O texto apresentado é obtido de forma automática, não levando em conta elementos gráficos e podendo conter erros. Se encontrar algum erro, por favor informe os serviços através da página de contactos.
Página 219

N.°22

SESSÃO DE 7 DE FEVEREIRO DE 1896

Presidencia do exmo. sr. Antonio José da Costa Santos

Secretarios-os exmos. srs.

Amandio Eduardo da Motta Veiga
José Eduardo Simões Baião

SUMMARIO

Tem segunda leitura a renovação do projecto, de 1894, auctorisando a camara de Guimarães a levantar um emprestimo.- Dá entrada na camara e presta juramento o sr. deputado João Rodrigues Ribeiro.- O sr. Carlos Braga, depois de apresentar tres representações, pelo providencias sobre o estado da estrada de Fafe a Guimarães. Responde-lhe o sr. ministro das obras publicas. - O sr. Abilio Beça discorre sobre o estado precario do districto de Bragança, e annuncia que em outra sessão continuará as suas observações, respondendo o sr. ministro das obras publicas que n'essa occasião dirá o que a respeito das observações feitas tem a objectar.- É apresentado o parecer das commissões de instrucção publica e commercio e artes, sobre o projecto de lei n.° 1-E.

Na ordem do dia continua a discussão do projecto de lei n.° 3, discutindo-se desde o artigo 106 ° até ao artigo. 140.°, inclusive.- Antes de se encerrar a sessão são apresentados os pareceres sobre o decreto de 10 de janeiro (contribuição de registo), e sobre pensões de officiaes e praças de pret. - São propostos, e ficam aggregados á commissão de marinha, os srs. deputados Mariarmo de Carvalho e Manuel de Bivar.

Abertura da sessão - As tres horas da tarde.

Presentes á chamada, 68 srs. deputados. São os reguintes: - Aarão Ferreira de Lacerda, Abilio Augusto de Madureira Beça, Adolpho da Cunha Pimentel, Agostinho Lucio e Silva, Alberto Antonio de Moraes Carvalho (Sobrinho), Albino de Abranchce Freire de Figueiredo, Amadeu Augusto Pinto da Silva, Amandio Eduardo da Mota Veiga, Antonio Adriano da Costa, Antonio de Almeida Coelho de Campos, Antonio Augusto Correia da Silva Cardoso, Antonio Barbosa de Mendonça, Antonio Candido da Costa, Antonio de Castro Pereira Corte Real, Antonio Hygino Salgado de Araujo, Antonio José da Costa Santos, Antonio José Lopes Navarro, Antonio Teixeira de Sousa, Antonio Velloso da Cruz, Arthur Alberto de Campos Henriques, Augusto César Claro da Ricca, Bernardino Camillo Cincinato da Costa, Carlos de Almeida Braga, Conde de Villar Secco, Diogo José Cabral, Diogo de Macedo, Eduardo Augusto Ribeiro Cabral, Francisco José Patricio, Henrique da Cunha Matos de Mendia, Jacinto Candido da Silva, Jacinto José Maria do Couto, Jayme de Magalhães Lima, João Alves Bebiano, João Ferreira Franco Pinto Castello Branco, João José Pereira Charula, João Lopes Carneiro de Moura, João Marcellino Arroyo, João Pereira Teixeira de Vasconcellos, Joaquim José de Figueiredo Leal, José Adolpho de Mello e Sousa, José Antonio Lopes Coelho, José Bento Ferreira de Almeida, José Coelho Serra, José Correia de Barros, José Eduardo Simões Baião, José Joaquim Dias Grallas, José Marcellino de Sá Vargas, José Pereira da Cunha da Silveira e Sousa Junior, José dos Santos Pereira Jardim, José Teixeira Gomes, José do Vasconcellos Mascarenhas Pedroso, Julio César Cal da Costa, Luiz Augusto Pimentel Pinto, Luiz Filippe de Castro (D.), Manuel de Bivar Weinholtz, Manuel Bravo Gomes, Manuel Joaquim Ferreira Marques, Manuel Joaquim Fratel, Manuel José de Oliveira Guimarães, Marianno Cyrillo de Carvalho, Polycarpo Pecquet Ferreira da Anjos, Quirino Avelino de Jesus, Theodoro Ferreira Pinto Basto, Visconde do Ervedal da Beira, Visconde da Idanha, Visconde de Leite Perry, Visconde de Palma de Almeida e Visconde de Tinalhas.

Entraram durante a sessão os srs.: - Alfredo de Moraes Carvalho, Antonio Ribeiro dos Santos Viegas, Augusto Dias Dantas da Gama, Conde de Anadia, Fidelio de Freitas Branco, Francisco Xavier Cabral de Oliveira Moncada, Guilherme Augusto Pereira de Carvalho de Abreu, Ignacio José Franco, João Maria Correia Ayres de Campos, João Rodrigues Ribeiro, Joaquim do Espirito Santo Lima, José Dias Ferreira, José Freire Lobo do Amaral, José Joaquim Aguas, José Luiz Ferreira Freire, José Maria Gomes da Silva Pinheiro, Luciano Affonso da Silva Monteiro, Luiz Maria Pinto do Soveral, Luiz Osorio da Cunha Pereira de Castro, Manuel Pedro Guedes, Miguel Dantas Gonçalves Pereira, Thomás Victor da Costa Sequeira e Visconde de Nandufe.

Não compareceram á sessão os srs.: - Adolpho Alves de Oliveira Guimarães, Adriano Augusto da Silva Monteiro, Antonio d'Azevedo Castello Branco, Antonio José Boavida, Augusto Victor dos Santos, Conde de Jacome Correia, Conde de Pinhal, Conde de Taverede, Conde de Valle Flor, Jayme Arthur da Costa Pinto, Jeronymo Osorio de Castro Cabral e Albuquerque, João da Mota Gomes, José Gil Borja Macedo e Menezes (D.), José Mendes Lima, Licinio Pinto Leite, Luiz de Mello Correia Pereira Medello, Luiz de Sampaio Torres Fevereiro, Manuel Augusto Pereira e Cunha, Manuel Francisco Varas, Manuel de Sousa Avides, Manuel Thomás Pereira Ementa de Castro, Romano Santa Clara Gomes, Visconde do Banho e Wenceslau de Sousa Pereira de Lima.

Acta - Approvada.

EXPEDIENTE

Officio

Do ministerio da marinha, remettendo, em satisfação ao requerimento do sr. deputado Antonio José Boavida, o processo, relativo ao ex-missionario da Guiné portugueza, o presbytero Marcellino Marques de Barros.

Para a secretaria.

Segunda leitura Renovação de Iniciativa

Proponho a renovação do projecto de lei, apresentado n'esta camara na sessão de 16 de novembro de 1894. - Sala das sessões, 5 de fevereiro de 1896. = Teixeira de Vasconcellos.

Lida na mesa, foi admittida e enviada às commissões de administração publica e de obras publicas.

O projecto de lei a que se refere esta renovação de iniciativa é o seguinte:

Projecto de lei

Artigo 1.º É auctorisada a camara de Guimarães a levantar, por emprestimo, a quantia de 31 contos de réis,

22

Página 220

220 DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS

§ unico. O juro do emprestimo não poderá ser superior a 5 por cento, e a sua amortisação será feita dentro do periodo de vinte annos.

Art. 2.° O projecto do emprestimo será applicado:

1.° Á amortisação do emprestimo de 1892;

2.º A construcção da estrada de Silvares á ponte de Serves a á conclusão de outras.

Sala das sessões, em 10 de novembro de 1894.- Teixeira de Vasconcellos.

O sr. Presidente: - Consta-me que está nos corredores da sala o sr. deputado João Rodrigues Ribeiro. Convido os Srs. deputados Mascarenhas Pedroso e Figueiredo Leal a introduzil-o na sala.

(Foi introduzido e prestou juramento.)

O sr. Carlos Braga: - Sr. presidente, pedi a palavra para enviar para a mesa tres representações: uma, da ex-arbitradores judiciaes da comarca do Monsão contra o decreto de 15 de setembro de 1892; outra da junta de parochia e uns parochianos da freguezia, de Garfe, concelho e comarca de Guimarães, contra o decreto que desannexou esta freguezia do concelho de Povoa de Lanhoso, e outra é camara municipal do concelho do Povoa de Lanhoso contra a parte do decreto de 14 de agosto do anno findo que annexou a freguezia de Garfe ao concelho e comarca de Guimarães.

Aproveito a occasião de estar com a palavra e ver presente o sr. ministro das obras publicas para pedir a s. exa. immediatas providencias sobre o estado em que se acha a estrada que váe da villa de Fafe á cidade de Guimarães, que, nas condições em que se encontra, exige immediatas providencias.

Aproveito tambem o ensejo de ver presente s. exa. para pedir-lhe immediatas providencias, a fim de remediar aquelle estado de cousas.

As representações publicam-se, por extracto, no fim d'esta sessão.

O sr. Ministro das Obras Publicas (Campos Henriques): - Sr. presidente, pedi a palavra para declarar ao illustre deputado que as providencias que s. exa. pediu foram já dadas ha dias, e as obras de reconstrucção d'essa estrada devem já ter principiado.

O sr. Carlos Braga: - Agradeço a explicação de s. exa. o sr. ministro das obras publicas.

O sr. Marianno de Carvalho: - Mando para a mesa o seguinte:

Requerimento

Requeiro que pelo ministerio da marinha sejam enviados com urgencia a esta camara os telegrammas, officios ou cartas enviadas pela commissão de escolha de navios e varias casas constructoras, pedindo-lhes projectos e preços, ou só aquelles ou estes, para acquisição de navios. = Marianno de Carvalho.

O sr. Abilio Beça: - Sr. presidente, eu desejo chamar á attenção do governo e em especial do sr. ministro das obras publicas para a situação em extremo precaria e, a certos respeitos, quasi alarmante em que se encontram alguns concelhos do districto de Bragança.

Eu pretendo solicitar a attenção do governo para o facto altamente symptomatico do augmento progressivo da emigarção no districto que represento, onde, ainda, ha bem poucos annos, ella era quasi nulla: apontar-lhe as causas mais palpaveis d'esse movimento da população n'algumas regiões de Traz os Montes; e pedir-lhe a applicação, na medida do possivel das providencias que podem combatel-o, ou, pelo menos, minorar-lhe a intensidade.

Fu sei, sr. presidente, que o problema da emigração é dos mais complexos e de solução mais difficil; assim como v. exa. sabe que o deslocamento da população, onde quer que superabunda, ou se acha era desproporção com as subsistencias, e frequentemente uma necessidade, um remedio ao pauperismo, o que o espirito de ganancia ou de aventura, que anima os emigrantes, cria por vezes uma abundante fonte de receita para o paiz; donde o movimento parte.

Mas sabe tambem v. exa. e sabe a camara que o desapparecimento, lento ou brusco, de povoações quasi inteiras não póde considerar-se nunca um symptoma nem uma esperança do bem estar e de prosperidade para uma região qualquer.

Sr. presidente, é digno de elogio o actual governo, que tanto se esmera em prevenir e providenciar sobre as necessidades da nação, em todos os ramos da sua economia.

E este capitulo da emigração não ha escapado á sua solicitude.

Prova-o a proposta de lei apresentada na sessão parlamentar de 1894, pelo então titular da pasta da marinha, o sr. conselheiro Neves Ferreira, e assignada tambem pelos nobres presidente do conselho e ministro do reino; proposta que visava a encaminhar a emigração portugueza para as nossas colonias, o que é de suppor seja renovada, ou substituiria por outra, pelo actual sr. ministro da marinha, de cujo talento e devotação pela causa publica o paiz tanto tem a esperar.

O notavel relatorio que procede aquella proposta, de lei mostra bem que o governo estudou com profundeza o momentoso problema da emigração nacional; e que, se elle não podo, pela penuria dos recursos do thesouro, regularisar o movimento emigrativo tão completamente como era de desejar, não deixou, todavia, de considerar a questão nos seus diversos aspectos, procurando fazer votar medidas attinentes a encaminhar a corrente da emigração.

Segundo essa proposta de lei, o governo adoptou n'esta questão o mesmo pensamento que em tempo inspirou o governo inglez, quando este procurou resolver com vantagem o problema da emigração do seu paiz.

A Inglaterra, começando por decretar medidas prohibitivas referentes ao assumpto, as quaes teve mais tarde de derogar, porque as idéas do seculo não se compadeciam já com a denogação arbitraria do direito que cada qual tem de sair livremente do seu paiz e de voltar quando quizer, a Inglaterra, com aquelle grande senso pratico que caractorisou sempre a sua administração, cedeu ao movimento irresistivel da emigração, que não pôde senhoriar, mas tratou de tirar délle partido, como meio de colonisar as suas vastissimas possessões.

A emigração da Inglaterra dirigia-se de preferencia para os Estados Unidos, como a de Portugal se tem dirigido em grande parte para o Brazil. Pois o governo inglez procurou e conseguiu fazer derivar uma parte da emigração do seu paiz para as suas colonias do Canadá, do Cabo e da Australia, despendendo para isso quantias consideraveis; e por tal modo o fez, que essas colonias prosperaram a ponto de possuirem já ha annos administrações autonomas e de constituirem abundantes mananciaes de riqueza para a nação que as fundou.

Ora a proposta governamental apresentada no parlamento pelo sr. Neves Ferreira visa tambem á creação de centros de colonização nas nossas provincias do Angola o Moçambique, fazendo convergir para ali uma parte da corrente da emigração portugueza.

Mas, para o caso restricto de que pretendo occupar-me, do que é preciso tratar-se não é tanto de encaminhar, como de evitar a emigração da população transmontana; porque no districto de Bragança, onde a densidade da população é já pequena - de vinte e sete habitantes por kilometro quadrado, a gravidade dos phenomonos economicos que a emigração tendo a provocar, particularmente sob o triplice ponto de vista do abaixamento do preço da propriedade, do encarecimento dos salarios agricolas e portanto da diminuição da producção do solo, sobreleva em importancia

Página 221

SESSÃO N.º 22 DE 7 DE FEVEREIRO DE 1896 221

a vantagem que a emigração importa como remedio ao pauperismo da provincia.

Não deixa o governo de considerar ainda o problema da emigração por esta face.

Vê-se isso dos dois seguintes períodos do bem elaborado relatório a que me referi.

(Leu.)

Do que li mostra-se que o pensamento do governo é sim, dirigir convenientemente uma parte da emigração nacional para as nossas provincias ultramarinas, sem que todavia deixe de curar em contrarial-a quanto possa, procurando combater as causas que a produzem.

É a effectivação d'esse pensamento do governo, tão claramente expresso no seu relatório, que eu entendo dever reclamar no tocante á emigração do districto de Bragança. E lembro a conveniência da realisação d'esse proposito do governo com respeito a esse districto, porque é n'elle que a corrente da emigração vae crescendo numa proporção que só encontra igual na emigração de ha ânuos na região vinhateira do Douro, quando a invasão phylloxerica destruiu os seus vinhedos; porque é n'elle que o movimento emigrativo vae augmentando n'uma progressão tal, que o decrescimento da população não poderá deixar, dentro em pouco, de se tornar muito sensivel em toda aquella região transmontana.

Sr. presidente, a emigração, excepção feita dos districtos de Evora, Portalegre, Santarém e Castello Branco, onde quasi não existe, tem augmentado, infelizmente, de anno para anno em todo o paiz. E a impulsão d'este movimento é tal que só podem conceber fundados receios de que a população deixe de crescer em Portugal, como progressivamente tem crescido em todos os paizes da Europa.

Pelo que diz respeito ao districto de Bragança, é já patente que o despovoamento continuo que n'elle se opera se vae convertendo numa causa seria de empobrecimento para alguns concelhos.

Segundo as, ultimas publicações dos trabalhos demographicos da repartição de estatística geral, vê-se que, do confronto do numero de obitos e de emigrantes durante o anno de 1890 com o numero de nascimentos no mesmo anno, resulta uma differença apenas de 7:600, numero que representa o saldo a favor da população do continente e ilhas adjacentes; e, este saldo desapparece, talvez, se fizermos entrar em linha de conta a emigração-clandestina, que se faz principalmente pelos portos da Galliza; a qual, a meu ver, não é compensada pelo numero de emigrantes que regressam ao reino, ou de emigrantes que se estabelecem no nosso paiz.

Quem consultar a estatistica do movimento da população, publicada em 1890, verá que a emigração em Portugal, nos últimos annos, foi, em numeros redondos, a seguinte:

Em 1886 emigraram 14:000 pessoas; em 1887, 16:000; em 1888, 24:000; em 1889, 26:600; e em 1890, 29:500.

Confrontando com estes números a emigração no districto de Bragança, nos mesmos annos, vê-se que ella augmenta ali numa proporção incomparavelmente maior que a que se observa no augmento da emigração geral do paiz. Deve notar-se que ha dez annos, em 1886, não havia emigração no districto de Bragança. Foi a invasão da phylloxera que, destruindo os importantes vinhedos de quasi todo o districto, empobrecendo centenas de familias, e deixando sem trabalho muita gente que se empregava no grangeio das vinhas, determinou ali a corrente de emigração, a qual principiou a accentuar-se notoriamente no concelho de Vinhaes.

Por outro lado as contribuições do estado, sobrecarregadas com as percentagens do districto, do municipio e da parochia incidindo sobre a propriedade, muitas vezes em desproporção com o rendimento della, em annos successivos de más colheitas, como foram às destes ultimos n'aquelle districto, têem concorrido para a ruina de pequenos proprietarios, que se vão lançando na aventura da emigração, deixando diminuida a população dos campos.

Por ultimo, a paralysação das obras particulares e publicas, consequencia da crise economica e financeira por que o paiz tem passado e que ainda não está de todo dominada, tem ajudado a engrossar a corrente dos que, não encontrando trabalho remunerado na pátria, vão procurar fortuna no Brazil.

Vejamos agora a traducção dos factos em numeros.

Consultemos a estatistica publicada em 1890.

A emigração, accusada pelos passaportes passados no governo civil de Bragança, sem contar os que emigram clandestinamente por Hespanha, foi n'aquelle districto, em 1886 de 30, em 1887 de 115, em 1888 de 544, em 1889 de 653, em 1890 de 1:065.

Quando se publicar a estatistica da emigração dos annos posteriores,
verificar-se-ha que ella continuou a augmentar muito sensivelmente n'aquelle districto.

Para avaliar-se do seu incremento basta que se saiba que só no mez de março do anno findo se passaram, no governo civil de Bragança, passaportes a 250 emigrantes.

A impulsão; da corrente emigratoria é esta; e se o governo se não apressa a adoptar algumas medidas que a façam estancar, o districto de Bragança, que, convenientemente explorado, poderia ser um dos mais ricos do paiz, virá a ficar privado do mais importante agente de trabalho e riqueza - a população abundante e activa.

Sr. presidente, é preciso que uma e muitas vezes se affirme n'esta casa do parlamento que o districto de Bragança tem sido sempre, no tocante a melhoramentos materiaes, auxiliares do desenvolvimento da riqueza, o mais esquecido, o mais desprezado pelos governos d'este paiz, Dará que emfim, se volte sobre elle a attenção que merece, e a que por muitos titulos tem incontestável direito.

Devido á sua situação no extremo norte do paiz, e sobretudo á deficiencia de communicações rapidas e económicas, aquelle districto é o menos conhecido do reino. E no emtanto não têem passado desapercebidas a um bom numero de homens illustrados que o hão visitado as riquezas, em grande parte inexploradas, que o seu solo representa e o seu sub-solo contem. A diversidade de climas, proveniente da grande accidentacão do terreno, combinada com a diversidade da constituição geológica do solo, permitte ali culturas o producções tão variadas, que póde dizer-se com verdade que o districto do Bragança contém todas as aptidões agricolas do continente portuguez.

Muito succintamente direi que n'aquella região se colhem vinhos dos mais apreciados typos das outras regiões do paiz, que ali se produz abundantemente o azeite, todos os cereaes, legumes e fructas, que ali se encontram excellentes madeiras de construcção e abundantes pastagens, que ali, emfim, prosperam todas as espécies de gado graudo e miudo.

Ainda mais, o districto de Bragança contém no seu subsolo, como nenhum outro, importantes jazigos mineraes, já assas conhecidos e que hão de um dia constituir a primeira riqueza d'elle, augmentando a riqueza do paiz.

São numerosas as minas de estanho que se encontram na parte septentrional do districto. Para as explorar tem-se já formado companhias nacionaes e estrangeiras, que hão já despendido quantias importantes na lavra d'elles e na montagem de machinismos para a lavagem do mineral. Mas a grande despeza que demanda actualmente ali o transporte do minerio até á primeira estação de caminho de ferro tem feito paralysar as explorações mineiras.

São muito notaveis os enormes jazigos de ferro do monte Reboredo, proximo a Moncorvo, os quaes occupam uma área de 17 kilometros quadrados e cujo minerio, que se encontra em grande abundancia a descoberto, contém uma percentagem superior a 70 por cento de ferro.

Estes importantes jazigos podem vir um dia a substituir as minas de ferro de Bilbau, em Hespanha, que, se-

Página 222

222 DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS

gundo li algures, se encontram já em via de extincção. Montando-se ali, ou próximo da foz do Douro, officinas com altos fornos, e vindo era auxilio das industrias metallurgicas nacionaes a protecção pautal, as minas do Reboredo poderão um dia fornecer de ferro em bruto e traba lliado todo o roiuo, de onde saem annualmente, para compra d'este artigo cerca de 2:000 coutos do réis, poderão fornecer as nossas vastas colonias, onde ha tanto caminho de ferro a construir e tanto machinismo industrial a montar, e poderão, emfim, fornecer os mercados estrangeiros.

Ha tambem n'aquelle districto as já afamadas pedreira de marmores brancos, tão preciosos como os do Garrara, (Apoiados.) e de magnificos alabastros do S. Pedro da Silva, no concelho de Miranda do Douro, mais vulgarmente conhecidas por pedreiras de marmore e alabastro de Vimioso.

E são ali notaveis as espaçosas grutas de paredes abobadas de alabastro, ornadas com caprichosos rendilhados do stalactites e stalagmites de todos os tamanhos; grutas tão bellas o curiosas, que, se houvesse próximo uma estação de caminho de ferro, formar-se-ía para ali uma constante romaria de nacionaes o estrangeiros, para as visitar. (Apoiados.)

Encontram-se ainda n'aquelle districto vestigios de ferro, prata e anthracite, espécie de carvão de pedra, e muitos outros minerios.

Pode-se avaliar da importancia dos jazigos mineraes que ali se encontram pelas informações colhidas no Inquerito industrial do 189O, do que tenho aqui algumas paginas, contendo os seguintes informes, que peco licença para ler á camara.
(Leu.)

Sr. presidente, é facto verificado e incontroverso que o districto de Bragança contém variadissimos elementos de riqueza, e que as suas producções se podem tornar consideravelmente mais abundantes do que o são hoje. Para isso é preciso valorisar convenientemente os seus productos, por forma a obter-se preços compensadores da exploração em mais larga escala do seu solo, que é vasto, e do seu sub-solo, tão opulento em mineraes. (Apoiados.)

Mas a este desideratum oppõe-se a falta do communicações rapidas e faceis. (Apoiados.)

Regiões assaz consideraveis, concelhos inteiros ha n'aquelle districto que vivem no mais apertado bloqueio. Por um lado a raia de Hespanha, e por outros as grandes distancias e os velhos caminhos accidentados quasi os isolam dos centros de consumo e de commercio.

A camara vae de certo admirar-se com os esclarecimentos que sobre a viação no districto de Bragança vou apresentar.

Tenho aqui o relatorio impresso do distincto engenheiro sr. Pedro Ignacio Lopes sobre a viação ordinaria do paiz em 30 de junho de 1893.

Recorrendo aos dados estatisticos que este instructivo documento nos fornece, vê-se que em 30 de junho de 1893 havia construídos no continente do reino 9:313 kilometros de estradas de primeira e do segunda ordem.

Há no reino só quatro districtos com maior extensão do que o de Bragança: são os de Beja, Lisboa, Santarem e Evora; Bragança occupa o quinto logar no tocante a extensão.

Ora, sendo dezesete os districtos administrativos do reino e senão doze mais pequenos do que o de Bragança, é este o que tom menor numero de kilometros de, estradas construidas.

D'aquelles 9:313 kilometros de estradas em conservação o districto de Bragança só tem 307 kilometros.

Todos os outros districtos têem maior número de estradas construidas do que elle; ha-os com metade ou menos da sua extensão, tendo todavia o dobro ou mais das estradas mais das estradas macadamisadas que possuo o districto de Bragança
quer dizer, têem proporcionalmente quatro, cinco ou seis vezes mais kilometros de estradas que elle.

Nada mais eloquente do que os números representativos dos factos que se desejam comparar.

Recorrendo á tabella estatistica da pag. 4.ª do relatorio do sr. Pedro Ignacio Lopes, vê-se que o districto de Bragança tem 6:665 kilometros quadrados de extensão e o districto de Vianna do Castello tem a terça parte, isto é, 2:238.

Pois o districto de Bragança tem apenas 307 kilomctros de estradas, emquanto que o districto de Vianna do Castello tem 388, quer dizer, proporcionalmente mais do triplo do que tem aquelle. O districto de Braga tem 2:730 kilometros de extensão, o de Bragança, como disse, 6:665; pois o districto de Braga tem, 603 kilometros de estradas, emquanto que o do Bragança tem só 307. O do Aveiro tem 2:925 kilometros quadrados de extensão e 586 kilometros de estradas. Se adoptarmos para comparação o numero do metros de estradas por cada kilometro quadrado, vê-se que o de Vianna tem 173, o de Braga 226, o do Porto 263, o de Aveiro 200, o de Vizeu 130, o de Coimbra 176, o do Santarém 131 e o do Lisboa 157, emquanto que o districto de Bragança tem só 46 metros de estradas por kilometro quadrado.

Poderia levar mais longe o exame da referida tabeliã, mas não o faço, para não cansar a attenção da camara.

Da desigualdade que tom havido na distribuição da melhoramentos publicos resulta que, havendo no paiz muitos districtos tão sulcados de estradas, que não só as povoações mais importantes d'elles estão ligadas entre si o com todos os centros de população, mas até as mais insignificantes aldeias e ainda as quintas dos particulares influentes são já servidas por estradas que o estado mandou construir, no districto de Bragança ha ainda dois concelhos que não estão ligados nem com a capital do districto, nem com o resto do paiz: são os concelhos de Vimioso e do Miranda do Douro.

(Interrupção.)

E o de Freixe de Espada á Cinta, segundo diz o illustre deputado o meu amigo sr. Lopes Navarro.

E no era tanto o concelho do Vimioso é dos mais ricos do districto, já pelas suas producções agricolas, já pela população commercial e industrial que contém; e o de Miranda é igualmente rico sob o ponto de vista agricola e possue a mais apreciada raça bovina do paiz, a chamada raça mirandeza; alem de que a sua capital, que é uma antiga cidade, foi já capital de provincia, séde de um bispado o praça do guerra com tres regimentos de guarnição.

Pois, apesar de tudo isto, fiquem sabendo a camara e o governo que no districto do Bragança ha ainda três concelhos que não têem estradas que os liguem com a capital do districto, nem com o resto do paiz. Não obstante, o estado não deixa de exigir aos habitantes d'aquelles concelhos as avultadas contribuições que os progressos da civilisação e os variados serviços da administração publica actualmente nos impõe.

A distribuição, sr. presidente, dos impostos progressivamente augmentados tem sido igual para todo o paiz; e o districto de Bragança tem tido n'ella a sua quota parte, e mais do que isso, desde que no tempo da administração do sr. conselheiro Dias Ferreira só mandou arbitrariamente sobrecarregar com 4 por cento a percentagem n'aquelle districto destinada aos encargos creados pela
extincta junta geral. A distribuição dos impostos, repito, tem sido igual para todos os districtos e aggravada para o de Bragança.

Na distribuição, porém, dos beneficios, dos melhoramentos de toda a ordem, todos os outros districtos têem tido o seu quinhão, maior ou menor: o quinhão do districto de Bragança ha sido sempre o mais pequeno.

Em abono d'este asserto basta que diga que aquelle districto é o unico cuja capital, Bragança, se encontra ainda

Página 223

SESSÃO N.º 22 DE 7 DE FEVEREIRO DE 1896 223

distanciada 70 kilometros da mais próxima estação do caminho de ferro; é o unico onde ainda existem tres concelhos sem estradas regulares que os liguem ao resto do paiz! (Apoiados.)

O districto de Bragança tem sobeja rasão para se queixar da maneira por que todos os nossos homens publicos, que hão gerido os negocios do estado, têem entendido e applicado os principies de justiça distributiva, no tocante á imposição de encargos e á partilha dos benefícios pelas diversas regiões do paiz, (Apoiados.)

Devo, no emtanto, fazer uma excepção honrosa a favor do sr. conselheiro Emygdio Navarro, que, na sua gerencia da pasto das obras publicas, dotou aquelle districto com algumas estradas; e foi o primeiro que apresentou ao parlamento um projecto de lei para o prolongamento do caminho de ferro de Mirandella a Bragança.

Por isso o nome deste homem d'estado é memorado em Traz os Montes como o de um benemerito do districto de Bragança.

Oxalá que o nobre ministro, que actualmente gere com tanto zelo e intelligencia a pasta das obras publicas, acostumado, como magistrado distinctissimo que tem sido, a applicar a justiça escrupulosamente, venha a constituir a segunda excepção que Bragança tenha a registar, dotando aquelle districto com os melhoramentos de que tanto carece, e a que, em presença dos que os outros districtos já receberam, tem incontestavel direito. (Vozes: - Muito bem.)

Voltando ao ponto de partida, permitta-me o illustre titular da pasta das obras publicas que eu emitta a minha opinião sobre o que é preciso fazer-se para de alguma maneira pôr um diqno á emigração do districto de Bragança, cuja corrente vae engrossando por forma a dever preoccupar-nos a todos nós.

Já apontei as causas que se me antolham como factores principaes do movimento emigratorio daquelle districto: a falta de conveniente valorisação dos productos do bolo, pela deficiencia da viação e consequente difficuldade dos transportes; a desproporcionada tributação attentas as condições locaes; e a falta de trabalho para as classes indigentes.

As providencias que urge, pois, tomar para se obstar ao desenvolvimento da emigração n'aquella região e ao empobrecimento, consequente d'ella, são, a meu ver, as seguintes:

1.° Mandar construir immediatamente os lanços que faltam na estrada, já em grande parte construída, que vae de Bragança a Vimioso e Miranda do Douro.

Para isso encontra o governo auctorisação no decreto de 15 de dezembro de 1894, que determina providencias extraordinarias em caso de força maior, caso que infelizmente ali se verifica, pois que a crise de trabalho, que está produzindo o augmento da emigração n'aquelle districto, justifica a modificação na distribuição da verba destinada á construcção de estradas.

2.° Resolver com urgencia a construcção de uma linha ferrea de Mirandella a Bragança, ou seja o prolongamento da de via reduzida do Tua, ou seja uma linha pelo systema Decauville, assente na berma da estrada real.

Eu bem sei que não se póde actualmente fallar era construcções de caminhos de ferro, sem que se corra o risco de ver o alvitro recebido com sorrisos ironicos ou movimentos de desapprovação.

Mas, no caso especial de que, se trata, a urgencia da construcção d'aquelle caminho de ferro impõe-se com tanta necessidade e a sua realisação representaria uma reparação tão justa, e por outro lado as despezas que esse emprehendimento demanda seriam por tal forma reproductivas, que me parece não se deve hesitar um momento em deliberar a adopção de medida tão conveniente e importante.

É intuitivo que, com a construcção de um caminho de ferro de Mirandella a Bragança, não só se fomentaria o desenvolvimento das riquezas agricolas, das explorações mineiras e da actividade industrial e commercial, augmentando-se assim a matéria collectavel em que incidem as contribuições do estado, mas tambem cresceria consideravelmente o movimento de passageiros e mercadorias nas linhas do Tua, a que o estado dá garantia de juro, e da linha do Douro, que é propriedade do estado. D'ahi resultaria que por um lado, crescendo o rendimento do caminho de ferro de Mirandella, diminuiria muito, ou cessaria mesmo por inteiro a necessidade da garantia de juro que o estado presta á companhia nacional, cuja importancia poderia ser applicada aos encargos da construcção da linha de Bragança, emquanto o seu rendimento não desse compensação sufficiente; e por outro lado, a nova linha, augmentando bastante o rendimento do caminho de ferro do Douro, traria outra compensação aos encargos que a sua construcção importasse.

Sr. presidente, uma outra ordem de considerações mostra a conveniencia de collocar o districto de Bragança em condições de poder dar em riqueza o que e susceptivel de produzir.

No actual momento historico, depois que os nossos valorosos soldados affirmaram com brilhantes feitos de armas, nas três partes do mundo em que possuimos domínios, a nossa vitalidade como nação colonial, a orientação que naturalmente nos está indicada, é a de um movimento de expansão ultramarina no sentido de se avigorar a nossa acção civilisadora no vasto continente africano.

Mas é necessario reflectir.

Devemos nós lançar-nos n'esse caminho sem que primeiro curemos em acabar de fomentar o desenvolvimento das, riquezas que o solo e sub-solo da metropole contêem?
E preciso reflectir, repito; porque quanto façâmos em prol das provincias do ultramar, pude dar-nos, é certo, compensações em um período mais ou menos largo de annos; mas mais tarde podemos perder a maior parte dos fructos dos sacrificios que fizermos n'esse empenho civilisador, em virtude da lei historica, inevitavel e fatal, que leva as colonias, quando sufficientemente desenvolvidas, a emanciparem se das nações que as fundaram.

O que succcdeu á Inglaterra com os Estados Unidos, o que succedeu e está succedendo á Hespanha com as suas possessões da America, e o que succedeu a Portugal cova o Brazil póde um dia succeder-nos com Angola o Moçambique.

Emquanto que, tudo o que se fizer no sentido de augmentar as riquezas das regiões ainda mal exploradas do paiz, ou seja com a colonisação do Alemtejo, ou seja com a valorisação dos productos de Traz os Montes, pelo desenvolvimento da viação ordinaria e accelerada n'elle, ficará revertendo sempre em proveito da nação, emquanto ella, como tal, existir.

A minha opinião, o meu voto é, pois, que se trate do fomento colonial, sim, mas que de preferencia nos empenhemos em aproveitar convenientemente as riquezas inexploradas que alguns districtos da metropole contêem.

Desejaria ainda occupar por alguns momentos a attenção da camara, mas como a hora de se entrar na ordem do dia está a dar, reservo-me para em outra sessão apresentar ao nobre ministro das obras publicas alguns alvitres sobre a maneira pratica de se realisar o emprehendimento da construcção do um caminho de ferro de Mirandella a Bragança.

Tenho dito.

Vozes: - Muito bem.

(O orador foi muito applaudido, durante o discurso e cumprimentado no fim por muitos srs. deputados.)

O sr. Ministro das Obras Publicas (Campos Henriques): - Tinha tomado apontamentos para responder ao illustre deputado, a quem felicito pelo seu brilhante discurso, e a quem eu agradeço as phrases amaveis que mo dirigiu; mas como s. exa. prometto continuar n'outra ses-

Página 224

224 DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS

são, e effectivamente a hora está muito adiantada, reservo-me para depois do discurso do illustre deputado responder às considerações que s. exa. acaba do fazer e aquellas que ainda venha a fazer n'essa sessão.

O sr. Beça: - Muito obrigado a v. exa.

O sr. Aarão de Lacerda: - Em nome da commissão de instrução superior e da commissão de commercio e ar tos reunidas, tenho a honra da mandar para a mesa o parecer sobre o projecto de lei n.° 1-E.

A imprimir.

ORDEM DO DIA

Continuação da discussão do projecto n.° 3, reforma do regimento interno da camara

O sr. Presidente: - Continua a discussão do artigo 106.° da reforma do regimento. Vae ler-se.

Leu-se o

Artigo 106.° A palavra pedida para antes da ordem do dia será concedida, segundo a antiguidade da inscripção, salvo o disposto no § unico do artigo 59.°

§ unico. O deputado que não poder usar da palavra quando lhe competir na ordem da inscripção, precisa inscrever-se novamente, excepto no caso previsto no § unico do artigo 59.°

O sr. Teixeira de Sousa (relator): - Na ultima sessão levantaram-se duvidas sobre a redacção do artigo 100.° Tal como estava, essa redacção podia dar logar a inconvenientes. Depois do ministro ter sido prevenido para responder á interrogação annunciada por aviso prévio de vinte e quatro horas, podiam passar uma ou duas sessões sem ter logar a interrogação; por outro lado podia dar-se o caso do deputado abusar do aviso previo, evitando assim que qualquer outro da seus collegas podesse obter a palavra antes da ordem do dia.

Para obviar a estes dois casos, mando para a mesa uma proposta de substituição ao artigo 106.°, salva a redacção.

Leu-se na mesa, e é do teor seguinte:

Proposta de substituição

A inscripção antes da ordem do dia far-se-ha alternando os deputados que fizerem aviso previo aos ministros com os que a pedirem fora d'estas condições, sujeita às seguintes regras:

1.ª A palavra será concedida em primeiro logar ao deputado que fez o aviso prévio, a que se refere o § unico do artigo 59.°

2.ª Se não estiver presente o deputado que fez o aviso prévio, passará para o fim da inscripção dos deputados que se tiverem inscripto nas mesmas condições.

3.ª Se o ministro faltar, o deputado que se inscreveu para o interrogar
seguir-se-ha no ultimo que fallar dentro da respectiva inscripção. = Teixeira de Sousa.

Declarada em discussão, foi logo approvada.

Leu-se o

Artigo 107.° Durante a discussão da ordem do dia, ou qualquer outra, para a qual se tenha aberto inscripcão especial, o deputado que pedir a palavra para formular um requerimento terá a preferencia aos que estiverem inscriptos para tomar parte na discussão, incluindo os relatores das commissões e os ministros d'estado ou seus delegados.

& unico. Os requerimentos nunca serão motivados nem discutidos.

O sr. Teixeira de Sousa (relator): - Mando para a mesa uma emenda ao § unico do artigo 107.°

Leu-se na mesa a seguinte:

Substituição

Artigo 107.°:

§ unico. Os requerimentos serão escriptos e não podem ser motivados nem discutidos. - Teixeira de Sousa.

Foi votado o artigo com a emenda apresentada pelo sr. relator.
Leu-se o

Artigo 108.° Ninguém poderá fallar mais de uma vez na mesma discussão:

Exceptuam-se:

1.° O deputado que abrir o debate, em nova inscripção, sem preterição da já feita;
2.° Os auctores das propostas ou moções;

3.° Os relatores das commissões e os ministros d'estado, ou seus delegados.

O sr. Patricio: - Mando para a mesa a seguinte proposta:

"Proponho que só mantenha, o disposto no artigo 94.° do regimento do 1876. = O deputado, E. J. Patricio."

A rasão por que combato o projecto n'este ponto, vem da supposição em que estou de que se relaciona perfeitamente este artigo com o artigo 132.°

N'esta casa, aonde as discussões devem ter amplissima liberdade, por este regimento, se passasse tal qual está n'esta parte, ficavam os srs. deputados sujeitos não só a emittirem uma só vez a sua opinião, como a restringirem-se, como vem disposto no artigo 132.°, a fallar apenas uma hora.

Parece-me inconveniente isto numa assembléa onde as discussões têem do ser amplamente esclarecidas. Por isso mando para a mesa a minha proposta.

O sr. Teixeira de Sousa (relator): - Sr. presidente, v. exa. vê que um dos fins que se teve em vista elaborando este regimento, foi reduzir as questões fastidiosas com que perdemos o tempo muitas vezes.

O antigo regimento dizia "que nas questões de ordem nenhum orador póde usar da palavra mais de uma vez, e nas outras discussões mais de duas".

Substituiu-se esta disposição do regimento de 1873 pela seguinte:
"Ninguém poderá fallar mais de uma vez na mesma discussão:
"Exceptuam-se:
"1.° O deputado que abrir o debate em nova inscripção sem preterição da já feita;
"2.° Os auctores das propostas ou moções;
"3.° Os relatores das commissões e os ministros distado ou seus delegados."
Por consequencia, vê-se que o direito de usar da palavra sobre a questSo não está tão restricto como se afigura ao sr. Patricio, por isso que n'estes tres ultimos casos se póde usar da palavra duas vezes.

São estas as rasões, sr. presidente, porque mantenho esta disposição que está no artigo 108.° E mando para a mesa este additamento ao n.° 2.°:

Additamento

"...nas condições do numero anterior."

O sr. Arroyo: - Comprehendo perfeitamente o pensamento que levou o sr. relator da commissão a modificar com o artigo 108.° do presente projecto a disposição que se encontrava no artigo 94.º do actual regimento da camara.

Mas eu entendo, sr. presidente, que se era um pouco exagerada a disposição constante do artigo 94.° do regimento actual, é demasiadamente exagerada também, no sentido opposto, a restricção do artigo 108.° do projecto de lei em discussão.

Página 225

SESSÃO N.º 22 DE 7 DE FEVEREIRO DE 1896 225

O deputado que for auctor de um projecto de lei póde fallar uma voz sobre a ordem e duas vezes sobre a materia; e por este artigo fica só como accumulando, dentro da mesma discussão, a discussão sobre a ordem e u discussão sobre a materia.

Pelo presente projecto de regimento o deputado só póde fallar uma vez, ou seja sobre a ordem ou seja sobre a materia. Ora, sr. presidente, podem dar se muitos casos em que, segundo o artigo 108.º, ninguém poderá usar mais de uma vez da palavra...

(Interrupção do sr. Marianno de Carvalho.)

Por exemplo, o projecto das pensões ha de vir aqui trazido pela commissão de guerra; mas como eu sou o auctor de uma proposta, que não é a das pensões e não sou membro da commissão de guerra, não posso usar da palavra sobre o projecto senão uma vez, quer sobre a ordem, quer sobre a materia.

E o argumento apresentado pelo sr. relator sobre a possibilidade de se apresentar proposta, não respondeu á dificuldade.

Lembro que um deputado apresenta, por exemplo, uma questão previa, ou um adiamento. Limita o seu discurso a defender essa questão previa, ou esse adiamento, e não entra na matéria do projecto, por que exactamente não lhe convém. Acaba de fallar, a camara rejeita a questão previa, ou o adiamento, entra-se na discussão do projecto e o deputado não póde tentar melhorar qualquer das disposições do mesmo projecto, porque nem sequer póde usar da palavra na discussão da materia!
O que me parece rasoavel é adoptar n'um termo médio. Nem o principio do regimento actual, nem o do projecto em discussão. Permittir que um deputado possa fallar duas vezes: uma sobre a ordem, outra sobre a materia.

(S. exa. não reviu nem este n'em nenhum dos outros discursos que pronunciou n'esta sessão.)

O sr. Teixeira de Sousa: - Não posso concordar com a modificação que o sr. Arroyo pretende que se faça, porque não me parece que se possam dar, os inconvenientes apontados por s. exa.

Em qualquer estado da discussão do artigo 1.° de um projecto de lei, ou parecer da commissão, se poderá suscitar uma questão previa. Pela redacção do § 1.º do artigo 135.° a questão previa toma o logar da questão principal, quando for admittida, e por conseguinte o uso da palavra na questão previa não impossibilita o orador de fallar sobre a materia.

Eu podia explicar, como entendo, o n.° 2.° do artigo 108.°, da seguinte maneira: "Pode entrar em discussão na occasião uma proposta, a qual póde ser a base da discussão, entretanto não tenho duvida em mandar para a mesa um additamento ao § 2.°, dizendo; "nas condições do numero anterior".

O sr. Marianno de Carvalho: - Parece-me que este artigo não podo ser interpretado isoladamente, é preciso comparal-o com artigos subsequentes que estão no capitulo XIII, relativo às discussões.

Antigamente os projectos tinham uma discussão na generalidade, e o deputado podia fallar na generalidade mais do que uma vez sobre a materia e sobre a ordem. Depois seguia-se a discussão por artigos, o em qualquer estado da discussão o deputado podia pedir a palavra sobre a materia e sobre a ordem, e apresentar sobre a ordem todas as substituições, emendas, additamentos, etc.

Agora não ha discussão na generalidade. Ella desapparece, porque se confunde com a discussão do artigo 1.° Portanto, já é cerceado o direito de fallar sobre um determinado assumpto, e a questão previa e proposta de adiamento não podem tratar-se senão sobre o artigo 1.°, de modo que, quando eu quizer fallar sobre a ordem a respeito de qualquer dos artigos subsequentes do projecto, tenho de inventar uma emenda ou uma substituição, com que talvez não concorde, tenho de fazer uma gymnastica intellcctual para poder fallar no artigo 1.°, a fim de poder apresentar qualquer proposta relativa aos outros artigos.

Ora, nesta questão do regimento como em todas, o melhor é, como se diz, não apertar muito o fiado, porque á força de o apertarem estouram os fios.

O melhor é chegar-se a um meio termo rasoavel, que seria cada deputado poder fallar uma voz sobre à materia em discussão, e uma vez sobre a ordem, e unicamente outra vez sobre a matéria se for auctor do alguma proposta. E ainda restringe mais as faculdades dadas aos deputados da maneira como está redigida a primeira parte do artigo 109.°

Poderia dizer-se: "ninguém poderá fallar mais de uma vez sobre a materia ou sobre a ordem", mas não "ninguém poderá fallar mais de uma vez na mesma discussão".

De maneira que na discussão do artigo 1.° do projecto, que vem a ser a discussão da generalidade e da especialidade desse artigo, eu não posso fallar mais de uma vez sobre a materia ou sobre a ordem. Se, porém, eu tiver tido a cautela de apresentar uma moção, succede então que, pelas disposições do, n.° 2.°, poderei ainda fallar mais uma vez, mas se quizer proceder lealmente na interpretação sobre a materia não posso apresentar nem moções, nem additamentos, nem questões previas, nem substituições, porque não posso fallar mais do uma vez na mesma discussão.

V. exa. comprehende quanto isto cerceia os direitos dos deputados, e que inconveniencia póde ter para a boa elucidação dos assumptos.

Seguramente não ha conveniencia em que as camaras sejam academias de palradores, em que só façam discursos intermináveis que possam trazer o obstruccionismo; mas tambem não se deve cair no excesso contrario de pretender que a camara seja composta de mudos, dando logar a que lá fora se diga ser a academia dos humildes ou ignorantes.

Pois para que é esta restricção, quer sobre a ordem, quer sobre a materia? Para se não poder fallar mais de uma vez? É pouco. Um discurso proferido, não por mim, mas por qualquer deputado mais, competente do que eu, podia trazer ao relator da commissão, ao ministro ou a qualquer dos meus collegas, idéa nova que obrigasse a voltar a tomar a discussão mais proveito publico. E esse direito que querem cercear? Não me parece rasoavel.

Vou citar um caso: a questão do alcool. O norte e sul do paiz estão divididos nesta questão. Os do norte querem direitos baixos para o alcool, e os do sul, parece preferirem elevados direitos. Lembro a v. exa. um expediente que ha muito tempo me passeia pela cabeça. Pôde ser profundamente erróneo, mas tambem por acaso póde ser bom. Ponho esta nova maneira de resolver a questão. O ministro da fazenda ou o das obras publicas, ou o sr. relator da commissão, ou qualquer sr. deputado, parecendo lhe esta idéa nova, tem objecções a fazer, e eu queria explical-a. Diz o regimento: não póde explicar! É assim não ha meio de poder esclarecer a questão.

Portanto, parecia-me que se devia propor o que disse o sr. Arroyo, sem deixar largas ao obstruccionismo, mas tambem sem cercear as discussões, para que a final de contas a camara não fique reduzida a uma machina de votar.

É para isso que chamo a attenção do sr. relator da commissão, esperando que s. exa. admitta alguma transacção a este respeito, que me parece convenientissima.

(S. exa. não reviu estas notas nem nenhumas das outras que respeitam aos seus discursos proferidos n'esta sessão.)

O sr. Arroyo: - Pareceu-me da resposta dada pelo sr. relator às minhas considerações ou que entre nós há equivoco, ou que então s. exa. não póde deixar de con-

Página 226

226 DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS

cordar com as observações feitas... d'este lado da camara.

Quando s. ex.s se referiu a questões previas, s. exa. observou-me que a questão previa tomava o logar da questão principal, e por conseguinte o uso da palavra sobre a questão previa não impossibilitava ao deputado de fallar sobre a materia.

Parece-me este o caso de formular um innocentissimo dilemma. As questões previas, as eliminações, as substituições e os additamentos são, sob um aspecto geral, moções de ordem. Ninguem o póde negar. Não encontro aqui cousa alguma que defina em geral uma questão de ordem.

O facto é que a questão previa, o additamento, eliminação ou substituição são moções de ordem. As eliminações, additamentos e substituições a que se refere o regimont finando trata da classificação das propostas, estão ou não comprehendidas no n.º 2.° do artigo 108?
Ou o n.° 2.º só interpreta no sentido do que quem usa a, palavra, sobre a ordem, póde usar a seguir da palavra sobre a materia, ou o n.° 2.° tem uma interpretação mais restrictiva, e n'esse caso, tem do modificar-se o corpo de artigo 108.° Ora, a unica alteração que pedia ao sr. relator que fizesse, era a seguinte: "Ninguém póde fallar mais de uma vez sobre a materia". Por esta forma tiraram-se todas as, duvidas, e do contrario, estabelece-se uma doutrina, que nunca chegará a pôr-se em pratica.

O sr. Teixeira de Sousa (relator): - Mando para a mesa a seguinte

Substituição

Ninguém póde fallar mais do duas vezes. Exceptuam só os relatores, ministros ou seus delegados. = Teixeira de Sousa.

Por esta forma, parece-me conciliar todas as opiniões.

O sr. Arroyo: - Agora, estou contra v. exa. n'outro sentido.

Peço ao sr. presidente que consulte a camara se consente que eu falle pela terceira vez sobre este artigo. (Consultada a camara, resolveu afirmativamente.)

O sr. Arroyo: - Dizia eu e repito agora, que estou contra o sr. relator, porque acho de mais o que s. exa. propõe agora.

Não quero a licença geral, para que um deputado possa usar da palavra duas vexes na mesma discussão; quero que seja concedido o fallar uma vez, sobre a ordem e uma vez sobro a materia. Duas vezes sobre a matéria acho de mais; duas vezes sobre a ordem acho tambem de mais. Repito, uma vez sobre a ordem o outra vez sobre a materia.

Peço pois, que se estabeleça aqui: "que o deputado póde fallar uma vez, sobre a ordem, e uma vez sobre a materia".

Agora sou eu mais papista do que o Papa.

o sr. Teixeira de Sousa (relator): - Parece-me que os desejos do illustre deputado, se podem então conciliar. Mando para a mesa uma proposta no sentido indicado. Foi approvado o artigo 108.º com a substituição apresentada pelo sr. relator da commissão julgando-se prejudicada a proposta do sr. Patricio.

Leu-se o

Artigo 109.° Os ministros d'estado ou seus delegados, faltando em nome do governo, o os relatores das commissões, na materia sujeita á discussão, interrompem a ordem da inscripção e têem a palavra, pedindo-a, com preferencia aos deputados primeiro inscriptos.

§ unico. Os relatores só podem gosar da prerogativa d'este artigo pedindo a palavra por parte da commissão.

O sr. Presidente: - Está em discussão.

O sr. Marianno de Carvalho: - Parecia-me que havia a acrescentar n'este artigo - alguma cousa e d'esta vez será em proveito dos srs. ministros, dos seus delegados e dos relatores das commissões, porque o artigo diz: aos ministros d'estado, ou seus delegados, fallando em nome do governo, e os relatores das commissões, na materia sujeita á discussão, interrompem a ordem da inscripção e têem a palavra, pedindo-a, com preferencia aos deputados primeiro inscriptos".
Onde diz materia sujeita, acho que deve ser: "não só materia sujeita á discussão, mas ainda sobre a ordem ou sobre assumpto que lhe diga respeito"; para não se comprehender que e simplesmente sobre a materia, como parece deprehender-se da redacção como está.

O sr. Arroyo: - A observação apresentada pelo sr. Marianno de Carvalho parece-me procedente; porque uma cousa é materia como synonymo de assumpto, outra cousa é matéria como objecto de ordem do dia. O que pedia, pois, ao sr. relator era o favor de transferir d'este artigo 109.° e o unico e explicar no corpo do artigo 109.º o que são os delegados do governo, porque n'este regimento não se diz uma palavra sobre delegados do governo.

Estes delegados são uma nova entidade, creada por um decreto dictatorial, que na parte propriamente chamada política já foi approvado por esta camara.

Repito, peço ao sr. relator o obsequio do explicar, no corpo d'este artigo, o que são estes delegados em que aqui se falla, porque realmente não se sabe o que sejam.

O sr. Teixeira de Sousa (relator): - Não vejo necessidade de no regimento da camara se definir o que são "delegados" porque já estão definidos por lei.

Foi approvado o artigo.

Seguidamente são approvados, sem discussão, os artigos 110.º, 111.º, 112.º e 113.º

Leu-se o

Artigo 114.° Nas discussões os ministros d'estado são em tudo sujeitos às mesmas regras que os deputados; podem, porém, nomear, de entre os funccionarios superiores da administração do estado, delegados especiaes para tomar parte perante a camara na discussão de determinados projectos de lei.

§ unico. A nomeação será participada ao presidente da camara, na qual o delegado terá assento durante a discussão do projecto para que for designado.

O sr. Arroyo: - Aqui estão definidos os taes delegados, que no artigo 109.° não se diz o que sejam. Eu parecia-me melhor passar a definição d'este artigo para o 109.°

O sr. Teixeira de Sousa (relator): - Não tenho duvida em concordar com a, transferencia em que o sr. Arroyo insiste.

Foi approvado em conformidade com a declaração do sr. relator.

Seguidamente foram approvados, sem discussão, os artigos 115.º,116.º,117.º,118.º,119.º, 120.º, 121.º,122.º e 123.º

Leu-se o

Artigo 124.° Não podem ser comprehendidas n'uma proposta ou projecto de lei materias que não tenham entre si intima ligação.

O sr. Marianno de Carvalho: - Proponho a eliminação d'este artigo, que não serve para nada, porque se o auctor do projecto conhecer tão pouco a arte de legislar pie no mesmo projecto inclua assumptos que não têem entre si relação, às commissões pertence, e depois á camara, o expurgar o projecto d'esses defeitos.

Eu vou contar uma anedocta. Um dia, sendo ministro, descobri que havia em Lisboa fabricas de manteiga artifi-ial, que produziam muito e que não pagavam imposto.

Descoberto isto, no exercicio do meu dever, mandei proceder a averiguações; vieram as informações e juntamente com ellas uma cousa que eu não tinha pedido, - que era

Página 227

SESSÃO N.°22 DE 7 DE FEVEREIRO DE 1896 227

uma avença em virtude da qual as fabricas ficavam muito a salvo. Jurei uma negra vingança. Passou-se o verão, mas jurei que o inverno não entraria som tomar essa vingança. E quando se abriu a camara, em janeiro, apresentei uma proposta de lei para serem tributadas com uma certa severidade as fabricas de manteiga artificial. Isto passava-se no negregado tempo dos accordos. Os meus collegas do ministerio ficaram enthusiasmados com a proposta.

Era o maior beneficio que se podia fazer á agricultura nacional e defendia-se da fraude o consumidor. Todos estavam, portanto, cheios de enthusiasmo fallei com alguns deputados da opposição, que não eram mui to propensos a accordos, assentando todos num accordo geral, em vez de se travar uma discussão mais ou menos acerba. O projecto devia passar sem nenhuma difficuldade. Passou-se tempo e fui avisado por um deputado da opposição regeneradora, que alem de um grande talento tem um caracter extremamente leal, de que a questão estava perdida para mim e tambem para elle, que não podia satisfazer a um tal ou qual compromisso que tinha tomado, porque a opposição opponha difficuldades ao projecto sobre a manteiga artificial, e eu não podia fazel-o vingar. Supponho que alguns collegas meus do ministerio já estavam tambem convertidos á doutrina contraria. Ora, eu sou pertinaz quando me dá para isso. O mesmo deputado regenerador lembrou-me que na outra camara se poderia metter na lei de meios o imposto sobre a manteiga artificial, porque como se estava no fechar da sessão a lei havia de passar por força. Foi o projecto para a commissão de fazenda d'aquella casa do parlamento, e no seio da commissão pedi, innocentemente, que num artigo relativo ao alcool se mettesse o imposto sobre a manteiga artificial. O projecto veiu da commissão para a camara, e ahi o sr. visconde de Moreira de Rey, - cuja recordação a todos causa saudade, pelo excellente companheiro que foi n'esta e na outra camara, pelo seu grande talento e bondoso caracter - ía-me matando o projecto com este argumento:
"Isto é contra todos os preceitos da arte de legislar! Querer introduzir no mesmo projecto, no mesmo artigo, o alcool e a manteiga artificial, é uma especie da torre de Babel! Não podem introduzir-se no mesmo projecto e no mesmo artigo materias que não tenham entre si intima ligação. O ministro da fazenda e a commissão metteram a manteiga artificial no artigo do alcool. Que relação intima, proxima ou remota ha entre manteiga e alcool?"
Eu fiquei embaraçado com o argumento. Pedi, como pude, recurso á imaginação - que eu tinha então mais fertil do que hoje, - e lembrou-me dizer com grande entono:

"O digno par sr. visconde de Moreira de Rey teria muita rasão se tivesse tantos conhecimentos chimicos como de direito, mas esqueceu-se que as substancias gordas são monoatomicas e o alcool é polyatomico."

O sr. visconde de Moreira de Rey ficou tão embaraçado como eu... se tentasse apresentar uma allegação juridica. O caso é que o imposto sobre a manteiga passou e ainda hoje se paga.

Aqui está como às vezes é preciso haver uma certa latitude e não exigir uma ligação demasiadamente intima, mesmo porque ha cousas que na apparencia, parecendo intimas não o são, e outras sendo-o não o parecem.

Para nos livrar-mos, portanto, de embaraços de ligação, supponho melhor eliminar o artigo.

O sr. Teixeira de Sousa: - Proponho a eliminação do artigo 124.°

Foi votada a eliminação.

Foram em seguida approvados sem discussão os artigos 125.°, 126° e 127.°

Leu-se o

Artigo 128.° Na discussão da materia dada para ordem do dia, o deputado que não estiver presente quando lhe couber a palavra, segundo a ordem da inscripção, será logo inscripto de novo pelo presidente em ultimo logar.

O sr. Arroyo: - Lembro ao sr. relator a conveniencia de eliminar as palavras "da materia". Com o viso da palavra "materia" póde dar-se um qui pro quo na interpretação do artigo a respeito da discussão dada para ordem do dia, de forma a comprehender tanto a inscripção da materia como na ordem.

O sr.. Teixeira de Sousa: - Concordo com a eliminação das palavras "da materia".
Votou-se o artigo com a eliminação.

Leu-se o

Artigo 129.° Sobre cada projecto de lei versará uma só discussão, que recairá seguida e separadamente sobre cada um dos seus artigos. Os titulos, paragraphos ou numeros não são considerados artigos para os effeitos da discussão e votação em separado.

O sr. Marianno de Carvalho: - Não me opponho absolutamente a que n'um grandissimo numero de casos se supprima a discussão na generalidade.

Ha nas camaras estrangeiras a este respeito variados exemplos. Evidentemente faz-se uma ou outra cousa, conforme os casos. Entretanto prohibir a discussão na generalidade, isto é, a forma de apreciar o conjuncto da lei, póde ter grandes inconvenientes.

O artigo 129.° estabelece uma só discussão. Passa-se ao artigo 130.° e vê-se:
Ora, quantas vezes eu rejeito o artigo 1.° de um projecto de lei sem rejeitar os outros artigos; e quantas vezes tem acontecido na camara, que eu tenha memoria, ser approvada a generalidade, menos o artigo 1.°, por um motivo qualquer que ninguem póde prever?

Parece-me, portanto, excessiva a suppressão da discussão na generalidade, estabelecendo ao mesmo tempo que, rejeitado o artigo 1.° de um projecto, fica rejeitado tudo o mais.

O sr. Presidente: - Eu lembro ao sr. deputado que a doutrina do artigo 130.° ainda não está em discussão.

O Orador: - Eu sei que não está em discussão, mas eu preciso interpretar o artigo 129.° pelo artigo 130.° O artigo 129.° estabelece uma só discussão; o artigo 130.°, sua consequencia e cuja apreciação influe no antecedente, determina que, rejeitado o artigo 1.° de um projecto, tudo o mais se considera rejeitado.

Parece-me isto inconvenientissimo; e eu pediria ao sr. Franco Castello Branco, que intervem n'este assumpto como deputado e não como ministro, eu pediria a s. exa., que tem uma larga pratica parlamentar, que me respondesse se isto realmente não póde trazer comsigo graves inconvenientes.

Reduzir as discussões a uma só e estabelecer que só no artigo 1.° se possam apresentar questões políticas; determinando-se alem d'isso que, rejeitado o artigo 1.°, tudo se considera rejeitado, é estabelecer uma grande confusão no debate: 1.°, porque não posso discutir na generalidade; 2.°, porque se quizer discutir a generalidade hei de discutir conjunctamente o artigo 1.°; e, finalmente, ver-me-hei obrigado a, se quizer o adiamento do artigo 2.º, a rejeitar o artigo 1.°, pois só assim farei desapparecer es outros artigos com que não concordar!
Creio que o pensamento da commissão foi afastar tudo que seja obstruccionismo; e eu estou de accordo com esse pensamento. Mas é necessario tambem guardar á discussão verdadeiros limites.

Referir-me-hei ainda á rejeição do artigo 1.° e á impossibilidade de interpor o adiamento senão a proposito do artigo 1.°; e direi que me parecia possivel dar á camara o direito de, com um simples requerimento por um certo

Página 228

228 DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS

numero de votos, indicar quaes as propostas em que se póde discutir a generalidade.

Sobre o requerimento não ha discussão; e a camara reconhece se é indispensavel haver discussão na generalidade, rejeitando-o ou approvando.

Ponderei o que tinha a ponderar sobre o caso, e a camara resolverá.

O sr. Carneiro de Moura: - Quero lembrar apenas se, quando se diz "sobre cada projecto de lei versará uma só discussão", se comprehende tambem tudo que se possa dizer sobre o systenm do projecto, suas condições economicas, as suas relações com os interesses do paiz? Se assim é, não póde deixar de haver discussão na generalidade. Se é n'estes termos que se deve entender, eu voto que não póde dispensar-se a discussão na generalidade, pois que é aquella que diz respeito às idéas geraes da lei, ao seu modo de ser.

São estas as observações que eu opponho ao artigo era discussão, e que desejarei ver esclarecidas.

O sr. Arroyo: - Como já disso o meu amigo o sr. Marianno de Carvalho, eu tambem creio que o ponto de vista de quem redigiu este artigo foi evitar o obstruccionismo. Estou perfeitamente de accordo, mas isto pela manutenção da discussão na generalidade não obrigatória, mas facultativa, podendo deixar de existir.

A discussão da generalidade depende de um requerimento, que para vingar deve reunir dois terços dos votantes.

Desde o momento em que se faça um requerimento, cuja votação reunir dois terços dos deputados presentes, não ha discussão da generalidade e passa-se á discussão da especialidade.

Com relação á redacção do artigo 120.° tenho de fazer a mesma declaração que fez o sr. Marianno de Carvalho; lenho de o discutir conjunctamente com outros artigos subsequentes; de outra forma não posso apresentar o conjuncto das minhas idéas.

É impraticavel o que aqui está.

Diz este regimento que "logo que seja rejeitado o primeiro artigo de um projecto, será este retirado da discussão".

O que se entende pela palavra rejeitado? E o que se encontrava disposto no artigo 1.º?

(Interrupção do sr. Teixeira de Sousa, relator.)

Parece-mo que o mais simples é, desde que se apresenta uma discussão, a regra geral do regimento ser que haja uma discussão na generalidade e outra na especialidade.

V. exa., sr. presidente, declara que "esta em discussão o projecto A ou o projecto B". Um deputado levanta-se, pede a palavra para um requerimento e requer que se faça a discussão por artigos. Se a votação reunir dois terços do deputados, não ha discussão na generalidade. Este é que me parece o processo indispensavel, sob o ponto de vista da discussão parlamentar.

Ainda tenho que fazer umas outras observações, mas essas respeitam ainda ao mesmo assumpto, embora incidam tambem na discussão do artigo 131.°

O artigo 131.° diz,- e neste ponto parece-me que respondo em parte ao sr. Carneiro de Moura,- que "na discussão do primeiro artigo de um projecto de lei é permittida a apresentação de questões previas e moções de adiamento, bem como de additamentos, emendas e substituições a esse artigo".

Eu supponho que n'este artigo 133.° é que está a idéa do sr. relator: a discussão do artigo 1.° de um projecto comprehendo a discussão da generalidade de todo o projecto e a discussão na especialidade.

A redacção d'este disposição tem um poucochinho de experiencia colhida nas lições da historia antiga.

Se s. exa. tivesse assistido aos trabalhos parlamentares, em Portugal, ha dez, doze, treze, vinte ou trinta annos para cá, veria que esse vicio, - o obstruccionismo, que existe
no regimen parlamentar de todos os parlamentos, - tambem está representado no regimen parlamentar em Portugal e existiu o floresceu no parlamento portuguez.

Voltando, porém, ao assumpto, direi que mo parece que o pensamento do sr. relator era que na discussão do artigo 1.º se poderia apresentar qualquer moção, additamen-to ou substituição que respeita ao projecto, visto que com a discussão do artigo 1.º se liga tão intimamente a discussão da generalidade.

Mas logo, quando se tratar do artigo 131.º tenho de apresentar uma modificação a este artigo, por conter tambem verdadeiras incompatibilidades.

Com relação á discussão na generalidade e na especialidade, já indiquei a forma por que entendo se considere que aquella não existe, desde que a camara por uma votação decida sobre um requerimento e não proposta apresentada por qualquer deputado. Parece-me ser este o meio de evitar o obstruccionismo.

O sr. Teixeira de Sousa (relator): - Eu não vejo que haja inconveniente na suppressão da generalidade, que é o que ha de mais improductivo na discussão de um projecto.

Põe-se na generalidade a questão política? Tambem póde pôr-se essa questão na discussão do artigo 1.°, assim como póde discutir-se no mesmo artigo a competencia ou incompetência da camara.

Também não vejo o inconveniente no que se dispoz relativamente á rejeição do artigo 1.º, pois que rejeitado elle, - que em regra é o artigo que envolve doutrina importante sobre que se legisla, - os mais estão condemnados na importancia que tinham.

Eu devo dizer a v. exa., sr. presidente, e á camara, que a commissão organisou este projecto tomando para base o regimento de 1876, algumas disposições do regimento da camara de deputados franceza e ainda um projecto de regimento elaborado por uma commissão que foi eleita em 3 de agosto de 1887, composta das pessoas que vou indicar:

(Leu os nomes dos membros desta commissão entre os quaes figura o sr. Arroyo.)

A esta commissão foram mais tarde aggregados outros srs. deputados

(Leu os nomes d'estes.)

Essa commissão ao organisar os seus trabalhos...

O sr. Arroyo: - V. exa. tem a certeza que isso era trabalho da commissão ou exclusivamente do sr. Ennes?

Eu nunca vi esse projecto.

O Orador: - Eu vi-o na secretaria da camara e até devo dizer que ha notas marginaes de approvação ou rejeição.

Já v. exa. vê e a camara, que eu não innovei, fui buscar isto á commissão nomeada em 1887. E repito: não vejo inconveniente nenhum em que se supprima a discussão na generalidade, por isso mesmo que as questões mais importantes podem ser discutidas quando se tratar do artigo 1.º e ahi se podem propor as questões previas e adiamentos.

Peço pois, licença a v. exa. para manter a doutrina do artigo.

O sr. Marianno de Carvalho: - Preciso insistir mostrando os inconvenientes que podem resultar na pratica da adopção do principio consignado nos artigos 129.° e 130.°

Não ha senão uma só discussão. A discussão da generalidade e especialidade versa sobre o artigo. Rejeitado este, está rejeitado o projecto. Aqui está em que se cifra a discussão? Não é assim? Pois vamos a ver o que isto dá. Temos, por exemplo, a lei da contribuição predial de 1888, que remodelou todo o nosso systema de contribuição predial. Não chegou a executar-se em parte, mas emfim foi uma remodelação completa.

Quer v. exa. saber o que diz o artigo 1.º

(Leu.)

Página 229

SESSÃO N.º 22 DE 7 DE FEVEREIRO DE 1896 229

É talvez um dos artigos mais insignificantes do projecto. Rejeitado elle, todas as modificações importantissimas da contribuição predial ficavam rejeitadas.

O sr. Teixeira de Sousa (relator): - Queira v. exa. ver o artigo 130.° e lá encontrará a resposta a essa objecção.

O Orador: - Muito bem. Já vi o artigo. Diz que os outros artigos podem vir remodelados; mas então o debate parlamentar complica-se extraordinariamente com as remessas continuas às commissões para ellas emendarem o que lhes convem.

A lei de 1880 introduziu modificações na contribuição de registo. Vou ler o artigo 1.º

(Leu.)

Rejeitado o principio contido neste artigo 1.º, lá se ia embora toda a contribuição - ou havia de ir á commissão, tornar esta a reunir-se, formular novo parecer, ir este a imprimir, ser distribuido e haviam de decorrer quarenta e oito horas para entrar novamente em discussão se o novo artigo 1.° fosse rejeitado, o projecto soffreria novamente a mesma sorte. É um expediente deploravel, e seria um nunca acabar!

Não é n'este projecto de contribuição que, póde-se dizer, é uma especialidade onde semelhante caso se póde dar; é folhear ao acaso os volumes da legislação.

Supponha-se outro projecto que dizia no artigo 1.°, absolutamente insignificante, que os quadros de saúde da Guino seriam compostos conforme a tabella junta-e nada mais. Rejeitado o artigo, rejeitavam-se todos os mais, que diziam respeito a habilitações, a promoções dó facultativos, enfermeiros, etc.!
E a carta constitucional?!
V. exa. sabe que toda a gente concorda em que a carta constitucional está muito bem redigida, mas que nunca pensou ninguem em reformar o artigo 1.º, apesar de outros terem tido sorte diversa.

Este artigo que estamos discutindo diz que, rejeitado que seja o artigo 1.° de um projecto de lei, será este retirado da discussão, mas diz tambem que a camara poderá, porem, sob proposta de algum dos seus membros, deliberar que os outros artigos do projecto sejam enviados á commissão competente, para serem por ella remodelados e entrarem então em discussão.

Ora, supponhâmos que, por um motivo que não pode-mos adivinhar, se apresentava às camaras o projecto da carta. A camara lembrava-se de rejeitar o artigo 1.º Acabava-se a carta?! Voltava á commissão ? Voltando á com-missão esta fazia - um novo projecto. A respeito do artigo 1.º, está bem de ver, não se fallava mais. Passava-se, pois, para o artigo 2.º, que passava a ser primeiro. Que diz este artigo?
O artigo 2.° diz:
"O seu territorio forma o reino de Portugal e Algarves, etc."

Se a camara rejeitasse este artigo, que é o 2.º e tinha passado a ser o 1.º,
voltava á commissão; e podia consumir-se a vida de nós todos a ver rejeitar successivamente os artigos da carta constitucional, porque ninguem concordava com os successivos artigos primeiros, por uma rasão qualquer!
Querem ver outro assumpto? Lei eleitoral de 8 de maio de 1878:

"Artigo 1.º São eleitores, e para isso considerados, como tendo a renda do artigo 5.º, n.° 1.º do decreto eleitoral de 30 de setembro de 1852, os cidadãos portuguezes de maior idade que souberem ler e escrever, ou forem chefes de familia."

E depois seguem-se todas as regulações importantissimas d'essa lei eleitoral: como recrutamento, execuções fiscaes e tudo quanto ha de materia importantissima em legislação eleitoral.

Eu não quero para eleitores todos os cidadãos portuguezes, como não quer o sr. ministro do reino, mas concordo com o resto do projecto. Rejeitado p artigo 1.° lá se ia embora a lei de 1878, que era boa!

Com a lei de 1884 succederia a mesma cousa.

Eu não concordo com os circulos plurinominaes nem com as accumulações, mas se rejeito o artigo 1.º fica rejeitada toda a lei eleitoral de 1884!
Isto não póde ser. O expediente do sr. relator o que produz é demora nos trabalhos parlamentares; e por consequencia parece-me melhor acceitar o expediente proposto pelo sr. Arroyo, ou outro qualquer, que nos tire d'este enorme cahos.

O sr. Arroyo: - Eu comprehendo que sobre assumptos d'esta importancia o sr. relator não queira, sem ouvir os outros membros da commissão, apresentar desde já pareceres modificando os artigos 129.º, 130.º e 131.º.

Nós temos tantos artigos a discutir, que poderiamos deixar estes artigos para o fim do capitulo; e se s. exa. não tivesse duvida, seria melhor adiar a discussão dos artigos 129.º, l30.º e 131.º, para no principio da sessão de amanhã se tomar uma resolução.

O sr. Teixeira de Sousa: - Eu não tenho inconveniente em que se faça o que v. exa. deseja e achando muito justificadas as duvidas do sr. Marianno de Carvalho e do sr. Arroyo, concordo que seja eliminado o artigo 130.º

Foi opprovado o artigo 129.º

Votou-se a eliminação ao artigo 130.º proposta pelo sr. relator.

Leu-se o

Artigo 131.º Na discussão do primeiro artigo de um projecto de lei é permittida a apresentação de questões previas e moções de adiamento, bem como de additamentos, emendas e substituições a esse artigo.

§ unico. As substituições, emendas e additamentos aos artigos seguintes só poderão ser apresentados e admittidos na altura das discussões respectivas.

O sr. Arroyo: - Não podemos fazer concordar o sr. relator n'um ponto de vista medio que resolvesse as difficuldades!

A minha impressão é que a camara acaba de votar uma disposição que não é pratica e vae dar origem a dificuldades sem nome.

Dito isto, e lamentando que a camara tomasse essa resolução, que não póde pôr-se em pratica, prosigâmos.

Parece-me que a idéa do sr. relator foi que na discussão do artigo 1.º se podia conglobar a apresentação de qualquer moção de ordem relativa ao artigo com a de qualquer moção de ordem relativa ao projecto. Por isso parece-me que em vez de fallar em especial, em questões previas e moções de adiamento, etc., se deve dizer que na discussão do artigo 1.° é permittida a apresentação de quaesquer moções de ordem relativamente á proposta do projecto em geral, bem como ao artigo 1.º em especial, isto é, sem especificar.

Torno a repetir. Eu entendo que o artigo precisa dupla emenda de redacção, dizendo-se em primeiro Jogar que a apresentação de qualquer moção de ordem relativa ao projecto em discussão se conglobará na discussão do artigo 1.º, e em segundo logar não se empregando qualquer palavra que se refira especialmente a uma determinada moção, mas usando apenas da expressão geral moções de ordem. De outra forma pergunto ao sr. relator se na discussão do artigo 1.º se podem apresentar quaesquer moções que não sejam questões previas, moções de adiamento, additamentos, emendas e substituições?

O sr. Teixeira de Sousa: - Não, senhor.

O Orador: - Peço desculpa! A substituição é uma moção, a emenda é tambem uma moção, tudo que restringe ou amplia o projecto é uma moção. Pergunto: alem das ta-

Página 230

230 DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS

nativamente indicadas no artigo 131.º nenhuma outra moção de ordem se póde apresentar?
O sr. Teixeira de Sousa: - É tudo aquillo a que se refere o artigo 136.º

O Orador: - "...Os deputados que usarem da palavra poderão formular moções em que exprimam opiniões ou manifestem desejos relativamente aos negocios publicos o aos actos do governo.

"Estas moções, depois de admittidas pela camara, ficão em discussão sendo votadas pela ordem da apresentação.

§ unico. Na discussão do projectos de lei e pareceres de commissões não só poderão apresentar moções que não estejam comprehendidas nas disposições da artigos 134.º e 135.º d'este regimento."

Quer dizer que na discussão de projectos e pareceres as únicas moções que se podem apresentar, segundo o projecto da commissão e a opinião do sr. relator, são as elinações, emendas, additamentos e substituições.

O sr. Teixeira de Sousa: - E no artigo 1.° as questões previas e as moções do adiamento.

O Orador: - Não se ligam os artigos um com o outro.

Eu estou insistindo n'estes artigos porque para a discussão parlamentar são os artigos capitães do regimento.

Nós estamos a fabricar uma lei que nos ha de garantir o direito de discussão; ora, como o systema e novo e muito complexo, é necessario votal-o com muita clareza. É necessario que votamos aquillo que queremos votar e não aquillo que não está na nossa intenção. Ora, applicando o artigo 136.° § unico, completado pelos artigos 134.º e 130.º e applicando o 131.º que está em discussão, o que conseguimos?

Em primeiro logar tiramos a seguinte conclusão: é que a doutrina do artigo 131.º contraria a doutrina dos artigos 134.º, 135.° e 130.°; porque ao passo que o artigo 131.° não consente que se apresentem na discussão do artigo 1.º de qualquer projecto senão a questão previa e o adiamento, o artigo 136.° § unico mandando applicar as disposições dos artigos 134.° e 13õ.° concede simplesmente o contrario!

O sr. Teixeira de Sousa (relator}: - Não é isso.

O Orador: - Não é isto?! Peço perdão.

Diz o § unico do artigo 136.°: que na discussão de projectos de lei e pareceres de eommissões não se poderão apresentar moções que não estejam comprehendidas nas disposições dos artigos 134.° e 135.° d'este regimento.

Parece, portanto, por este paragrapho, que as moções dos artigos 134.° e 135.°, se podem apresentar nas discussões dos artigos primeiros de quaesquer projectos de lei!

Mas quaes são as moções constantes dos artigos 134.° e l35.°?

São as eliminações, emendas, substituições e additamentos! Conseguintemente, applicando-se o artigo 136.° & unico, que é completada pelos artigos 134.° e 135.°, á discussão de qualquer projecto de lei em ordem do dia, segue-se que ha uma contradicção entre o artigo 131.°, quando applica o principio da discussão da generalidade á discussão do artigo 1.°, e ha ainda contradicção entre o artigo 131.° e os artigos 134.° e 135.°, porque alem distes artigos completarem o pensamento do artigo 136.°, dispõe completamente o contrario!

Pelo artigo 136.° podem apresentar-se moções em que se exprimam opiniões ou manifestem desejos relativamente aos negócios públicos e aos actos do governo, ao passo que pelo artigo 131.º não se podem apresentar na parte respeitante á generalidade, do projecto ou do parecer da commissão, senão questões previas ou adiamentos !

Esta é a primeira consequência tirada da applicação d'este texto.

Mas ha mais ainda: é que não só se tira a conclusão de que o artigo 131.º não jjoga com o artigo 136.° § unico, o qual por si, chama os artigos 134.º e 135.º, mas tambem se conclue que na discussão de qualquer projecto não existe a liberdade de acção que os deputados tinham, para apresentar as moções, additamentos, substituições, etc... o que julgo uma restricção gravissima.
Ura, eu n'esse ponto, tenho as minhas opiniões assentes, das quaes consideração alguma me faz afastar.

Entendo que é necessario combater os exageros do obstruceionismo. Neste ponto tem-me a commissão perfeitamente ao sou lado.

Encontramo-nos ainda na disposição que marca um determinado espaço de tempo, - uma hora, para cada deputado usar da palavra, embora veja n'isso uma restricção ao uso da palavra, - mas do meu direito de apresentar moções de ordem, d'esse e que não desisto de forma alguma, n'isso é que não podemos concordar.

Quero direito illimitado, mas sem restricção de qualquer natureza, para o orador, no uso da palavra sobre a discussão de qualquer projecto de ordem do dia, poder apresentar moções sejam de que natureza forem.

Não admitto nem posso admittir a este direito a mais insignificante restricção.

Pois nós já restringimos a discussão, acabando com a discussão na generalidade, ou confundindo-a com a discussão do artigo 1.º, e quando se chega á discussão de um parecer qualquer, não havemos de dar o direito, ao orador, do apresentar qualquer moção de ordem, substituição, emenda ou o que desejo?!

Nada! Seja em adiamento, questão previa, additamento ou emenda, seja no que no for, em tudo tem logar uma moção de ordem de caracter político, marcando a confiança no governo ou apresentando a desconfiança no seu proceder.

Isto parece-me de tal forma indispensavel, que eu não me limito a votar contra, para não ter a mais pequena parcella de responsabilidade; voto contra e protesto, por que desejo que me digam em que altura é que um deputado póde então apresentar uma moção de ordem.

Antes da ordem do dia? Antes da ordem do dia não se podem apresentar moções, posso apenas fazer considerações varias estando presente algum ministro, dirigir-lhe quaesquer perguntas.

Dentro da ordem do dia? Querem agora que o não possa fazer! Não me querem agora consentir!
Isto não póde ser. Não acceito o texto restricto do artigo 131.° nem do artigo 136.°, tolhendo o exercicio do direito de moção, como se prescrevi o no novo regimento.

Eu sobre este ponto alarguei-me um pouco, porque considero isto absolutamente indispensável. Volto-me, por exemplo, para o sr. João Franco, que em tão variados assumptos e combates parlamentares batalhou commigo, e pergunto a s. exa. se é possivel manter esta doutrina. E dirijo-me a s. exa., porque entendo que não póde deixar de ter a mesma idéa sobre o assumpto.

Se um deputado no uso do exercicio do sou direito de fallar, quizer apresentar uma moção, como o ha de fazer? Não lhe dêem senão um logar, perfeitamente, mas dêem-lhe na ordem do dia, quando se discute o projecto ou especialmente a materia, á qual visa a moção de ordem.

Eu, que presto homenagem às qualidades de trabalho e de estudo do illustre relator, não posso suppor que s. exa. não esteja prompto a alterar a redacção do artigo, mas de maneira nenhuma concedo a mais ligeira restricção, a mais pequena modificação alem d'aquellas que permittam o direito de moção em qualquer altura da ordem do dia. Estou convencido do que o illustre relator ha de vir á boa doutrina, e termino pedindo desculpa á camara de me ter alongado mais, mas fazendo notar que essa largueza é justificada pelo interesse que este artigo tem nas discussões parlamentares.

O sr. Marianno de Carvalho: - Como ninguem responde, sómente desejo fazer sobresair que muito peior do

Página 231

SESSÃO N.° 22 DE 7 DE FEVEREIRO DE 1896 231

que o que disse o sr. Arroyo é o que resulta da combinação d'este artigo com o artigo 136.°

Não é perfeitamente exacto o que disse o sr. Arroyo: isto é, que nunca se póde apresentar uma moção politica. Há um caso, mas é um, só, unico, em que se póde apresentar a moção politica. É quando se abra inscripção especial. Fora d'este caso, porém, não ha mais nenhum em que possa ser apresentada. Antes da ordem do dia, se quizer apresentar uma moção politica é impossivel, se não houver inscripção especial: na ordem do dia tambem se não póde apresentar, se não houver a tal inscripção especial. Ora. isto não me parece bem, porque as camaras não são machinas de fazer leis. São assembléas politicas que têem de deliberar sobre os destinos do paiz.

A ordem do dia versa quasi sempre sobre uma questão qualquer, e não havendo inscripção especial não se pode apresentar uma moção politica; por consequência, quando a maioria da camara for facciosa e não consentir que se abra uma inscripção especial, nunca um deputado da opposição póde apresentar uma moção politica. Isto é a negação do parlamentarismo. Então colloquem junto do governo um conselho d'estado que o ajude a formular os projectos de lei, e talvez seja melhor do que as camaras. Mas com camaras legislativas, camaras politicas, não póde admittir-se que não seja permittido ao deputado apresentar uma moção politica.

Fazendo minhas as palavras do sr. Arroyo, pedia ao sr. relator que consentisse na demora d'estes artigos 131.º a 136.º para a sessão de amanhã a fim de voltarem á commissão, para os redigir de forma que este projecto seja um projecto viavel, sem dar largas ao obstruccionismo, como se faz em todos, os paizes em que ha parlamento.

Não é da apresentação da moçcão que póde resultar obstruccionismo, porquê a moção fica em discussão conjunctamente com a materia e vota se no fim; o unico prejuizo que póde resultar é do discurso, e esse posso eu fazer sempre que quizer.

Parece-me que nós não estamos aqui a fazer questões politicas que interessem ao governo ou ao capricho de ninguem, o que estamos é a fazer uma regimento para que acabem as scenas desagradaveis dentro do parlamento e se ponha termo ao obstruccionismo.

O sr. Ministro do Reino (Franco Castello Branco): - Apoiado.

O Orador: - Visto que todos estamos de accordo, o que eu pedia era que estes artigos voltassem á commissão, a fim de que amanhã o sr. relator os apresentasse com outra redacção, que seria acceita por todos.

O sr. Teixeira de Sousa (relator): - Faço justiça á sinceridade com que os srs. Arroyo e Mariano de Carvalho têem discutido este regimento e ainda devo dizer que na sua confecção têem prestado grandes serviços. (Apoiados.)

Eu entendo que as questões politicas irritam muito os debates, não só devem misturar com as discussões dos projectos, mas attentas as manifestações da camara, que eu muitissimo respeito, não tenho duvida alguma em concordar que seja permittido nas questões de ordem apresentar quaesquer moções e que o artigo 130.º e seguintes se redijam por forma a attender a esta consideração.

O sr. Marianno de Carvalho: - Acceito, é claro, a proposta do sr. relator; mas pedia a s. exa. uma nova prova de condescendencia que me parece de utilidade para todos.

O principio está acceite; mas este artigo, como se póde ver pela discussão, se ella proseguir, fica todo desconnexo e inconvenientemente redigido. Não podia o sr. relator trazer amanhã uma nova redacção de todos estes artigos, de forma que estejamos todos de accordo, como se fez na sessão passada, relativamente a outro que fallou de maneira que todos se conformaram? Parecia-me melhor preterir uma redacção boa a uma redacção defeituosa.

O sr. Teixeira de Sousa (relator): - O artigo 132.º nada tem com o que se tem discutido e apreciado; não ha inconveniente em que a discussão do artigo 132.º prosiga. Peço a v. exa. que ponha á discussão o artigo 131.º com as modificações que eu apresentei ha pouco, salva a redacção.

Foi votado o artigo 131.º com as modificações propostas.

Seguidamente leu-se, e foi votado sem discussão, o artigo 132.º
Leu-se o

Artigo 133.º Em qualquer estado da discussão de um projecto de lei, parecer da commissão ou proposta, e permittido aos deputados que estiverem inscriptos para usar da palavra, apresentar propostas de eliminação, emendas, substituições ou aditamentos á materia que se discute.

O sr. Marianno de Carvalho: - Cá está este artigo 133.º a brigar com o artigo 131.º, e necessitado de modificações por causa d'elle. O que acontece ao artigo 133.º ha de acontecer ao artigo 134.º Tudo se podia fazer deixando uma nova redacção para ámanhã. O que digo é que o artigo 133.º precisa ser modificado, era harmonia com o artigo 131.º

O artigo 133.º diz (leu o artigo):

É preciso tambem juntar moções politicas. Chega-se ao artigo seguinte, em de dizer-se como se faz a classificação para essas novas moções, o assim successivamente.

O sr. Teixeira de Sousa (relator): - Peço a v. exa. que ponha á votação o artigo 133.º com a modificação feita.

Foi approvado com a modificação indicada pelo sr. Marianno de Carvalho.

Leu-se o

Artigo 134.° São classificadas:

Eliminações - as propostas destinadas a fazer desapparecer por completo o texto;
Emendas - as propostas que, conservando parte do texto da proposta que só discuto, restringirem, ampliarem ou modificarem a materia principal;
Additamentos - as propostas que contiverem matéria nova, destinada a ser acrescentada á proposta em discussão, conservando a parte textual dessa proposta, mas ampliando-a, restringindo-a ou explicando-a.

Substituições - as propostas que contiverem disposições diversas ou contrarias áquella que se discute.

§ 1.° A classificação das propostas incumbe á mesa.

§ 2.° Classificadas as propostas de eliminação, emenda, substituição ou additamento, ficarão em discussão conjunctamente com a materia principal.

O sr. Marianno de Carvalho: - Devo ponderará camara que este artigo não está era completa harmonia com o artigo 32.° n.° 14, nem em harmonia com os preceitos que deve seguir-se. O n.° 14 do artigo 32.° diz que quem classifica as propostas é a mesa", e lá se diz "que haja recurso para a camara, quando algum sr. deputado não concordar com a classificação feita pela mesa".

No artigo 32.° diz-se "que a classificação pertence ao sr. presidente e não a toda a mesa"; e diz mais "que d'essa classificação ha recurso para a camara ser consultada, quando houver duvida".

Por consequencia é necessario que estas cousas se liguem umas com as outras, o que, pela forma por que está, não acontece.

O sr. Teixeira de Sousa (relator): - Peço a v. exa. que ponha á votação o artigo 134.º, com a modificação proposta pelo sr. Marianno de Carvalho.

Com relação ao que s. exa. disse ácerca da indicação do artigo 136.º, apresentarei a este artigo uma modificação,

Página 232

232 DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS

Em seguida foi approvado o artigo 134.º, com a modificação apresentada pelo sr. Murianno de Carvalho, com que concordou o sr. relator.

O sr. Presidente: - Vae passar-se á discussão do artigo 130.°

Leu-se o

Artigo 136.° Em qualquer estado da discussão do artigo 1.° de um projecto de lei ou parecer de commissão, se poderá suscitar uma questão previa, ou apresentar uma proposta de adiamento.

§ 1.º A questão previa versa exclusivamente sobre a competência da camara para deliberar ácerca da materia em discussão. Sendo admittida, será discutida o resolvida antes da questão principal.

§ 2.º A proposta de adiamento tem por fim convidar a camara a abster-se, temporaria ou indefinidamente, de deliberar sobre a materia sujeita, e sendo admittida ficará em discussão com a matéria para ser resolvida antes da questão principal.

§ 3.º As propostas e os projectos de lei adiados indefinidamente não podem ser trazidos á discussão na mesma sessão annual.

O sr. Teixeira de Sousa (relator): - Mando para a mesa uma alteração ao corpo do artigo 135.º, em harmonia com o que já foi resolvido.

O sr. Aoroyo: - Eu, sr. presidente, sinto muito discordar inteiramente da proposta mandada para a mesa pelo sr. relator, e já discordava da proposta que aqui está no projecto.

Ha pouco disse á camara que o projecto que se fazia com o proposito de atacar o obstruccionismo, continha em si o modo de tornar quasi interminavel a discussão.

É exactamente no § unico d'este artigo, que estamos discutindo, que se encontrada disposição a que alludia.

Então com a modificação do sr. relator ainda o debate podia ir mais alem do que com o que já no projecto estava disposto.

Quem me dera esta disposição n'outros tempos que vão passados!

Só com este artigo 1.º me dava por bem aventurado; n'esse tempo, se o apanhasse, estava servido á maravilha! (Apoiados.)

Este § 1.° diz assim:

"A questão previa versa exclusivamente sobre a competência da camara para deliberar ácerca da materia em discussão. Sendo admittida, será discutida e resolvida antes da questão principal."

Posso dizer a v. exa. que desde todas as epochas historicas e prehistoricas, muito antes ainda do império Assyrio-Babylonico, já n'esta casa se discutia o celeberrimo e nunca assas fallada questão previa; se era ou não questão previa, e se era questão previa, qual era a marcha a seguir e como se votava.

Todas as maiorias sustentavam, apoiando-se em todos os compendios de logica o de philosophia, que tinham á mão, que a questão previa devia ser não só votada mas discutida antes da questão principal.

Alguns que estão aqui são d'esse tempo de combates heroicos, e hão de lembrar-se da verdade do que eu acabo de dizer.

Recordo-me não de uma nem duas, mas de dezenas de discussões levantadas sobro este assumpto. A opposição sustentava intransigentemente, com o regimento na mão, que não era verdade dizer o regimento que uma questão previa não devia ser discutida antes da questão principal. A maioria sustentava o contrario e clamava:

"Leiam a letra do regimento."

E aberto o regimento encontrava-se:

"Entrará em discussão" sem virqula.

(Riso.)

Observavam todos os deputados da maioria, com a mão no ar: sem virgula!

(Riso.)
Repetia a presidencia: sem virgula!

(Riso.)
O sr. Marianno de Carvalho: - Essa virgula custou um par de carteiras!

(Riso.)

O Orador: - Manda a verdade dizer-se que não era motivo para nos castigarem agora com a sua ausencia.

(Riso.)

O regimen adoptado no actual regimento é o seguinte; "A questão previa é discutida e votada antes da questão principal".

A commissão faz discutir e votar a questão previa antes da principal. Muito bem! vence a logica, não triumpha a causa da virgula.

(Riso.)

Pois, sr. presidente, desde já declaro que se não introduzirem uma restricção a este principio; se não pozerem aqui n'este artigo do regimento qualquer cousa que restrinja o uso da palavra para as questões previas, em a opposição querendo fazer obstruccionismo, nunca se entrará na discussão da materia. Levantar-se-ha a questão previa e a camara, em face do regimento, que já tem virgula, fal-a-ha discutir e votar.

Levanta-se outro orador, com o regimento na mão, o apresenta outra questão previa. Nos termos regimentaes não se póde negar a admissão, discute-se e
vota-se. Assim, com meia duzia de oradores, do mediano folego, e com meia dúzia de questões previas, a atmosphera parlamentar entrará numa tensão de intolerancia tão extrema que não haverá moção que resista. E ir-se-ha embora, como muitas que eram derrubadas n'aquelles tempos heroicos, até mesmo... sem se abrir a boca.

(Riso.)

N'estes termos, peço ao sr. relator a fineza de attender às considerações que eu acabo de fazer, assim como lhe peço que juntamente commigo e com todos os membros d'esta casa, é claro, pense na maneira de tornar real o exercicio do direito de apresentar as questões previas, fazendo-as discutir antes da principal, mas não de maneira que esse direito se transforme n'um acto impertinente de discussão parlamentar, que póde dar logar ao desbarate do melhor dos projectos de lei.

Parece-me que, qualquer que seja a má vontade do sr. João Franco para o adiamento desta discussão, esse adiamento não póde deixar de dar-se. Supponho que não lhe tinha acudido esta observação, contra a qual não julgo facil encontrar de repente o remedio necessario.

O sr. Teixeira de Sousa (relator): - Não acho inconveniente em que a discussão do artigo 135.º fique para amanhã.

Foi adiada a discussão do artigo 135.º

O sr. Presidente: - Vão entrar em discussão o artigo 130.º

O sr. Teixeira de Sousa (relator): - Mando para a mesa uma proposta modificando a redacção do artigo 130.º

O sr. Marianno de Carvalho: - Parece-me necessario harmonisar o artigo 136.º com o 134.º

Aqui acaba-se por dizer que as moções politicas admittidas na discussão do qualquer artigo do projecto são postas á votação pela ordem da sua apresentação.
Mas se juntamente com as moções politicas se apresentarem eliminações, emendas, additamentos, substituições, questões previas, etc... sobre o artigo 1.º, qual é ordem respectiva para a votação? As moções politicas entram primeiro em votação do que as eliminações, emendas, additamentos, substituições, adiamentos e questões previas, ou entram no meio, ou no fim, ou quando entram?

O sr. Presidente: - Não ha mais ninguem inscripto, vão votar-se o artigo.

Página 233

SESSÃO N.° 22 DE 7 DE FEVEREIRO DE 1896 233

O sr. Marianno de Carvalho: - O sr. relator está no seu direito de não responder a qualquer deputado, mas a boa cortezia manda que, quando se faz uma pergunta, se obtenha uma resposta.

É conveniente saber-se em que ordem entram nas votações as moções politicas.

O sr. Teixeira de Sousa (relator): - Parece-ma que a resposta está na ultima parte do artigo 136.º

(Leu, a ultima parte do artigo 136.º)

Quer dizer, havendo mais de uma moção politica, esta é votada pela ordem da apresentação, e a opportunidade pertence ao artigo 138.º

Foram depois approvados os artigos 136.º e 137.º

Leu-se o

Artigo 138.º Se outro deputado adoptar como sua a proposta que se pretende retirar, seguirá esta os termos do regimento como proposta do deputado adoptante.

O sr. Marianno de Carvalho: - Parece-me que n'este artigo deve haver uma alternativa.
Eu apresento, por exemplo, uma proposta. Até ao momento em que ella é admittida, é propriedade minha e posso retiral-a. Desde o momento em que é admittida, deixou de ser propriedade minha e já, a não posso retirar sem consentimento da camara que póde concedel-a ou negal-a. Emquanto a proposta é propriedade minha, não me parece que outrem possa adoptal-a como sua; poderá apresentar outra similhante, mas aquella não. Admittida, porém, á discussão, embora seja retirada pelo seu auctor, qualquer outro póde perfilhal-a. E preciso, portanto, fazer a distincção.

O sr. Teixeira de Sousa: - Parece-me que se póde votar o artigo dizendo:

"Logo que qualquer outro deputado adoptar como sua a proposta admittida pela camara."

Votou-se o artigo com a modificação acima indicada pelo sr. relator.

Leu-se o

Artigo 139.º A discussão acaba por se haver esgotado a inscripção, ou por approvação de requerimento para que a materia se julgue discutida, nos termos do artigo 62.º d'este regimento. N'este ultimo caso a camara resolverá, por votação, se a materia está sufficientemente discutida.

§ unico. Em nenhum caso o assumpto em discussão será posto á votação sem que se extinga a inscripção ou seja approvado requerimento especial para que seja julgado discutido.

O sr. Marianno de Carvalho: - Eu peço apenas uma reducção mais clara.

De outro modo parece que primeiro que se approve o requerimento para a matéria se julgar discutida, ha logar para uma discussão e depois de tornar a votar-se outra para se acabar a discussão.

O sr. Teixeira de Sousa: - Concordo com a eliminação do segundo periodo.

É votado o artigo com a eliminação proposta.

Leu-se o

Artigo 140.° Terminada a discussão, não poderá o presidente conceder a palavra para explicações de facto ou do discurso; quando, porém, a camara, em casos especiaes, permitta as explicações, estas só poderão ter logar no fim da sessão, não podendo, usar-se da palavra por mais de quinze minutos.

O sr. Arroyo: - Não posso concordar, com á limitação a quinze minutos da palavra para explicações. A palavra para explicações refere-se em geral a incidentes de ordem pessoal.

O que é mais racional e conveniente é que estas questões pessoaes se dirimam o terminem no seio do parlamento. É a solução mais facil, é aquella que mais probabilidades tem de bom exito; porque emfim junta-se a boa vontade, os esforços de todos: os esforços da mesa, de todos os membros, da camara e até os do governo para fazer desapparecer a causa do conflicto.

A limitação do incidente por quinze minutos parece-me perigosa e inconveniente. Pergunto ao sr. relator se tem duvida em eliminar as palavras que fixam o praso?

O sr. Teixeira de Sousa (relator): - Devo dizer que os quinze minutos indicavam-se aqui no intuito de não alongar muito a sessão. Não tenho, porém, duvida alguma em concordar com o sr. Arroyo eliminando as palavras que fixavam; a demora das explicações.

Vota-se o artigo com a eliminação proposta.

O sr. Presidente: - Faltam apenas cinco minutos para dar a hora, por isso vou dar a palavra ao sr. Moncada, que a pediu para antes de se encerrar a sessão.

O sr. Cabral Moncada: - Por parte da commissão de fazenda mando para a mesa o parecer relativo ao decreto de 10 de janeiro de 1890 sobre a contribuição de registo.

A imprimir.

O sr. Couto: - Mando para a mesa o parecer das commissões reunidas, de fazenda, guerra e marinha, sobre a proposta de lei, concedendo pensões, aos officiaes e praças de pret, que se distingam em combate.

A imprimir.

O sr. Cunha Silveira: - Manda para a mesa a seguinte:

Proposta

Proponho que sejam aggregados á commissão de marinha os srs. Marianno de Carvalho e Manuel de Bivar.

Sala das sessões, 7 de fevereiro de 1896. = O deputado, J. Cunha da Silveira.

Peço que seja considerada urgente esta proposta.

Approvada, depois de admittida a urgencia.

O sr. Presidente: - A ordem do dia para amanha é a continuação da que estava dada para hoje.

Está levantada a sessão.

Eram seis horas da tarde.

Documentos mandados para a mesa nesta sessão

Representações

1.ª Da camara municipal do concelho da Povoa de Lanhoso, contra a parte do decreto de 14 de agosto do anno findo, que annexou a freguezia do Garfe ao concelho e comarca de Guimarães.

Apresentada pelo sr. deputado Carlos Braga, e enviada á commissão do bill.

2.ª Da junta de parochia e parochianos da freguezia de Garfe, do concelho e comarca de Guimarães, contra o decreto que desannexou esta freguezia do concelho da Povoa de Lanhoso.

Apresentada pelo sr. deputado Carlos Braga, e enviada á commissão do bill.

3.ª Dos ex-arbitradores judiciaes da comarca de Monsão, contra o decreto de 15 de setembro de 1892, que revogou o artigo 37.° do decreto de 20 de julho de 1886 e regulamento dê 17 de março de 1887.

Apresentada pelo sr. deputado Carlos Braga, e enviada á commissão do bill.

4.ª Dos segundos officiaes e amanuenses dos quadros da extincta direcção geral dos correios, telegraphos e pha-

Página 234

234 DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS

roes, actualmente em serviço na actual direcção dos serviços telegrapho-postaes, pedindo que na tabella da distribuição da despeza sejam incluídos os vencimentos e as gratificações que lhes competem pelos n.º s 24.º e 25.º do artigo 126.° da organisação dos serviços telegrapho-postaes.

Apresentada pelo sr. deputado Marianno de Carvalho, e enviada á commissão do orçamento.

Requerimentos de interesse particular

Dos alferes de cavallaria Alfredo Augusto B. de Seixas, Antonio Mendes de Almeida Brito e Faro, Frederico S. Machado e José Leonidas de Aragão Lamy, pedindo que aos alferes graduados, promovidos pela carta de lei de 16 de julho de 1885, seja applicada a doutrina da disposição 7.ª do alvará do 2 de janeiro de 1807.

Apresentados pelo sr. deputado Marianno de Carvalho, e enviados á commissão de guerra.

Justificações de faltas

Participo a v. exas. e á camara que tenho faltado a algumas sessões por motivo justificado. = Fidelio de Freitas Branco.

Para a secretaria.

Declaro a v. exa. e á camara que faltei ás ultimas sessões por falta de saude. = Manuel Pedro Guedes.

Para a secretaria.

Participo a v. exa. que o sr. deputado Luiz de Mello Correia Medello faltou á sessão de hoje, e faltará a mais algumas seguidamente, por motivo justificado. = O deputado por Santarém, D. Luiz Filippe de Castro.

Para a secretaria.

O redactor = Barbosa Colen.

Descarregar páginas

Página Inicial Inválida
Página Final Inválida

×