descuidada e alegre, para que possamos passar jovialmente os dias da nossa vida ministerial e tambem alegrar os amigos com na larguezas dadivosas da nossa generosidade. (Apoiados.) Entregam-se todos as garantias, obedece-se a todas as imposições desde que nos dêem dinheiro, o dinheiro que embalde procurámos no assucar, nos tabacos; nos phosphoros, nos caminhos de ferro, o dinheiro que tem sido a unica preoccupação, o unico desejo, o unico norte, a obcecação do governo.» (Apoiados.)
Sujeitar a tudo para conseguir um emprestimo, porque a verdade é esta, do emprestimo espera s. exa. resultados maravilhosos e extraordinarios. Mas depois, quando se gastar o dinheiro? (Apoiadas.)
O sr. ministro da fazenda já tem a sua resposta formulada, porque diz no seu relatorio.
(Leu.)
É singular que um espirito tão esclarecido e robusto