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SESSÃO DE 4 DE FEVEREIRO DE 1885

Presidencia do exmo. sr. Luiz Frederico de Bivar Gomes da Costa

Secretarios - os exmos. srs.

Francisco Augusto Florido de Mouta e Vasconcellos
Augusto Cesar Ferreira de Mesquita

SUMMARIO

Dá-se conhecimento de nove officios de diversos ministerios e de um da presidencia do conselho. - Téem segunda leitura e são admittidas cinco propostas para renovações e iniciativa de diversos projectos de lei. - Representação apresentada pelo sr. presidente e mandada publicar no Diario do Governo.- Justificações de faltas dos srs. Adolpho Pimentel, Wenceslau de Lima e barão de Ramalho. - O sr. visconde de Reguengos manda para a mesa o diploma do sr. deputado eleito, Julio de Vilhena. - Apresentação dos pareceres relativos às eleições supplementares de Beja e Leiria e á eleição de Quilimane. - É julgada a urgencia e são approvados. - Proclamação dos srs. Julio de Vilhena e Elvino de Brito. - Suspende-se a sessão por não estar ainda presente o governo. - Reaberta, usa da palavra o sr. presidente do conselho para dar explicações sobre a crise parcial do ministerio. - Segue-se o sr. Braameamp, fazendo declarações contrarias ao governo e no sentido de não o terem satisfeito as explicações do sr. presidente do conselho. - Responde-lhe o sr. ministro da fazenda. - O sr. Lopo Vaz confirma as declarações do governo.- E introduzido na sala e presta juramento o sr. Julio de Vilhena. - Tomam ainda, parte na discussão sobre a crise os srs. Barros Gomes, presidente do conselho, Correia de Barros e ministro da fazenda. - A pedido do sr. Pequito, são aggregados á commissão das reformas politicas os srs. Lopo Vaz e Julio de Vilhena. - Os srs. Navarro, ministro da fazenda e Alves Matheus usam ainda da palavra sobre a questão da crise. - O sr. Consiglieri Pedroso pede informações ao governo sobre a veracidade do facto, constante de um telegramma, de terem os portuguezes tomado posse das duas margens do Zaire. - Responde-lhe o sr. ministro da marinha, trocando-se, ainda depois, entre o mesmo sr. ministro e os srs. deputados Consiglieri e Navarro, algumas palavras sobre este incidente. - Por ser tarde não se entra na ordem do dia.

Abertura - Ás duas horas e meia da tarde.

Presentes á chamada - 66 srs. deputados.

São os seguintes: - Lopes Vieira, Agostinho Fevereiro, Albino Montenegro, A. da Rocha Peixoto, Silva Cardoso, Sousa e Silva, Pereira Corte Real, Antonio Centeno, Garcia Lobo, A. J. d'Avila, Antonio Ennes, Moraes Machado, Santos Viegas, Sousa Pavão, Almeida Pinheiro, A. Hintzc Ribeiro, Urbano de Castro, Augusto Poppe, Fuschini, Pereira Leite, Avelino Calixto, Barão de Ramalho, Lobo dÁvila, Conde de Thomar, Conde de Villa Real, E. Coelho, Emygdio Navarro, Sousa Pinto Basto, Fernando Geraldes, Firmino Lopes, Vieira das Neves, Correia Barata, Mouta e Vasconcellos, Francisco de Campos, Mártcns Ferrão, Frederico Arouca, Guilherme de Abreu, Matos de Mendia, Augusto Teixeira, Souto Rodrigues, J. Alves Matheus, Ponces de Carvalho, J. J. Alves, Coelho de Carvalho, Amorim Novaes, Correia de Barros, Ferreira de Almeida, José Borges, Laranjo, Lobo Lamare, Figueiredo Mascarenhas, Ferreira Freire, Oliveira Peixoto, Lopo Vaz, Luiz de Lencastre, Luiz Ferreira, Bivar, Luiz Dias, Luiz Jardim, Manuel d'Assumpção, Aralla e Costa, M. P. Guedes, Martinho Montenegro, Miguel Dantas, Miguel Tudella, Pedro de Carvalho, Gonçalves de Freitas, Sebastião Centeno, Vicente Pinheiro, Visconde das Laranjeiras, Visconde de Reguengos e Consiglieri Pedroso.

Entraram durante a sessão os srs.: - Adolpho Pimentel, Adriano Cavalheiro, Agostinho Lucio, Moraes Carvalho, Garcia de Lima, Anselmo Braamcamp, Alfredo Barjona de Freitas, Antonio Candido, A. J. da Fonseca, Lopes Navarro, Pereira Borges, Cunha Bellem, Fontes Ganhado, Jalles, Carrilho, A. M. Pedroso, Pinto de Magalhães, Seguier, Ferreira de Mesquita, Neves Carneiro, Bernardino Machado, Caetano de Carvalho, Sanches de Castro, Cypriano Jardim, Ribeiro Cabral, Góes Pinto, E. Hintze Ribeiro, Estevão de Oliveira, Filippe de Carvalho, Francisco Beirão, Castro Corte Real, Wanzeiler, Barros Gomes, Sant'Anna e Vasconcellos, Silveira da Motta, Costa Pinto, Baima de Bastos, J. A. Pinto, J. A. Valente, Melicio, Scarnichia, Franco Castello Branco, João Arroyo, Ferrão de Castello Branco, Sousa Machado, Joaquim de Sequeira, Simões Ferreira, Teixeira de Sampaio, Avellar Machado, Azevedo Castello Branco, Dias Ferreira, Elias Garcia, Pereira dos Santos, José Luciano, Pinto de Mascarenhas, Julio de Vilhena, Reis Torgal, Luiz Osorio, M. da Rocha Peixoto, Pinheiro Chagas, Marçal Pacheco, Mariano de Carvalho, Pedro Correia, Santos Diniz, Rodrigo Pequito, Pereira Bastos, Tito de Carvalho, Visconde de Alentem, Visconde de Ariz e Visconde do Rio Sado.

Não compareceram á sessão os srs.: - Augusto Barjona de Freitas, Ferreira Braga, Teixeira do Vasconcellos, Ribeiro dos Santos, J. A. Neves, José Frederico, J. M. dos Santos, Simões Dias, Lourenço Malheiro, Correia de Oliveira, Manuel de Medeiros, Guimarães Camões, Pedro Franco, Pedro Roberto, Dantas Baracho e Visconde de Balsemão.

Acta. - Approvada.

EXPEDIENTE

Officios

1.° Da presidencia do conselho de ministros:

Illmo. e exmo. sr. - Tenho a honra de participar a v. exa. para conhecimento da camara dos senhores deputados da nação portugueza, que, por decretos datados de hoje, houve Sua Magestade El-Rei por bem conceder a exoneração, que lhe pediram, os conselheiros Lopo Vaz de Sampaio e Mello, do cargo de ministro e secretario d'estado dos negocios ccclesiasticos e de justiça, e Antonio Augusto de Aguiar, do cargo de ministro e secretario (Testado dos negócios das obras publicas, commercio e industria.

Dignando-se outrosim o mesmo augusto senhor, por decretos da referida data, nomear-me interinamente ministro dos negócios das obras publicas, commercio o industria, o ao conselheiro Augusto Cesar Barjona de Freitas, ministro e secretario (Testado dos negócios do reino, ministro interino dos negócios ecclcsiasticos e de justiça.

Deus guarde a v. exa. Presidência do conselho do ministros, em 4 de fevereiro de 1885. - Illmo. e exmo. sr. presidente da camara dos senhores deputados da nação portugueza. = Antonio Maria de Fontes Pereira de Mello.
Inteirada.

2.° Do ministerio do reino, remettendo o mappa indicativo dos contratos que se realisaram por este ministerio no anno de 1884, e cujo valor foi superior a 500:$000 réis.

A commissão de fazenda.

3.° Do mesmo ministerio, remettendo, em satisfação ao requerimento do gr. Eduardo José Coelho, vários documentos em relação ao districto de Villa Real.

A secretaria.

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4.° Do ministerio da marinha, remettendo mais 25 exemplares das tabellas da receita e despeza das provincias ultramarinas para o anno economico de 1884-1885.
A secretaria.

5.° Do mesmo ministerio, remettendo, em satisfação ao requerimento do sr. Vicente Pinheiro, a adjunta copia do officio do curador geral interino dos serviçaes e colonos da provincia de Angola, em que este magistrado dá conta da visita por elle feita ao districto de Mossamedes.

A secretaria

6.° Do mesmo ministerio, remettendo, em satisfação ao requerimento do sr. deputado Vicente Pinheiro, copias dos mappas do effectivo da guarnição da corveta Bainha de Portugal, de estação em Angola, e do movimento da mesma guarnição no mez de fevereiro de 1884.
A secretaria.

7.° Do mesmo ministerio, remettendo as informações originaes relativas ao sargento ajudante da guarnição da provincia de Macau e Timor, Aurelio Victor Xavier.
Á secretaria.

8.º Do mesmo ministerio, remettendo, em satisfação ao requerimento do sr. Ferreira de Almeida, copia dos documentos que dizem respeito ao resgate de 400 indígenas em Mossamedes embarcados no transporte India em novembro do anno próximo passado para Moçambique.
Á secretaria.

9.° Do mesmo ministerio, participando que por aquelle ministerio se não podem dar os esclarecimentos requeridos em sessão de 9 de janeiro pelo sr. Ferreira de Almeida, por se referirem a abonos de vencimentos feitos por outros ministerios.
Á secretaria.

10.° Do mesmo ministerio, remettendo, em satisfação ao requerimento do sr. Ferreira de Almeida, documentos relativos á compra de armamentos e às construcções de navios, auctorisadas pelas cartas de lei de 10 de abril de 1874 o de 12 de abril de 1877, construcção e armamento de novas canhoneiras a vapor e despeza feita em Inglaterra com o fabrico do transporto Africa.
Á secretaria.

Segundas leituras

Propostas para renovação de iniciativa de projectos de lei

1.ª Renovo a iniciativa do projecto de lei n.° 4G-A, apresentado na sessão de 31 de março de 1883, pelo sr. Luciano Cordeiro, prohibindo a preparação e importação de medicamentos de composição desconhecida, não incluídos na pharmacopêa portugueza.

Sala das sessões, em 31 de janeiro de 1885.= J. J. Alves, deputado por Lisboa.

Lida na mesa foi admittida e mandada enviar á commissão de fazenda, ouvida a de saude.

O projecto a que se refere esta proposta é o seguinte:

Senhor. - Mais uma vez se tem feito ouvir no seio do parlamento n'estes ultimos dias, queixas e reclamações justissimas relativamente, não á liberdade da introducção no uso therapeutico de medicamentos de composição desconhecida liberdade que, quando não regulada convenientemente, seria, já de si, absurda e perigosa - mas á verdadeira e inaudita licença que por omissão de lei, e não pouco tambem por desleixo e abuso de muitos que deveriam ser dos primeiros a respeital-a e cumprir, se tem estabelecido neste assumpto de tão delicada e transcendente importancia publica.

Bastara que os medicamentos secretos ou de composição duvidosa e desconhecida, recusassem por este seu particular caracter, as mais rudimentares garantias, não já de efficacia, mas de innocividade, á applicação e ao critério therapeutico, para que o estado, em nome o em defeza da saude publica, não devesse conferir-lhes uma liberdade, que, por um lado seria a legitimação da fraude, e por outro o criminoso abandono da saude e da vida dos cidadãos.

Mas quando se reconhece e evidenceia que os medicamentos secretos e de composição desconhecida originam e constituem, como succede hoje em relação a Portugal, uma larga exploração de falsificação e de burla que, sem se preoccupar com a vida das multidões, cuja ignorância ou boa fé surprehende, affronta e perturba o exercicio legal; a própria imputação honrada daquellas industrias, a que a lei por interesse e segurança geral impõe ciosamente garantias e responsabilidades excepcionaes e onerosas, como são a pharmacia e a clinica, parece-me que não póde hesitar-se conscienciosamente em adoptar uma medida decisiva, severa e pratica que ponha termo a esta perigosa situação.

E é tão somente, devo dizel-o, por suggestão de consciência que ouso trazer-vos a minha idéa. Sei, porém, felizmente que outros poderão acudir-lhe, levantando-a e honrando-a, com uma larga justificação scientifica.

Não ignoro tambem que não basta o que eu proponho, para corrigir o mal que todos sentem e confessam.

E porém uma simples medida defensiva que eu quiz projectar. Outros virão depois.

Não ha muito que perante os tribunaes do seu paiz, um dos mais conhecidos e importantes industriaes de medicamentos secretos ou de composição não formulada, declarou terminantemente que só os falsificava e phantasiava, para a exportação estrangeira. Portugal era um dos seus melhores consumidores.

Defendamo-nos, pois, contra esta singular industria, que põe a sua innocencia ou a sua legitimidade em defraudar as bolsas ou em estragar a saude dos que não têem a fortuna de ser seus compatriotas.

Tenho a honra de propor-vos o seguinte projecto do lei: Artigo 1.° Fica expressamente prohibida a fabricação ou preparação, a importação, a venda, a exposição, a receita ou emprego de medicamentos secretos, ou de composição desconhecida; os uno incluidos na pharmacopêa portugueza, ou não auctorisados legalmente no paiz.

§ único. Os medicamentos não incluídos na pharmacopêa portugueza, ou não auctorisados legalmente, só o poderão ter, precedendo exame chimico-pharmaceo-therapeutico, nos termos da presente lei.

Art. 2.° Em cada uma das cidades de Lisboa, Porto e Coimbra, haverá uma commissão especialmente encarrega-la de proceder ao exame chimico-pharmaceo-therapeutico dos medicamentos que os auctores d'estes, os seus agentes, correspondentes ou representantes desejem fazer auctorisar, ou que o governo entenda dever submetter a esse exame, por motivo de conveniência e de saude publica.

§ 1.° Cada uma d'estas commissões será composta de um chimico, um medico ou cirurgião-medico, que exerça habitualmente a clinica, e um pharmaceutico, nomeados pelo governo, sendo o clinico e o pharmaceutico respectivamente propostos: em Lisboa, pela sociedade de sciencias medicas e sociedade pharmaceutica lusitana, e no Porto pela sociedade união medica e centro pharmaceutico portuguez.

§ 2.° O exame a que se refere este artigo será de preferencia feito nos laboratorios officiaes, gratuitamente, quando ordenado pelo governo; e, quando requerido por particular, mediante o previo pagamento de uma taxa de réis 50$000, para os medicamentos de procedência estrangeira, e de 20$000 réis para os de procedencia nacional.

§ 3.° 50 por cento da taxa constituirão a remuneração

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dos peritos. O restante será cobrado pelo estado como garantia das despezas geraes o especiaes d'este serviço.

§ 4.° Quando qualquer das commissões indicadas tenha reconhecido que um medicamento submettido ao sou exame deve ser approvado, assim o proporá ao governo, motivadamente.

Art. 3.° O governo fará os regulamentos necessarios á execução d'esta lei.

Art. 4.º Fica revogada a legislação em contrario.
31 do março de 1883. = Luciano Cordeiro, deputado.

2.º Renovo a iniciativa do projecto do lei apresentado em sessão de 9 de março de 1875, que tem por fim reorganisar as aulas de pharmacia annexas às escolas medicas de Lisboa, Porto e Coimbra.

Sala das sessões, 31 de janeiro de 1885. J. J. Alves, deputado por Lisboa.

Senhores. - O ensino da pharmacia em Portugal deve á iniciativa do illustre estadista Pasmos, Manuel a sua primeira reforma.

Esta reforma, adequada provavelmente áquella, epocha, e as modificações que lhe foram feitas em 18õ4, estão bem longe de satisfazer as justíssimas aspirações da classe pharmaceutica.

O espirito de imitação, tão pronunciado no nosso paiz pelo que só pratica no estrangeiro, o os progressos da sciencia têem feito crear escolas, institutos, desenvolver os cursos, augmentando-os por meio de cadeiras especiaes; mas em todo este movimento vê-se notavelmente exceptuada a pharmacia portugueza. Para ella subsistem leis anachronicas, promulgadas ha cerca do quarenta annos, que produzem a mais absurda desigualdade no systema, do ensino.

Repugna ao bom senso e causa serio reparo este abandono injustificado, origem da anarchia que se nota nos diversos modos por que actualmente se habilitam os pharmaceuticos.

Appellando para as nações estrangeiras, vemos que nas mais illustradas se tem olhado com desvelo e attenção para esta classe, reputando a sua instrucção não menos importante que a da medicina.

Em todos estes paizes existem escolas especiaes de pharmacia, o em alguns por tal forma desenvolvidas, que esta sciencia constituo uma faculdade.

Todos os homens do sciencia conhecem os bons resultados obtidos em differentes nações pela forma regalar dada ao ensino da pharmacia, o os nomes illustres do verdadeiros sábios, que se têem tornado distinctos como naturalistas e chimicos, ennobrecendo por este modo as escolas que os crearam, o paiz de que são filhos, e a classe pharmaceutica a que pertencem.

No nosso paiz, aonde não se julga conveniente a existência das duas classes do facultativos, não é racional que se permitia o contrario para um outro ramo das sciencias medicas, que não tem menor responsabilidade.

Existem actualmente, posto que em pequeno numero, pharmaceuticos com o curso regular e desenvolvido; outros ha em maior numero habilitados segundo as leis de 29 de dezembro de 1836 e de 12 de agosto do 1804, que lhes facultam o poderem obter diploma, poupando-se á frequência exigida pelas escolas o a um corto numero de preparatórios.

Não obstante reconhecermos que se encontram nesta ultima classe, devido ao natural talento e propensão ao estudo, pharmaceuticos de subida capacidade, constituem estes uma excepção, que não justifica o serem considerados iguaes em habilitações indivíduos tão diversamente instruídos.

Contra tão descurada legislação tem desde muitos annos clamado a benemerita sociedade pharmaceutica lusitana. E em nome d'ella, e como filho que me prezo de ser da mesma classe, que levanto a minha humilde voz a esta camara, pedindo aos meus illustres collogas o seu valioso auxilio, para que se obtenha uma reforma em harmonia com o estado actual da sciencia, que a justiça o a saude publica reclamam.

Uma unica classe de pharmaceuticos habilitados por uma só forma, com um curso superior, adquirido em aulas especiacs annexas às escolas medico-cirurgicas do Lisboa e Porto, e á faculdade do medicina da universidade de Coimbra, é quanto requer a claeso pharmaceutica de accordo com a proposta do corpo docente da escola medica de Lisboa, quando em 1866 foi convidada pelo governo a emittir opinião sobro a reforma do ensino superior.

Longo de pretender agravar as despezas do thesouro, limita se esta classe a pedir a instrucção o consideração a que tem direito, não exigindo escolas especiaes que, dando igual resultado, acarretariam avultada despeza.

Firmado nas rasões expostas, e convencido da urgente necessidade de organização do ensino pharmaceutico em Portugal, tenho a honra de submetter á vossa consideração o seguinte.

Projecto de lei para a reforma das escolas de pharmacia annexas á universidade de Coimbra e às escolas medico-cirurgicas de Lisboa e Porto

Artigo 1.º O curso pharmaceutico é dividido em theorico e pratico.

§ 1.° O curso theorico cumprehende:
1.º Physica;
2.° Chimica inorganica;
3.º Chimica organica e analyse;
4.° Botanica;
5.° Zoologia;
6.° As materias que fazem parte do curso pharmaceutica na escola do pharmacia.
§ 2.º O curso pratico comprehende:

1.º O exercício por tres annos em officina, pharmaceutica legalmente estabelecida, e comprovado por certidão extrahida do livro da matricula das escolas;

2.º A pratica no laboratorio da escola que for determinada pelo respectivo professor durante o anno lectivo.

Art. 2.º O curso pharmaceutico consta das cadeiras o disciplinas seguintes:

1.ª cadeira - Historia natural pharmaceutica; pratica no laboratorio da escola.

2.ª cadeira - Pharmacia theorica e analyse chimica applicada às sciencias medicas; pratica no laboratorio da escola.

Art. 3.º Os alumnos de pharmacia, depois de concluido o curso e tendo obtido approvação em todas as cadeiras que o constituem, serão obrigados a defender uma these, que deverá sor impressa, na qual apresentarão tambem proposições relativas às cadeiras theoricas do curso.

Art. 4.º As disciplinas do que trata, o artigo 2.° serão ensinadas em dois annos e distribuídas do modo seguinte:

1.º anno - 1.ª cadeira.
2.° anno - 2.ª cadeira.

Art. 5.° Fica existindo uma unica classe de pharmaceuticos habilitados n'estas escolas.

Preparatorios para a matricula

Art. 6.° Para a matricula no 1.° anno do curso pharmaceutico são preparatorios:

1.º Curso de portuguez;

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2.° Latim;
3.º Philosophia racional e moral e principios de direito natural;
4.° Lingua franceza;
5.° Mathematica elementar;
6.° Principios de chimica e physica e introdução á historia natural;
7.° Geographia, chronologia e historia.

Art. 7.° Os alumnos que pretenderem matricular-se no 1.° anno do curso pharmaceutico farão os seus requerimentos aos directores das escolas, acompanhados:

1.° Das certidões de approvação, nos lyceus de 1.ª classe do reino, das materias de que trata o artigo antecedente;

2.° De certidões legaes de approvacão, na escola poly-technica, academia polytechnica e faculdade do philosophia da universidade de Coimbra, em chimica orgânica, chimica inorgânica, physica, botânica e zoologia, de que trata o artigo 1.º

Dos exames

Art. 8.° No fim de cada anno lectivo, os alumnos farão exame das materias da cadeira deste anno perante um jury composto de tres lentes pharmaceuticos.

§ unico. No caso de reprovação o alumuo terá a frequentar novamente esse anno.

Art. 9.° Approvados os alumnos em ambos os annos e apresentado o documento authentico em que provem ter satisfeito a pratica exigida no § 2.° do artigo 1.°, farão acto grande, de cuja approvação se lhes passará o competente diploma.

Dos lentes

Art. 10.° Em cada uma das escolas haverá dois lentes proprietarios e um substituto, que farão parte dos conselhos escolares, e pertencerão ao corpo cathedratico, com as mesmas prerogativas, vencimentos e regalias dos demais lentes.

§ unico. O lente substituto servirá no impedimento de algum dos lentes proprietarios, e alem d'isso ajudal-os-ha nos trabalhos praticos.

Art. 11.° Os legares de lentes só poderão ser providos em pharmaceuticos portuguezes, legalmente habilitados com o curso da escola de pharmacia.

Art. 12.° Depois da publicação desta lei nenhum individuo poderá habilitar-se a pharmaceutico, sem que seja pela formula nella estabelecida.

§ unico. Os indivíduos que na data da creacão da escola de pharmacia tiverem quatro annos de pratica registada nas escolas medico-cirurgicas de Lisboa o Porto, ou na universidade de Coimbra, e os preparatórios exigidos na lei de 12 de agosto de 1854, poderão ser admittidos á primeira matricula na escola de pharmacia independentemente das habilitações estabelecidas na presente lei.

Sala das sessões da camara dos senhores deputados, em 9 de março de 1875. = Os deputados, Joaquim José Alves = Mariano de Carvalho = Visconde de Carregoso = Pedro Augusto Franco.

3.º Renovo a iniciativa do projecto de lei apresentado na sessão de 19 de fevereiro do 1884, pelo deputado Francisco José Patricio, applicando as disposições do artigo 7.° do decreto de 2 de janeiro do 1882 aos cónegos que, embora não sendo bachareis formados, tenham satisfeito durante doze annos o onus do ensino theologico era qualquer seminário do reino ou das ilhas adjacentes.

Sala das sessões, em 27 de janeiro de 1885. = P. M. Gonçalves de Freitas.

Lida na mesa, foi admittida e mandada enviar á commissão de legislação civil, ouvida a ecclesiastica.

O projecto a que se refere esta proposta é o seguinte:

Artigo 1.° As disposições do artigo 7.° do decreto de 2 de janeiro de 1862, serão tambem applicaveis aos cónegos

que, embora não sendo bachareis formados, tenham satisfeito durante doze annos o ónus do ensino theologico em qualquer seminário do reino ou das ilhas adjacentes.

Art. 2.° Fica revogada a legislação em contrario.

Sala das sessões, em 19 de fevereiro de 1884. = Francisco José Patricio.

4.ª Renovo a iniciativa do projecto de lei n.° 51, do 1884, relativo á bibliotheca da cidade de Braga.

Sala das sessões, em 28 de janeiro de 1885. = O deputado, José Borges de Faria.

Lida na mesa, foi, admittida e mandada enviar á commissão de instrucção superior, ouvida a de administração publica.

O projecto a que se refere esta proposta é o seguinte:

Projecto de lei n.° 51

Senhores. - A vossa commissão de instrucção superior e especial foi presente a renovação de iniciativa, feita em sessão d'esta camara de 4 de março de 1882, pelo illustre deputado por Espozende, o sr. José Borges Pacheco de Faria, com relação ao projecto do lei, apresentado tambem nesta camara, em 15 de março de 1875, pelo illustre deputado o sr. Jeronymo da Cunha Pimentel, e que se refere á bibliotheca publica da cidade de Braga.

A commissão ponderou attentamente os argumentos, em que se baseia o proponente para demonstrar que o municipio da referida cidade custeia onerosamente aquella bibliotheca, sem que lho assista o justo direito de regulamentar o serviço, nomear o pessoal e fiscalisar o geral aproveitamento d'aquelle fecundo meio de instruccão.

Os despendios feitos pela municipalidade bracharense, a conveniencia geral, o exemplo do que já se deu e se remediou no Porto, as mais singelas normas da rasão e de equidade aconselham a adopção d'aquelle projecto de lei.

Portanto, de accordo com o governo, a vossa commissão é de parecer que seja approvado o seguinte projecto de lei:

Artigo 1.° A bibliotheca publica da cidade de Braga e suas dependências é considerada instituição municipal, ficando para todos os effeitos legaes e de direito na propriedade do respectivo municipio.

Art. 2.° Fica revogada a legislação em contrario.

Sala das sessões da commissão do instrucção superior o especial da camara dos senhores deputados, 28 do março de 1884. = Antonio José Teixeira - José Elias Garcia = Cypriano Jardim = Dr. Bernardino Machado = A. X. Lopes Vieira = Wenceslau, de Lima - Carlos Candido de Brito Côrte Real = J. C. Rodrigues da Costa, relator.

A vossa commissão de administração publica concorda com o parecer da illustre commissão de instrucção superior e especial.

Sala das sessões, 29 de março do 1884. = Ignacio Francisco Silveira da Motta = Luiz de Lencastre - Manuel Aralla = Visconde de Alentem = Manuel d'Assumpcão = Augusto Zeferino Rodrigues = Visconde da Ribeira Brava, relator.

N.° 89-K

Renovo a iniciativa do projecto lei apresentado na sessão de 15 de março de 1875, pelo deputado Jeronymo Pimentel, o que tem por fim tornar municipal a bibliotheca publica da cidade de Braga.

Sala das sessões, em 4 de março de 1882.= O deputado por Espozende, José Borges Pacheco de Faria.

N.° 108-C

Senhores. - A lei do 2 de dezembro de 1841, que organisou a bibliotheca publica da cidade de Braga, determinou que ficassem a cargo do municipio as despezas com o pessoal e conservação d'aquelle estabelecimento, emquanto não fossem mais favoraveis as circumstancias do thesouro.

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Mais de trinta annos são passados e ainda hoje aquellas despezas estão a cargo da camara de Braga. O que parecia temporário e provisorio tornou-se definitivo, sem embargo das reclamações que mais de uma vez áquella camara dirigiu aos poderes do estado.

O municipio tem despendido com a bibliotheca uma quantia muito superior a 20:000$000 réis sem que d'ahi tenham resultado importantes vantagens para o derramamento da instrucção, fim dos estabelecimentos d'aquella ordem.

Este mal tem em grande parte a sua origem na irregular e anomala organisação d'aquella bibliotlicca.

A camara municipal, que pesa com todos os encargos que exige a sua conservação, póde-se dizer que não exerce attribuições algumas a respeito d'aquclle estabelecimento. A sua organisação é a mesma da bibliotheca publica da cidade do Porto. A camara d'esta cidade, reconhecendo os inconvenientes que d'ahi provinham, pediu, por intermedio do seu presidente, que tambem é um dos representantes do Porto n'esta casa do parlamento, que ella fosse considerada para todos os effeitos estabelecimento municipal.

Igual pedido venho hoje fazer para a bibliotheca publica da cidade de Braga, auctorisado pela respectiva camara, a que me honro do presidir.

Só á conta da camara, estão todas as despezas que demanda a conservação d'aquelle estabelecimento, é justo e conveniente que ella tenha a faculdade do escolher o seu pessoal e o direito de o fiscalisar, salva a inspecção superior.

Fiando da justiça da causa e sobretudo da vossa elevada illustração a approvação d'este projecto, tenho a honra de o submetter ao vosso esclarecida exame.

PROJECTO DE LEI

Artigo 1.° A bibliotheca publica da cidade de Braga e suas pertenças passa a ser propriedade do municipio, ficando para todos os effeitos considerada estabelecimento municipal.

Art. 2.º Fica revogada a legislação em contrario.
Sala das sessões da camara, 13 de março da 1875.= Jeronymo da Cunha Pimentel.

5.ª Renovâmos a iniciativa do projecto de lei n.° 100, já approvado por esta camara na sessão de 17 de maio de 1884, e que ficára prudente do igual approvação na camara dos dignos pares, isentando de imposto de tonelagem e de quaesquer outros, e de lazareto, o bem assim de impostos ou taxas de porto e doca, estabelecidos ou a estabelecer, os vapores que procurarem as ilhas adjacentes e os seus portos naturaes ou artificiaes para receberem unicamente carvão para o proseguimento de viagem.

Sala das sessões, em 31 de janeiro de 1885. = Filippe de Carvalho = Arthur Hintze Ribeiro = Antonio Augusto de Sousa e Silva.

Lida na mesa, foi admittida e mandada enviar á commissão de fazenda.

O projecto a que se refere esta proposta é o seguinte:

Projecto de lei n.º 100

Senhores. - Á vossa commissão de fazenda foi presente o projecto de lei n.° 96- E, assignado pelos srs. deputados Filippe de Carvalho, Manuel José Vieira, barão de Ramalho, Antonio José d'Avila, Gonsalves de Freitas, Manuel de Arriaga e Caetano de Carvalho, tendente a isentar de qualquer imposto ou direito de porto, ancoragem ou de doca, os vapores que demandarem as ilhas adjacentes com o único Cm de se abastecerem de carvão.

E a vossa commissão, considerando que já o decreto de 3 de dezembro do 18G8 e as cartas de lei de 27 o 28 de dezembro de 1870 tinham isentado, não só de direitos de tonelagem, mas tambem de impostos sanitarios, os navios de qualquer classe, que entrando nos nossos portos não praticassem nenhuma operação commercial;

Artigo 1.º São isentos de impostos de tonelagem, de quarenta e de lazareto, e bem assim de quaesquer impostos ou taxas de porto e doca, estabelecidos ou a estabelecer, os vapores que procurarem as ilhas adjacentes e nos seus portos, naturaes ou artificiaes, receberem unicamente carvão para proseguimento de viagem.

Art. 2.° não é considerado operação commercial para o pagamento, pelos vapores, dos impostos de porto em vigor, o fornecimento aos mesmos vapores que aportarem as ilhas adjacentes, de artigos conhecidos como «refrescos para consumo de bordo», nem o recebimento de passageiros até ao numero do cinco, que se queiram aproveitar de qualquer vapor que às mesmas ilhas aporte para tomar carvão.

Art. 3.° Fica revogada a legislação em contrario.

Sala da commissão de fazenda, aos 11 de maio de 1884. = Adolpho Pimentel - Antonio de Sousa Pinto de Magalhães - Frederico Arouca - José Gregorio da Rosa Araujo - A C. ferreira de Mesquita - Marçal pacheco - pedro Roberto Dias da Silva - Filipe de Carvalho - L. Cordeiro - Antonio M. P. Carrilho, relator - tem voto do sr. manuel d'Assumpção.

N.º 96-E

Senhores. - No mau estado económico das nossas ilhas da Madeira e dos Açores, cumpre não nos esquecermos de que Portugal tem nos dois archipelagos cerca de 400:000 dos seus filhos, que nos pedem e esperam com confiança tudo quanto depende dos poderes publicos que possa attenuar as grandes dificuldades com que luctam para viver.

Um dos meios que proporcionava interesses importantes às cidades do Funchal, Ponta Delgada e Horta provinha da procura dos seus portos por grande numero de vapores que necessitavam, em viagem, de se fornecer de carvão.

Hoje estes vapores estão sendo convidados a procurarem outros portos, onde, a par de haver tudo quanto convém encontrar no decurso de longas viagens, os forneci-

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360 DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS

mentos de carvão são offerecidos, isentos dos pesados encargos que a legislação impõe nas nossas ilhas. O commercio, como não ignoraes, sabe aproveitar todas as economias. Portugal deve, portanto, facilitar, como fazem outras nações, com grande proveito seu, a procura, aos nossos portos. Só assim poderão os nossos portos insulares concorrer com os outros estrangeiros, fazendo cessar por este modo as enormes perdas que as nossas ilhas estão soffrendo.

O governo conhece cabalmente a necessidade de promptas e efficazes providencias no sentido da que vamos propor-vos, mas, como sabeis, tem-lhe a actual sessão absorvido todas as suas attenções para outros assumptos, que, por serem de interesse geral, não podiam deixar de ter a preferencia na ordem das suas propostas.

Temos, pois, a honra de submetter á vossa illustrada approvação o seguinte projecto de lei:

Artigo 1.° Ficam isentos de toda e qualquer contribuição, direito ou imposto, seja qual for a sua applicação ou denominação, com a unica excepção cio que provier da pauta geral das alfândegas, os vapores que procurarem as ilhas adjacentes, hajam ou não docas de abrigo, e d'ellas se aproveitem para o unico fim de se fornecerem de carvão para proseguimento de viagem.

§ unico. O fornecimento dos artigos, sempre conhecidos sob a denominação de refrescos para consumo de bordo, não é considerado como operação commercial, nem o é o recebimento de passageiros até ao numero de cinco, que se queiram aproveitar de qualquer vapor que aporte sómente para tomar carvão.

Art. 2.° Fica revogada toda a legislação em contrario.

Sala das sessões da camara dos senhores deputados, 9 de maio de 1884. = Filippe de Carvalho = Antonio José d'Avila - Luiz A. Gonçalves de Freitas = Caetano de Carvalho = Manuel de Arriaga = Manuel José Vieira = Barão do Ramalho.

JUSTIFICAÕES DE FALTAS

1.ª Participo a v. exa. e á camara que tenho faltado às ultimas sessões por motivo justificado. = O deputado, Adolpho Pimentel.

2.ª Participo a v. exa. e á camara que o nosso collega e meu amigo Wenceslau Lima tem faltado às ultimas sessões por motivo justificado. = O deputado, Adolpho Pimentel.

3.ª Participo a v. exa. e á camara que por motivo justificado deixei de comparecer às sessões de o 1 de janeiro e de 3 do corrente. = Barão do Ramalho.

O sr. Presidente: - Uma commissão dos empregados de commercio e industria encarregou-me de apresentar á camara uma representação, pedindo a discussão e approvação da proposta de lei relativa aos melhoramentos do porto de Lisboa.

A representação vae ser enviada às commissões de fazenda e obras publicas, e eu consulto a camara sobre se permitte que ella seja publicada no Diario do governo.
Assim se resolveu.

O sr. Visconde de Reguengos: - Mando para a mesa o diploma do sr. Julio Marques de Vilhena, deputado eleito pelo circulo do Beja.

O sr. Consiglieri Pedroso: - Peço a v. exa. me reserve a palavra para quando estiver presente o sr. ministro da marinha ou dos negócios estrangeiros.

O sr. Pereira Leite: - Por parte da primeira commissão de verificação do poderes, mando para a me:- a três pareceres acercas das eleições de Beja, Leiria e Quilimane.

Peço a v. exa. que consulte a camara sobre se dispensa o regimento para que estes pareceres entrem desde já em discussão.

Consultada a camara, resolveu-se afirmativamente.
Leram-se em seguida os pareceres.
São os seguintes:

PARECER N.° 7

Circulo n.° 89.- (Beja)

Senhores.- A vossa commissão do verificação de poderes examinou o processo eleitoral do circulo n.° 89 (Beja), terem entrado na uma 6:103 listas, tendo
e verificou obtido:

Conselheiro Julio Marques de Vilhena .... 6:002 votos
Manuel de Arriaga .... 60 votos
Manuel de Ariaga .... 23 votos
Manuel de Arriaga (advogado).... 10 votos
Dr. José Mendes Lima .... 3 votos
Dr. Antonio José Boavida .... 2 votos
Manuel de Arreiaga .... 2 votos
Dr. José Jacinto Nunes .... 1 votos

O acto eleitoral correu em todas as assembléas com a mesma ordem e regularidade, todavia na assembléa de Moura, cinco cidadãos reclamaram ao constituir-se a respectiva mesa, com o fundamento de que o cidadão Augusto Carlos Fialho e Castro não podia presidir aos trabalhos eleitoraes, visto na véspera ter findado o exercido legal das funcções da commissão de recenseamento, e de que o mesmo cidadão fazia parte, e como esta reclamação não fosse attendida, os srs. cidadãos lavraram o protesto que acha junto ao processo:

Na assembléa de Safara e Amareleja, foram lavrados idênticos protestos contra as constituições (Testas mesas, com os fundamentos acima allegados.

O que tudo visto:

Considerando que, segundo o disposto no artigo 14.° § 4.° da lei de 21 de maio ultimo, são unicamente causas de nullidade as infracções da lei, e as faltas de formalidades que, affectando a essencia do acto eleitoral, possam influir rio resultado da eleição, o que na espécie sujeita se não dá:
E alem d'isto:

Considerando que as prescripções do decreto de 30 de dezembro de 1852, ácerca d'esta materia, foram devidamente cumpridas, como de todo o processo se verifica;

Por todos estes fundamentos, é de parecer a vossa commissão de verificação de poderes, que a eleição seja approvada, e seja proclamado deputado o cidadão mais votado, Julio Marques de Vilhena, que apresentou o seu diploma em forma legal.

Sala das sessões da commissão, 4 de fevereiro de 1885.= Luiz de Lencastre = Frederico Arouca = Firmino João Lopes = Moraes Machado = Pereira Leite, relator.

Foi approvado sem discussão.

PARECER N.° 8

Circulo n.º 144 (Quilimane, 2.º)

Senhores. - Á vossa commissão de verificação de poderes foi presente o processo eleitoral relativo ao circulo n.° 144 (Quilimane, 2.°).

Do exame do processo e da acta de apuramento verifica-se que o numero total dos votantes em todo o circulo foi de 4:632, assim divididos pelas seguintes assembléas:

Bazaruto e Chiloane:

Elvino José de Sousa e Brito .... 72 votos
Luciano Cordeiro .... 65 votos

Tete:

Elvino José de Sousa e Brito .... 5 votos
Luciano Cordeiro .... 102 votos

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SESSÃO DE 4 DE FEVEREIRO DE 1885 361

Sofalla:

Luciano Cordeiro .... 161 votos
Quilimane:
Elvino José de Sousa e Brito .... 65 votos
Luciano Cordeiro .... 397 votos

Inhambane:
Elvino José de Sousa e Brito .... 2:991 votos
Luciano Cordeiro .... 635 votos

o que perfaz o numero de 4:493 votantes, faltando portanto 139 para completar o numero de 4:632, que necessariamente deverão ser os das assembléas de Lourenço Marques e Sena, cujas actas e respectivos documentos não se acham juntos ao processo, nem mesmo consta terem sido remettidos ao ministerio da marinha.

A eleição pelo que se deprehende das actas das differentes assembléas e da acta de apuramento, correu com a máxima regularidade, sendo sem importancia os protestos que na assembléa de Quilimane fizeram os eleitores Daniel Duarte Reis Zagallo, quartel mestre de caçadores n.° 2, e Miguel, por não influírem no resultado da eleição os factos por elles allegados nos seus protestos, não constituindo por isso nullidade, segundo o disposto no artigo 14.°, § 4.°, da lei de 21 de maio ultimo.

O que tudo visto: e

Considerando que a votação obtida pelo cidadão Elvino José de Sousa e Brito nas assembléas acima mencionadas foi de 3:133 votos, e a do cidadão Luciano Cordeiro tão sómente de 1:360, e

Considerando que, dada toda a votação das assembléas de Lourenço Marques e Sena ao cidadão Luciano Cordeiro ainda o seu contendor ficava com a maioria de 1:634 votos;

E de parecer a vossa commissão que a eleição deve ser approvada e proclamado deputado o cidadão mais votado Elvino José de Sousa o Brito, que apresentou o seu diploma em forma legal.

Sala das sessões da commissão, 4 de fevereiro de 1885. = Luiz de Lencastre = Moraes Carvalho = Firmino J. Lopes = Frederico Arouca = Moraes Machado - Pereira Leite., relator.

Approvado sem discussão.

PARECER N.° 9

Circulo n.° 66 (Leiria)

Senhores. - A vossa commissão de verificação de poderes examinou o processo eleitoral do circulo n.° 66 (Leiria) e verificou terem entrado na uma 2:484 listas, tendo obtido:

Luciano Cordeiro .... 2:327 votos
Manuel de Arriaga .... 107 »
José Jacinto Nunes .... 50 votos

E não tendo havido protesto algum, nem nas assembléas primarias, nem na assembléa de apuramento, é de parecer a vossa commissão que a eleição seja approvada, devendo ser proclamado deputado o cidadão mais votado, Luciano Cordeiro, logo que apresente o seu diploma em forma legal.

Sala das sessões da commissão, 4 do fevereiro de 1885. = Luiz de Lencastre = Frederico Arouca = Firmino João Lopes = Moraes Machado = Pereira Leite, relator.

Approvado sem discussão.

O sr. Presidente: - Proclamo deputados da nação portugueza os srs. Julio Marques de Vilhena e Elvino José de Sousa e Brito.

Não proclamo tambem o sr. Luciano Cordeiro porque o seu diploma ainda não foi apresentado.

O sr. Adolpho Pimentel: - Mando para a mesa a declaração de que tenho faltado a algumas sessões por motivo justificado.
Faço identica declaração por parte do meu illustre collega o sr. Wenceslau de Lima.

Vão publicadas as declarações no logar competente.

O sr. Presidente: - Vou interromper a sessão até que compareçam os srs. ministros, que não podem tardar.

Eram duas horas e tres quartos da tarde.

As tres horas e cinco minutos continuou a sessão.

O sr. Presidente do Conselho de Ministros (Fontes Pereira de Mello): - Sr. presidente, cumpre-me dar a v. exa. e á camara as seguintes explicações:

Tendo surgido no seio do gabinete uma divergência sobre o modo de encaminhar a discussão da proposta do governo, relativamente aos melhoramentos do porto de Lisboa, entendendo o meu collega, que o era então, na qualidade de ministro das obras publicas, o sr. Antonio Augusto de Aguiar, que essa proposta devia ser discutida immediatamente em ambas as casas do parlamento, e sendo de opinião contraria a maioria dos ministros restantes, que entendia convir mais esperar que a cotação dos nossos fundos melhorasse, subindo um pouco mais, não foi possível conciliar estas duas opiniões oppostas; e apesar de todos os esforços, meus e dos meus collegas, o sr. Antonio Augusto de Aguiar, com um grande sentimento rneu, e do todos nós, resolveu pedir a demissão do cargo que exercia de ministro das obras publicas.

Em seguida, o meu illustre collega, no ministerio da justiça, o sr. Lopo Vaz de Sampaio e Mello, julgando, do accordo com a idéa do sr. Antonio Augusto de Aguiar, que convinha discutir desde já aquella proposta, e em consequência collocando-se por este lado tambem em divergência com os seus collegas no gabinete, não obstante os esforços que todos empregámos para que s. exa. continuasse a fazer parte do ministério, honrando-nos com a sua camaradagem o auxiliando-nos com o seu grande talento, insistiu em pedir a demissão, e esta foi acceita.

Nestes termos, o governo, deixando para mais tarde o preencher as duas pastas que ficaram vagas, decidiu conservar-se no seu posto, encarregando-me interinamente da pasta das obras publicas, e o meu collega, o sr. ministro do reino, da pasta da justiça.

E inútil dizer a v. exa. e á camara, quanto foi desagradável para nós a perda de dois collaboradores tão intelligentes e prestimosos, como são os srs. Aguiar e Lopo Vaz, nossos cx-collegas das obras publicas e da justiça, o qual o sentimento que eu particularmente tive, vendo-os sair do ministerio a que tenho a honra de presidir. Infelizmente a sua resolução foi inabalavel.

Devia á camara esta explicação, que mo apresso a dar, tendo sido já communicados a v. exa., como eu creio, os decretos pelos quaes Sua Magestade houve por bem conceder as exonerações pedidas e fazer as nomeações a que já me referi.

Vozes: - Muito bem.

(S. exa. não revê os seus discursos.)

O sr. Anselmo Braamcamp: - Vejo finalmente resolvida ou antes adiada por mais algum tempo a crise ministerial que tem prendido a attenção, a curiosidade da capital e talvez do paiz; todavia não posso acceitar como satisfactorias as explicações dadas pelo illustre presidente do conselho.

Vejo diante de minha os restos do gabinete passado, mas faltam dois dos seus membros mais notaveis, e nas palavras proferidas pelo nobre ministro não encontro rasão sufficiente que justifique essa falta.

O illustre presidente do conselho unicamente apontou, como motivo das divergências ministeriaes, o desejo do sr. Antonio Augusto de Aguiar, de que a proposta de lei respectiva aos melhoramentos do porto de Lisboa fosse

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discutida desde já nas commissões, e o propósito do resto do gabinete, de que tal discussão fosse adiada para alguns dias mais tarde.

Realmente uma divergencia de tão pouca importancia mal póde explicar a desmembração do gabinete; não me parece que a apresentação de uma proposta de lei seja simplesmente uma exposição inútil das idéas de um ministro, condemnada desde logo a ficar sepultada nos ar-chivos das commissões, sem resolução, e sem que esta seja levada a effeito; nem posso admittir que os ministros que a assignam não tenham devidamente calculado as responsabilidades e os encargos que podem advir dessa apresentação.

Sr. presidente, n'aquella proposta encontro duas assignaturas, a assignatura do sr. Aguiar como ministro das obras publicas, e a do sr. Hintze Ribeiro como ministro da fazenda; (Apoiados.) vejo, pois, dois responsáveis, dois ministros que tomaram promiscuamente a responsabilidade da proposta, o por consequência a da opportunidade da sua realisação; e sendo assim, qual é a rasa o por que se retirou dos conselhos da corôa unicamente um dos signatários, o sr. Aguiar? (Apoiados.)

Esta curiosa crise ministerial que presenciámos, está envolvida em nuvens tão densas, num tão profundo mysterio, que é difficil comprehender a sua origem, as suas diversas phases e ainda mesmo o seu desenlace.

Houve, porventura, alguma votação em qualquer das duas casas do palamento que a originasse? Não. Então o que foi? Não se sabe; tudo correu às escuras, tudo se passou no gabinete do sr. presidente do conselho, e a camara e o paiz de nada soube nem sabe, senão pelas declarações vagas e insufficientes que acaba de apresentar o sr. presidente do conselho!!

A nuvem em que ficou envolta esta transformação do ministerio deixa-nos constrangidos a guiarmo-nos unica e exclusivamente pelos boatos que se espalharam, boatos que, infelizmente, não condizem com as declarações do illustre presidente do conselho.

O que, pelo menos, corre como certo é que o illustre ex-ministro das obras publicas convocara a commissão de obras publicas, de quem obteve um voto favorável á sua proposta; mas que, sendo necessario tambem o da commissão do fazenda, s. exa. pedira para que se reunissem ambas no praso creio que de oito dias, declarando desde logo que tencionava n'aquella reunião promover uma decisão definitiva.

Passaram-se os oito dias aprasados, reuniu-se novamente a commissão de obras publicas, mas da commissão de fazenda, da qual estava dependente a resolução, não compareceu membro algum, nem mesmo ella houve por bem responder á convocação que lho fora feita a pedido do sr. ministro das obras publicas!

E não faltou só a commissão, faltou igualmente o illustre ministro da fazenda, que poucos dias antes assignára a proposta com o seu collega, e se encobria com a commissão respectiva, faltando-lhe a energia sufficiente para impugnar abertamente o projecto que elle proprio apresentara.

Este procedimento, que me abstenho de qualificar, não tem precedentes na historia parlamentar, (Muitos apoiados o sobradamente justifica a decisão do sr. Aguiar de immediatamente solicitar a sua exoneração.

O acinte era manifesto, a desconsideração era evidentemente, não só por parte da commissão, como pela do sen collega, que tinha assignado a proposta, tinha responsabilidade d'ella, de todas os suas consequências.

Mas o sr. ministro da fazenda, julgou que lhe era licito negar a sua firma e deixar de acompanhar o seu collega no meio das difficuldades que tinham surgido. E, sr. presidente, torno a dizer, esse procedimento devia ferir tanto mais profundamente ao illustre ministro das obras publica quanto, não só a responsabilidade do projecto, mas a da situação em que se encontrava a fazenda publica recaía com muito mais rasão sobre o illustre ministro da fazenda. Muitos apoiados.)

O sr. Hintze Ribeiro, quando ministro das obras publicas, tinha a esmo espalhado por todo o paiz obras das mais despendiosas, cujos encargos talvez sejam mais pesados do que os dos melhoramentos do porto de Lisboa.

Emprehenderam-se trabalhos collossaes em todo o paiz, que levaram o sr. Aguiar a comparar, em um discurso notavel, o sr. Hintze Ribeiro com o illustre ministro e insigne engenheiro francez, o sr. Freveinet.
Tal comparação foi em demasia lisonjeira. O sr. Freycinet submetteu á approvação do parlamento francez um conjuncto de obras que deviam melhorar sensivelmente, e em todo o sentido, o estado da nação franceza; mas o plano tinha sido longa, e cuidadosamente estudado na sua parto technica, pelos engenheiros mais distinctos, emquanto que o ministro da fazenda, o illustre economista, o sr. Léon Say, apreciara, com esmerada prudência, os meios financeiros de poder realisar os trabalhos sem difficuldades para o thesouro, e se estas posteriormente se levantaram, não foram ellas consequencia do plano primitivo, das sim do excessivo augmento das obras projectadas.

Se o ministro francez procedia com tanta cautela, o sr. Hintze Ribeiro, com animo mais largo, não duvidava emprehender despendiosos, melhoramentos, sem curar do ónus que traziam para o thesouro, sem estudos, sem outro plano que não fosse o de obedecer unicamente às exigências de um e de outro, às conveniências eleitoraes e á necessidade de acalmar attritos, o de ganhar adhesões. (Apoiados.)

Sr. presidente. Voltando ao principal assumpto que me propuz tratar, não posso deixar de ponderar á camara quanto este negocio é serio.

Não é possivel comprehender d'este modo a solidariedade ministerial, as relações que devem existir entre os ministros nem a sua mutua responsabilidade. (Apoiados.)

A proposta foi assignada por dois srs. ministros, e s. exas., seguindo as praxes mais triviaes do systema constitucional, segundo as exigencias de uma leal camaradagem, deviam acompanhar um ao outro na saída do ministerio. (Apoiados.)

O allegado pretexto, da conveniencia da proposta ser discutida um pouco mais tarde ou mais cedo, é para mim de tão pequeno alcance, que em nada altera a situação dos dois srs. ministros.

Desejo sinceramente que o sr. ministro da fazenda possa responder de um modo cabal às objecções gravissimas que suscitou o seu procedimento com o seu collega.

Emquanto á situação do gabinete e da opposição, essa situação está bem claramente definida.

Apesar das graves difficuldades e das circumstancias delicadíssimas que se dão relativamente ao ministerio das obras publicas, o sr. presidente do conselho não duvidou acceitar a direcção dessa pasta.

O sr. Fontes Pereira de Mello, que ainda ha poucos dias, respondendo a umas observações minhas, lembrando a necessidade do moderar as despezas, hasteava novamente e com tanta energia a bandeira do partido regenerador, como único que póde salvar o paiz pelo incessante progresso dos melhoramentos materiaes; o sr. Fontes, que ainda em plena crise ministerial, dispondo a seu fallante do voto da maioria, declarava á associação commcrcial que ainda nesta sessão havia de ser discutido e votado o projecto relativo aos melhoramentos do porto de Lisboa; o sr. Fontes é hoje ministro das obras publicas. Este facto basta só por si para determinar a feição do gabinete.

São os mesmos vultos, e portanto as mesmas tendencias e as mesmas aspirações do ministerio passado, mas talvez ainda mais accentuadas.

Não precisamos ouvir o sr. presidente do conselho para

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SESSÃO DE 4 DE FEEVREIRO DE 1885 363

saber qual o seu programma; não precisâmos ouvil-o para saber que temos a esperar a continuação do systema sempre seguido por s. exa., de avultados despendios e de largos melhoramentos materiaes; semear para colher; e quando o celeiro estiver exhausto, quando escacearem os meios, será então ensejo para o illustre presidente do conselho se retirar, deixando a outros o trabalho ingrato e Ímprobo de procurar novas receitas para restabelecer a fazenda publica em melhores condições.

São os mesmos erros, é o mesmo programma; e portanto, da sua parte, a opposição não póde deixar tambem de proseguir na attitude que tinha tomado, attitude franca, leal, mas severa.

Os illustres ministros continuam sustentando os principios que sempre advogaram, nós estamos firmes nos nossos, e combatemos como até agora.

Guerreâmos a situação actual, porque para nós ella não representa mais do que a continuação, talvez enfraquecida, de uma sombra do gabinete passado.

O sr. Ministro da Fazenda (Hintze Ribeiro): - Não me surprehendeu a declaração do illustrado chefe do partido progressista, que acabou de fallar, definindo a sua politica em face do governo actual. Era de hostilidade a posição parlamentar de s. exa., e é de hostilidade tambem agora a sua attitude, em frente de um ministerio que perdeu alguns dos seus membros e conserva outros, a maioria, dos que o compunham.

Se de alguma cousa me podesse admirar seria de ter o illustre deputado fundamentado a sua declaração no facto de se traduzir a politica do gabinete na continuação de largas despezas, e isto exactamente na occasião em que o governo entendia dever sobre estar, por emquanto, na adopção immediata de uma proposta para melhoramentos materiaes, que traz comsigo a necessidade de grandes despezas.

E como o illustre deputado se referiu especialmente às minhas responsabilidades e á minha posição no gabinete, não posso, pela muita consideração que tenho por s. exa., deixar de lhe dar as explicações que são de meu dever.

Eu nunca neguei as responsabilidades que uma vez assumi; nunca puz de parte a assignatura que tivesse posto num documento apresentado ao parlamento.

É verdade que assignei com o meu collega, que foi das obras publicas, o sr. Aguiar, uma proposta relativa aos projectados melhoramentos do porto de Lisboa. Esta assignatura não a renego; esta responsabilidade mantenho-a. A conveniência, que uma vez reconheci, dos melhoramentos do porto de Lisboa, é a mesma conveniência que hoje reconheço em absoluto; mas póde haver uma rasão, que prenda com as responsabilidades da minha pasta, e que, numa occasião dada, hoje, me leve a entender ser menos opportuna ou menos conveniente para interesses tão vitaes, como são os interesses do nosso credito, a realisaçâo immediata desses melhoramentos.

Não quer isto dizer que eu ponha de parte ou renegue a sua conveniencia; quero unicamente dizer que no momento dado julgo mais conveniente sobreestar no seu mais rápido desenvolvimento.

Foi exactamente isto o que se deu ácerca da proposta relativa aos melhoramentos do porto de Lisboa.

Não podem accusar-me de ser contrario a estes melhoramentos; porque, quando fui ministro das obras publicas, apresentei aqui uma proposta de lei em que se creava um elemento de receita valioso para que elles podessem mais facilmente ser levados a effeito.

Não posso ser accusado de contrariar o pensamento fundamental do meu ex-collega, quando ainda o anno passado assignei com elle a proposta o com elle fui ao seio das commissões sustentar as opiniões que eu tinha sobre o assumpto.

Este anno, porém, o sr. Aguiar instava para renovar a iniciativa da mesma proposta. Já então as cotações dos nossos fundos não estavam altas, e eu tinha apprehensões de que um annuncio de despezas avultadas podesse reflectir-se no estado dos mercados, aqui e lá fora; mas os desejos do meu ex-collega apresentaram-se n'aquella occasião tão sinceros, tão instantes, que eu, não querendo crear dificuldades ao gabinete, resolvi assignar a renovação de iniciativa, que foi apresentada a esta camara.

Deu-se, porém, depois uma descida gradual, mas rápida, nas cotações dos nossos fundos, como o illustre deputado não póde ignorar, por isso que elles baixaram a mais de 1/2.

Nós apresentámos a proposta a 12 de janeiro, estando os fundos a 46 3/8; mas desde então até ao dia 22 desceram tanto quanto vae de 46 3/8 a 44 1/4

Francamente, esta baixa importante no momento em que se propunha a realisação de obras dispendisiossimas e que importam a necessidade de novos recursos ao credito, não podia deixar de me impressionar; e por isso entendi que mais conveniente seria, para podermos entrar com mais desafogo na discussão da proposta, a que me estou referindo, esperar que se restabelecessem as cotações dos nossos fundos e que o nosso credito se mantivesse.

A divergencia foi esta.

Eu não queria que se pozesse de parte o projecto, cuja conveniência reconheço; não pedi que se deixasse no limbo das commissões um projecto de tanta importância, mas, visto que se dava uma baixa repentina e successiva na cotação dos nossos fundos, entendia, repito, que era conveniente esperar-se algum tempo, até que a situação melhorasse, para depois, eu, ao lado do meu collega das obras publicas, pugnar pela proposta no seio das commissões. Foi com isto que o sr. Aguiar não concordou.

De resto, póde o illustre deputado, na sua consciencia, julgar frívolas ou insuficientes estas rasões para determinarem uma crise ministerial; mas não as deve considerar como taes, desde que queira attender a que eu, como ministro da fazenda, tinha de pesar as circumstancias que affectavam o nosso credito, convencido como estou de que é preciso mantel-o em condições do podermos caminhar desafogadamente. (Apoiados.}

Quando vejo que os nossos mais avultados melhoramentos têem sido feitos, invocando nós essa alavanca do progresso, chamada credito, por forma que ainda elle não nos faltou, nem nós nunca deixámos de honrar os compromissos tomados perante os mercados estrangeiros; quando vejo que, sem a manutenção do credito, inútil será pensar em melhoramentos, e succede que as nossas cotações baixaram em um momento dado, eu não sei como se possa deixar de attender a estas circumstancias, e consideral-as motivos justificados para que o ministro da fazenda peça que se sobre esteja na realisação de melhoramentos importantes, até que adquiramos as condições necessárias para levar por diante esse pensamento com mais afouteza e mais segurança.

S. exa. acha isto um pretexto frívolo, para mim não é. Mas se era pretexto frívolo o de dar andamento ao projecto mais cedo ou mais tarde, como é que s. exa. póde julgar menos frívolo o pretexto da comniissão se reunir ou deixar de reunir-se?! (Apoiados.)

Se frivolo era para uma crise o pretexto de não dar andamento a um projecto em um momento dado, não me parece que possa deixar de ser taxado tambem do frívolo o pretexto da commissão se reunir ou não.

Estão presentes, senão todos, pelo menos alguns dos membros da commissão de fazenda e eu invoco o testemunho do s. exas. para declararem se eu, directa ou indirectamente, contribui ou influi para que essa commissão deixasse de se reunir. Não houve uma palavra trocada a esse respeito entre mim e qualquer dos seus membros. (Apoiados.) E nem o meu collega, o sr. António Augusto de Aguiar, me pediu era occasião alguma para eu instar com os membros da mesma commissão para que se reunissem.

Repito, nem directa nem indirectamente obstei á convocação ou não convocação da commissão de fazenda.

22 *

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Dito isto, inutil será irmos remontar mais longe, para buscar um fundamento, quanto á cotação dos nossos fundos, nos projectos de lei, que outrora eu tivesse apresentado á sancção parlamentar.

É inutil estar agora a comparar o plano de Freycinet com o meu, quando nunca reclamei para mim as glorias de ter apresentado um projecto completo de melhoramentos públicos, á altura de um grande estadista, e unicamente reclamo para mim a circumstancia de ter procurado cumprir o meu dever e dotar o meu paiz com melhoramentos que julgava indispensáveis ao seu desenvolvimento.

Pôde o illustre deputado divergir de mim sobre a apreciação do alcance desses projectos, mas a consideração que tenho pelo illustre deputado faz-me suppor, que s. exa. não deixará de reconhecer que os esforços empregados por mim para que taes projectos vingassem, foram simplesmente dictados pelos bons desejos de ser util ao meu paiz. (Apoiados.)

E como é que s. exa. pretende que esses projectos tivessem influido na cotação actual dos nossos fundos, quando na epocha em que eu deixava a pasta das obras publicas os fundos estavam mais altos talvez do que noutras epochas? (Apoiados.}

DG mais, a responsabilidade desses projectos já não me competia a mim só; competia tambem ao parlamento, porque desde o momento em que um projecto é apresentado pelo governo às camaras e por ellas é approvado, a responsabilidade do parlamento torna-se de todo o ponto solidaria com a do governo.

E não me arrependo do que fiz; não julgo ter contribuido para o desprestigio do meu paiz; pelo contrario, julgo ter cumprido rigorosamente os deveres de meu cargo, como ministro das obras publicas, apresentando ao parlamento medidas que julgava úteis, e como ministro da fazenda, aconselhando e lembrando a necessidade que ha de attender bem ao estado do nosso credito nos mercados estrangeiros, para que não nos precipitemos inconsideradamente na realisação de obras, que, embora úteis, trazem comsigo, por serem grandiosissimas, largos despendios; e finalmente procurando de preferencia caminhar a passo lento, mas firme e seguro, no caminho do desenvolvimento material, em que todos nós temos o maior empenho.

Feitas estas declarações e dadas estas explicações ao illustre deputado, espero que s. exa. se convença, que da minha parte não houve propósito de hostilisar nenhum dos meus collegas, pensamento que não cabe no meu animo nem se abriga na minha alma. Tão sómente houve uma maneira de ver, que póde ser erronea, conformo o ponto de vista de cada um, mas que era dictada por um espirito de prudencia que a boa rasão aconselha na gerencia dos negócios públicos.

Nada mais direi por agora.

Vozes: - Muito bem.

(S. exa. não revê os seus discursos.}

O sr. Lopo Vaz: - Pedi a palavra para fazer simples declarações á camara; não seria agora momento opportuno para fazer um discurso longo, nem o estado da minha voz o permittiria, ainda que para discursar houvesse opportunidade.

Em primeiro logar cumpre-me agradecer ao nobre presidente do conselho as palavras amáveis que s. exa. ate dispensou, a propósito da explicação dos motivos da crise, palavras que não posso attribuir senão á sua muita benevolência para commigo, de que sempre me tem dado provas, e á muita estima e consideração com que s. exa. me honra e a que correspondo.

Feita esta declaração, direi que não me cumpre a mim defender o governo em relação ao modo por que foi resolvida a crise, por isso que elle já o tem feito exuberantemente, mas simplesmente me compete expor os motivos por que saí do ministerio.
Houve da minha parte e da do sr. Aguiar, em relação ao governo, um ponto de divergência, que nos levou a abandonar as cadeiras do poder, sem que comtudo julgue, pela minha parte, para com o governo em nada alteradas as nossas boas relações e o nosso accordo em tudo quanta respeita ao pensamento politico do aclual gabinete e a todos os assumptos graves, em que eu tenha responsabilidade, já dependentes do parlamento ou que o possam vir a estar.

Sobre o objecto da divergência a que me referi, o ar. presidente do conselho, bem como o sr. ministro da fazenda, acabaram de dar explicações, que em homenagem, á verdade corroboro.

A divergencia de opiniões versou unica e exclusivamente sobre a opportunidade do andamento ou não andamento da proposta de lei relativa aos melhoramentos do porto de Lisboa.

Esta divergência, versando sobre a opportunidade de uma medida de administração altamente importante, não é frivola, como ha pouco se affirmou aqui, mas é de natureza essencialmente restricta e transitória.

Era uma questão de opiniões, que podiam livremente manifestar-se em qualquer sentido por parte dos diversos membros do gabinete, e não uma questão de mais ou menos lealdade, de procedimento mais ou menos correcto, por parte deste ou d'aquelle ministro.

Eu, que sou insuspeito neste ponto em relação aos actuaes ministros, posso dar testemunho á camara de que houve, por parte dos collegas que saíram do ministerio e dos que ficaram, o mais correcto procedimento e a mais completa lealdade, antes da crise, como na occasião em que ella se verificou e emquanto durou.

Simplesmente se discutia se desde 12 de janeiro, data em que o nobre ministro da fazenda assignou conjunctamente com o sr. ministro das obras publicas a renovação de iniciativa do projecto de melhoramentos do porto de Lisboa até á epocha actual, ou, para melhor dizer, até á epocha da crise, tinham ou não variado as circumstancias tão substancialmente que a prudencia na governação publica aconselhasse o sobreestar-se no andamento do projecto.

Eu pela minha parte entendi que essas circunstancias não tinham variado essencialmente, e o meu collega da fazenda, bem como todos os outros membros do gabinete actual, entenderam o contrario.

O sr. ministro da fazenda acabou de declarar que os fundos públicos tinham a cotação de 46 3/8 ou 46 1/2 no dia em que o projecto foi aqui apresentado, e que tinham a cotação de 44 1/4 ou 44 1/2 na occasião em que se declarou a crise.

Esta baixa actuou e prevaleceu no espirito do sr. ministro da fazenda e no do governo para sobreestar no andamento do projecto.

Os meus ex-collegas entenderam, e tinham o direito de assim pensar, que a baixa de dois por cento nas cotações era summamente attendivel para o effeito de não se dar por emquanto andamento algum á proposta de melhoramentos do porto de Lisboa; a mim pareceu-me que não o eram, não só porque tinha sido muito mais notável a baixa anterior á renovação da iniciativa do projecto, mas por muitas outras considerações, que seria fastidioso expor.

Entendi, pois, que, tendo considerado em 12 de janeiro opportuno o andamento do projecto, tambem o devia considerar assim em 29 do mesmo mez.

Mas não se seguia dahi, e nesta parte colloco-me ao lado do gabinete, que da apresentação da proposta no dia 12 de janeiro se seguisse necessariamente a sua discussão immediata em qualquer hypothese e quaesquer que fossem as circumstancias supervenientes.

É certo que a proposta não foi feita para ficar no limbo das commissões, como disse o sr. Braamcamp, mas é tambem certo que a apresentação de uma proposta não importa, em geral, de uma maneira logicamente necesssaria e

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fatal a sua discussão immediata no parlamento. Por isso havia, sem quebra de lealdade para nenhum dos membros do governo, logar para opiniões divergentes sobre a opportunidade em 29 de janeiro do andamento da proposta.

Dadas estas explicações á camara, como corroboração das declarações que o governo acaba de fazer, não tenho senão a pedir-lhe desculpa do tempo que lhe tomei.

Vozes: - Muito bem.

O sr. Presidente: - Convido os srs. deputados Sebastião Centeno e João Arroyo a introduzirem na sala o sr. Júlio de Vilhena que se acha proclamado deputado.

Foi introduzido e prestou juramento.

O sr. Barros Gomes: - Ouvi com a maxima attenção as explicações que por parte de s. exas. os srs. ministros, por desgraça d'este paiz, distantes de tudo quanto representa o jogo regular das instituições parlamentares.

Todos nos recordâmos que em tempo o sr. presidente do conselho, fugindo de dar a qualificação de constituinte para esta camara, não poderá comtudo negar-nos a gloria de termos ao menos uma parcella d'esses poderes constituintes, extraordinarios e excepcionaes que nos foram conferidos pelo nosso mandato, e nos habilitam a modificara lei fundamental do estado, assignalando porventura na historia constitucional do paiz um momento notavel do nosso desenvolvimento politico, e um progresso na maneira como as instituições representativas funccionam em Portugal.

Ora um governo, a quem se proporciona occasião de dirigir as discussões de uma camara em taes condições, deveria ter, antes de reunida a mesma camara, meditado Írofundamente sobre todas as circumstancias susceptiveis e influir no bom ou mau andamento do trabalhos de tal gravidade, e que tão importantes consequencias podem ter para a melhor organisação dos poderes públicos em Portugal. (Apoiados.)

Por isso, repito, ver rebentar uma crise, logo em começo dos trabalho» parlamentares, precisamente no momento em que se discute a resposta ao discurso da corôa, quando esta camara está pela primeira vez accentuando a sua feição politica, e quando dentro em pouco nos cumpre discutir o projecto de reformas politicas, é um facto anormal, e tanto menos explicavel quanto, é um facto anormal, e tanto menos explicavel quanto a mais pequena e modesta previsão teria evitado o rebentar d'essa crise em momento por tal maneira inopportuno. (Apoiados.)

Pois o projecto dos melhoramentos do porto de Lisboa era porventura alguma novidade? Não foi esse projecto apresentado á camara no anno anterior?

Não se sabia que era opinião firme e accentuada do illustre ex-secretario de estado do ministro das obras publicas provocar uma discussão a tal respeito para deixar vinculado o seu nome á realisação d'essa obra que lhe parecia muitissimo util, e que tinha um caracter de grandeza pouco vulgar entre as que temos ultimamente emprehendido? (Apoiados.) Não se conhecia tudo isto? Não se sabe, por outro lado, que no discurso da corôa se não fez menor referencia a uma obra de tamanha importancia como esta? E não significaria este facto que desde muito existia entre os srs. ministros o germen de uma divergencia, que mais tarde necessariamente viria a rebentar, mas quando as condições em que esse facto politico se d'esse podiam ter summa gravidade? (Apoiados.)

É bem sabido que de ordinário no discurso da corôa se faz referencia a propostas de bem menor alcance económico e financeiro do que o tem a dos melhoramentos do porto de Lisboa, e todavia nem uma palavra se disse n'esse documento a respeito de similhante proposito. O que significa isto?

Sendo muito graves as responsabilidades que sobre os seus hombros tinha tomado o sr. presidente do conselho, já porque ia dirigir os debates de uma camara com par-cella de constituinte, na expressão de s. exa., já porque durante o interregno parlamentar havia praticado actos que têem sido ultimamente assumpto de largos debates e de acres censuras por parte da opposição, devia s. exa. ter
diligenciado escrupulosamente afastar todas as causas de conflictos secundários, que podessem pôr em perigo a existência do gabinete, e com elia o complemento da obra constitucional que a esta camara cumpria realisar. Mas não se fez isto.

Sabia-se de ante-mão que o sr. Antonio Augusto de Aguiar fazia questão d'essa proposta, e tambem de ante-mão se procurou illudir a espectativa de s. exa., não fazendo sequer referencia no discurso da corôa a uma providencia de tal magnitude. Pouco depois, no momento mais inopportuno, vemos rebentar esta crise. E por isso que eu affirmo representar ella a negação absoluta do verdadeiro espirito das instituições parlamentares, e o desconhecimento quanto lamentavel da excepcional gravidade do actual momento politico.

Proseguindo, porém, na minha ordem de idéas direi que me felicito por ver que s. exa. o sr. ministro da fazenda entende dever subordinar a realisação de obras tão importantes e dispendiosas, e aos melindres da situação financeira.

Declaro-me ao lado de s. exa. quando entende dever-se prestar toda a attenção às cotações dos nossos fundos, e á maior ou menor robustez do nosso credito nas
praças estrangeiras, (Apoiados.) quando se trata de realisar despezas tão consideraveis como aquellas a que póde arrastar-nos a proposta ácerca dos melhoramentos do porto de Lisboa. (Apoiados.)

Oxalá, porém que sempre s. exa. assim tivesse pensado; (Apoiados.) oxalá que não tivesse sido, no desempenho do cargo de ministro das obras publicas, como há pouco disse o sr. Braamcamp, o primeiro a fomentar largamente as obras de toda a ordem, a exagerar o prurido dos melhoramentos materiaes á custa de um excesso tão consideravel de despeza, que bem facil será provirem-nos d'elle desastres financeiros, cujas consequencias pesarão por largos annos sobre o bem estar d'este paiz. (Apoiados.)

Por que preço emittiu s. exa. o grande emprestimo há pouco realisado?

Esse emprestimo toda a camara se recorda do facto, foi apresentado á subscripção publica pelo preço de 50 por cento.

Todos sabemos tambem que infelizmente o seu exito não correspondeu ao que podia desejar-se por parte de todos que estimam ver sempre alto o credito portuguez, e respeitada a boa fé do governo de Portugal, não só pela opinião publica em geral, mas tambem pela opinião d'aquelles que influem nas praças estrangeiras, de cujo apoio carecemos pela necessidade ainda existente de emprehender melhoramentos, alguns dos quaes são complemento indispensavel de outros que tão largos sacrificios nos têem custado até agora.

O que succedeu, porém, posteriormente á emissão d'esse grande emprestimo?

O que succedeu foi a baixa progressiva, accentuada, persistente da cotação dos nossos fundos, desde 50 por cen-

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to, preço da emissão, até 46 3/8 por cento, em 19 de janeiro ultimo.

Pois esta baixa do quasi 4 por cento, não seria de per si sufficiente para demover o sr. ministro das obras publicas da idéa de renovar neste momento a iniciativa da proposta de lei relativa aos melhoramentos do porto do Lisboa, e o sr. ministro da fazenda de associar a sua assignatura a similhante renovação de iniciativa? (Apoiados.)

Comtudo o nobre ministro da fazenda não se prendeu por tão pouco, e assignou a renovação de iniciativa.

Pois era então que s. exa., na ordem de idéas a que hoje se soccorre em defeza própria, devia ter pensado que o estado melindroso do credito publico não podia facilmente supportar, no momento actual, encargos de tal ordem.

E a meu ver, repito, a resistência de s. exa. devia ter vindo de mais longe. Devia ter-se accentuado antes da reunião das cortes constituintes, porque, não funccionando estas ainda haveria a possibilidade, caso se manifestasse divergência insanável entro os ministros, do gabinete se recompor, o que agora estamos vendo que não foi possível, porque alias não deixariam de ser providas em ministros especiaes duas pastas tão importantes, como o são as da justiça e das obras publicas, principalmente a das obras publicas, com todas as espinhosas difficuldades que neste momento andam inherentes ao exercício do cargo de ministro e secretario de estado dos negocios daquella pasta. (Apoiados.)

E fallando em obras publicas, vou formular uma pergunta directa ao sr. presidente do conselho de ministros; esperando dever a s. exa. a honra de me responder, não por consideração para comungo, que não mereceria tanto, mas por attenção para com o paiz e para com a opinião publica, perante a qual s. exa. não póde deixar de manifestar-se categórica e terminantemente.

Pergunto, pois, ao sr. presidente do conselho se é exacta a noticia, que foi mencionada na imprensa, de que recebendo os representantes do uma corporação respeitável, a qual representa, não só o commercio de Lisboa, mas até certo ponto tambem os interesses do commercio geral da nação, s. exa., compromettera solemnemente a fazer approvar nas duas camarás, no decurso da presente sessão, a proposta relativa aos melhoramentos do porto de Lisboa.

Não quero por mim discutir neste momento se por acaso tal compromisso foi tomado pela forma que acabo de enunciar, e que tanto tem de desattenciosa para com o parlamento.

Demasiado estamos acostumados a ver a maneira por que as camaras são tratadas pelo governo. (Apoiados.}

Ainda mesmo durante esta crise tivemos sobejos motivos de o experimentar, vendo quanto as antigas tradições estão esquecidas, não se usando, nem se mantendo já para com o parlamento, aquella deferência que representava uma justa homenagem para com os eleitos do povo, nem sequer A delicadeza que deve sempre existir entre os representantes dos differentes poderes públicos. (Apoiados.)

Abstráhio de tudo isso, e limito-me a perguntar a s. exa., se o que ha pouco referi é ou não exacto, se esto compromisso se tomou. E se é exacto, como é que se explica então a permanência do sr. ministro da fazenda n'aquelle logar? (Apoiados.}

Não desejo cansar por mais tempo a attenção da camara; direi, porém, que das palavras ha pouco proferidas pelo ex-ministro e secretario d'estado dos negocios da justiça, não pude por minha parte deprehender bem as rasões que pesaram no animo de s. exa. para aggravar com a sua demissão uma crise tão inconveniente, fundando-se para isso apenas na opportunidade, mais ou menos demorada, da discussão de uma proposta de lei. Sobre este ponto, porém, nada julgo dever acrescentar, limitando-me a insistir pela resposta que solicitei do sr. presidente do conselho, e que espero e desejo ver formulada por s. exa. com inteiro desassombro, e por forma a não deixar subsistir a mínima duvida ácerca da sua significação e alcance.

O sr. Presidente do Conselho de Ministros (Fontes Pereira de Mello): - Pouco tenho que dizer á camara, mas preciso corresponder ao convite que me fez o illustre deputado que acaba de fallar, e dar uma explicação, ou antes fazer uma declaração, relativamente á resposta que eu dei á direcção da associação commercial de Lisboa quando, num da dias passados, me procurou para me entregar uma representação, pedindo para que seja votada ainda nesta sessão a proposta sobre os melhoramentos do porto de Lisboa.

Consta-me que a imprensa, que não me ouviu, nem ouviu a direcção, porque nós estávamos sós em minha casa, referiu de uma maneira inexacta, o que eu dissera nessa occasião. E eu estimo deveras que o illustre deputado me tivesse provocado a dar agora esta explicação, porque assim ficará registrada no parlamento a responsabilidade que me cabe pela declaração que fiz, mas só por essa declaração, e não pela que me attribuiu a imprensa.

A direcção da associação pediu-me, dia e hora, para a receber, a fim de me ser presente a representação no sentido que já indiquei á camara.

Teve logar a conferencia, e o digno vice-presidente da associação commercial, e meu amigo, leu a representação em que se pedia, exactamente como disse ha pouco, que nesta sessão fosso votada a proposta com respeito aos melhoramentos do porto de Lisboa.

Eu respondi que a minha opinião a respeito d'aquella obra era conhecida ha muito tempo; que eu tinha sido sempre propugnador dos interesses públicos; que o governo de que tinha a honra de fazer parte, apresentara uma proposta nesta camara para serem levados a effeito os melhoramentos de que se trata, e que, quanto ao merecimento delles, á sua importancia, às vantagens que podiam produzir para Lisboa e para o paiz inteiro, tinha eu opinião assentada, não duvidando affirmar que se eu tivesse de escrever a representação, ainda mais diria n'ella em abono dos mesmos melhoramentos.

Acrescentei, porém, que em todo o caso o governo era o juiz, palavras textuaes, da opportunidade para promover a discussão da proposta nas duas casas do parlamento, e que nas circumstancias actuaes o governo tinha julgado que seria mais conveniente não a discutir immediatamente, deixando isso para uma occasião mais favorável; que, todavia, estava convencido de que durante a actual sessão ainda se poderia dar essa opportunidade, e que n'este caso eu empregaria, pela minha parte, todos os esforços ao meu alcance para que a proposta fosse votada pelas duas casas do parlamento.

Aqui está o que eu disse á direcção da associação commercial; e o que disse é perfeitamente correcto e está no limite das minhas attribuições.

O illustre deputado, que me conhece ha algum tempo, não me faz, creio eu, a injuria de suppor que eu tivesse a indelicadeza, não só constitucional para com o parlamento, mas especial para com a maioria que me faz a honra de me apoiar, de dizer que eu respondia pela approvação do projecto nesta camara, assegurando sob minha palavra de honra que seria effectiva essa approvação! Seria isso até uma falta de senso commum e de tal ordem que, a não ser s. exa. levado pela posição que occupa nesta casa, mal se comprehende que pelo seu espirito passasse, um instante sequer, a idéa de que eu podesse ter proferido taes palavras.

O que eu disse foi o que acabei de referir. Essa declaração é perfeitamente correcta; podia fazel-a. (Apoiados.}

O sr. ministro da fazenda, a quem se têem referido os illustres deputados, que têem fallado por parte da opposição, declarou mais de uma vez que estava perfeitamente de accordo com a idéa dos melhoramentos do porto de

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Lisboa; que tinha assignado a proposta; que não a combatia, e que, pelo contrario, sobre a sua proficuidade conservava hoje a mesma opinião que já anteriormente tinha, e que a questão era apenas de opportunidade.

Pela minha parte, repito, eu disso á associação commercial que o governo era o juiz da opportunidadc para promover o andamento da proposta; que eu sympathisava com ella e havia de fazer todos os esforços ao meu alcance para que ainda nesta sessão podesse ser discutida e Votada.

O que ha nisto do censurável? Onde está aqui o crime, ou pelo menos a inconveniência da minha parte? (Apoiados.)

Por outro lado, eu estava perfeitamente de accordo, não só com a resolução tomada pelo gabinete, mas com as mi nhãs tradições parlamentares. (Apoiados.)

Permitta-me ainda s. exa. dizer-lhe que foi injusto commigo quando me accusou, de certo em nome das idéas do partido a que pertence e que eu muito respeito, de ter promovido uma politica de extraordinarias despezas e de excessivos melhoramentos, na epocha em que pela primeira vez tive a honra de entrar nos conselhos da corôa e do ter organisado o ministerio das obras publicas.

É certo, e todos sabem, que fui eu que organisei esse ministerio.

Tomo inteira a responsabilidade do facto. Honro-me até com o que fiz, porque, se não tivesse então organisado o referido ministério, era completamente impossivel fazer-se tudo quanto se tem feito desde então até hoje, em beneficio do paiz.

O primeiro período dos melhoramentos materiaes decorreu desde 1851 até 1856.

A epocha chamada da regeneração comprehende duas partes essenciacs. A primeira é a da conciliação entre os diversos partidos, para que terminasse a lucta nos campos da batalha, e fosse substituída pela lucta incruenta da palavra no parlamento.

Esta parte compete especialmente a Rodrigo da Fonseca Magalhães.

À outra parte é a dos melhoramentos públicos, e esta compete a todos os ministros. A mim tambem me cabo responsabilidade por ser o ministro que estava então á frente do ministerio das obras publicas.

Mas essa politica era tão sympathica, tão popular e tão vantajosa, já o disse noutra sessão e repito-o novamente, que o sr. duque de Loulé, cuja memória os illustrcs deputados não podem repudiar, veiu dizer nesta camara, no dia immediato áquclle em que tomou conta dos negócios públicos, e sobro as perguntas que lhe fazia a opposição, que elle seguiria a politica illustrada dos seus antecessores, e não tinha nada que emendar.

Isto consta dos archivos parlamentares; e sendo aquella a opinião do mais auctorisado chefe do partido progressista e dos indivíduos que calorosamente o applaudiam, não sei como o illustre deputado se lembrou de vir hoje accusar essa politica, que teve em vista, e deu em resultado os immensos melhoramentos, que, depois, todos os partidos promoveram e têem realisado em beneficio do paiz.

N'estes termos, eu tenho respondido, não só á pergunta que me dirigiu o illustre deputado, o sr. Barros Gomes, mas às observações que me fizera tambem o illustre deputado e meu amigo, o sr. Anselmo Braamcamp.

Emquanto ao facto de não vir mencionada no discurso da corôa a proposta- dos melhoramentos do porto de Lisboa, não póde elle auctorisar o illustre deputado, nem pessoa alguma, a concluir que o governo tinha intenção reservada de não fazer prevalecer aquella proposta na discussão parlamentar, e de não promover que ella fosse convertida em lei.

Em primeiro logar não é licito entrar nas intenções de ninguem, e por consequência o illustre deputado não podia, sem violar os mais triviaes preceitos parlamentares, dizer que o governo tinha uma intenção reservada, quando deixou de mencionar no discurso cia corôa a proposta de lei de que se trata.

As intenções reservadas não se suppõem, e muito menos se declaram taes no parlamento.

Mas a omissão a que s. exa. alludiu, indica tanto que o governo estava na resolução de abandonar aquella proposta, como indica igual intenção a respeito de todas as outras propostas que tambem não vieram mencionadas no discurso da coroa.

Se o governo tivesse feito a enumeração, como se tem feito em outras occasiões, das diversas propostas que tinha tenção de trazer ao parlamento, e cuja approvação tencionava promover, fazendo unicamente exclusão d'esta, então sim; então é que isso podia dar logar á suspeita de que o governo, tinha o pensamento reservado de adial-a; mas quando nenhumas propostas vêem especialmente indicadas; quando se falla em termos genericos, que não comprehendem nem excluem esta ou aquella proposta, como póde o illustre deputado inferir daqui que o governo tinha o pensamento reservado de pôr de parte uma proposta de lei em que estava empenhado o sr. ministro das obras publicas?

O illustre deputado, cuja intelligencia sou o primeiro a reconhecer, não póde tambem duvidar da intelligencia do sr. Aguiar, e se s. exa. não reconhecesse a boa camaradagem dos seus collegas, e suspeitasse que da parte d'elles existia idéa reservada, não tomaria de certo a responsabilidade do discurso da coroa, quando este foi apreciado e discutido em conselho de ministros.

Quando o sr. Aguiar tiver occasião, como ha de ter, de tratar do assumpto na outra casa do parlamento, estou certissimo que s. exa. ha de prestar aos que foram seus collegas o testemunho de lealdade que elles lhe prestam.

Por consequencia esta hypothese desapparece completamente.

Mas ainda mais: depois do discurso da coroa, dias depois, foi pelos srs. ministros das obras publicas e da fazenda renovada a iniciativa dessa proposta de lei.

Como pócle, pois, o illustre deputado suppor, agora, depois d'este facto posterior, que o ministerio praticara um acto de deslealdade?

Está s. exa. de certo no direito de classificar o governo como quizor; mas dentro dos limites parlamentares, a que não é capaz de faltar.

Se o governo, pela renovação da iniciativa da proposta de lei, mostrou a intenção de querer levar por diante essa proposta, o que é a negação da hypothese da intenção contraria que se lhe quer attribuir, como é que passadas poucas semanas, vem o illustre deputado dizer que se no discurso da corôa se não apresentou enumerada a mesma proposta, é porque já havia a intenção reservada de a não apresentar ao parlamento e promover a sua approvação?

Não posso responder senão dizendo que não ú exacto. Não tenho outro meio de provar, que nunca esteve no nosso animo o pensamento de praticar esse acto de deslealdade para com um collega. (Apoiados.)

Creio que são estas as explicações capitães que me cumpria dar; mas referir-me-hei ainda ao que s. exa. chamou circumstancias anormaes da crise parcial do governo.

Ora, sr. presidente, quem tem como eu uma vida politica já um pouco longa e alem disso, não esquece os documentos e actos parlamentares de todos os partidos políticos, mal póde comprehendcr como um membro auctorisado de um partido, que já foi ministro e é dignissimo de o ser uma e mais vezes, (Apoiados.) póde vir qualificar de anormal e condemnar uma crise do governo por um facto que em muitas occasiões e em circumstancias similhantes tem occorrido, achando-se no poder o partido a que s. exa. pertence!

Póde realmente dizer-se anormal uma crise, porque ella

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nasce da discordancia entre um ou outro ministro e o resto do ministerio?!

Quantas vezes o partido progressista tom recomposto os seus ministerios, sem precedência de acto algum parlamentar, sem que tenha havido votação alguma contraria, e sim unicamente por effeito de discrepância entre os ministros, não podendo o governo caminhar, sem se recompor ou modificar de qualquer modo que seja!

Ainda no ultimo ministerio progressista não vimos nós sair o sr. João Chrysostomo de Abreu e Sousa e entrar o sr. Castro?

E qual foi a votação parlamentar que deu logar a esse facto?

Se houvesse essa votação abrangeria ella só um ministro?

Foi simplesmente uma divergência, um desaccordo com os seus collegas o que fez sair do ministerio o sr. João Chrysostomo.

Porque não previram esse desaccordo?
Porque não evitaram a tempo a crise?

Foi pelo mesmo motivo por que nós agora não previmos a crise que se deu ; foi porque nunca se suppõe que se dêem esses factos extremos de manifestações de crises senão quando a discordância de idéas toma um aspecto tal que a conciliação se torna impossível. Foi o que aconteceu então e o que acontece agora.

Mas quando se têem praticado estes actos recentemente e que estão vivos na memória de toda a gente, custa a comprehender como um homem da elevada capacidade do illustre deputado venha accusar de anormal a situação em que o governo se collocou, porque saiu um ministro, sem se lembrar que no ministerio de que s. exa. fazia parte, e ainda era ministerios anteriores, tem acontecido exactamente o mesmo, sem ter precedido nenhum acto parlamentar.

A crise é fatal e inevitavel para o gabinete se ha discordância completa de opiniões entre os ministros.

Mas desde que em assumpto importante, um ministro tem uma opinião e outro manifesta, opinião diversa, o governo dará ou não todo a sua demissão, conforme for conveniente. Depende isso da natureza da questão que se ventila, e de outras circumstancias. E se se resolve a recomposição, quem está em minoria sáe, e sáe honrada e honrosamente, sem que dahi resulte nenhum anathema nem para estes, nem para os que ficam.

É o que se tem feito sempre inalteravelmente e nunca governo algum foi condemnado por esses factos que são triviaes.

Esta crise foi, como têem sido muitas outras, uma crise parcial que não alterou em nada absolutamente a política do gabinete.

Muito bem disse ha pouco o illustre chefe da opposição, quando no seu discurso insistiu em declarar que o governo ficava onde estava com as suas idéas, com a sua política, com os seus precedentes e com os seus intuitos, e a opposição igualmente na attitude que tinha tomado de atacar o governo por todos os meios ao seu alcance. Nem nós pretendemos o contrario.

Respeitamos muito os nossos hábitos e as theorias parlamentares para o desejar.

Não pedimos nenhuma especie de benevolencia á opposição ella ha de tratar como entender as questões sujeitas á tela do debate, e nós havemos de defender-nos com as forças de que podermos dispor. (Apoiados.)

Resta-me fallar de um acto que se reputou uma falta de cortezia para com a camara.

Eu não sou capaz de praticar um acto de descortezia para com ninguém e muito menos ainda para com a camara; e mesmo na hypothese de que os meus adversarios pratiquem actos desses para commigo, eu sou incapaz de faltar aos deveres que a cortezia me impõe.

Se o ministerio tivesse dado a sua demissão, eu teria vindo immediatamente dar disso conhecimento á camara, que muito respeito.

Mas o governo não entendeu que houvesse motivo para pedir a demissão e tratou unicamente de preencher interinamente as duas pastas que estavam vagas. N'estas circumstancias o governo dirigiu-se á camara por officio, participando-lhe o facto e annunciando lhe que se apresentaria em breve.

E o que hoje fez.

Tratava se unicamente do preenchimento de duas pastas. Eu não podia impedir que qualquer dos membros da opposição, ou da maioria viesse aqui pedir explicações sobre o facto; mas ao mesmo tempo não me era possivel dar essas explicações sem comprometter porventura a modificação que se pretendesse introduzir no gabinete.

Não devia, portanto, vir ao parlamento expor-me a que me dirigissem perguntas às quaes eu não estava habilitado a responder; e nestas circumstancias fiz o mesmo que se costuma fazer em casos analogos; isto é, mandei um officio a v. exa. participando o facto que se dava e declarando que esperava brevemente vir dar conta á camara da solução da crise parcial.

Tenho dado as necessarias explicações e creio que poucas mais poderei dar.

Vozes: - Muito bem.

(S. exa. não revê os seus discursos.)

O sr. Correia de Barros: - Sr. presidente, releve-rne v. exa. e releve-mo a camara que eu use da palavra em uma conjunctura tão importante, e sirva para attenuar a minha ousadia a declaração sincera de que, longo de ceder ao prurido de usar do um direito, do qual de muito boa vontade prescindiria, procuro apenas cumprir, como posso o como sei, um dever que reputo indeclinavel, e em todo o caso com a sã e recta intenção de bem servir o meu paiz. (Vozes: - Muito bem.)

Sr. presidente, eu não comprehendo, em verdade, como é que um estadista tão illustre e de talentos tão provados, como o sr. presidente do conselho de ministros, procura justificar a crise pela qual o gabinete acaba de passar, e sobretudo a maneira por que tal crise foi resolvida, com as recomposições que soífreu o ultimo ministerio progressista.

Em primeiro logar direi a s. exa. que, se na epocha a que se referiu, houve recomposições ministeriaes, agora houve apenas uma desmembração do ministerio. (Apoiados.)

Acrescentarei em segundo logar que, sendo essencialmente differentes as circumstancias, não tem fundamento, nem póde colher a comparação.

Pois não vê o nobre presidente do conselho que n'aquella epocha se achava o governo em frente de umas cortes ordinarias, ao passo que o actual gabinete se acha em presença de uma camara constituinte? (Apoiados.)

No caso presente, e attentas as graves consequencias que podem resultar de uma crise política antes de se haver a camara desempenhado da sua missão propriamente constituinte, e de primeira intuição que os membros do gabinete tinham o rigoroso dever de por tal forma, haver accordado sobre quaes as propostas de lei que cada um apresentaria, e qual o andamento que a cada uma dellas deveria promover-se, que sómente de uma votação parlamentar podesse resultar uma crise. (Apoiados.)

Magoou-se tambem o sr. Fontes porque o illustre deputado e meu amigo o sr. Barros Gomes taxou de menos cortez o procedimento do governo para com o parlamento.

Oh, sr. presidente, pois ter-se-ha varrido já da memoria de alguem o que se passou aqui na sessão de sexta feira ultima? (Apoiaaos.)

Pois terá esquecido já a algum dos membros desta camara que o nobre ministro da fazenda, unico dos membros do governo, que se achava presente, e que por isso o representava, se recusou pertinazmente, apesar das repetidas instancias dos srs. deputados José Luciano e Emygdio

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Navarro a declarar á camara se era ou não verdade estar o ministerio em crise, em consequencia da demissão que se dizia pedida pelo sr. Antonio Augusto de Aguiar?

Pois não se lembra v. exa., e não se lembrará a camara da teimosia com que o sr. ministro nos recusou explicações, que tinha indeclinavel obrigação de nos dar, e que nós tinhamos indiscutivel direito de exigir? (Apoiados.)
Mas ha mais: o illustre ministro da fazenda foi mais longe ainda. S. exa. mais que uma vez affirmou categoricamente que a situação do governo não havia soffrido alteração alguma, e que por isso continuavam sem alteração as relações do ministerio com o parlamento.

E no entanto s. exa. sabia, quando fazia aquella categorica declaração, que desde a vespera não havia ministro das obras publicas.

E estranha o sr. presidente do conselho que um membro desta camara taxe de incorrecto, o de menos cortez o procedimento do governo! (Apoiados.)

Isto posto, seja-me permittido que, no uso do meu direito como deputado, eu formule uma pergunta, á qual espero o governo não deixará de responder.

Sr. presidente, se não tem precedentes na nossa historia parlamentar a crise de que nos estamos occupando, sem precedentes é tambem a fórma, realmente pela qual foi resolvida. (Apoiados.)

Duas pastas importantissimas foram interinamente confiadas a dois ministros, a cargo dos quaes estavam já duas secretarias taes como a da guerra o a do reino.

Porque não se completou o ministerio? (Apoiados.)

Pois não haveria na maioria, em cujo seio o paiz applaude tantos e tão vigorosos talentos, e capacidades tão brilhantemente affirmadas, dois homens, que o sr. presidente do conselho achasse á altura de fazer parte do governo com proveito da causa publica? (Apoiados.)

E se ahi os não achou, estará de todo estanque já o alfebre de sabios, onde em casos apertados costuma s. exa. ir recrutar ministros? (Apoiados.)

Aguardo a resposta do governo, e peço á camara que me desculpe se acaso me alonguei demasiado nas considerações que me julguei obrigado a fazer n'esta occasião.

Termino declarando do modo mais categórico que em tudo quanto disso não tive a intenção de ser pessoalmente desagradável a nenhum da cavalheiros, que se sentam nas cadeiras do governo.

Vozes: - Muito bem.

O sr. Ministro da Fazenda (Hintze Ribeiro): - Pedi a palavra para dar Tinia explicação ao sr. deputado Correia de Barros.

S. exa. como que me accusou de ter sido menos cumpridor dos meus deveres e não sei mesmo se menos leal nas declarações que tive occasião de fazer na sexta, feira n'esta casa. Eu entendo, pelo contrario, que as palavras que troquei com alguns srs. deputados, que me perguntavam se havia crise, ministerial e se o meu collega o sr. Aguiar tinha saído do ministerio, estava no plenissimo direito de as dizer.

Estava no plenissimo direito de as proferir em frente da verdade dos factos e em presença do respeito e de consideração que devo á camara.

Sr. presidente, eu não affirmei, nem neguei. (Riso).

É o facto; não o contexto. Nem affirmei nem neguei que o sr. Aguiar ácerca da sua saída do ministerio foi dada no sabbado, 31 de janeiro, e as explicações que me pediram foram dadas por mim no dia 30; quer dizer que ainda então não havia decisão definitiva ácerca do proposito que o sr. Aguiar manifestára de se ausentar do poder.

Ora, não havendo decisão definitiva, digam-me os illustres deputados se eu devia vir aqui negar ou affirmar que o sr. Aguiar saíria do ministerio, quando eu ainda não tinha a certeza do qual seria a resolução final de s. exa., em virtude dos esforços empregados pelo sr. presidente do conselho para que continuasse a fazer parte do ministerio?

Aqui está a rasão por que não affirmei nem neguei que o sr. Aguiar tivesse pedido a sua demissão.
Agora podem os illustres deputados sorrir-se da minha resposta. Ella fica mantida e explicada em harmonia com a verdade.

Corre-lhe a obrigação de manter os deveres do seu cargo até ao momento em que a sua demissão lhe é acceita. Não póde haver solução de continuidade demorada de ministerio em ministerio. Os ministerios succedem-se, mas sem uma interrupção, sem um longo praso de tempo, que seria prejudicial aos negocios publicos. (Apoiados.)

Mesmo em frente das nossas leis communs, os ministros não podem deixar do se conservar nos seus logares, até á sua substituição, porque, se o abandono de funcções não é permittido aos outros funccionarios, tambem o não é aos ministros.

Portanto, o sr. Aguiar, na sexta feira, era ministro e respondia pelos actos do seu ministerio.

Até ao momento da sua exoneração era elle quem tinha a responsabilidade da gerencia da negocios da sua pasta, o era por isso que eu dizia que o ministerio estava como até então; e tanto assim que, apesar do sr. Aguiar ter manifestado na quarta feira o seu proposito de sair do ministerio, ainda na Quinta feira assignava diplomas e referendava despachos como ministro.

Antes d'isso seria uma imprudencia, uma leviandade; seria faltar á verdade e aos rigorosos deveres para com esta camara, só eu viesse declarar outra cousa que não fosse o que declarei na sessão de sexta feira.

Pelo que toca á pergunta que o illustre deputado fez, sobre os motivos por que não se completou o governo, eu responderei que elle não se completou porque julgou não o dever fazer por emquanto, para assim chegar mais depressa á solução da crise, mantendo todavia a mais completa estima e dedicação pelos seus amigos politicos, que o têem acompanhado e de certo continuarão a acompanhal-o
(Muitos apoiados.)
Vozes: - Muito bem.
(S. exa. não revê os seus discursos.)

O sr. Rodrigo Pequito: - Por parte da commissão de reformas politicas, requeiro a v. exa. que consulte a camara, sobre se permitte que sejam aggregados a esta commissão os srs. deputados Lopo Vaz o Julio do Vilhena.

O sr. Emygdio Navarro: - Fez diversas considerações censurando o modo por que se resolveu a crise, e commentando desfavoravelmente as explicações dadas pelo sr. presidente do conselho.

Preferia que se tivesse organisado um ministerio de acalmação, como dissera o seu chefe, o sr. Braamcamp.

Pretendia saber porque se não completou o ministerio e precisava saber isto por dignidade da maioria.

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Não bastava que um dos srs. ministros viesse dizer que o governo se não completara por achar isso mais conveniente, entendia que o governo tinha obrigação de se apresentar ao parlamento completo, ou então declarar se, tendo pedido a reconstrucção do gabinete, isso lhe não fôra concedido.

Era sua opinião que o sr. Aguiar fora empurrado pelo sr. Hintze para fora do ministerio, e parecia-lhe que um tal acto não tinha precedentes.

(O discurso será publicado na integra, quando s. exa. o restituir.)

O sr. Ministro da Fazenda (Hintze Ribeiro): - A camara me desculpará que eu peça, pela terceira vez, a palavra n'este debate, tendo em consideração, que as apreciações feitas pelo illustre deputado o sr. Navarro, se dirigiram principalmente ao meu modo de proceder. Alem de que s. exa. levantou contra mim uma accusação, que é do meu dever immediato repettir com toda a energia, e ao mesmo tempo com o convencimento da verdade.

Eu não empurrei nenhum dos meus collegas do ministerio. (Apoiados.) Tenho sido leal para com todos; tenho-os acompanhado na mais estreita camaradagem em todos os actos da nossa vida ministerial. Posso ter divergido da opinião de alguns, mas nunca faltei áquillo que é da minha dignidade pessoal.

Não empurrei o sr. Aguiar; não era isso proprio de mim; não o fiz nunca, nem o poderia nunca fazer, porque faltaria aos preceitos mais elementares, não direi da cortezia pessoal, mas da boa fé que se deve manter entre membros de um gabinete que constituo uma família, política. Empurrar, porque? Quando alguém vem ao parlamento aventar uma accusação desta natureza deve citar os factos, para que o paiz possa conhecer se a accusação é ou não verdadeira; porque, só o não for, ella irá ferir, não o accusado, mas o accusador. (Apoiados.)

Empurrar porque? Porque não dei ordem á commissão de fazenda que se reunisse?

Pois eu havia de dar ordem aos membros de uma commissão parlamentar para se reunirem?

São estes senhores, porventura, meus subordinados, a quem eu possa dar ordens?

Não as dei, porque as não podia dar; nem s. exas. as receberiam, porque a sua posição elevada n'esta casa não consentiria que obedecessem.

Se o meu collega, o sr. Aguiar, tivesse manifestado desejos de que a commissão se reunisse, de certo que eu teria contribuido quanto pudesse, para que fosse satisfeito; mas s. exa. nunca instou, nem me disse uma única palavra a tal respeito; por consequencia eu nada tinha a fazer. De resto, bastaria a influencia de que dispunha o meu collega das obras publicas, para obter que a commissão de fazenda se reunisse, a fira de tratar de qualquer assumpto dependente da sua pasta.

Eu sempre assim procedi; e s. exa. assim podia ter praticado também.

Do mesmo modo, se porventura esta questão tivesse sido tratada entre nós, eu teria dado a s. exa. a rasão que já expuz ao parlamento, e que me levou a desejar que se sobre estivesse no andamento da proposta de lei relativa aos melhoramentos do porto de Lisboa.

Mas eu devia acompanhar o sr. Aguiar na sua demissão! Porque?

Nenhum ministro deve sair do gabinete por simples cortezia, como não deve entrar por ambição.

Os ministros saem quando a sua posição é insustentavel no gabinete por divergência com a maioria dos seus collegas ou quando lhes falta o apoio parlamentar ou a confiança da coroa. Fora destas hypotheses, têem obrigação de se conservar nelle. Proceder de modo contrario seria uma deserção.

Eu faltaria, portanto, ao meu dever, se me tivesse tambem retirado do ministerio, estando, como estou, em perfeito accordo com a maioria dos seus membros e não só tendo dado nenhuma das outras condições que póde justificar o pedido de demissão de algum ministro.

A pergunta, porque não se completou o ministerio, respondi eu já como sabia e podia. Não tinha mesmo outra resposta a dar, nem me pareço que a opposicão tenha direito a mais do que a exigir que o ministerio cumpra os deveres do seu cargo, o pela minha parte tenho-o cumprido.

Nenhuma pasta está ao abandono. Á excepção d'aquella que eu estou gerindo, as demais estão confiadas a collegaa meus que, pela sua illustração parlamentar, pelos seus habitos e pela experiencia na governação do estado, dão garantias bastantes de que as questões são por ellea tratatadas com a circumspecção e madureza necessárias, o que são proprias do seu talento e do conhecimento dos negocios publicos. (Apoiados.)

Ha, porém, uma pergunta feita pelo illustre deputado que carece de resposta.

Quer s. exa. saber, se o governo não só completou por não lho ter sido concedida a sua recomposição, tendo esta sido pedida.

Eu ouvi sempre com a maior attenção as perguntas que me foram dirigidas, e todos ellas me podiam parecer naturaes e inspiradas no desejo do conhecer a verdade dos factos que se tivessem dado, ou das circumstancias que tivessem occorrido. Mas o que me pareceu realmente extraordinario e injustificavel foi que se perguntasse a um membro do gabinete se porventura, tendo o governo podido a recomposição, ella lhe fora negada.

Sr. presidente, pois se o governo houvesse pedido a recomposição o ella lhe tivesse sido negada, poderia ella porventura achar-se ainda aqui?!

Desde o momento em que se desse essa recusa, faltaria a confiança da corôa e perdida ella, o gabinete teria immediatamente pedido a sua demissão. (Apoiados.)

S. exa., remontando a um ponto de vista mais alto, declarou que felizmente a situação era definida, clara, sem ambages, e tal que collocára os partidos no seu verdadeiro terreno; o que sendo este um governo do intransigencia não podia haver da parte da opposição veleidades de accordo, conciliação, ou harmonia sobre qualquer questão.

A intransigencia do governo demonstrou-se quando fez o accordo com os seus adversarios. Quanto á intransigencia da opposicão, se eu me soccorresse a exemplos que tenho visto seguir n'esta casa, podia talvez, como outros srs. deputados têem feito, ir buscar aos echos da imprensa uma prova do que essa intransigência não é tão completa, que não se apregoasse a conveniencia, de um ministerio do conciliação.

É n'este caso eu perguntaria aos que me ouvem, onde ficava o espirito de intransigencia attribuido ao governo e a guerra intransigente tão alardeada pela opposição. (Muitos apoiados.)

Nós não precisâmos do benevolencia dos nossos adversarios. Emquanto tivermos amigos que nos acompanhem, emquanto tivermos a confiança da corôa e do nosso lado a maioria parlamentar, havemos do cumprir com os nossos devores a despeito de todas as accusações, ainda as mais violentas, e procuraremos responder pelos nossos actos e justificar a nossa situação em frente do parlamento. (Muitos apoiados.)

Não precisamos da benevolencia dos nossos adversarios, se porventura elles entenderem que, nos interesses partidarios que têem a manter, são convenientes as accusações violentas, a guerra desapiedada. (Apoiados.)

Se assim for, chovam sobre nós todas as iras da opposição, todos os raios da cholera dos nossos antagonistas, que nós, impávidos e serenos, procuraremos cumprir o nosso dever com aquella abastança de consciencia que é propria, não digo dos homens fortes, porque me não con-

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sidero tal, mas dos homens que têem responsabilidades a sustentar. (Apoiados.)

Essa consciencia, é que dá a força, mais do que qualquer outra, porque não é á força que se traduz pela violência da palavra, mas sim a força que se traduz pelo inabalável propósito de só seguir o caminho que se acha traçado. (Apoiados.)

Intransigencia com o governo e com a sua obra?!
Como queiram os illustres deputados.

Não é tal o aferro do governo às pastas, e, quando fallo do governo, fallo dos ministros actuaes, que, se porventura elle entrevisse a possibilidade de qualquer accordo, no interesse dos partidos militantes, em harmonia com as circumstancias que se dão e tendo em vista o largo objectivo das reformas politicas, não pozesse tudo de parte para realisar esse accordo.

Quando nós temos visto os illustres deputados da opposição virem aqui, alevantados em colera, e despejar contra o governo, e principalmente contra o sr. presidente do conselho, as palavras mais acerbas, as mais tremendas accusações, seria da parte do governo aferro às pastas e não tratar sequer de saber se algum espirito de conciliação podia animar as hostes partidarias em beneficio da causa publica?

Não seria para estranhar que tal succedesse, e todavia não succedeu. (Apoiados.)

Por consequencia, convençam-se os illustres deputados de que não é o aferro ao poder que nos tem aqui.

A nossa intransigência é unicamente a necessidade de cumprirmos o nosso dever.

A nossa intransigencia é unicamente a necessidade de oppormos às accusações dos illustres deputados a defeza da nossa causa, é unicamente a necessidade de respondermos á, guerra desapiedada e cruel que se levanta contra nós, com a sustentação, palmo a palmo, do terreno em que nos collocámos, e das idéas que abraçámos.

Vozes: - Muito bem.

O sr. Alves Matheus: - A sessão vão muito adiantada, o eu não desejo abusar da longanimidade da camara, e por isso vou apreciar em breves palavras a solução e o desfecho da ultima crise ministerial.

Depois de tantos trabalhos e de tão mysteriosas combinações, ninguém podia esperar um resultado tão pequeno.

Sabe v. exa. crise, que se abriu, se reuniram conselhos, se mandaram embaixadas, se fizeram propostas, se teceram muitos manejos e porventura fervilharam numerosas intrigas; e depois de tudo isto vemos, um logar de um ministerio recomposto, um governo mutilado. (Apoiados.)

Uma recomposição, como a propria, palavra está dizendo, significa o aproveitamento e o concurso de elementos novos, que venham reconstruir e consolidar uma situação politica.
Mas o que vemos nós?

Vemos uma reducção do ministros e uma accumulação de pastas. Vemos ministros de monos o fraqueza de mais.

Isto não é uma composição, é uma decomposição; (Apoiados.) não é signal de vida, e um symptoma de morte. Isto, sr. presidente, não significa um esforço sincero para governar com proveito do paiz; isto não é mais do que o inútil estrebuchar de uma inglória e lenta agonia. O resultado da ultima crise não é só a expressão do uma grande fraqueza, é tambem a consagração publica o authentica de um procedimento menos leal para com o sr. ex-ministro das obras publicas. (Apoiados.)

Sr. presidente, em poucas palavras demonstrarei a verdade da minha proposição: ou o sr. Fontes não tinha elementos para. preencher as pastas vagas e fazer uma verdadeira recomposição, e n'esse caso o partido regenerador, o que s. exa. illustremente presido, não terá as necessarias condições de vida; sobre ella uma desconsideração tão grave como injusta. (Apoiados.)

Mas, qual seria a causa principal d'esta crise tão laboriosa tão longa e complicada, em que a montanha ministerial, coroada pela personalidade illustre do sr. Fontes Pereira de Mello, estremeceu e gemeu para se desentranhar a final nesse fructo, n'esse parto enfermiço, condemnado já a um período do vida muito curto?

Eu ouvi attentamente as explicações dadas pelos illustres ministros que tomaram parto no debate, e confesso, que nenhuma dessas explicações me satisfez.

Disse primeiro o sr. Fontes: «Nunca impugnámos a proposta relativa aos melhoramentos do Lisboa, mantivemol a sempre com todas as suas disposições, não renunciámos ao pensamento e ao desejo de a realisar; a questão era do opportunidade, e a rasão mais poderosa para sobreestar-mos agora na execução dessa proposta era a descida dos nossos fundos em Londres».

Mas qual foi a rasão por que no conselho de ministros, em que se resolveu, apesar das primeiras repugnancias manifestadas, adoptar a proposta do sr. Aguiar sobro os melhoramentos do porto de Lisboa, só não apreciou e ponderou
logo o ponto importante da opportunidade?

N'essa occasião já se estavam sentindo os desastrados o lastimosos effeitos do ultimo empréstimo; já então se patenteou um facto gravíssimo, que não podo deixar do só considerar como um terrível abalo, como um grande desastre para o nosso credito, porque a maior parto dos titulos não encontraram tomadores.

Nas praças estrangeiras sabe-se perfeitamente e ha muito tempo, qual é o nosso estado financeiro; conhece-se e comprehende-se, que a construcção simultanea de uns poucos de caminhos de ferro representa encargos pesadissimos, que o governo tem de satisfazer em breve, e nas circumstancias ruinosas em que está a fazenda publica, só por meio de onerosissimos sacrifícios se podem satisfazer esses encargos.

Sr. presidente, declarou ha pouco o illustre ministro da fazenda em tom solemne e altisonante: «Eu não empurrei o sr. Aguiar!»

O meu illustre collega e amigo o sr. Emygdio Navarro, referindo-se ha pouco ao sr. ex-ministro das obras publicas, apreciou com inteira justiça os elevados dotes e os distinctos merecimentos do sr. Aguiar, que é, na verdade, não só um homem illustradissimo, mas tambem um caracter serio o honrado. Ora, o sr. Aguiar interpretou certos factos e occorrencias que se deram, como impedimentos, como estorvos, calculadamente postos pelo governo á approvação da sua proposta, e a opinião publica, que e suprema julgadora, pronunciou-se já do uma maneira terminante e significativa, reputando a saida do sr. Aguiar como a resultante de um conluio e do um acto menos leal, como uma das emboscadas mais tenebrosas, de que tem sido victima um ministro da corôa. (Apoiados.)

Acabou de dizer o sr. ministro da fazenda obrigação era ficar n'esse logar.

A obrigação rigorosa de s. exa. não só politica, como moral, era não continuar mais n'aquellas cadeiras; era acompanhar o sr. Aguiar, visto que tinha posto a sua assignatura na proposta, á qual tem presas as suas responsabilidades,
não podendo nenhuns subterfugios, nenhumas allegações de opportunidade justificar a sua continuação como ministro.

O principio da solidariedade ministerial devia merecer a s. exa. mais respeito, mas o seu apego obstinado e cego ao poder, não lhe deixa ver, nem comprehender, nem acatar outro principio, que não seja o da, sua perpetuidade no poder. (Apoiados.)

Podem rebentar crices, podem cair ministros, podem sur-

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gir difficuldades gravissimas, podem, as ondas e as tempestade assaltear e escalavrar o barco ministerial, que o sr. ministro, agarrado com mãos do ferro á borda vacillante desse barco, resiste a todos os impulsões, escapa de todos os perigos, salva-se de todos os naufragios, e emquanto quasi toda a tripulação se afunde e desapparece, elle fica impavido e sereno no meio das ruinas e dos desastres. S. exa. é certamente o Achilles da politica nacional; (Riso.) não ha golpe certeiro, que possa feril-o no calcanhar.

Qual será a causa desta teimosia, desta insistencia do sr. Fontes em continuar no poder, acabando de dar a prova mais cabal, de que não póde se quer fazer já uma recomposição ministerial?

Todas as tentativas, todos os esforços, todos os expedientes empregados pelo sr. Fontes para manter uma situação gasta, enfraquecida e dilacerada, (Apoiados.) por dissensões internas, são completamente baldados e infructuosos.

A permanencia do sr. Fontes no poder não póde fundamentar se em nenhumas rasões de conveniencia publica, nem d'ella é licito esperar a resolução das questões mais graves e urgentes, que impendem ao para e que demandam uma solução prompta. O sr. Fontes perdeu a força e já não tem auctoridade para resolver a questão de fazenda; não póde fazer proveitosamente as reformas politicas, nem asseguram-lhe uma larga duração porque tem contra cilas a guerra aberta e franca do partido progressista e do grupo conservador da camara alta; tambem não póde contar com a benevolencia e apoio do partido constituinte, cujo illustre chefe e meu antigo amigo o sr. Dias Ferreira declarou, ha um anno, nesta casa, que não admittia organisação da segunda camara, que não tivesse por base essencial a applicação do principio electivo.

Se a presença do sr. Fontes no poder não significa nem representa actualmente a satisfação de nenhum grande interesse publico, serve ella sómente para mostrar que a omnipotencia politica do sr. presidente do conselho, sobrepondo-se a tudo e a todos, é o nosso primeiro dogma constitucional; só serve para mostrar que s. exa. tem a impavida, mas triste coragem de pretender ligar o seu nome e associar a sua responsabilidade á tremenda derrocada, que nos ameaça na administração, nas finanças, nas colónias, no credito publico, na decadencia cada vez mais profunda do systema representativo, e na propaganda cada vez mais engrossada das idéas republicanas.

A solução da crise, os lances, que a acompanharam e a obstinação do sr. Fontes em governar a todo o transe servem tambem para comprovar, que, se n'este paiz não domina nem prepondera aquella impura politica de serralhotão severamente condemnada pelo sr. Pinheiro Chagas,...

Uma voz: - Não falle n'isso, que o fazem ministro.

O Orador: -...campeia e prevalece rodeada do velleidades mesquinhas e de intrigas envenenadas uma politica miseranda, desvairada e dissolvente, que relembra a do baixo imperio.

Vozes: - Muito bem.

O sr. Presidente: - Está extincta a inscripção. Dou agora a palavra ao sr. Zophimo Pedroso, que a pediu para quando estivesse presente o sr. ministro da marinha.

O sr. Consiglieri Pedroso: - Visto estar presente o sr. ministro dos negócios da marinha e ultramar, desejava que s. exa. informasse a camara ácerca da veracidade do facto relatado num telegramma publicado nos jornaes de hoje, telegrannna em que se diz que o presidente da camara de commercio de Manchester recebera noticia de que os portuguezes tinham tomado posse das duas margens do baixo Congo.

Como este facto é summamente grave, especialmente na occasião actual, desejava que da parte do governo se dessem á camara algumas informações sobre se o telegramma a que me referi tinha algum fundo de verdade.

O sr. Ministro da Marinha (Pinheiro Chagas): - Sr. presidente, dentro de poucos dias deve chegar a Cabo Verde um vapor, vindo de Angola, e se elle trouxer alguma noticia grave, será immediatamente communicada ao governo em telegramma, e eu estarei então habilitado a responder ao illustre deputado.

Sabe s. exa. que ha uma linha de vapores que estabeleceu communicação directa entre o Zaire o a Inglaterra, e é possível por isso que em Inglaterra houvesse conhecimento especial de algum facto que no Zaire se passasse; mas, repito, se effectivamente se deu alguma cousa de notável, dentro de pouco tempo eu terei conhecimento disso e darei á camara as competentes informações.

Por ora, nada mais posso dizer sobre o assumpto ao illustre deputado.

(S. exa. não reviu as notas tachygraphicas do que disse n'esta sessão.)

O sr. Consiglieri Pedroso: - Sei muito bem que o sr. ministro da marinha não póde por agora ter noticia directa dos factos que se houverem passado, depois da saída do ultimo paquete, do Zaire; mas sei tambem que, se o facto narrado no telegramma é verdadeiro, a auctoridade do governo daquella região não se atreveria a praticar um acto de tão alta gravidade, se porventura não tivesse a esse respeito instrucções claras e terminantes do governo.

Portanto, desejava que o illustre ministro da marinha informasse a camara se em conselho de ministros se resolveu alguma cousa sobro este assumpto.

O sr. Ministro da Marinha (Pinheiro Chagas): - A camara sabe que não havendo communicações telegraphicas, por ora, entre Lisboa e Angola, e inconveniente deixar de habilitar o governador de Angola com instrucções um pouco amplas para proceder do modo que elle julgue mais conforme aos interesses públicos, quando se dêem certas e determinadas hypotheses.

A camara comprehende que eu não posso neste momento conhecer os factos occorridos no Zaire, que podessem obrigar o governador de Angola a tomar medidas que elle reputasse necessarias para manter a dignidade da corôa portugueza e a fazer respeitar os direitos que temos n'aquella região.

Não posso saber se elle entendeu ou não que devia impedir o exercício do outra soberania no Zaire.

O governador de Angola, repito, tem instrucções bastante amplas para proceder nas differentes hypotheses que se podem dar; mas neste momento, eu não posso dizer se elle cumpriu ou não as instrucções que tem, porque ignoro por emquanto a hypothese que se deu na Afinca occidental e a que quiz referir-se o illustre deputado.

(S. exa. não reviu.)

O sr. Emygdio Navarro: - Tomando parte no incidente, notou que o sr. ministro da marinha não respondesse precisamente á pergunta do sr. Consiglieri Pedroso, e instou com s. exa. para declarar se nas instrucções dadas ao governador de Angola, auctorisavam o acto a que se refere a noticia de que se trata. Fez ainda outras considerações sobre o assumpto.

(O discurso será publicado na integra, quando s. exa. devolver as notas tachygraphicas.)

O sr. Ministro da Marinha (Pinheiro Chagas): - Eu já declarei que dentro de muito poucos dias posso ter esclarecimentos completos para elucidar a camara.

Não posso de maneira alguma n'este momento ir mais longe. O que posso affirmar é que o governador do Angola tem. instrucções bastantes para poder manter a dignidade do governo portuguez e os nossos legítimos direitos, sem que isso possa significar menos respeito por qualquer decisão que se possa tomar na conferencia de Berlim e que o governo portuguez tenha de acatar.

O sr. Consiglieri Pedroso: - Eu estava bem longe de suppor, sr. presidente, que umas palavras tão simples e que uma pergunta tão singela, que poderia ser feita sem reparo em todos os parlamentos do mundo, tivessem da

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parte do governo como unica resposta, apenas mal disfarçadas evasivas.

Em todo o caso eu já devia estar do certo modo prevenido do que se me responderia por parte do sr. ministro da marinha.

Pois não ouvimos nós, ha poucos minutos, dizer o sr. ministro do fazenda que na sessão de sexta feira, depois de ser com insistência, interpellado ácerca da existência ou não existencia da crise ministerial, elle não tinha affirmado nem negado que o sr. Aguiar tivesse deixado do ser ministro das obras publicas?!

Estamos agora n'um caso identico. O sr. ministro da marinha segue o mesmo svstema do seu collega. Nem affirma nem nega.

Eu não trato do sabor quaos as instrucções que o governo deu ao governador geral de Angola, porque, embora o campo politico em que milito seja o da, extrema esquerda d'esta camara, sei bem que um certos assumpto se deve guardar uma bem entendida reserva, que não póde ser intorrompida pela impaciencia de partido algum, por isso que em questões internacionaes que só prendem com altos interesses do paiz, nenhum de nós deve ter politica, ou ter a unica politica admissivel nesses casos, a politica do patriotismo; mas pergunto unicamente se o facto a que allude o telegramma do Londres é ou não verdadeiro, e se for verdadeiro, contento me com a simples afirmativa do sr. ministro, abstendo-me, por motivos fáceis de comprehender, de mais considerações neste momento, considerações que reservarei para mais tarde.

Diz-me s. exa. que não tom communicação directa com a Africa. Sei isso perfeitamente, já o disse; mas sei que o facto é de tal ordem, que não haveria governador algum do ultramar, por mais amplas que fossem as instrucções que tivesse, que se arriscasse a tomar uma resolução que poderia importar graves consequências para o paiz. (Apoiados.)

Nenhum governador do Angola tomaria n'este momento posse das duas margens do baixo Gongo se não tivesse instrucções precisas do governo neste sentido.

Peço, portanto, ao sr. ministro do ultramar que me diga ao menos, o nesta occasião com isso me contentarei, se o facto está dentro dos limites das instruções que foram dadas áquelle governador. Mais tardo teremos occasião do poder apreciar até que ponto o governo procedeu com acerto, e com que prudencia essas instrucções foram dadas.

Por agora preciso unicamente saber se o governo foi surprehendido pelo telegramma de Londres, ou se o facto que elle revela está dentro do alguma das hypotheses a que se referiu o sr. ministro da marinha.

O finado marquez de Sá da Bandeira em 1838 dava umas instrucções claras e terminantes ao vice-almirante Noronha, teve grande honra em fazer conhecidas essas instrucções.

O actual ministro da marinha procede de modo differente. Intrincheira-se por detraz das reservas diplomaticas, de que só está abusando tanto com grave desprestigio do parlamento, como só numa questão do facto podesse haver reservas diplomaticas!

Não persistirei mais por agora neste incidente, mas desejaria que o sr. ministro da marinha me dissesse se, tendo os soldados portuguezes tomado posso das duas margens do baixo Zaire, se procedendo d'esta forma, estava o governador geral de Angola dentro do limite das instrucções que recebeu do governo.

O sr. Ministro da Marinha (Pinheiro Chagas): - Desde o momento em que o illustre deputado manifesta, e eu sou o primeiro a reconhecêl-o, que acima de tudo, até mesmo dos interesses do seu partido, vê os interesses nacionaes, e que não deseja prejudicar qualquer resolução que possa ser bem acceita por todos aquelles que se prezam de amar a sua patria, como o illustre deputado e eu do mesmo modo; desde que s. exa. sabe perfeitamente, que não posso responder-lhe agora categoricamente, sobre um facto de que não tenho, por emquanto, conhecimento especial, como quer s. exa. que neste momento, sobre hypotheses que não posso architectar, lhe dê as explicações que pretende?

Tenha o illustre deputado paciencia para esperar mais algum tempo, na certeza de que eu, depois de competentemente esclarecido sobre o assumpto, e habilitado por consequência a informar, darei então a s. exa. resposta completa, e á camara todas as informações que forem convenientes.

(S. exa. não reviu.)

Presidente: - Está esgotada a inscripção para antes da ordem do dia. A hora está muito adiantada e por isso vou encerrar a sessão.

Amanha ha trabalhos em commissões e a ordem do dia para sexta feira e a continuação da discussão sobre a resposta ao discurso da coroa.

Está levantada a sessão.

Eram mais de cinco horas e meia da tarde.

Rectificação

A pag. 344, col. 2.ª, lin. 13.ª, onde se lê «formula correcta de todo o saber» leia-se «formula concreta de todo o saber»; a pag. 350, col. 2.ª. lin. 45.º, onde se lê «e habilitando em Berne» deve ler-se «e habilitando esse banco»; a pag. 351, col. 1.ª, lin. 24.ª, onde se lê «proposta franco-allemão leia-se «proposta franco-italiana». lin. 25.ª, onde se lê «representante da Russia» leia-se «representante da França», lin. 30.ª, onde se lê «na impossibilidade de com respeito a alcançar ao fim primordial;» leia-se «na impossibilidade de a alcançar recordar n. 49.º. onde se lê «oeste» leia-se «leste»; lin. 67.ª, onde se lê «todos os srs. deputados e muitos pares do reino», leia-se «muitos srs. deputados e pares do reino».

Redactor = S. Rego.

Página 374

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