SESSÃO N.º 22 DE 7 DE FEVEREIRO DE 1896 225
O deputado que for auctor de um projecto de lei póde fallar uma voz sobre a ordem e duas vezes sobre a materia; e por este artigo fica só como accumulando, dentro da mesma discussão, a discussão sobre a ordem e u discussão sobre a materia.
Pelo presente projecto de regimento o deputado só póde fallar uma vez, ou seja sobre a ordem ou seja sobre a materia. Ora, sr. presidente, podem dar se muitos casos em que, segundo o artigo 108.º, ninguém poderá usar mais de uma vez da palavra...
(Interrupção do sr. Marianno de Carvalho.)
Por exemplo, o projecto das pensões ha de vir aqui trazido pela commissão de guerra; mas como eu sou o auctor de uma proposta, que não é a das pensões e não sou membro da commissão de guerra, não posso usar da palavra sobre o projecto senão uma vez, quer sobre a ordem, quer sobre a materia.
E o argumento apresentado pelo sr. relator sobre a possibilidade de se apresentar proposta, não respondeu á dificuldade.
Lembro que um deputado apresenta, por exemplo, uma questão previa, ou um adiamento. Limita o seu discurso a defender essa questão previa, ou esse adiamento, e não entra na matéria do projecto, por que exactamente não lhe convém. Acaba de fallar, a camara rejeita a questão previa, ou o adiamento, entra-se na discussão do projecto e o deputado não póde tentar melhorar qualquer das disposições do mesmo projecto, porque nem sequer póde usar da palavra na discussão da materia!
O que me parece rasoavel é adoptar n'um termo médio. Nem o principio do regimento actual, nem o do projecto em discussão. Permittir que um deputado possa fallar duas vezes: uma sobre a ordem, outra sobre a materia.
(S. exa. não reviu nem este n'em nenhum dos outros discursos que pronunciou n'esta sessão.)
O sr. Teixeira de Sousa: - Não posso concordar com a modificação que o sr. Arroyo pretende que se faça, porque não me parece que se possam dar, os inconvenientes apontados por s. exa.
Em qualquer estado da discussão do artigo 1.° de um projecto de lei, ou parecer da commissão, se poderá suscitar uma questão previa. Pela redacção do § 1.º do artigo 135.° a questão previa toma o logar da questão principal, quando for admittida, e por conseguinte o uso da palavra na questão previa não impossibilita o orador de fallar sobre a materia.
Eu podia explicar, como entendo, o n.° 2.° do artigo 108.°, da seguinte maneira: "Pode entrar em discussão na occasião uma proposta, a qual póde ser a base da discussão, entretanto não tenho duvida em mandar para a mesa um additamento ao § 2.°, dizendo; "nas condições do numero anterior".
O sr. Marianno de Carvalho: - Parece-me que este artigo não podo ser interpretado isoladamente, é preciso comparal-o com artigos subsequentes que estão no capitulo XIII, relativo às discussões.
Antigamente os projectos tinham uma discussão na generalidade, e o deputado podia fallar na generalidade mais do que uma vez sobre a materia e sobre a ordem. Depois seguia-se a discussão por artigos, o em qualquer estado da discussão o deputado podia pedir a palavra sobre a materia e sobre a ordem, e apresentar sobre a ordem todas as substituições, emendas, additamentos, etc.
Agora não ha discussão na generalidade. Ella desapparece, porque se confunde com a discussão do artigo 1.° Portanto, já é cerceado o direito de fallar sobre um determinado assumpto, e a questão previa e proposta de adiamento não podem tratar-se senão sobre o artigo 1.°, de modo que, quando eu quizer fallar sobre a ordem a respeito de qualquer dos artigos subsequentes do projecto, tenho de inventar uma emenda ou uma substituição, com que talvez não concorde, tenho de fazer uma gymnastica intellcctual para poder fallar no artigo 1.°, a fim de poder apresentar qualquer proposta relativa aos outros artigos.
Ora, nesta questão do regimento como em todas, o melhor é, como se diz, não apertar muito o fiado, porque á força de o apertarem estouram os fios.
O melhor é chegar-se a um meio termo rasoavel, que seria cada deputado poder fallar uma voz sobre à materia em discussão, e uma vez sobre a ordem, e unicamente outra vez sobre a matéria se for auctor do alguma proposta. E ainda restringe mais as faculdades dadas aos deputados da maneira como está redigida a primeira parte do artigo 109.°
Poderia dizer-se: "ninguém poderá fallar mais de uma vez sobre a materia ou sobre a ordem", mas não "ninguém poderá fallar mais de uma vez na mesma discussão".
De maneira que na discussão do artigo 1.° do projecto, que vem a ser a discussão da generalidade e da especialidade desse artigo, eu não posso fallar mais de uma vez sobre a materia ou sobre a ordem. Se, porém, eu tiver tido a cautela de apresentar uma moção, succede então que, pelas disposições do, n.° 2.°, poderei ainda fallar mais uma vez, mas se quizer proceder lealmente na interpretação sobre a materia não posso apresentar nem moções, nem additamentos, nem questões previas, nem substituições, porque não posso fallar mais do uma vez na mesma discussão.
V. exa. comprehende quanto isto cerceia os direitos dos deputados, e que inconveniencia póde ter para a boa elucidação dos assumptos.
Seguramente não ha conveniencia em que as camaras sejam academias de palradores, em que só façam discursos intermináveis que possam trazer o obstruccionismo; mas tambem não se deve cair no excesso contrario de pretender que a camara seja composta de mudos, dando logar a que lá fora se diga ser a academia dos humildes ou ignorantes.
Pois para que é esta restricção, quer sobre a ordem, quer sobre a materia? Para se não poder fallar mais de uma vez? É pouco. Um discurso proferido, não por mim, mas por qualquer deputado mais, competente do que eu, podia trazer ao relator da commissão, ao ministro ou a qualquer dos meus collegas, idéa nova que obrigasse a voltar a tomar a discussão mais proveito publico. E esse direito que querem cercear? Não me parece rasoavel.
Vou citar um caso: a questão do alcool. O norte e sul do paiz estão divididos nesta questão. Os do norte querem direitos baixos para o alcool, e os do sul, parece preferirem elevados direitos. Lembro a v. exa. um expediente que ha muito tempo me passeia pela cabeça. Pôde ser profundamente erróneo, mas tambem por acaso póde ser bom. Ponho esta nova maneira de resolver a questão. O ministro da fazenda ou o das obras publicas, ou o sr. relator da commissão, ou qualquer sr. deputado, parecendo lhe esta idéa nova, tem objecções a fazer, e eu queria explical-a. Diz o regimento: não póde explicar! É assim não ha meio de poder esclarecer a questão.
Portanto, parecia-me que se devia propor o que disse o sr. Arroyo, sem deixar largas ao obstruccionismo, mas tambem sem cercear as discussões, para que a final de contas a camara não fique reduzida a uma machina de votar.
É para isso que chamo a attenção do sr. relator da commissão, esperando que s. exa. admitta alguma transacção a este respeito, que me parece convenientissima.
(S. exa. não reviu estas notas nem nenhumas das outras que respeitam aos seus discursos proferidos n'esta sessão.)
O sr. Arroyo: - Pareceu-me da resposta dada pelo sr. relator às minhas considerações ou que entre nós há equivoco, ou que então s. exa. não póde deixar de con-