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N.º 21
SESSÃO DE 17 DE FEVEREIRO DE 1898
Presidencia do exmo. sr. Eduardo José Coelho
Secretarios- os exmos. srs.
Joaquim Paes de Abranches
Frederico Alexandrino Garcia Ramires
SUMMARIO
Approvada a acta, o sr. presidente dá explicações ácerca da resolução tomada relativamente a proposta do sr. conde de Burnay, e communica ter recebido uma representação das associações de classe, e cooperativas operarias do Porto e Villa Nova de Gaia, contra o decreto de 31 de dezembro de 1897, que deu nova fórma ao lançamento o cobrança de algumas taxas da contribuição industrial. Esta representação foi mandada publicar no Diario do governo.-Lê-se o expediente, e em seguida o sr. Ferreira da Cunha faz varias considerações sobre a rectificação das assembléas eleitoraes do concelho de Alcobaça, que o sr. ministro da justiça prometto transmittir ao sr. presidenta do conselho.-O sr. Moraes Sarmento annuncia uma interpellação ao sr. ministro da guerra sobre a applicação do decreto de 10 de janeiro de 1895 e carta de lei de 18 de maio de 1890, e o sr. Francisco Machado declara que lançára na caixa varios requerimentos de interesso particular, e requer varios esclarecimentos relativos ao serviço dos julgados municipaes, que acompanha de varias considerações. Responde-lho o sr. ministro da Justiça. -O sr. Teixeira de Sousa queixa-se do procedimento do administrador do concelho do Alijo contra Antonio Alves Callado, e o sr. ministro da justiça promette transmittir essas considerações ao sr. presidente do conselho.- O sr. Oliveira Matos pede que a freguesia de S. Pedro de Alva passe para a comarca de Ponacova, declarando-lhe o sr. ministro da justiça que, se o pedido for justo, não terá duvida em o attender.
Na ordem do dia prosegue a discussão do projecto do lei n.º 5 (conversão), usando da palavra os srs. Barbosa Vieira e Malheiro Reymão.-A requerimento do sr. Laranjo é considerado sufficientemente discutido o artigo 1.°, e a requerimento do sr. Baracho lê-se a inscripção. - A questão previa é rejeitada nominalmente a requerimento do sr. Teixeira do Sousa.-Trocam-se explicações entre o sr. presidente e o sr. Teixeira de Sousa. Acerca do modo de proceder com relação á proposta de substituição do sr. conde de Burnay, sendo afinal approvada a moção de ordem do sr. Villaça e em seguida o artigo 1.°, rejeitando-se o requerimento do sr. Avellar Machado, para que essa votação fosse nominal, o resolvendo-se que todas as propostas fossem enviadas á commissão.-Antes de se encerrar a sessão, trocam-se explicações entre o sr. Barbosa Vieira e o sr. Teixeira de Sousa sobre um incidente occorrido antes da ordem do dia, e o sr. presidente do conselho, em resposta a uma pergunta do sr. Luciano Monteiro, declara que ainda não tem conhecimento official da resolução do tribunal arbitral sobre o litigio entre o governo e a companhia dos tabacos, mas que o governo só desempenhara da promessa que fizera.- Entre o sr. Teixeira de Sousa e o sr. presidente ha ainda uma troca de explicações, relativos á resolução tomada com respeito á proposta do sr. conde, de Burnay.
Primeira chamada- Ás duas horas da tarde. Presentes, 4 srs. deputados.
Abertura da sessão - Ás tres horas da tarde.
Presentes á segunda chamada, 56 srs. deputados. São os seguintes: - Abel da Silva, Adriano Anthero de Sousa Pinto, Alexandre Ferreira Cabral Paes de Amaral, Alfredo Cesar de Oliveira, Antonio Eduardo Villaça, Antonio Ferreira Cabral Paes do Amaral, Antonio de Menezes e Vasconcellos, Antonio Simões dos Reis, Antonio Teixeira de Sousa, Arnaldo Novaes Guedes Rebello, Arthur Pinto de Miranda Montenegro, Carlos Augusto Ferreira, Carlos José de Oliveira, Conde da Serra de Tourega, Conde de Silves, Eduardo José Coelho, Eusebio David Nunes da Silva, Francisco de Almeida e Brito, Francisco Antonio da Veiga Beirão, Francisco José Machado, Francisco Limpo de Lacerda Ravasco, Francisco Manuel de Almeida, Francisco Xavier Cabral de Oliveira Moncada, Frederico Alexandrino Garcia Ramires, Frederico Ressano Garcia, Gaspar de Queiroz Ribeiro de Almeida e Vasconcellos, Jacinto Simões Ferreira da Cunha, Jeronymo Barbosa de Abreu Lima Vieira, João Abel da Silva Fonseca, João Baptista Ribeiro Coelho, João de Mello Pereira Sampaio, Joaquim Augusto Ferreira da Fonseca, Joaquim Heliodoro Veiga, Joaquim Paes de Abranches, Joaquim Saraiva de Oliveira Baptista, Joaquim Simões Ferreira, José Alberto da Costa Fortuna Rosado, José Alves Pimenta de Avellar Machado, José Augusto Correia de Barres, José Benedicto de Almeida Pessanha, José da Cruz Caldeira, José Eduardo Simões Baião, José Estevão de Moraes Sarmento, José da Fonseca Abreu Castello Branco, José Frederico Laranjo, José Joaquim da Silva Amado, José Maria de Oliveira Matos, José Mathias Nunes, Lourenço Caldeira da Gama Lobo Cayola, Luiz Fischer Berquó Poças Falcão, Luiz José Dias, Manuel Affonso de Espregueira, Manuel Telles de Vasconcellos, Martinho Augusto da Cruz Tenreiro, Sebastião de Sousa Dantas Baracho e Visconde de Melicio.
Entraram durante a sessão os srs.: - Adolpho Alves de Oliveira Guimarães, Alfredo Carlos Le-Cocq, Alvaro de Castellões, Antonio Maximo Lopes de Carvalho, Augusto Cesar Claro da Ricca, Augusto José da Cunha, Bernardo Homem Machado, Conde do Alto Mearim, Conde de Burnay, Elvino José de Sousa e Brito, Francisco do Castro Mattoso da Silva Côrte Real, Francisco Felisberto Dias Costa, Francisco Pessanha Vilhegas do Casal, Henrique Carlos de Carvalho Kendall, Henrique da Cunha Matos de Mendia, João Catanho de Menezes, João Lobo de Santiago Gouveia, João Pereira Teixeira de Vasconcellos, Joaquim José Pimenta Tello, José Adolpho de Mello e Sousa, José Dias Ferreira, José Gonçalves Pereira dos Santos, José Gregorio de Figueiredo Mascarenhas, José Malheiro Reymão, José Maria Pereira de Lima, Luciano Affonso da Silva Monteiro e Luiz Osorio da Cunha Pereira de Castro.
Não compareceram á sessão os srs.: - Albano de Mello Ribeiro Pinto, Antonio Carneiro de Oliveira Pacheco, Antonio Maria Dias Pereira Chaves Mazziotti, Antonio Tavares Festas, Arthur Alberto do Campos Henriques, Conde de Idanha a Nova, Conde de Paçô Vieira, Francisco Barbosa do Couto Cunha Sotto Maior, Francisco Furtado de Mello, Francisco Silveira Vianna, Guilherme Augusto Pereira do Carvalho do Abreu, Jacinto Candido da Silva, Jeronymo Barbosa Pereira Cabral Abreu e Lima, João Antonio de Sepulveda, João Ferreira Franco Pinto Castello Branco, João Joaquim Izidro dos Reis, João Monteiro Vieira de Castro, João Pinto Rodrigues dos Santos, Joaquim Ornellas de Matos, José de Abreu do Couto Amorim Novaes, José Bento Ferreira de Almeida, José Capello Franco Frazão, José Gil de Borja Macedo e Menezes (D.) José Luiz Ferreira Freire,
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344 DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS
José Maria de Alpoim de Cerqueira Borges Cabral, José Maria Barbosa de Magalhães, Leopoldo José de Oliveira Mourão, Libanio Antonio Fialho Gomes, Luiz Cypriano Coelho de Magalhães, Manoel Antonio Moreira Junior, Manuel Pinto de Almeida, Marianno Cyrillo de Carvalho, Sertorio do Monte Pereira e Visconde da Ribeira Brava.
Acta - Approvada.
O sr. Presidente: - Peço a attenção da camara. Sou informado do que alguns srs. deputados, devido, certamente, ás más condições acusticas da sala, não ouviram a declaração feita na mesa, de que a proposta de substituição ao projecto de lei n.° 5, mandada para a mesa, pelo sr. conde de Burnay, ficava em discussão conjunctamente com aquelle projecto. Foi exactamente isto o que a mesa fez.
A mesa classificou, como a camara de certo estará lembrada, de substituição, a proposta mandada para a mesa pelo sr. conde de Burnay, proposta que depois de admittida ficou em discussão conjunctamente com o projecto. O sr. relator da commissão pediu em seguida, em nome da commissão, e de accordo com o governo, que tanto a proposta do sr. conde de Burnay, como quaesquer outras que se apresentassem no decorrer da discussão, fossem enviadas á commissão de fazenda, sem prejuizo da votação dos reactivos artigos do projecto a que essas propostas dissessem respeito, o que a camara approvou.
E evidente que essa proposta ficou em discussão conjunctamente com o projecto, e que terá de ser enviada, com quaesquer outras á commissão de fazenda para as considerar e mais tarde voltar o projecto e propostas com o parecer respectivo para a sancção parlamentar.
EXPEDIENTE
Officios
Da camara dos dignos pares do reino, acompanhando a proposição de lei que fixa em 8$000 réis por kilogramma o direito de importação dos saes de quinino, á qual se fizeram as seguintes
Alterações
Artigo 1.º O direito de importação para consumo dos saes de quinino é fixado em 8$000 réis por kilogramma do peso liquido.
Art. 2.° É revogada a legislação em contrario.
Palacio das côrtes, em 29 de janeiro de 1898. = Maria Rodrigues de Carvalha- Julio Carlos de Abreu e Sousa = Conde de Bertiandos.
Enviada a commissão de fazenda.
Do ministerio do reino, remettendo, em satisfação ao requerimento do sr. deputado Ribeiro Coelho, nota das despezas effectuadas com as commissões de exame dos livros destinados á instrucção secundaria, desde 1895 inclusive.
Para a secretaria.
Do mesmo ministerio, remettendo, em satisfação ao requerimento do sr. deputado Teixeira de Sousa, copia da correspondencia trocada entre o governador civil do districto administrativo de Lisboa e o fiscal do governo junto do theatro de S. Carlos, referida á execução que até hoje tem tido o contrato com o actual adjudicatario.
Para a secretaria.
Do mesmo ministerio, remettendo, em satisfação ao requerimento do sr. deputado F. J. Machado, a representação relativa ao restabelecimento do antigo concelho da Pederneira.
Para a secretaria.
Do ministerio da fazenda, remettendo, em satisfação ao requerimento do sr. deputado Avellar Machado, copia da consulta da procuradoria geral da corôa e fazenda, ácerca do imposto do sêllo em contratos realisados pelo monte pio geral.
Para a secretaria.
Do mesmo ministerio, remettendo os documentos pedidos pelo sr. deputado Mello e Sousa, em sessão de 14 de janeiro ultimo.
Para a secretaria.
O sr. Jacinto Ferreira da Cunha: - Sr. presidente, cumprindo o que tive a honra de dizer hontem a v. exa., vou usar da palavra; mas francamente, sr. presidente, custa a comprehender, que me Veja forçado a tratar do assumpto constante do meu aviso previo, que no dia 8 do corrente foi enviado ao sr. presidente do conselho, sem a presença de s. exa. que ainda, até hoje, não compareceu n'esta casa do parlamento antes da ordem do dia, apesar de na segunda feira pedir aos collegas de s. exa., que estavam presentes, a fineza de o Avisarem, de que eu desejava a sua comparencia.
Não posso acreditar que seja propositada a ausencia de s. exa., nem mesmo que possa significar menos consideração para com este lado da camara.
Quero acreditar que s. exa., occupado pelos multiplos e graves afazeres do seu cargo e pelas questões complicadas que tem a resolver, não tem podido comparecer na camara antes da ordem do dia; no emtanto não posso deixar de estranhar acremente a sua falta de comparencia.
Sr. presidente, vou entrar no assumpto do meu aviso previo, e serei breve quanto possivel.
Desejava interrogar o exmo. ministro do reino sobre a rectificação das assembléas eleitoraes do concelho de Alcobaça, rectificação ordenada pelo decreto de 29 de janeiro, e que devia verificar-se no dia 7 corrente. Tal rectificação não se fez.
É certo, porém, que a commissão do recenseamento se reuniu, mas não tendo cumprido e desempenhado o fim da sua reunião, forçoso lhe foi fundamentar a rasão do seu procedimento. Estes fundamentos constam da acta da sessão, que vou ler a v. exa. e á camara para que os possam apreciar devidamente.
Peço aos srs. tachygraphos o maior cuidado nas suas notas, para que não haja depois qualquer confusão.
Diz a acta o seguinte:
«... foi pelo vogal sr. Victorino de Avellar Froes declarado o seguinte: Não me considerando habilitado a dar cumprimento ao decreto de 29 de janeiro de 1898, por isso que deve attender esta remodelação á maxima commodidade dos povos, e sendo-me, alem d'isso, impossivel attender a esta para mim tão poderosa circumstancia, declino respeitosamente tão grave responsabilidade por tão justissimos como escrupulosos motivos, deixando ao governo esse encargo, isto na conformidade legal. E pelo vogal sr. Cavalleiro foi dito que, não conhecendo a topographia das localidades que devem agrupar-se para formarem as assembléas eleitoraes de que trata o decreto de 29 de janeiro ultimo, e não querendo de fórma alguma deliberar em contrario da commodidade dos povos, nada delibera sobre a sua formação, declinando esse encargo ao governo conforme preceitua o § 1.° do artigo 41.° da lei eleitoral.»
Ora já v. exa. vê e a camara, qual o escrupulo e o cuidado que este assumpto mereceu á commissão do recenseamento. Era tão melindroso, que ella não quiz tomar a responsabilidade, e declinou-a no governo.
Pois este escrupulo e cuidado não Significa senão uma perfeita burla e uma completa comedia, (Apoiados.} porque não se póde comprehender, que os membros da commissão do recenseamento, composta dos principaes pro-
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Prietarios do conselho de Alcobaça, ali nascido e creados, não se póde comprehender, digo, como elles não conheçam quaes são as freguezias que estão mais proximas umas das outras para formarem as assembléas eleitoraes, e o governo ha de conhecer então qual a posição topographica d'essas freguezias, para attender ás commodidades dos povos.
Mas eu, sr. presidente, que não sou natural de Alcobaça, mas que conheço perfeitamente o concelho, que tive a honra de administrar durante sete annos, e que conheço ainda melhor as intenções da commissão do recenseamento, vou expor a v. exa. e á camara quaes as circumstancias em que se encontram as assembléas eleitoraes do concelho de Alcobaça, e quaes as intenções da commissão do recenseamento na rectificação das mesmas assembléas.
Como v. exa. e a camara sabem, o decreto de 10 de janeiro ultimo restaurou os concelhos que tinham sido extinctos pela ultima reforma administrativa, dissolveu as camaras municipaes da concelhos que tinham sido alterados com aquella restauração, e nomeou para uns e outros commissões municipaes que gerissem os negocios dos municipios até ás novas eleições, que deviam fazer-se dentro de quarenta dias.
O primeiro acto da commissão municipal, na sessão da sua posse, foi revogar a nomeação de dois vogaes da commissão do recenseamento, feita pela camara municipal, sem querer saber se os novos vogues estavam ao facto da posição topographica das differentes freguesias do concelho, mas certa de que, contra o acto illegalissimo que praticava, só podia reclamar para o presidente da relação o administrador do concelho, de cuja parcialidade e condescendência a mesma commissão estava bem segura.
Não ficaram, porém, por aqui as prepotencias da commissão. Era preciso ir mais longe, para assegurar o vencimento da proxima eleição municipal. Era necessario fazer uma completa alteração em todas as assembléas eleitoraes, mudar as sédes d'estas, e constituil-as de modo a tornar penosa, incommoda e difficil a concorrencia dos eleitores das freguezias, em que a commissão não tinha elementos partidarios, e inutilisar assim a votação dos seus contrarios.
Não lhe faltava arrojo para levar a cabo tão monstruosa illegalidade, mas surgia-lhe o obstaculo da disposição do § 2.° do artigo 41.° da lei de 21 de maio de 1896, que dá aos eleitores do circulo a faculdade de reclamação para o juizo de direito da comarca; e este, que não tem politica partidaria, mas sómente politica legal, não sanccionaria similhante arbitrariedade.
Em tal conjunctura, a commissão do recenseamento eleitoral, acobertando-se sob a impossibilidade de attender á maxima commodidade dos povos, declinou «respeitosamente tão grande responsabilidade, por tão justissimos como escrupulosos motivos», deixando ao governo esse encargo, na conformidade da lei, como consta da acta que ha pouco tive a honra de ler á camara.
Pergunto, pois, ao sr. ministro do reino: Quererá o governo assumir tal responsabilidade? Quererá s. exa. praticar a illegalidade, que a commissão do recenseamento não teve a coragem de realisar?
Quero crer que não; e para assim pensar tenho como garantia as repetidas asseverações do sr. ministro do reino, feitas n'esta casa, de que não auctorisa nem sancciona ilegalidades, e ainda a declaração, por s. exa. ultimamente feita na camara alta, de que condemna os actos de politica facciosa, e que o peior serviço que os seus amigos podiam fazer ao governo, era lançar-se nesse caminho.
Sr. presidente, o artigo 41.° da lei eleitoral fixa o numero de 500 a 1:000 eleitores approximadamente para a constituição das assembléas eleitoraes, e determina que estas sejam formadas agrupando-se as freguezias na rasão directa da sua proximidade, quando não possam do per si formar uma no assembléa.
O mesmo artigo, no seu § 3.°, dispoz que as assembléas, depois de assim fixadas, só por lei podem per alteradas, excepto quando haja alteração na circumscripção de algum circulo ou de algum conselho, a qual affecte a divisão estabelecida, pois n'esse caso será convocada por decreto a commissão do recenseamento, para proceder ás indispensavis modificações na constituição das assembléas.
Foi o que fez o decreto de 29 de janeiro, convocando as commissões do recenseamento para proceder ás indispensaveis rectificações nas assembléas eleitoraes, que tivessem sido alteradas pela ultima circumscripção administrativa.
N'estes termos, vejamos, sr. presidente, quaes as assembléas que foram alteradas no concelho de Alcobaça. Foram duas: a de. S. Vicente e a de Turquel.
Aquella pela passagem da freguezia do Juncal para o concelho de Porto de Moz, e esta pela restituição da freguezia de Santa Catharina ao concelho das Caldas da Bainha, ficando ambas aquellas assembleia com menos de 600 eleitores, e portanto sem poder legalmente formar assembléa eleitoral.
Restava, pois, á commissão adoptar um de dois expedientes: ou annexar áquellas freguezias uma outra que supprisse a falta das do Juncal e Santa Catharina, ou aggregal-as a outra assembléa.
Isto, porém, não convinha á commissão, que, como já disse, precisava fazer uma completa alteração em todas as assembléas eleitoraes, mudando as sédes d'estas e modificando a sua constituição, em harmonia com as exigencias do seu facciosismo politico.
Sr. presidente, vou mandar para a mesa dois mappas por mim assignados, um indicativo da actual divisão das assembléas eleitoraes no concelho de Alcobaça, e outro das rectificações a fazer nas mesmas assembléas, por força da ultima circumscripção administrativa.
Não leio estes mappas por fastidiosos, mas peço que sejam publicados no extracto das sessões.
Não tenho, sr. presidente, a vaidade de esperar que o sr. ministro do reino se conforme com as rectificações indicadas, mas o que posso afiançar a v. exa. e á camara é que, se o governo quizer ter em consideração a commodidade dos povos e as prescripções legaes, nenhumas outras poderá decretar, pois as indicadas no mappa, que mando para a mesa, estão em harmonia com as disposições do decreto de 13 de janeiro ultimo e da lei eleitoral de 21 de maio de 1896.
Mappa demonstrativo da divisão das assembléas eleitoraes no concelho de Alcobaça
Eleitores
Alcobaça ..................................................................... 307
Evora .............................................................................263
1.ª Maiorga ...........................................................121
Vallado .......................................................................137
Vimeiro ....................................................................... 97
925
Vestiria .................................................................... 92
2.ª Famalicão ...................................................... 147
Cella .......................................................................... 331
570
Alpedriz .................................................................. 135
3.ª Pataias ..................................................... 233
Coz ............................................................................. 138
506
4.ª - Pederneira ...................................... 644
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346 DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS
5.ª
Turquel............................... 150
Benedicta............................. 192
(Santa Catharina (a).................... - 342
6.ª
S. Vicente............................. 176
Prazeres.............................. 205
Juncal (b)............................. - 381
S. Martinho (c)......................... 212
Alfeizerão (c)........................... 241 453
Ferreira da Cunha.
Mappa demonstrativo das rectificações a fazer nas assembléas eleitoraes do concelho de Alcobaça
Eleitores
1.ª
Alcobaça.............................. 307
S. Vicente............................ 176
Prazeres.............................. 205
Maiorga............................... 121
Vallado.............................. 137 946
2.ª
Vestiaria.............................. 92
Famalicão............................. 147
Celia................................. 331 570
3.ª
Alpedriz................................ 135
Pataios................................ 233
Cós..................................... 138 506
4.ª
Pederneira............................. 644
5.ª
Turquel............................... 150
Benedicta............................. 192
Evora................................. 263 605
6.ª
S. Martinho............................ 212
Alfeizerão............................. 241
Vimeiro................................. 97 550
Ferreira da Cunha.
O sr. Ministro da Justiça (Francisco Beirão): - O illustre deputado tinha annunciado um aviso previo ao sr. presidente do conselho, ao qual s. exa. poderia responder minuciosamente; mas o sr. presidente do conselho não pude talvez hoje comparecer na camara por ser dia de assignatura real. E se não tem comparecido n'esta casa
(a) Esta freguezia passou para o concelho das Caldas da Rainha.
(b) Esta freguezia foi para o concelho do Porto do Moz.
(c) Estas freguesias voltaram do concelho das Caldas da Rainha para o de Alcobaça e não têem o numero de eleitores precisos para constituir assembléa.
desde que o illustre deputado annunciou o aviso previo, não é por falta de consideração para com esse lado da camara, nem para com membro algum d'ella, pois o sr. presidente do conselho, como todos os ministros, têem a maxima consideração pelo parlamento e individualmente pelos seus membros.
S. exa. desejava interrogar o sr. presidente do conselho sobre se assumia a responsabilidade na resolução tomada pela commissão de recenseamento de Alcobaça, que na opinião de s. exa. pertence áquella commissão e não ao governo, e se, acceitando a declinatoria, sanccionaria uma illegalidade.
Devo dizer a s. exa. que o governo assume todas as responsabilidades, como aqui tem dito muitas vezes, mas não consente illegalidades, e ha de cumprir a lei.
Não sei quaes são as rasões que a commissão de recenseamento teve para declinar de si a decisão d'esta questão; mas o que devo presumir é que ella deveria ter rasões para tomar esta attitude, e que não seriam aquellas que s. exa. lhe quiz attribuir.
Em conclusão, tomo nota das observações do illustre deputado e communical'as-hei ao sr. presidente do conselho logo que elle aqui chegar.
(S. exa. não reviu.)
O sr. Moraes Sarmento: - Mando para a mesa uma nota de interpellação ao sr. ministro da guerra, e peço a qualquer dos srs. ministros presentes o obsequio de communicar ao seu collega que eu tenho o maior desejo de que s. exa. se dê por habilitado o mais depressa possivel para responder a esta interpellação, cujo assumpto é da maior importancia e opportunidade.
(S. exa. não reviu.)
Leu-se na mesa a seguinte
Nota de Interpellação
Desejo interpellar o sr. ministro da guerra ácerca da applicação do decreto de 10 de janeiro de 1895 e carta de lei de 13 de maio de 1896, que fixam as condições de promoção e de passagem ao quadro auxiliar por limite de idade dos officiaes na actividade; mas em serviço estranho ao ministerio da guerra. = João Estevão de Moraes Sarmento.
Mandou-se expedir.
O sr. Ministro da Justiça (Veiga Beirão): - Communicará ao meu collega da guerra, o desejo que s. exa. tem de interpellar sobre o assumpto à que se referiu.
S. exa. não está presente porque foi hoje á assignatura e não tem frequentado a camara com assiduidade por causa do seu estado de saude.
(S. exa. não reviu)
O sr. Presidente: - Logo que o sr. ministro da guerra se dê por habilitado, designarei dia para a interpellação se realisar.
O sr. Francisco José Machado: - Sr. presidente, ou mandar deitar na caixa cinco requerimentos dos primeiros tenentes de marinha, pedindo uma modificação no tempo de serviço para a promoção aos diversos postos. O que os signatarios pedem, não é diminuição no tempo de serviço, mas que seja contado de outro modo.
Estes requerimentos dizem respeito á doutrina do projecto que eu outro dia tive a honra de apresentar n'esta camara e por isso perfilho a sua doutrina, por me parecer de todo o ponto justa.
Mando tambem para a mesa um requerimento do soldado Domingos Jacinto, que está reformado e em precarias circumstancias.
Este soldado fazia parte da companhia de policia de Lourenço Marques, quando se feriram os batalhas contra o Gungunhana. Tomou parte em todas aquellas campanhas, portando-se com a maior distincção e com o maior
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valor. Foi ferido por uma azagaia no quadrado de Marracuene fazendo parte da guarnição de uma peça de que era o n.° 1. Em virtude d'esse ferimento, deu baixa ao hospital de Lourenço Marques, aonde esteve cincoenta dias, e não se podendo curar foi julgado inutilisado para o serviço em Africa, mandando-o regressar ao serviço do reino, sendo collocado em um dos regimentos da capital, creio que em infanteria n.° 1 ou caçadores n.° 2. Passado algum tempo, reconhecendo-se que o ferimento o impedia completamente de continuar no serviço activo, reformaram-no com o pequeno vencimento de soldado reformado, e não lhe deram a pensão de sangue, por mais que tenha requerido, como deram a muitos outros nas suas circumstancias. Sr. presidente, v. exa. sabe que não ha nada que mais revolte, do que as injustiças. É por isso que esta praça vem pedir à camara, para que lhe seja concedida uma pensão, procedendo-se para com ella do mesmo modo que se tem procedido com muitos dos seus camaradas, que prestaram relevantes serviços em Africa, mas não mais importantes do que os seus.
É d'aquellas supplicas, que eu entendo que a camara deve deferir, porque não deve pagar com ingratidão os serviços prestados á patria; é n'este caso está este soldado, que tanto honrou a bandeira das quinas, derramou o seu sangue pela patria e inutilisou-se por toda a vida. Assim como a camara tem votado diversas pensões a fim de pagar serviços analogos a este, é justo que vote tambem esta; se por acaso os serviços que o supplicante allega são verdadeiros, como supponho.
A pensão é muito pequena, apenas 6$000 réis por mez. Mas não se deve deixar abandonado este servidor da patria, que tantos serviços prestou.
A camara ha de desculpar-me de ou apresentar aqui tantos requerimentos; mas não posso ser superior ás desgraças que se apresentam aos meus olhos, e cujas victimas vem solicitar o auxilio e o fraco apoio da minha palavra para lhes patrocinar as causas que reputo justas. Não posso ser insensivel perante tanta miseria e desgraça que affligem os desgraçados. É por isso que eu sou de entre os meus collegas aquelle que apresento aqui maior numero de requerimentos; vêem ter commigo para eu apresentar á camara as suas supplicas e eu não posso recusar-me a isso.
Em virtude d'estas circumstancias, mando tambem para a mesa um requerimento de José Maria de Miranda, que foi guarda da alfandega a cavallo. Este empregado tez vinte e oito annos de serviço ao paiz e estava dado como incapaz de fazer serviço activo, e apenas mais serviço moderado, para mais tarde ser julgado completamente incapaz o reformado, como manda a lei.
Apparece, por uma circumstancia qualquer, implicado n'um crime commettido em Torres Vedras. Em virtude d'isso, foi despedido do serviço; isto é demittido sem vencimento algum.
Este homem, este desgraçado, está impossibilitado de ganhar a vida; por um equivoco foi pronunciado e demittido, porém mais tarde reconheceu-se que tinha sido injustamente pronunciado, como prova pelos documentos que apresenta.
Parece-me, pois, de justiça reintegral-o, e em seguida reformal-o porque está incapaz de servir. Houve um equivoco; prova o reclamante que nada tinha com o crime praticado, os tribunaes reconheceram a sua innocencia, e os poderes publicos devem desfazer o que fizeram. Os meus collegas desculpem de eu estar aqui sempre a apresentar requerimentos; mas, vendo um velho alquebrado diante de mim, com as lagrimas nos olhos, contar-me a desgraça da sua vida, que queriam v. exa. que eu fizesse?! Póde haver um coração tão duro que não se compadecesse d'este desgraçado?! Creio que não.
Sr. presidente; já que estou com a palavra, desejo chamar a attenção do sr. ministro da justiça para factos que se passam em algumas comarcas do reino, os quaes reputo anormaes.
Já n'outra sessão, em que v. exa. não estava presente, me referi a assumptos praticados em algumas comarcas, nas suas relações com os julgados municipaes, instituição que v. exa. fundou no intuito manifesto de melhorar o serviço da justiça e no interesse e commodidade dos povos.
Muitos dos empregados, que foram ao principio nomeados, não tinham a verdadeira noção dos seus deveres, o que difficultou o exercicio d'essa instituição, a meu ver tão util, mas que não deu os resultados que se podia esperar.
Em alguns julgados, conheci funccionarios que mal sabiam ler, e se sabiam ler não sabiam entender o que liam. D'esta fórma, evidentemente o serviço não podia deixar de ser mal feito, e d'ahi o descredito que veiu para esta instituição.
V. exa. ha de ter no seu ministerio um requerimento que mandei ha dias para a mesa a fim de que me fossem fornecidos um certo numero de documentos, para chamar a attenção de a. exa. e pedir-lhe que fizesse entrar na ordem os funccionarios das comarcas e obrigal-os a cumprir a lei, inteiramente, nas suas relações com os julgados municipaes.
Chamo agora a attenção de v, exa. para este assumpto.
Como v. exa. sabe, o § 4.º do artigo 180.° do codigo do processo civil diz o seguinte:
«Quando a citação ou intimação, ordenada pelo juiz de direito, tiver de verificar-se a mais de 10 kilometros da séde da comarca, em algum dos julgados d'ella, a diligencia será feita pelo escrivão ou official do respectivo julgado, em vista do requerimento e despacho ou por mandado quando o despacho tiver sido proferido no processo ou em requerimento já distribuido em começo da causa.»
Esta doutrina é estabelecida pelo n.° 2.° do artigo 2.° do decreto de 29 de julho de 1886, para os juizes de paz fóra da séde da comarca, para quem passaram as attribuições dos juizes ordinarios.
Quer dizer, os empregados das comarcas não podem fazer citações a mais de 10 kilometros de distancia das sédes das comarcas. Isto é o que diz a lei, e foi o que se confirmou pelo n.° 2.° do artigo 2.° do decreto de 29 de julho de 1886.
No emtanto, estas disposições não se cumprem e os juizos de direito não vêem que a lei é postergada, nem os agentes do ministerio publico promovem contra quem tão manifestamente falta ou ultrapassa o que a lei dispõe, ou então, se vêem, consentem no abuso praticado pelos seus subordinados, em prejuizo de outros empregados que, comtanto que não façam serviço no tribunal da comarca, estão sejeitos a cumprirem os mandados dos juizes de direito, sob pena de desobediencia. Estes são os empregados dos juizes de paz.
Estas disposições não se cumprem e os empregados das comarcas vão fazer serviço á area dos districtos dos juizos de paz, seja qual for a distancia; mas só quando elle é remunerado, porque quando é gratuito é mandado fazer pelos empregados dos juizos de paz, o que é uma violencia sem nome. Mais de uma vez tem acontecido haver um serviço remunerado e outro gratuito no mesmo logar, no mesmo dia e na mesma hora, e os empregados das comarcas fazerem o serviço remunerado, servirem de testemunhas ao serviço gratuito, feito pelos empregados da juizos de paz, e era mandados cumprir pelos juizes de direito.
Nos serviços gratuitos das comarcas, ou como taes considerados, gastam os empregados dos juizes de paz muito tempo e têem tambem em muitos casos de percorrer grandes distancias a pé ou pagar á sua custa o meio de conducção, para a final verem o serviço que os póde compensar d'esses sacrificios usurpado pelos empregados das co-
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marcas que, com abuso ou consentimento dos juizes de direito ali vão.
Pedia, portanto, ao sr. ministro da justiça que desse as providencias necessarias, para que se cumprisse a lei. Eu bem sei que os empregados das comarcas desejam auferir maiores lucros para poderem viver; mas tambem os empregados dos juizos de paz têem igual direito á vida e andam, por assim dizer, luctando com difficuldades para proverem ao seu sustento e de sua familia, e no emtanto estes tambem são servidores do estado.
Desde o momento em que os empregados das comarcas lhes vão cercear os seus interesses, o que hão de elles fazer? Não é justo, nem regular que as commodidades sejam só para aquelles, ao passo que estes estão privados dos meios de subsistencia.
Se a lei não é boa, modifique-se; e se é boa cumpra-se, e cada um aufira o que de direito lhe pertence, e correspondente ao trabalho que em sua observancia é compellido ou obrigado a fazer. Por estas irregularidades de proceder, é difficil encontrar quem queira servir nos juizos de paz, que geralmente estão sem pessoal, porque ninguem quer exercer cargos gratuitos, mormente quando essa gratuidade é em favor de outros empregados e não em virtude de lei ou que esta se chame para o caso a forciori.
Por isso vou mandar para a mesa os seguintes
Requerimentos
1.°
Requeiro que, pelo ministerio da justiça, seja pedida aos juizes de direito uma nota, para me ser enviada, de toda e qualquer citação ou intimação verificada a mais de 10 kilometros da séde da camarca, e pertencente a qualquer processo civel, crime, orphanologico ou commercial, indicando o funccionario que a verificou, os emolumentos que lhe foram contados, se os recebeu ou se lhe estão em divida e a rasão por que; isto relativo aos ultimos tres annos.
2.°
Nota de qualquer providencia ordenada pelos juizes de direito para evitar o abuso dos officiaes de diligencias que verificam estas citações e intimações a mais de 10 kilometros da séde da comarca, e bem assim nota de qualquer promoção do ministerio publico, allegando nullidade dos actos assim praticados por incompetencia do funccionario quanto ao logar.
3.°
Nota da correspondencia trocada entre os juizes de direito e os juizes de paz, e assim como informação de quaesquer queixas verbaes ou escriptas que sobre este assumpto tenham sido feitas aos juizes de direito pelos empregados dos juizes de paz. = O deputado, F. J. Machado.
Já que estou com a palavra, direi que tive hoje uma grandissima satisfação ao ler no Diario de noticias, que o supremo tribunal administrativo deu provimento às reclamações ou protestos de alguns generaes ao serviço do ministerio das obras publicas, contra o limite da idade. Esta decisão vem justificar a causa, que tenho defendido com tanto calor no sentido de se modificar a lei, que mandou pôr fóra do serviço os generaes que attingissem o limite da idade. A prova de que elles não estão incapazes do serviço é que continuam a prestal-o.
Como se entende então isto? Os generaes ao serviço do ministerio da guerra continuam a ser postos fóra do serviço por terem attingido o limite da idade, ao passo que os que estão no ministerio das obras publicas continuam a servir o estado, não obstante terem attingido esse limite. A decisão do supremo tribunal administrativo póde dar um conflicto gravissimo, que é preciso evitar de algum modo.
Ou hão de continuar todos no serviço activo, ou nenhum, quando attingirem o limite da idade. É evidente, que desejo que todos continuem, uma vez que lh'o permitiam as suas condições de capacidade moral e physica.
O sr. Moraes Sarmento, quando ministro da guerra, tornou extensiva aos officiaes, a que me estou referindo, a lei dos limites de idade.
Se se fizer a excepção relativamente áquelles que estiverem ao serviço no ministerio das obras publicas, succederá que os officiaes do exercito dependentes do ministerio da guerra, quando estiverem proximos de attingir o limite da idade e tiverem protecção, hão de transitar para o ministerio das obras publicas, ficando em melhor situação que os seus camaradas, que continuarem no ministerio da guerra, e livram-se assim de lhes ser applicada a lei do limite de idade.
Isto não póde ser; ou a lei se ha; de applicar a todos ou a nenhum. A minha opinião, como disse, é que não se applique a nenhum, e que os officiaes que forem julgados incapazes para o serviço, physica ou moralmente, se reformem; mas continuando ao serviço os que forem julgados aptos para elle.
O que não é possivel e póde dar logar, repito, a um conflicto, é que os que estão ao serviço do ministerio das obras publicas, embora tenham attingido o limite da idade, continuem a prestar serviço, emquanto os desgraçados que estiverem sempre ao serviço do ministerio da guerra, bastante penoso, difficil e sujeitos a todas, as inclemencias são inexoravelmente postos fóra por terem attingido o limite da idade, qualquer que seja a sua capacidade physica e moral.
Ouvi hontem contar um caso, que é perfeitamente elucidativo. Na Hespanha existia uma grande quantidade de generaes, em virtude de guerras e luctas civis e o ministro da guerra de então, o general Concha, querendo remediar um pouco este estado de cousas, vendo que a nação não podia com tanta despeza, reuniu uma porção d'esses generaes e quiz com elles combinar um projecto para fixar um quadro e acabar com o grande numero de generaes que havia. Lembraram-se da lei do limite de idade, e um dos generaes mais antigos desatou a chorar como uma creança! Queriam pôr fóra alguns generaes, mas depois desistiram de implantar esta medida no exercito.
Posso informar a camara, que muitos officiaes têem soffrido grande abalo pelo facto de terem sido dispensados do serviço activo do exercito; o sr. general Maciel está á morte, e uma das causas foi o abalo que soffreu por o terem reformado, applicando-lhe a lei dos limites de idade.
Comprehende-se, que quem ama a sua patria, e as instituições e julgando-se ainda capaz de as servir, quando se vê apartado para sempre dos seus camaradas, que ficam ainda no exercito, soffra um choque de tal ordem, que forçosamente lhe ha de ser fatal!
Portanto, desejava que o sr. ministro da guerra se pronunciasse de alguma fórma sobre a questão do limite de idade.
O meu amigo, o sr. Moraes Sarmento, mandou para a mesa uma nota de interpellação sobre esta assumpto e tem fatalmente de se tomar uma resolução a este respeito.
Excepções é que se não podem admittir de fórma alguma.
É bom que o assumpto se vá ventilando na camara, na imprensa e nos tribunaes, para se saber onde havemos de chegar.
O sr. Ministro da Justiça (Veiga Beirão): - Tomei nota das considerações que o illustre deputado acaba de fazer.
Na parte que diz respeito ao meu ministerio referem-se
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ellas a dois pontos: o primeiro diz respeito ao modo como é feito o serviço nos julgados municipaes; o segundo é relativo ao exercicio de funcções que pertencem aos escrivães dos juizos de paz e que são exercidos pelos escrivães dos juizes de direito.
Deseja s. exa. obter esclarecimentos para se habilitar a tratar desenvolvidamente d'estes factos..
Com respeito ao primeiro creio que já alguns foram enviados a esta, camara, e relativamente, ao segundo, como s. exa. foi o proprio a reconhecer, ha de ser difficil obter documentos com os elementos necessarios para satisfazer às perguntas de s. exa.
O que posso é prometter empenhar todos os meus esforços para procurar conseguir que lhe sejam enviados esses esclarecimentos.
(S. exa., não reviu.)
O sr. Teixeira de Sousa: - Não vae tratar de um assumpto de interesse geral, mas sim referir-se a um abuso e grave injustiça praticada contra o sr. Antonio Alves Callado, seu dedicado amigo.
Refere que no dia 11 ou 12 d'este mez foi preso n'uma feira em Alijó um homem a quem foram encontradas notas falsas.
Levantado o auto o preso foi remettido ao poder judicial, e o juizo entendeu que o devia pronunciar com fiança. O accusado pertence a uma freguesia que é inteiramente affecta a elle, orador, e que é representada, perante elle, por aquelle seu amigo, cavalheiro honestissimo, cheio de virtudes, e dos mais ricos de Douro, o sr. Antonio Alves Callado, que, exactamente por lhe ser affecto, tem sido victima de perseguições, movidas por adversarios politicos. Agora offereceu-se-lhes ensejo para uma vingança crudelissima.
Aquelle cavalheiro estava no Porto, e, a pedido do accusado, prestou-se a affiançal-o. Tanto, bastou para que a administrador do concelho de Alijó requisitasse a sua prisão e uma busca no hotel onde estava.
Elle, orador, tem tido sempre o proposito de não pronunciar no parlamento uma só palavra desagradavel para quem quer que seja, o que não quer dizer que não seja capas de a pronunciar, e que pronunciando-a não tenha a coragem de a sustentar. N'este momento não tem duvida em dizer que o procedimento do administrador de Alijó foi infame.
O sr. presidente do conselho, a quem procurou, prometteu-lhe fazer justiça, e por isso só elogios tem a dirigir-lhe. S. exa., porém, parece que nada póde fazer.
Em seguida lê o orador os seguintes trechos de jornaes do Porto;
«Notas falsas - Como noticiámos hontem, foi preso em Alijó o negociante João Fernandes Andréas, a quem foram apprehendidos sessenta e uma notas de 1$000 réis, falsas.
«Por causa do mesmo assumpto, o sr. administrador do concelho de Alijó telegraphou hontem ao sr. commissario geral de policia, pedindo-lhe que mandasse proceder a buscas em uma hospedaria da rua de Sá Noronha; que capturasse o proprietario d'ella, bem como um individuo que ali devia estar hospedado, proprietario e negociante em Alijó, e ainda outro sujeito de quem dava os signaes. Indo a policia judiciaria da 1.ª divisão á alludida hospedaria, procedeu a essa busca, e nada encontrou que se relacionasse com o caso em questão. Foram presos o dono e o negociante; o outro indigitado não appareceu.
O negociante, que é muito conhecido n'esta cidade, e mantém transacções com importantes casas commerciaes, nega por completo ter qualquer cumplicidade no caso sujeito. Declarou que, a pedido, escrevêra a dois amigos seus que intercedessem junto do sr. juiz de Alijó a fim de ser benevolo com o preso Andréas, para que este podesse prestar fiança. Nada mais soubera, pois teve que vir para o Porto liquidar com uma casa ingleza um negocio de vinhos na importancia de 3:400$000 réis, tendo ainda na carteiro, quando foi preso, cerca de 2:000$000 réis, em notas de 20$000 réis. A prisão, portanto, só podia attribuil-a ao facto de se interessar pelo Andrés, ou, o que lhe parece mais provavel, a vingança politica do administrador, com quem anda de mal.
«Tanto o negociante como o dono da hospedaria foram recolhidos ao Aljube, e vão hoje para Alijó, a fim de ser entregues ao administrador d'aquelle concelho.»
«Caso de notas falsas. - No sabbado, 12 do corrente, foi preso na feira mensal de Alijó o negociante ambulante João Francisco Andréas, por andar ali a passar notas falsas de 1$000 réis, de typo antigo, mas perfeitas.
«Na occasião da captura, que foi no fim da feira, foram-lhe apprehendidas dez notas falsas.
«Por mandados do sr. administrador de Alijó foram hontem presos n'esta cidade um negociante de vinhos d'ali e o dono de uma hospedaria da rua Sá de Noronha, para averiguações
Foram recolhidos ao Aljube, devendo seguir hoje no comboio da manhã para Alijó, a fim de serem entregues aos requisitantes.»
Continuando, diz o orador que hontem, quando se dirigiu ao sr. presidente do conselho, suppunha que o seu respeitabitissimo amigo tinha sido remettido para a comarca de Alijó, e por isso pediu a s. exa. que desse instruções ao sr. governador civil de, Villa Real, para que apressasse as averiguações, a fim de que desapparecesse o mais depressa possivel este enxovalho em que só queria envolver um homem de bom.
O facto, porém, é que, no momento em que elle chegava á gare de Campanhã, recebeu o commissario de policia do Porto um telagramma do administrador do Alijó, dizendo-lhe que o retivesse preso á ordem do sr. juiz veiga, de Lisboa.
Não ha palavras para classificar um tal abuso, e se não lhe chama outra cousa, é pelo muito respeito que tem pela presidencia.
Declára, porém, que está disposto a arriscar a vida por aquelle cavalheiro, e que tambem, muitas vezes, elle tem arriscado a sua pela do orador.
Narra depois alguns factos para mostrar que aquelle funccionario não tinha auctoridade para proceder como procedeu, acrescentando que nem quer dizer a que profissão elle se entrega, para ser agradavel ao sr. presidente do conselho.
No districto de Villa Real tem-se dado factos sobre os quaes podia assentar uma interpellação, mas não o tem querido fazer, continuando assim a dar, como tem dado sempre, provas da mais absoluta cordura. Parece-lhe por isso que tem direito a esperar uma reparação por parte do sr. presidente do conselho; pede a s. exa., em nome do principio da auctoridado, que demitia immediatamente aquelle funccionario.
(O discurso será publicado na integra, quando s. exa. devolver as notas tachygraphicas.)
O sr. Ministro da Justiça (Francisco Beirão): - Em resposta ao illustre deputado, direi que não tenho duvida em communicar ao sr. presidente do conselho as considerações que s. exa. acaba de fazer.
S. exa. começou por dizer que tinha tido uma conferencia com o sr. presidente do conselho, na qual lhe tinha exposto todos os aggravos que julgava ter contra a auctoridade a que se referia, e que o nobre presidenta do conselho lhe tinha promettido proceder, a respeito do assumpto, de modo tal, que o illustre deputado, com o seu espirito justiceiro, não duvidava declarar á camara que s. exa. havia, procedido n'esse caso, como em todos os outros, honradisimamente, e que por consequencia não tinha senão a tecer-lhe elogios.
(Interrupção do sr. Teixeira de Sousa.)
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O Orador: - Não tenho duvida em relatar ao nobre presidente do conselho o que se passou posteriormente á conferencia que s. exa. teve com elle.
Tenho de repetir mais uma vez perante a camara a declaração feita pelo sr. presidente do conselho, de que o governo não está aqui para encobrir illegalidades de qualquer especie, e desde o momento que s. exa. tomou sobre ai o negocio, dizendo que ia adoptar providencias, o illustre deputado e a camara devem esperar pelo resultado d'ellas e então julgar o governo pelos seus actos.
O sr. Teixeira de Sousa: - Eu não accuso o governo.
O Orador: - Muito bem. S. exa., que tem sempre procedido com a maxima correcção, e que embora discutindo com a vehemencia propria dos debates parlamentares, com o calor proprio do seu temperamento, nunca se tem afastado d'este caminho proferindo qualquer palavra que podesse irritar o debate, permitta-me dizer-lhe, á boa paz, que sinto muito que, levado aliás por um sentimento amizade para com o cavalheiro a quem se referiu, antes de cumprida a promessa do sr. presidente do conselho de examinar o processo e tomar as providencias que fossem necessarias, viesse accusar um funccionario por fórma tal, que não posso deixar de levantar, por parte do governo, a palavra proferida por s. exa., e que de certo lhe escapou no calor da discussão. O governo responde pelos actos dos seus funccionarios emquanto publicamente os não reprova.
(S. exa. não reviu.)
O sr. Presidente: - Tem a palavra o sr. Oliveira Matos.
Lembro a s. exa. que faltam poucos minutos para se entrar na ordem do dia.
O sr. Oliveira Matos: - Sr. presidente, pedi a palavra para chamar a attenção do illustre ministro da justiça, que me ouve, para o prejuizo e incommodo que estão soffrendo os habitantes das freguezias que pela ultima e acertada reforma administrativa voltaram para os concelhos de onde levianamente tinham sido desannexadas, continuando, porém, judicialmente, a pertencer às comarcas para onde as desterraram, e contra o que fizeram as suas reclamações e protestos. E quero referir-me especialmente às freguezias de S. Pedro de Alva e Sampaio, do concelho de Penacova, porque muito bem as conheço; e se não fazem parte do circulo que tenho a honra de representar n'esta camara, são suas vizinhas proximas e por ellas tomo o mais vivo interesse, o que bem se comprehenderá, sabendo-se que nasci na primeira, a minha querida e saudosa aldeia, a que me prendem tão gratas recordações da infancia, e aonde tenho parentes e amigos, que muito prezo e estimo.
Sr. presidente, antes da nefasta e odiada reforma administrativa do ministerio regenerador, que não foi mais do que uma especulação politica e uma desalmada vingança contra algumas freguezias progressistas, a importantissima freguezia de S. Pedro de Alva, uma das mais ricas e populosas do districto de Coimbra, pertencia á comarca de Penacova desde a sua creação; mas como os seus independentes habitantes não fossem regeneradores, e como o concelho e comarca de Penacova, unida e firme sob a poderosa influencia do meu prezadissimo amigo o sr. conselheiro Alipio Leitão, um honrado e respeitabilissimo progressista, muito conhecido e que já teve assento n'esta camara, era preciso castigal-os, castigando ao mesmo tempo a comarca aonde a regeneração ha muitos annos não consegue uma insignificante minoria, esteja no governo ou na opposição! E foi para que este castigo e vingança politica se realisasse, que se passaram judicial e administrativamente para a comarca e concelho de Tábua, as freguezias a que me estou referindo, contra a vontade dos povos, que para logo protestaram energicamente, allegando os grandes prejuizos que soffriam e os enormes incommodos a que os obrigavam, sem nenhum proveito para elles; ou para a melhor administração da justiça. Não foram então attendidos, está claro! A monstruosa violencia consumou-se. Os mandões regeneradores de Coimbra e Tábua ficaram satisfeitos com a mesquinha vingança, e mais uma vez a justiça foi postergada, o direito desprezado, a vontade e conveniencia dos povos desattendida e escarnecida! É a norma dos velhos costumes regeneradores! Não ha que estranhar em taes politicos, são os seus processos, já se não emendam!
Agora, com o que se fez, e muito bem, na ultima reforma concelhia, attendendo as justas reclamações dos povos feridos nos seus direitos e regalias locaes, remediou-se parte do grande mal.
Decretou-se que as freguezias de S. Pedro de Alva e Sampaio, voltassem novamente para o concelho de Penacova, a que tinham sido usurpadas; mas ficaram e estão pertencendo ainda, judicialmente, á comarca de Tábua para onde as tinham mandado, violentamente e de castigo, para expiarem o negro crime de nas eleições não receberem as indicações e as listas da mão do administrador do concelho regenerador e seus representantes...
Ora o que eu pedia ao nobre ministro da justiça, a quem pelo seu espirito recto e austero devera, repugnar estas manigancias politicas mal disfarçadas, em que se dignasse attender sem demora as instas reclamações de que me faço echo e que pondo cobro a um mal que tanto prejudica os povos de S. Pedro de Alva, obrigando-os a ter de ir com grande sacrificio de tempo e dinheiro a dois concelhos differentes e muito distantes para tratar n'um os assumptos administrativos e n'outro os judiciaes, ordenasse sem demora a volte das freguezias queixosas para a sua antiga comarca de Penacova, a que sempre pertenceram.
É um acto de justiça e de moralidade que se não deve fazer esperar. E o nobre ministro bem merecerá, em elogios e reconhecimento, a gratidão d'aquelles povos que com rasão tanto se queixam e a quem está ferindo a mais grave das injustiças.
Peço pois a v. exa. e espero que, tomando na devida consideração o que muito resumidamente acabo de expor, ordene as devidas providencias para que cesse quanto antes um condemnavel estado de cousas, não só prejudicial aos povos, mas tambem aos serviços judiciaes, pelo estado anarchico em que tudo se encontra actualmente, n'uma lamentavel interinidade, na comarca de Tábua e na de Penacova.
E por agora nada mais direi, não me desobrigando de voltar ao assumpto, o que muito estimaria não fosse necessario.
O sr. Ministro da Justiça (Veiga Beirão): - Como o illustre deputado sabe, o parlamento, na sessão passada, auctorisou o governo a proceder á revisão da circumscripção administrativa e judicial, e como s. exa. tambem sabe, foi nomeada uma commissão encarregada de apreciar as representações que se apresentassem a respeito do assumpto.
Sabe v. exa. igualmente que essa commissão se desempenhou do seu encargo com respeito á circumscripção administrativa e judicial, e que o governo, no uso da auctorisação que lhe foi conferida, publicou a reforma que entendeu justa e conveniente relativamente á circumscripção administrativa. Falta proceder pela mesma fórma quanto á circumscripção judicial, e eu devo dizer a v. exa. que já recebi os documentos d'aquella illustrada commissão, que são bastante volumosos. Tenho-os estudado com todo o cuidado, mas, como v. exa. sabe, não ha nada mais difficil do que remodelar a circumscripção judicial; entretanto, hei de atttender, tanto quanto for possivel, as reclamações dos povos.
Não sei se a respeito do caso especial a que s. exa. se referiu haverá estudos n'aquella commissão; mas o que
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posso dizer-lhe é que hei de fazer todo o possivel para attender o seu pedido.
Seria muito bom que estivessemos em situação de podermos fazer uma divisão judicial que coincidisse com a divisão administrativa; mas considero isso absolutamente impossivel. Tenha, porém, o illustre deputado a certeza de que o desejo do governo é attender tanto quanto possivel às justificados reclamações dos povos sem inconveniente para o serviço publico.
(S. exa. não reviu.)
O sr. Presidente: - Estão ainda inscriptos alguns srs. deputados, mas não posso conceder-lhes a palavra, porque já excede um pouco a hora marcada para se entrar na ordem do dia, que é às quatro horas e um quarto da tarde.
ORDEM DO DIA
Continuação da discussão do projecto de lei n.º 5 (conversão)
O sr. Jeronymo Barbosa Vieira: - Toma a palavra unicamente para justificar o seu voto a favor do projecto.
Parecendo-lhe que se quer collocar a maioria n'uma situação menos sympathica perante o paiz, vem assumir a responsabilidade que lhe possa competir, porque gosta mais das responsabilidades individuaes definidas do que das responsabilidades collectivas.
Em cinco proposições ou theses se póde resumir o discurso do sr. deputado que o antecedeu:
1.º O thesouro já não póde satisfazer os encargos actuaes, logo, é inconveniente ir garantir a satisfação d'esses encargos;
2.º O projecto não melhora as condições da lei de 30 de maio de 1893, é inutil o accordo e perigosa a garantia que se vae conceder;
3.º O projecto dá garantias especiaes aos credores externos e diminuo a garantia geral da credores internos, não havendo rasão para esta differença de tratamento;
4.º O emprestimo vem augmentar os encargos do thesouro, que já não póde com os actuaes;
5.º A consignação dos rendimentos das alfandegas é o peior que o governo podia fazer.
É novo na camara, e não conhece as conveniencias politicas nem as conveniencias parlamentares, mas, se o seu chefe lhe desse ordem para vir declarar que o estado não póde satisfazer os encargos a que se comprometteu ha cinco annos, não a cumpria.
Admira-se, portanto, que um partido que tanta responsabilidade tem da situação actual, venha declarar que o paiz não póde com os actuaes encargos!
O partido regenerador, quando em 1892 o sr. Dias Ferreira reduziu os juros externos a um terço em oiro, entendeu que o paiz podia com este encargo, e hoje vem declarar que já não póde. Ambas as proposições podem ser verdadeiras, o que indica que no paiz se deu uma mudança importante o que a administração publica no periodo decorrido, cuja responsabilidade na sua maior parte pertence ao partido regenerador, foi má.
Refere-se o orador a algumas das causas que determinaram a actual situação do paiz, accentuando que foi a impossibilidade do recurso ao credito e a falta da importação de oiro do Brazil, unicos meios por que se saldavam os nossos grandes deficits financeiros e economicos, que nos levaram a esta situação quasi desesperada e de que nos é indispensavel saír.
Para saírmos d'ella conhece um meio, que foi apontado pelo sr. ministro da fazenda no seu relatorio, que foi aconselhado pelo sr. Marianno de Carvalho, e que é tambem indicado por todos os economistas e financeiros: é o de trazer oiro para o paiz, para se diminuir a circulação fiduciaria e para se augmentarem as reservas metallicas do banco de Portugal. E o oiro não se póde trazer senão em virtude de um emprestimo.
Há ainda o meio indicado pelo sr. Dias Ferreira de nos governarmos com a prata da casa, mas não o julga possivel.
Temos, pois, necessidade absoluta de arranjar oiro, e para isso é preciso que façamos um convenio amigavel com os credores externos, mostrando-lhes que estamos dispostos a cumprir religiosamente os nossos compromissos, para conseguirmos que se nos abram os mercados estrangeiros. N'este sentido o projecto melhora a situação creada em 1893, porque a amortisação passa a fazer-se por preço inferior ao actual, o que nos livra de grandes embaraços.
Em sua opinião, o emprestimo vem diminuir os encargos em logar de os augmentar, porque o seu juro é inferior ao juro da actual divida fluctuante, que é amortisada, e tambem porque ha de diminuir consideravelmente o agio do oiro.
Acrescenta o orador, que a situação dos credores internos é hoje melhor do que a dos externos, e que não havia que tratar com elles como se faz com os externos, por isso que o regimen da divida interna não se modifica; permanece como estava.
Não ha, portanto, rasão para os reparos do sr. Luciano Monteiro.
Quanto á consignação do rendimento das alfandegas, não vê tambem rasão para a opposição que se tem levantado, por isso que alem de não constituir materia nova na nossa legislação, sobre este assumpto, já em 1891, quando ainda se não tinha suspendido pagamentos, um rendimento publico, o dos tabacos, era consignado a um emprestimo, e então com a aggravante de que isso representava claramente o contrôle, visto que esse rendimento não era recebido directamente pelo estado, mas pela companhia dos tabacos, que fizera o emprestimo.
É sua convicção de que não ha nenhum deputado que tenha combatido este projecto, que não tenha na sua consciencia cousa differente d'aquillo que lhe tem saído dos labios, e leva-o a essa convicção o tacto de terem procedido por fórma identica áquelle que hoje condemnam.
O governo, consignando o rendimento das alfandegas, teve em vista que os credores externos, interessados na nossa regeneração economica, collaborassem lealmente comnosco na regeneração do paiz, porque estão de accordo com os nossos os interesses d'elles.
E, se nós estamos dispostos a cumprir, de boa fé, os compromissos que tomámos, não vê que possa haver inconveniente algum n'essa consignação.
(O discurso será publicado na integra, quando s. exa. o restituir.)
O sr. Malheiro Reymão: - Sr. presidente, começou o illustre deputado que me precedeu por accusar, com singularissima injustiça, a minoria d'esta casa de apenas proferir palavras, palavras só!
Pois s. exa. é que apenas proferiu palavras, (Apoiados.) palavras eloquentes, é certo, mas que são um inesgotavel manancial de argumentos para mostrar quanto ha de inconveniente, de perigoso e de vexatorio no projecto que se discute. (Apoiados.)
Uma phrase preciso eu de levantar desde já; é quando s. exa. assegurava que nós tinhamos na bôca palavras, que seguramente não tinhamos na consciencia.
Não é verdade. (Apoiados.) Por mim respondo, por todos os meus collegas d'este lado posso responder, (Apoiados.) que fallâmos aqui para que o paiz nos onça em defeza desinteresses mais caros da nossa patria; (Apoiados.) fallâmos só a verdade; (Apoiados.) devemos fallar só a verdade; e, se errâmos, não é porque estejamos atraiçoando os nossos deveres; mas por defeito do nosso espirito, que não por intenção da propria consciencia. (Apoiados.)
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A uma synthese posso reduzir todo o discurso do illustre deputado; é o seu vehemente protesto contra aquella phrase do sr. Dias Ferreira, que, dizia s. exa. symbolisava e condensava todo o plano financeiro d'aquelle illustre estadista: governar com a prata da casa.
Pois sou eu partidario d'esse systema, se elle representa a economia rigorosa, a parcimonia avara, que as condições do paiz impõem a todos nós.
Eu antes quero que se governe com as pratas da casa, do que com o oiro lá de fóra. (Apoiados.)
Começou tambem s. exa. por perguntar de quem eram as responsabilidades do estado actual e eu noto que, dizendo o sr. ministro da fazenda no seu relatorio que era inconveniente e inutil discutir aqui a historia do passado, que se relembrassem precedentes da situação calamitosa em que nos encontravamos, estejamos a cada passo a ver procedimento contrario.
Tinha rasão s. exa.; mas os illustres deputados d'aquelle lado da camara é que insistentemente arrastam para o debate retaliações politicas, com o unico intento de obscurecerem o espirito do paiz, para que não attento, nem veja o que aqui se está passando e o que vae votar-se; porque nunca houve projecto de tanta importancia para a vida nacional, que tão directa e indirectamente interessasse a cada cidadão.
É com o precedente da lei de 1892, votado n'esta casa, que s. exa. quer justificar a consignação do rendimento das alfandegas! A lei de 1892 deve servir de lição para muita cousa, mas não seguramente para auctorisar a consignação do mais importante rendimento nacional.
Em 1892 rebentou de surpreza, para o espirito dos mais optimistas, a voragem que ameaçava subverter todo o paiz! Votou-se então uma lei que nem poupava as migalhas dos orphãos, nem as penurias da viuvez. Votou-se, sob a impulsão de um nobre sentimento de honrado desinteresse, uma pesada contribuição, que feria desde os mais altos corgos do estado ao mais insignificante rendimento de cada um. Tomada esta deliberação, que ha de sempre fulgurar como um exemplo de nobreza e de isenção, feito este despojo voluntario do que era nosso, era ainda mister dizer ao credor que se tornava impossivel honrar por mais tempo os nossos compromissos. Concedeu-se então uma auctorisação ampla e larga, para negociar com o estrangeiro a remodelação das nossas condições financeiras, não duvidando ir ao seu encontro com garantias que o nosso desastre podia tornar justificadas ou innegaveis! Era da nossa honra desde que em uma das mãos levavamos a suspensão de pagamentos, a notificação da bancarota, levarmos em outra a garantia de todos os nossos haveres, para mostrar a lealdade do nosso procedimento. (Apoiados.)
E apesar, de perante a frieza do capital não poder amoedar-se o doloroso do sacrificio, certo é que podemos conseguir, sem consignação especial de qualquer receita, o regimen de 1893, que temos cumprido honrada e fielmente, sem outra garantia que não fosse o nosso compromisso. Hoje o que é que nós propomos? O que pedimos aos nossos credores senão a manutenção d'esse regimen, que temos mantido com honra e brio em periodos dolorosissimos de uma intensa crise nacional? A que vem, pois, a offerta ou a exigencia de uma caução especial?
Disse o illustre deputado que a apreciação de uma crise como esta se deve fazer nas suas causas e effeitos. Não é preciso; nós não estamos a apreciar a crise, estamos a apreciar o projecto, e n'esse ponto restricto, o que se tem demonstrado rigorosamente d'este lado da camara, sem que d'ahi tentassem sequer contestal-o, é que o projecto é oneroso, porque augmenta os encargos actuaes, injustificavel porque o thesouro já não póde supportar os encargos que actualmente o oneram, inutil porque nos deixa na mesma situação de descredito, perigoso porque nos colloca sob a ameaça de uma crise muito maior, e vexatorio porque, mais ou menos dissimuladamente, permitte e auctorisa a fiscalisação estrangeira.
Apesar da concisão extrema com que está redigido o parecer sobre um assumpto tão importante; apesar de absolutamente despido de quaesquer elementos de calculo para a apreciação financeira do projecto, d'aqui demonstrou-se qual era a somma dos encargos que actualmente supporta o thesouro, a penuria da sua actual situação, o desbarato dos seus haveres, acompanhado de um crescimento progressivo e assombroso da divida fluctuante.
Averiguou-se que o desequilibrio do thesouro montou, em um periodo de onze mezes, a perto de 10:000 contos de réis; demonstrou-se que ascendem a 2:000 contos de réis em oiro os encargos do emprestimo auctorisado pelo projecto, e tudo isto sem haver d'esse lado da camara - permitia-me v. exa. que eu o diga, sem estar no meu animo a menor idéa de falta de respeito e consideração para com os que me precederam no debate e a quem presto a homenagem da minha admiração -uma unica resposta a todas estas objecções que reduziram a pó toda a essencia do projecto. Tudo isto quando se nota e vê com surpreza que, excepção feita do sr. deputado Villaça, que com brilhantissimo talento e notavel sagacidade versou o assumpto do projecto sem sequer, ligeiramente, se comprometter, outros illustres parlamentares, os cabos de guerra mais afamados das legiões da maioria, pareces que cuidadosamente se conservam arredados d'esta discussão. Tudo isto quando se vê que o projecto fica entregue a talentos notaveis, que se têem revelado esperanças brilhantissimas, mas que em todo o caso são soldados ainda bisonhos, como eu, que não costumam terçar as suas armas em projectos d'esta magnitude, em que a reserva se impõe aos oradores que têem de fallar por parte do governo e da maioria e que devem de pesar e meditar as suas palavras, para que descuidosamente não profiram na discussão qualquer declaração ou phrase que possa ser mal interpretada e ser assim prejudicial, não só para o mesmo governo, mas sobretudo para os interesses do paiz.
Quando tudo isto se dá, quando parecia natural que o sr. ministro da fazenda mais de uma vez entrasse na discussão, esclarecendo-nos com os recursos vastissimos da sua intelligencia, em vez d'isso o projecto, que foi aqui classificado desde o principio de grande projecto nacional, dependendo d'elle toda a nossa regeneração economica, vê-se, não digo repudiado, mas abandonado dos afamados cabos de guerra que a camara conhece e reconhece como eximios combatentes n'estas luctas parlamentares. (Apoiados.)
Isto causa-me surpreza e desgosto, porque creio realmente que este projecto é importantissimo, e parece-me inexplicavel este desinteresse do governo. (Apoiados.)
Apesar das enormes deficiencias do projecto, notabilissimos oradores d'este lado da camara demonstraram que haviam estudado os recursos do thesouro e os encargos que elle ia supportar.
O illustre deputado que nos accusava de não termos estudado fundamentalmente a essencia do projecto, é que vinha aqui declarar que não sabia qual era o juro do emprestimo, qual o da divida fluctuante, e nem assim se queixa do sr. ministro da fazenda e do sr. relator do projecto; que não dão elementos para uma apreciação completa, para um juizo seguro, preferindo que a camara se debata no vago e mysterioso das contas publicadas por uns e por outros. (Apoiados.)
Todos esses elementos financeiros de que o relatorio se encontra completamente despido haveriam de esclarecer o illustre deputado e a nós todos em uma cuidada apreciação do assumpto.
Annuncia-nos de seguida s. exa. toda a prosperidade que deve resultar da realisação do emprestimo!
Pois o illustre deputado, que tão valiosos conhecimentos economicos revela, está sinceramente convencido de que
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um emprestimo de 10:000, 12:000 ou 16:000 pontos de réis modifica por completo, de repente, a situação, financeira do paiz.
Seria um trabalho tão improficuo como o de encher o tonel mythologico das danaides.
Quanto oiro atirassem para o paiz todo se escoava como a agua de uma repreza a que tirassem a adufa!
Depois ninguem sabe a quanto monta o emprestimo; outro mysterio do projecto. (Apoiados.)
Supponhamos mesmo que é um emprestimo larguissimo, aquelles celebrados 60:000 contos de réis, que eram o anno passado toda a esperança do governo, os resultados seriam os mesmos.
Diz s. exa. que desde o momento que deixe de haver procura por parte do governo das dividas estrangeiras, o agio desce immediatamente a metade. Mas nós ouvimos aqui hontem, e é verdade, a um illustre orador d'este lado da camara, que o governo ha proximamente um anno que não tem pesado no mercado com a compra de cambiaes, e não obstante isso o agio continua subindo, como de hontem para hoje aconteceu ainda.
Quando isto se dá, quando são multiplicados e não apenas de ordem interna os motivos d'este estado de cousas, quando o encargo cambial cresce e o agio do oiro é cada vez maior, os prognosticos do illustre deputado não merecem grande confiança e são infelizmente um devaneio de imaginação phantasiosa!
Se isto é o resultado do estudo das leis economicas e do conhecimento dos negocios financeiros, Deus nos livre então de taes economistas, (Apoiados.) vâmos antes com o ramerrão do bom senso, com os impulsos da propria consciencia, com o convencimento profundo da gravidade da crise que atravessamos, que exige o concurso de todos nós, não a cooperação e concurso para approvar um projecto que, com rasão, reputâmos a ruina de todo o paiz, (Apoiados.) mas cooperação e concurso que se dirigisse a uma remodelação completa dos nossos processos de governo e dos nossos processos de administração. (Apoiados.)
É preciso uma vida nova, que não seja de palavras, mas de factos e que, não sendo acanhada e estreita, podesse ser de conveniencia para o paiz. (Apoiados)
Uma cousa ha que não póde ser substituida pelo grande talento e pela brilhante intelligencia, é a honestidade de caracter, a honradez e seriedade que devemos todos transportar e trazer de nossas casas para as luctas e para as brigas da politica. Ser honrado é ser bom, e ser bom é ser util! (Apoiados.)
O illustre deputado teve ainda outra declaração curiosa; e permitta-me v. exa. e a camara que eu não perca estes pequenos pontos de referencia que me deixou o notavel discurso do orador que me precedeu.
Respondendo a um argumento do meu prezado amigo e um da mais brilhantes talentos d'esta camara e da minoria parlamentar, o sr. Luciano Monteiro, quando increpava a garantia que, em desproveito dos credores da divida interna, se ia dar exclusivamente aos portadores da divida externa, tinha o illustre deputado este argumento superior: «Alterâmos apenas o regimen da divida externa, porque não nos occupâmos da divida interna!»
Quando ouvi este argumento passou-me pelo espirito um episodio do celebre processo que se esta julgando em França.
Era interrogado um perito calligrapho, de nome Bertillon, que havia declarado sem de Dreyfus a letra da nota ou apontamento que era a frase de toda a discussão. Declarava elle que a letra não era de Esterhazy, e perguntando-lhe porque, dizia: Porque é de Dreyfus. E porque é de Dreyfus? Porque não é de Esterhazy!
Aqui é o mesmo caso. Porque dão só garantias á divida externa? Porque não tratâmos da divida interna! Porque não tratam da divida interna? Porque tratâmos só da divida externa.
É uma resposta, mau o que nunca será á um argumento do valor.
Eu creio que a maioria já acha longa esta discussão. O projecto que ella annunciou como sendo de tanto magnitude e de uma importancia tão decisiva e primaria para a causa nacional, no seu entender deve votar-se de pressa, porque não resistiria, com certeza, aos quatro dias de carnaval!
O sr. Laranjo: - Peço a palavra para um requerimento.
O Orador: - O illustre leader da maioria, meu preclaro professor, ornamento d'esta casa, tendo dado em toda a sua vida constantes demonstrações do seu valor intellectual e do brilhantismo do seu espirito, tem já o apagador engatilhado precisamente no mesmo momento e em flagrante contraste com o empregado que entra e começa de accender as luzes d'esta sala. (Riso.)
É precisamente quando a luz se accende que se apaga a discussão do projecto. É preciso que assim seja! (Apoiados.)
Apaga se a discussão para consolo e alegria da maioria, a quem o encargo já pesa e esmaga, o isto apesar do illustre ministro da fazenda haver desde o principio declarado que considerava esta questão uma questão aberta.
Uma voz: - É que está outra na forja.
O Orador: - Ha porventura algum projecto em que houvessem de definir se mais rigorosamente os termos, em que mais cuidados devam ser as auctorisações? (Apoiados.)
Por mais esclarecida que seja a opinião de todos nós, ha alguem, a não ser o governo, que saiba o que se deva prometter, visto que só elle sabe o que póde integralmente cumprir-se? E quando só elle conhece os termos das negociações, o limite dos exigencias dos credores, as possibilidades do convenio a fazer, quando só elle póde precisar com rigor e determinar com exactidão até onde podem ir os nossos compromissos, é o governo que vem dizer-nos que isto é uma questão aberta! (Apoiados.)
Como explicar esta especie de desinteresse do governo n'um assumpto em que todos vêem que é mister o maximo cuidado e a maxima reserva? (Apoiados.)
Isto é, a meu ver, a demonstração da errada orientação seguida pelo governo e do como longo de ter em vista fazer uma obra de regeneração nacional e financeira, mira apenas a poder conseguir a sua commodidade de occasião, não se importando em transformar o futuro do paiz em negros dias de miseria e de amargura. (Apoiados.) É o emprestimo!
Questão aberta para nós, questão aberta para os credores a quem se darão todas as garantias, todas as consignações, todas as hypotheses, sujeitando-nos a todos os sacrificios, a todas as humilhações! (Apoiados.)
Emprestem-nos dinheiro, dêem-nos dinheiro para que possamos viver vida descuidada e alegre, para que possamos passar jovialmente os dias da nossa vida ministerial e tambem alegrar os amigos com na larguezas dadivosas da nossa generosidade. (Apoiados.) Entregam-se todos as garantias, obedece-se a todas as imposições desde que nos dêem dinheiro, o dinheiro que embalde procurámos no assucar, nos tabacos; nos phosphoros, nos caminhos de ferro, o dinheiro que tem sido a unica preoccupação, o unico desejo, o unico norte, a obcecação do governo.» (Apoiados.)
Sujeitar a tudo para conseguir um emprestimo, porque a verdade é esta, do emprestimo espera s. exa. resultados maravilhosos e extraordinarios. Mas depois, quando se gastar o dinheiro? (Apoiadas.)
O sr. ministro da fazenda já tem a sua resposta formulada, porque diz no seu relatorio.
(Leu.)
É singular que um espirito tão esclarecido e robusto
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não possa libertar-se d'esta estranha obcecação. (Apoiados.)
Eu tenho pelo sr. ministro da fazenda toda a consideração e respeito; o respeito e a consideração que os mais novos devem aos que são mais velhos, a consideração que merece um homem que affirma brilhantemente nas lides parlamentares o alto valor da sua palavra e da sua inteligencia, o respeito devido a todos os que n'esta hora ingrata, eriçada de difficuldades e cheia de perigos, têem sobre os seus hombros o pesado encargo de administrar e gerir os negocios publicos; mas por serem estes os meus sentimentos e reconhecer em s. exa. tão admiraveis dotes, é que todos nos temos o direito de exigir-lhe mais alguma cousa do que aquillo que até hoje nos tem dado. (Apoiados.)
Lamentaveis e tristes devem então ser as condições do nosso paiz para que um homem de tão reconhecido talento, a quem acabo de prestar a minha sincera e humilde homenagem, não consiga encontrar outros meios, que não sejam estes tristes expedientes. (Apoiados.)
Ainda ha outra preciosa declaração do illustre deputado, que, quero crer, só por equivoco a fez s. exa. e não porque traduzisse fielmente o que se passou.
S. exa. não duvidou affirmar aqui que foi o governo quem offereceu espantaneamente como caução os nossos rendimentos alfandegarios!
Se isto é verdade, ao menos não se diz, e o pratical-o seria um verdadeiro crime! (Apoiados.)
Permitia-me v. exa. e a camara a vaidade de lhe fazer esta indicação: que não mais se compare aqui a situação de uma nação com a situação de um individuo, que não mais se diga que é completamente indifferente para uma nação devedora garantir os seus creditos com a consignação de rendimentos especiaes! (Apoiados.) Não, para que alguem não presuma que ha quem, com sangue e coração portuguez, herdeiro dos que gloriosamente affirmaram na historia da humanidade a fina tempera dos seus brios, não reconheça o doloroso da affronta e não sinta nas faces o vergão da immerecida injuria.
Podiamos fazel-o violentados pela imposição de estranhos, avergando ao peso de pressões alheias, acorrentados por inconfessaveis violencias, podiamos fazel-o apesar de através de uma dolorissima crise termos cumprido honrada e lealmente os nossos compromissos; mas espontaneamente por nossa vontade, nunca! (Apoiados.) Era uma vergonha e uma infamia. Não póde nem deve ser verdadeira a extraordinaria declaração do illustre deputado, porque isso deshonraria, não só o governo, mas o paiz inteiro. (Apoiados.)
Não tenho que entrar na parte financeira do projecto, não só porque sou absolutamente incompetente no assumpto, mas tambem porque não me chamava para esse lado a argumentação do illustre deputado que me precedeu no debate, e muito menos o que a esse respeito se encontra no parecer do projecto em discussão.
Quanto se destaca singularmente d'este projecto o que ha dois dias ouvi ler n'esta casa e foi apresentado pelo sr. conde de Burnay, representante do governo no trabalho de sondagem que foi fazer aos nossos credores no estrangeiro!
Não sei eu se s. exa. quiz ou não fazer uma censura directa ao sr. ministro da fazenda, não sei! O que é certo é que o relatorio do seu projecto está tão repleto de cifras, de dados, de algarismos, que faz um contraste evidente com a proposta apresentada pelo governo, o tal projecto grave e serio submettido á nossa discussão! (Apoiados.)
Como podia eu entrar na discussão financeira d'este parecer tamanino, parecer que não contém uma unica cifra alem da data? (Apoiados.)
Eu não quero abusar por mais tempo da paciencia da camara, nem retardar-lhe o prazer de ver encerrada a discussão do artigo l.º Não quero suspender por mais tempo as iras do apagador. (Riso.) Devo, porém, dizer convicta e sinceramente a v. exa. que eu entendo que este projecto não consegue cimentar solidamente a obra da nossa regeneração financeira, apagar para, sempre os vestigios dos nossos desatinos e loucuras passadas, e quando muito poderá apenas alongar e protelar, como balão de não em labios de moribundo, a agonia estertorosa da nação.
Tenho dito.
Vozes: - Muito bem.
(O orador foi cumprimentado.)
O sr. Frederico Laranjo: - Mando para a mesa o seguinte
Requerimento
Requeiro a v. exa. que consulte a camara sobre se julga sufficientemente discutida a materia do artigo 1.° do projecto em discussão e os seus paragraphos = O deputado, José Frederico Laranjo.
Foi approvado.
O sr. Dantas Baracho: - Mando para a mesa o seguinte
Requerimento
Requeiro que v. exa. se digne ler a inscripção dos srs. deputados que tinham pedido a palavra. = S. Baracho.
O sr. Presidente: - Estavam ainda inscriptos contra o projecto os srs. Cabral Moncada, Avellar Machado, Guimarães, Luiz Osorio e Marianno de Carvalho; e a favor os srs. conde de Burnay e Elvino de Brito.
Agora peço a attenção da camara. Es tão na mesa tres moções de ordem, a proposta de questão previa apresentada pelo sr. Dantas Baracho e a proposta de substituição apresentada pelo sr. conde de Burnay. Segundo a declaração do sr. relator do projecto, as propostas enviadas para a mesa, incluindo as do sr. Dias Ferreira e conde de Burnay, vão á commissão para ahi serem apreciadas; assim o ficou entendendo a camara, e creio que assim o resolveu. N'estas condições julgo approvado que a proposta do sr. conde de Burnay, como todas as outras, vão á commissão sem prejuizo da votação dos artigos a que respeitam.
Agora vou submetter á votação da camara a proposta da questão previa.
Leu-se na mesa. É a seguinte
Moção
A camara, reconhecendo a conveniencia de uma conversão dos titulos de divida externa em condições que, assegurando a possivel satisfação aos portadores d'esses titulos, elles sejam compativeis com a dignidade da nação e com as circumstancias do thesouro; mas não podendo, ante as declarações do governo, tomar desde já uma definitiva resolução no assumpto, e não devendo comprometter o exito de negociações tão importantes com qualquer antecipada e prejudicial deliberação, espera se chegue a um accordo que, n'aquelles termos impreteriveis, possa ulteriormente ser approvado pelas côrtes. = J. E. de Moraes Sarmento = Luciano Monteiro = Teixeira de Sousa = Teixeira de Vasconcellos = J. G. Pereira dos Santos = Sebastião Baracho.
O sr. Teixeira de Sousa: - Eu queria simplesmente significar a v. exa. que me não conformava com a resolução que tomou ácerca das propostas á que v. exa. se referiu; mas terei occasião de dizer o que penso a este respeito quando forem submetidas á votação.
Creio que v. exa. vae pôr á votação a proposta do sr. Baracho e n'esse caso peço a palavra para um requerimento.
O sr. Presidente: - Tem v. exa. a palavra.
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O sr. Teixeira de Sousa: - Mando para a mesa o seguinte
Requerimento
Requeiro a v. exa. que consulto a camara se quer votação nominal sobre a moção do sr. Baracho. = Teixeira de Sousa.
Foi approvado.
Fez-se a chamada.
Disseram approvo os srs.: - Adolpho Guimarães, Lopes de Carvalho, Teixeira de Sousa, Henrique Mendia, Ferreira da Cunha, Teixeira de Vasconcellos, Mello e Sousa, Avellar Machado, Dias Ferreira, Simões Baião, Moraes Sarmento, Pereira dos Santos, Figueiredo Mascarenhas, Malheiro Reimão, Luciano Monteiro, Dantas Baracho.
Disseram rejeito os srs.: - Abel da Silva, Adriano Anthero, Alexandre Paes do Amaral, Alfredo Le-Cocq, Alfredo Cesar de Oliveira, Alvaro de Castallões, Eduardo Villaça, Antonio Paes do Amaral, Menezes e Vasconcellos, Simões dos Reis, Arnaldo Guedes Rebello, Arthur Montenegro, Augusto José da Cunha, Carlos Ferreira, Carlos José de Oliveira, Conde do Alto Mearim, Conde de Burnay, Conde da Serra de Tourega, Conde de Silves, Elvino de Brito, Eusebio Nunes, Veiga Beirão, Mattoso Côrte Real, Dias Costa, Lacerda Ravasco, Francisco Manuel de Almeida, Vilhegas do Casal, Ressano Garcia, Gaspar Ribeiro, Henrique Kendall, Abreu Lima, Ribeiro Coelho, Santiago Gouveia, João de Mello, Ferreira da Fonseca, Joaquim Veiga, Joaquim Tello, Oliveira Baptista, Simões Ferreira, Fortuna Rosado, Almeida Pessanha, Cruz Caldeira, Abreu Castello Branco, Frederico Laranjo, Silva Amado, Oliveira Matos, Mathias Nanes, Lourenço Cayola, Poças Falcão, Luiz José Dias, Espregueira, Manuel Telles de Vasconcellos, Martinho Tenreiro, visconde do Melicio, Frederico Alexandrino Garcia Ramires, Joaquim Paes de Abranches, Eduardo José Coelho.
O sr. Presidente: - Está, portanto, rejeitada por 58 votos contra 16.
Ha duas moções de ordem sobre a mesa, uma apresentada pelo sr. Villaça e outra pelo sr. conde de Burnay. Ha tambem uma proposta do sr. Dias Ferreira.
As moções serão votados pela sua ordem e os propostas ou se votam conjunctamente com os artigos a que respeitem, ou irão á commissão se a camara assim o resolver.
O sr. Adriano Anthero (relator): - Lembro a v. exa. que a camara resolveu já que tanto a emenda apresentada pelo sr. Dias Ferreira como o projecto apresentado pelo conde de Burnay, o qual mesmo s. exa. considerou tambem como emenda, e nem assim quaesquer outras emendas que se apresentassem fossem enviadas á commissão para ali serem devidamente apreciadas.
O sr. Presidente: - Eu tambem assim o tinha entendido, mas queria que a camara o ratificasse.
Vou pôr á votação da camara a moção apresentada pelo sr. Villaça.
Vae ler-se.
Leu-se na mesa, É a seguinte
Moção de ordem
A camara, cooperando com o governo no patriotico empenho de resolver honrada e equitativamente a questão dos credores externos, passa á ordem do dia = O deputado, Antonio Eduardo Villaça.
Foi approvada.
O sr. Presidente: - Reputo prejudicada a moção do sr. conde de Burnay.
Vae votar-se o artigo 1.º, que não importa prejuizo das propostas que vão á commissão.
O sr. Teixeira de Sousa (sobre o modo de propor): - Eu tenho a mais alta consideração pela maneira distincta como v. exa. tem presidido a esta camara; mas devo declarar que me parece que v. exa. no caso de que se trata, labora n'um pequeno equivoco.
O sr. conde de Burnay mandou para a mesa um projecto de substituição áquelle que se tem discutido. O projecto de substituição foi lido na mesa. V. exa. consultou a camara sobre se o admittia, e a camara n'esse sentido resolveu.
Em seguida o meu illustre amigo o sr. relator pediu a v. exa. que remettesse á commissão todas as emendas que porventura fossem apresentadas ao projecto.
Eu devo dizer a v. exa. que me parece haver um equivoco quando se diz que a camara resolveu n'esse sentido. Mas parece-me que sem uma manifestação da camara, em face do regimento, não podia resolver ácerca da substituição do sr. conde de Burnay.
Eu peço a attenção de v. exa. para a disposição do artigo 141.°
(Leu.)
Eu não venho discutir agora se o projecto mandado para a mesa pelo sr. conde de Burnay é ou não uma substituição.
O sr. Presidente: - O sr. deputado tem unicamente a palavra para mandar para a mesa a proposta, e está a fundamental-a.
O Orador: - Não posso proceder de outra maneira. O que eu queria dizer é que v. exa., referindo-se ao projecto do sr. conde de Burnay, mais de uma vez lhe chamou substituição.
Eu não tenho duvida alguma em admittir que esse projecto é uma completa substituição.
Se assim é - pergunto eu - votado o projecto que está em discussão, não fica prejudicada a substituição do sr. conde de Burnay? Fica ou não fica?
Na minha opinião, parece-me que a substituição do sr. conde de Burnay fica prejudicada com a votação do projecto. (Apoiados.)
A este respeito não ha nenhuma resolução da camara, nem me pareço que n'esta altura a possa haver. N'esta altura v. exa. só tem de proceder á votação do projecto; não póde dar a palavra senão sobre o modo de propor ou de votar.
O que v. exa. tem a fazer é, em primeiro logar, segundo o regimento, propor á votação o projecto, e, votado elle, está prejudicada a substituição.
Assim é que eu entendo. Mas em todo o caso desejava que v. exa. me dissesse o que pensa a tal respeito.
O sr. Presidente: - Parece-me que v. exa. labora n'um equivoco. Quando se apresentou o projecto ou substituição, ou proposta de substituição ao projecto em discussão, a mesa, bem ou mal, classificou isso de uma proposta de substituição.
Não houve reclamação. Desde o momento que a proposta de substituição foi approvada pela camara, ipso jure regimentalmente fallando, ficou em discussão conjunctamente com o projecto.
O sr. relator levantou-se e pediu que esta proposta de substituição ou qualquer outra que fosse apresentada sobre o debate fossem remettidas á commissão respectiva, para ella as apreciar, é claro e evidente sem prejuizo da votação dos artigos do projecto em discussão.
O projecto de substituição e qualquer outro será apreciado pela commissão, mas não implica nem impede que se vote o projecto em discussão, por isso que, mais tarde, ha de voltar á discussão o parecer de commissão, em harmonia com as conclusões a que chegarem n'essa discussão. Foi o que se fez ha poucos dias na questão dos celleiros communs.
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É uma deliberação da camara, que reputo definitiva.
O sr. Teixeira de Sousa: - Isso é que é o equivoco, e peço perdão a v. exa., mas...
O sr. Presidente: - Eu já declarei que a camara votou.
O sr. Teixeira de Sousa: - Então votou-se ou não a substituição do projecto?
O sr. Presidente: - A proposta do sr. Burnay, assim como todas as outras que se apresentaram, são enviadas á commissão para as apreciar.
O sr. Teixeira de Sousa: - Mas v. exa. não póde mandar á commissão a substituição.
Tenho muito respeito por v. exa., mas pratica um acto inteira e absolutamente arbitrario.
O sr. Presidente: - Peço desculpa a v. exa., mas a camara é que é o regimento desde que dispensou o regimento n'esta parte.
A camara deliberou que a substituição fosse á commissão, para ahi ser considerada, e portanto a approvação do artigo 1.° não implica o prejuizo das propostas, que não são submettidas á votação da camara.
É uma resolução definitiva, em que não posso estar em duvida.
O sr. Teixeira de Sousa: - Isso é arbitrario, e nós não podemos deixar ir isso assim.
O sr. Presidente: - V. exa. pede a palavra para explicações, no fim da sessão, ou invoca a disposição do regimento para se verificar se o presidente cumpriu ou não o seu dever.
Vae ler-se o artigo 1.° para se votar.
Leu-se. É o seguinte:
Artigo 1.° É o governo auctorisado a fixar, por accordo com os portadores de titulos da divida fundada externa, actualmente sujeita ao regimen da lei de 20 de maio de 1893, novas condições relativas ao capital, juro e amortisação d'essa divida, comtanto que o encargo resultante d'esse accordo não seja superior ao que provem da execução da referida lei.
§ 1.° A amortisação da parte da mencionada divida, que é amortisavel, far-se-ha por sorteio ou por compra no mercado, conforme mais convier ao thesouro, mas de maneira a resgatar-se sempre, em cada semestre, pelo menos o numero de titulos necessarios para que a extincção total da divida se realise nos prasos estipulados nos proprios titulos.
§ 2.° A importancia que o thesouro economisar, em cada semestre, pelo facto da amortisação dos actuaes titulos amortisaveis se effectuar por compra no mercado, será applicada á amortisação dos titulos da divida externa consolidada, tambem por compra no mercado.
§ 3.° Desde que se torne effectivo o referido accordo, serão os seus termos impressos, nos proprios titulos da divida externa, podendo a respectiva folha de coupons ser substituida por outra com os juros reduzidos. Este serviço realisar-se-ha nas praças de Londres, París, Berlim, Amsterdam e Bruxellas, correndo todas as despezas por conta do governo portuguez.
O sr. Avellar Machado: - Mando para a mesa o seguinte
Requerimento
Requeiro v. exa. se digne consultar a camara se quer que haja votação nominal sobre o artigo 1.° do projecto. = Avellar Machado, deputado por Abrantes.
O sr. Teixeira de Sousa: - Eu tinha pedido a palavra para antes de se votar o artigo 1.° e não para explicações antes de se encerrar a sessão.
V. exa. quer-me dar agora a palavra?
O sr. Presidente: - Ainda não.
O sr. Teixeira de Sousa: - Requeiro a v. exa. que dê cumprimento ao artigo 141.°
O sr. Presidente: - Os srs. deputados que entendem que a presidencia não cumpriu o seu dever...
Vozes da esquerda: - Não é isso, não é isso.
O sr. Presidente: - O sr. Teixeira de Sousa quer ainda a palavra?
O sr. Teixeira de Sousa: - Para que!
O sr. Presidente: - Segue-se a discussão do artigo 2.°; mas a hora está adiantada e alguns srs. deputados pediram a palavra para explicações para antes de se encerrar a sessão. Não me parece, portanto, que deva entrar hoje em discussão esse artigo, visto terem de se interromper os trabalhos parlamentares por alguns dias.
Por isso dou por terminada hoje a discussão do projecto, e vou consultar a camara sobre se consente que o sr. Barbosa Vieira use da palavra para explicações.
Vozes: - Falle, falle.
O sr. Presidente: - Dou a palavra ao sr. Barbosa Vieira.
O sr. Abreu e Lima: - Pediu a palavra, porque, tendo-se-lhe afigurado que o sr. Teixeira de Sousa se lhe referira quando usára da palavra antes da ordem do dia, queria declarar que, estando a conversar com um seu collega, não dera motivo a essa referencia.
(O discurso será publicado na integra, quando o orador restituir as notas tachygraphicas.)
O sr. Teixeira de Sousa: - Declara que não foi a s. exa. que se dirigiu.
(O discurso será publicado na integra, quando o orador restituir as notas tachygraphicas.)
O sr. Luciano Monteiro: - Pergunta ao sr. presidente do conselho quaes são as intenções do governo, em face da resolução do tribunal arbitral, que se deu por incompetente para julgar do litigio levantado entre o governo e a companhia dos tabacos.
(O discurso será publicado na integra quando o orador restituir as notas tachygraphicas.)
O sr. Presidente do Conselho de Ministros (José Luciano de Castro): - Visto que o illustre deputado se dirigiu a mim, não tenho duvida em responder á pergunta que s. exa. me fez.
Eu não tenho conhecimento official da resolução do tribunal e desde que digo isto, é claro que não tenho conhecimento dos fundamentos d'esta resolução. É natural que ella seja communicada ao governo officialmente, e então este tomará a deliberação que julgar mais conveniente para dar satisfação á promessa que fez, podendo s. exa. estar certo de que o governo ha de cumprir o seu dever.
(S. exa. não reviu.)
O sr. Teixeira de Sousa: - V. exa. comprehende que eu estava obrigado a dar explicastes ácerca da minha insistencia em que fosse cumprido o artigo 141.º do regimento.
Fique bem assente que eu, levantando qualquer duvida sobre a execução do regimento, não tinha a menor intenção de melindrar v. exa., que muito considero e respeito. (Apoiados.) Não é isto uma affirmação banal, é a expressão de um sentimento verdadeiro.
Devo, porém, dizer que nós, minoria; reconhecemos que por qualquer conveniencia do governo não foi cumprido o regimento (Apoiados.) E eu, em nome dos meus amigos politicos, declaro que protesto contra a resolução tomada, e estamos convencidos de que se fez uma infracção do regimento para fins que interessam ao governo, (Apoiados.) e que nós mais tarde apreciaremos.
E depois de fazer este protesto, só tenho a acrescentar que, com a insistencia em mandar o projecto do sr. conde de Burnay á commissão de fazenda, nós alguma cousa ficámos percebendo. (Apoiados.)
(S. exa. não reviu.)
O sr. Presidente: - Devo ponderar muito respeito-
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SESSÃO N.º 21 DE 17 DE FEVEREIRO DE 1898 357
samente ao illustre deputado que, se a presidencia não cumpria rigorosamente o regimento, foi por não ter sido mandado para a mesa um requerimento nos termos precisos do regimento.
É possivel que eu me equivocasse, mas estou convencido de que cumpri integralmente o regimento. (Apoiados.)
Por duas vezes me dirigi á camara sobre as substituições apresentadas ao artigo 1.° e designadamente sobre o projecto de substituição do sr. conde de Burnay, e a camara, em harmonia com a declaração do sr. relator, por differentes vezes ratificou que este projecto e quaesquer outras propostas de substituição fossem á commissão, para lá serem apreciadas. (Apoiados.)
Desde o momento em que a camara, por mais de uma vez, tomou esta resolução, devia propor á camara a approvação da substituição.
Dou esta explicação para mostrar que procurei cumprir imparcialmente o regimento. (Apoiados.)
A primeira sessão é no dia 24 e dou para ordem do dia a continuação da de hoje, isto é, o artigo 2.º seguintes do projectos, e mais os projectos n.º 6, convenção sanitaria de París, e n.° 7, convenção com a Belgica.
Está levantada a sessão.
Eram seis horas e vinte minutos da tarde.
Representação mandada para a mesa
Dos representantes das associações de classe e cooperativas operarias do Porto e Villa Nova de Gaia contra o decreto de 31 de dezembro de 1897, que deu nova fórma ao lançamento e cobrança de algumas taxas da contribuição industrial.
Apresentada pelo sr. presidente da camara Eduardo José Coelho, enviada á commissão de fazenda e mandada publicar no Diario do governo.
O redactor = Sá Nogueira.