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N.° 22

SESSÃO DE 29 DE JULHO DE 1897

Presidencia do exmo. sr. Eduardo José Coelho

Secretarios - os exmos. srs.

Joaquim Paes de Abranches
Frederico Alexandrino Garcia Ramires

SUMMARIO

Approvada a acta, o sr. presidente dá conta á camara de uma representação que lhe foi entregue da associação da classe dos refinadores do assacarão Lisboa. -Lê-se o expediente e têem segunda leitura quatro projectos de lei. - O Sr. Alpoim apresenta uma proposta para que haja sessões nocturnas, que é approvada, depois de uma troca de explicações entre s. exa., o sr. Franco Castello Branco e o sr. Laranjo. - O sr. Eusebio Nunes apresenta e justifica dois projectos de lei, respondendo-lhe o sr. ministro da fazenda. - O sr. Simões Ferreira manda para a mesa uma renovação do iniciativa do um projecto de lei e uma representação. - O sr. Simões Baião chama a attenção ao governo para o facto de estarem em atraco os vencimentos dos empregados da camara municipal de Ceia. - O sr. ministro das obras publicas da informações ao sr. Joaquim Tello, com respeito, da obras do paredão de Lagos e o sr. Joaquim Tello agradece essas informações. - O sr. Frederico Ramires apresenta o parecer das commissões do marinha e fazenda sobre o projecto de lei n.º 22-D. - O sr. Barbosa de Magalhães manda para a mesa um requerimento de interesse publico. - O sr. Dias Costa apresenta um projecto do lei e declara ter lançado varios requerimentos na caixa, de petições. - Os srs. Fialho Gomes, Carlos Ferreira e Alvaro Castellões enviam para a mesa representações.

Na ordem do dia, prosegue-se na discussão do artigo 1.º e tabella de receitas do projecto de lei n.º 21, usando da palavra os srs. Teixeira de Sousa, Dias Costa, Teixeira do Vasconcellos, Fialho Gomes e Marianno de Carvalho.

Antes de se encerrar a sessão dá explicações o sr. Dias Costa.

Abertura da sessão - Ás duas horas e meia da tarde.

Presentes d chamada 47 srs. deputados. São os seguintes: - Adriano Anthero de Sousa Pinto, Alexandre Ferreira Cabral Paes do Amaral, Alfredo Carlos Le-Cocq, Alvaro de Castellões, Antonio de Menezes e Vasconcellos, Antonio Simões dos Beis, Antonio Teixeira de Sousa, Bernardo Homem Machado, Carlos Augusto Ferreira, Carlos José de Oliveira, Eduardo José Coelho, Eusebio David Nunes da Silva, Francisco de Almeida e Brito, Francisco Barbosa do Couto Cunha Sotto Maior, Francisco Felisberto Dias, Costa Francisco Furtado de Mello, Francisco Xavier Cabral de Oliveira Moncada, Frederico Alexandrino Garcia Ramires, Frederico Ressano Garcia, Jacinto Candido da Silva, Jacinto Simões Ferreira da Cunha; Jeronymo Barbosa de Abreu Lima Vieira, Jeronymo Barbosa Pereira Cabral Abreu e Lima, João Ferreira Franco Pinto Castello Branco, João de Mello Pereira Sampaio, João Pereira Teixeira de Vasconcellos, Joaquim Augusto Ferreira da Fonseca, Joaquim Heliodoro Veiga, Joaquim José Pimenta Tello, Joaquim Paes de Abranches, Joaquim Simões Ferreira, José de Abreu do Couto Amorim Novaes, José Augusto Correia de Barros, José Bento Ferreira de Almeida, José da Cruz Caldeira, José Eduardo Simões Baião, José Frederico Laranjo, José Malheiro Reymão, José Maria de Alpoim de Cerqueira Borges Cabral, Libanio Antonio Fialho Gomes, Lourenço Caldeira da Gama Lobo Cayola, Luiz Fischer Berquó Poças Falcão, Luiz José Dias, Manuel Telles de Vasconcellos, Martinho Augusto da Cruz Tenreiro, Visconde da Ribeira Brava e Visconde de Silves.

Entraram durante a sessão os srs.: - Adolpho Alves de Oliveira Guimarães, Antonio Maximo Lopes de Carvalho, Antonio Tavares Festas, Arthur Alberto de Campos Henriques, Augusto Cesar Claro da Ricca, Augusto José da Cunha, Conde de Burnay, Conde de Paçô Vieira, Francisco Antonio da Veiga Beirão, Francisco de Castro Mattoso da Silva Côrte Real, Francisco Limpo de Lacerda Ravasco, Francisco Silveira Vianna, Henrique Carlos de Carvalho Kendall, Henrique da Cunha de Matos de Mendia, João Catanho de Menezes, João Joaquim Izidro dos Reis, João Monteiro Vieira de Castro, José Adolpho do Mello e Sousa, José Alberto da Costa Fortuna Rosado, José Alves Pimenta de Avellar Machado, José Dias Ferreira, José Estevão de Moraes Sarmento, José Gonçalves Pereira dos Santos, José Gregorio de Figueiredo Mascarenhas, José Joaquim da Silva Amado, José Maria Barbosa de Magalhães, José Maria Pereira de Lima, Leopoldo José de Oliveira Mourão, Luciano Affonso da Silva Monteiro, Luiz Osorio da Cunha Pereira do Castro, Manuel Antonio Moreira Junior, Manuel Pinto de Almeida, Marianno Cyrillo de Carvalho e Sertorio do Monte Pereira.

Não compareceram á sessão os srs.: - Albano de Mello Ribeiro Pinto, Antonio Carneiro de Oliveira Pacheco, Antonio Maria Dias Pereira Chaves Maziotti, Conde do Alto Mearim, Conde de Idanha a Nova, Francisco Pessanha Vilhegas do Casal, Gaspar de Queiroz Ribeiro de Almeida e Vasconcellos, João Abel da Silva Fonseca, João Antonio de Sepulveda, João Pinto Rodrigues dos Santos, Joaquim Simões Ferreira, José Benedicto de Almeida Pessanha, José Gil de Borja Macedo e Menezes (D.), Manuel Affonso de Espregueira, Sebastião de Sousa Dantas Baracho e Visconde de Melicio.

Acta - Approvada.

O sr. Presidente: - Participo á camara que recebi da associação da classe dos refinadores de assucar de Lisboa uma representação contra a proposta de lei, relativa á concessão do exclusivo para a fabricação e refinação do assucar de beterraba.

Vae ser remettida á commissão de fazenda.

Está por extracto no fim da sessão.

EXPEDIENTE

Officios

Do ministerio do reino, remettendo, em satisfação ao requerimento do sr. deputado Jacinto Candido, quatro documentos respeitantes aos acontecimentos occorridos na ilha Terceira.

Para a secretaria.

Do mesmo ministerio, remettendo, em satisfação ao requerimento do sr. deputado Mello e Sousa, copia do contrato do supprimento de 600:000 libras feito pela casa Henry Burnay & C.ª

Para a secretaria.

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Do ministerio da marinha, satisfazendo aos requerimentos feitos pelo sr. deputado Pereira de Lima em sessão de 20 do corrente.

Para a secretaria.

Segundas leituras

Projecto de lei

Senhores. - Pela lei de 14 do setembro de 1890 foi concedida aos parochos com mais de setenta annos a sua apresentação ordinaria.

De ver é que a poucos póde aproveitar tal beneficio, por isso que, como as estatisticas comprovam, raro é aquelle que chega a tal idade.

Importa, pois, remediar este inconveniente da lei, pondo-a de harmonia com os interesses do thesouro e da classe que pretendeu beneficiar.

E facil se torna, desde que a aposentação ordinaria seja concedida, depois do sessenta annos.

N'esta ultima hypothese continuará a dar-se o que se tem visto, isto é, serem poucos ou que requeiram tal beneficio o paguem as respectivas quotas. Raro será aquelle que presuma chegar a tal idade.

E se a referida lei de 1890 teve em vista beneficiar, sem prejuizos para o thesouro, a classe dos parochos que é tão mal remunerada, e que tantos serviços presta á sociedade, indispensavel se torna por isso dar-lhe um caracter pratico o positivo. Cumpre que a lei estabeleça garantias que possam aproveitar a muitos, o que não convença a maior parte, como os factos têem demonstrado, que raro será aquelle a quem taes disposições possam aproveitar.

Logo que isso se dê, que tal justiça se reconheça, muitos ou quasi todos concorrerão com as suas quotas, e ellas serão de sobejo para o pagamento d'aquelles que se aposentarem.

Convem, por isso, prorogar o praso por mais seis mezes para todos aquelles que nos termos da referida lei de 1890 quizerem aproveitar-se de tal disposição.

Tal é o fim do presente projecto de lei que tenho a honra de submetter á apreciação da camara.

Artigo 1.° É concedida aos parochos que tiverem mais de sessenta annos do idade e de vinte de serviço, e que se achem nas condições prescriptas na lei de 14 de setembro de 1890, a aposentação ordinaria.

Art. 2.º Para este fim, e nos termos da mesma lei, é concedido do novo o praso de um anno a fim de que todos os que o quizerem, possam requerer tal beneficio.

Art. 3.° Fica revogada a legislação em contrario.

Sala das sessões da camara dos senhores deputados, 29 de julho do 1897. = Os deputados, Antonio Simões dos Reis = Antonio Tavares Festas.

Lido na mesa, foi admittido e enviado ás commissões de negocios ecclesiasticos e de fazenda.

Projecto de lei

Senhores. - Ha annos já principiou a camara municipal do concelho de Arravollos a construir um edificio destinado aos paços do concelho, e respectivas repartições publicas. Era urgente tal construção por não haver n'aquelle concelho casa alguma adequada para este fim, achando-se por isso a camara e todas as demais repartições pessimamente installadas em casas de renda e por preços avultados.

Depois do construidas as paredes do novo edificio, e feitos mais algumas despesas, teve aquella obra de parar por falta do recursos. Expostas a todas as intemperies se acham aquellas obras ha cinco annos, e se mais alguns decorrerem, perdidos serão todos os capitães gastos, pois do ver é que não estando coberto ainda o edificio, nem reparadas as paredes, tudo em pouco se arruinará.

Para obviar a este estado de cousas deseja a camara, como é do seu mais alto interesse e dever, completar os referidos paços do concelho e do fórma a não crear novos encargos ou augmentar os existentes.

Tudo isso poderá fazer sendo-lhe permittido que durante dez annos desvie annualmente 500$000 réis do seu fundo de viação, com o que concluirá esta obra.

N'este sentido tão justo como rasoavel, tenho a honra de apresentar á camara o seguinte projecto de lei:

Artigo 1.° É auctorisada a camara municipal do concelho de Arrayollos a desviar do seu fundo de viação, durante dez annos, 500$000 réis annuaes, destinados exclusivamente á continuação das obras do paço d'aquelle concelho.

Art. 2.° Fica revogada a legislação em contrario.

Sala das sessões, 27 de julho do 1897. = O deputado, Antonio Tavares Festas.

Lido na mesa, foi admittido e enviado ás commissões de obras publicas e de fazenda.

Projecto de lei

Senhores. - Tendo D. Antonia Luciana Tocha Moraes, do concelho do Redondo, instituido por testamento um legado em favor da camara municipal do mesmo concelho, na importancia de 6 contos de réis, destinados a serem empregados na acquisição, exploração e conducção das aguas da herdado dos Marnões, na serra de Ossa, para o abastecimento da villa do Redondo;

Visto que esta obra é de uma importancia e vantagem incontestavel para aquelle concelho do Alemtejo, onde é tão sensivel a falta de aguas para a irrigação dos campos como para o abastecimento da população;

Considerando que a camara municipal já deu principio aos trabalhos em ordem a cumprir o legado á vista do grande beneficio que a villa auferirá com o melhoramento, e que lhe será possivel realisar com brevidade se obtiver as facilidades que é uso conceder aos que emprehendam similhantes obras;

Tenho a honra de submetter á vossa apreciação e approvação o seguinte projecto de lei:

Artigo 1.° É concedida á camara municipal do Redondo a isenção da contribuição de registo, por titulo gratuito, do legado de 6:000$000 réis, instituido em seu favor por D. Antonia Luciana Tocha Moraes, em testamento publico de 24 de dezembro do 1896, para acquisição, exploração e conducção das aguas da herdade dos Mamões, na serra de Ossa, com o fim de abastecer a villa do Redondo.

Art. 2.° É revogada a legislação em contrario.

Sala das sessões, 27 de julho de 1897. = O deputado, Antonio Tavares Festas.

Lido na mesa, foi admittido e enviado á commissão de fazenda.

Projecto de lei

Senhores. - A associação commercial de Lisboa foi dissolvida pelo decreto de 31 de janeiro de 1894, transferindo-se para a camara do commercio, pelo decreto de 10 de fevereiro de 1894 e lei de 14 do fevereiro de 1896, todas as prerogativas e attribuições que pertenciam aquella associação.

Mas póde dizer-se que apesar de dissolvida, a associação commercial existiu sempre de facto, porque a sua commissão installadora desempenhou sempre um serviço activo e vigilante, pelos interesses da classe, não conseguindo nunca a camara do commercio reunir os elementos necessarios para o fim para que foi creada.

Desde 1894 até principios do fevereiro d'este anno ficaram no esquecimento os estatutos da associação commercial sem nunca serem approvados.

Com o advento, porem, do gabinete progressista aos

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conselhos da corôa, veiu tambem e quasi immediatamente a approvação d'aquelles estatutos.

E esta approvação foi tanto mais lisonjeira para os interessados, quanto é certo que nasceu espontaneamente, sem solicitações, sendo o primeiro acto governativo, do exmo. ministro das obras publicas.

Assim é que por alvará de 11 de fevereiro d'este anno foram os estatutos approvados, revivendo a associação ainda com mais força do que quando foi dissolvida.

Agora, e como consequencia necessaria, é justo que a reparação seja completa, restituindo-se á associação commercial de Lisboa todas as garantias, attribuições e encargos que lhe pertenciam antes da dissolução.

Por isso temos a honra de apresentar-vos o seguinte projecto de lei:

Artigo 1.° Ficam pertencendo á associação commercial de Lisboa as regalias que, antes da sua dissolução, decretada em 31 de janeiro de 1894, lhe tinham sido conferidas pelas cartas de lei de 20 de abril de 1886, decretos de 29 de julho e 29 de dezembro do 1887, codigo commercial, approvado por carta de lei de 28 de junho de 1888, decretos de 29 de agosto de 1889, 27 de abril, 30 de setembro e 30 de dezembro de 1892, 6 de abril e l de julho de 1893, e por quaesquer outros diplomas especiaes anteriores á referida dissolução.

Art. 2.° Ficam tambem pertencendo á mesma associação os encargos e os rendimentos a que se referem os artigos 8.° e seguintes da carta, de lei de 10 de fevereiro de 1876 e artigo 126.° § 6.° do decreto n.° 3 de 17 de setembro de 1886, e os decretos de 21 de abril e 31 de dezembro de 1892.

Art. 3.º Fica revogada toda a legislação em contrario.

Sala da camara dos senhores deputados, em 27 de julho de 1897. = João Catanho de Menezes = Carlos J. de Oliveira = J. A. Correia de Barros = Luiz José Dias = J. J. da Silva Amado = Manuel Antonio Moreira Junior.

Lido na mesa, foi admittido e enviado á commissão de commercio.

O sr. Alpoim: - Sr. presidente, mando para a mesa viria, proposta que, em conformidade com o regimento, vae assignada por sete srs. deputados.

É a seguinte:

Proposta

Propomos que haja sessões nocturnas, ficando o sr. presidente da camara auctorisado a designar os dias em que devem realisar-se. = José Frederico Laranjo = J. A. Correia de Barros = José Maria de Alpoim = Joaquim Simões Ferreira = Libanio Fialho Gomes = Visconde da Ribeira Brava = Adriano Anthero.

Sr. presidente, escuso de expor á camara os motivos que me determinaram a fazer esta proposta, para a qual peço urgencia.

Se acerca d'ella houver discussão, então pedirei a palavra para expor á camara quaes as rasões fundamentaes em que ella se baseia.

Consultada a camara sobre a urgencia, foi admittida, entrando em seguida a proposta em discussão.

O sr. Franco Castello Branco: - Sr. presidente, bastava a declaração feita pelo illustre deputado, auctor da proposta, de que, se ella fosse impugnada, se levantaria novamente, e então exporia á camara as rasões que a justificavam, para que eu desejasse ouvir os motivos em que se fundamenta.

V. exa. comprehende perfeitamente que, tendo nós o direito e até a obrigação de votar qualquer assumpto submettido á apreciação da camara, que nada nos póde ser tão util para determinar o nosso espirito, quer no sentido da approvação, quer no da rejeição, como sabermos as rasões que levaram o sr. deputado Alpoim a mandar essa proposta para a mesa. Eu estimaria, por isso, ouvir essas rasões.

(S. exa. não reviu as notas tachygraphicas.)

O sr. Frederico Laranjo: - Sr. presidente, as rasões da proposta apresentada pelo sr. Alpoim são muito claras e evidentes: a sessão está bastante adiantada e ha ainda muitissimos trabalhos para discutir, alem de que, como v. exa. sabem, funccionando na mesma sala a camara dos dignos pares do reino e a camara dos senhores deputados, ha dias em que n'esta não póde haver sessão, e, portanto, é necessario compensar essa falta com sessões nocturnas.

O illustre deputado sabe muito bem que, em todos os tempos, mesmo quando as sessões começam no periodo regular e é preciso apressar o andamento dos trabalhos paramentares, que a camara vota a auctorisação necessaria á presidencia para que ella marque as sessões nocturnas.

São estas as rasões que determinaram sempre a camara dos senhores deputados a auctorisar a presidencia a marcar as sessões nocturnas, e foi essa mesma a rasão que levou agora o illustre deputado o meu amigo o sr. Alpoim a fazer e apresentar a proposta que se discuto e que é, por todos os motivos, justificadissima. (Apoiados.)

(S. exa. não reviu.)

O sr. Franco Castello Branco: - Sr. presidente, quando eu esperava ouvir as rasões justificativas d'esta proposta, da bôca do illustre deputado o sr. Alpoim, levantou-se para dar essas rasões o nobre deputado e meu amigo o sr. Laranjo, fazendo-me lembrar isto aquelle antigo dito, que n'uma parte se põe o ramo, e n'outra se vende o vinho.

Assim, o sr. deputado Alpoim apresenta e envia para a mesa uma proposta, mas quem a justifica, quem a fundamenta, quem apresenta as rasões em que ella se baseia, talvez por receio do temperamento demasiadamente vivo d'aquelle illustre deputado, é o sr. Laranjo, investido das moções graves e ponderadoras de verdadeiro leader da maioria. Seja, porém, como for, o que é certo, é que ambos eram capazes de apresentar e justificar essa proposta ou qualquer outra, e um só mesmo era bastante para fazer as duas cousas, não sendo preciso um Cyreneu para tão pequeno trabalho.

Sr. presidente, a sessão abriu no dia 10 de junho, a camara ficou constituida nos primeiros dias d'este mez, o orçamento foi apresentado ha cerca de tres semanas, mas o respectivo parecer só ultimamente é que foi distribuido,
sendo, portanto, ha pouco tempo dado para ordem do dia.

V. exa. sabe muito bem que a regularidade dos trabalhos parlamentares não tem sido por qualquer fórma prejudicada, nem por effeito da opposição, nem da demora que ella tenha dado, quer na exposição das suas idéas, quer na apreciação dos projectos que lhe tenham sido submettidos.

Em occasião alguma se tem trabalhado no parlamento com tanta regularidade e até com tanta paz e harmonia, pois póde dizer-se que reina a paz entre os principes christãos.

V. exa. ha de recordar-se que, quando aqui se apresentou o projecto de resposta ao discurso da corôa, diploma a que é costume dedicarem-se muitas sessões, especialmente quando succede, como succedeu n'esta sessão, ser apresentado depois de umas eleições geraes, por parte da opposição regeneradora eu então declarei que, de proposito, não discutiamos aquelle diploma e nos abstinhamos de levantar n'esta camara quaesquer questões de ordem politica, por entendermos que, nas actuaes circumstancias do paiz, o que importa é voltar a nossa attenção para os assumptos economicos e financeiros, e que desejavamos, que, quando elles viessem a tela da discussão, não nos

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fosse tirado o tempo para bem os estudar e discutir e que as discussões não fossem feitas precipitadamente para não prejudicar o bom estudo d'essas questões. É, pois, com certa surpreza que vejo agora apresentar uma proposta para haver sessões nocturnas.

V. exa. sabe que essas sessões, em qualquer occasião, são um impedimento para o estudo regular das questões submettidas ao criterio do parlamento, o para o bom andamento das discussões, mas isto que é sempre verdadeiro, n'uma epocha como a que vamos atravessando, de verão, ainda o é mais.

V. exa. fica auctorisado a marcar sessões nocturnas, e feita esta observação por parte da opposição, recordado que não é por culpa d'ella que se tem de lançar mão d'isso, que é uma violencia parlamentar, appello para o bom criterio de v. exa. para que, no uso que fizer d'essa auctorisação, não seja tirado aos deputados o tempo necessario para o estudo e discussão dos projectos, nem que as discussões corram por fórma a importar uma violencia physica para os membros da opposição.

A maioria tom o direito do governar; governe conforme quizer, mas v. exa. sabem muito bem que não são simplesmente as vontades da maioria que se podem impor na administração do um paiz, porque, aliás, era escusado estarmos aqui a occupar-nos com discussões de qualquer ordem.

Dito isto, termino as rainhas considerações, e vou agora ouvir as rasões que vae apresentar o illustre deputado o sr. Alpoim.

(S. exa. não reviu.)

O sr. Alpoim: - Se s. exa. tivesse ouvido ler com attenção a minha proposta, escusava de pôr em relevo que fosse o sr. Laranjo quem a defendesse. S. exa. subscreveu-a, e, portanto, era licito que exposesse os motivos que a justificaram. Eu, se não o fiz, foi porque entendi que os motivos da sua necessidade resultavam evidentemente da propria proposta, e porque sendo meu intento que os trabalhos parlamentares se apressem o mais possivel, e ao mesmo tempo que as discussões se abreviem, não queria tomar tempo á camara.

O illustre deputado o sr. João Franco louvou muito a maneira por que tem procedido a minoria parlamentar d'esta casa. Não vem para aqui controverter esse assumpto, mas o illustre deputado não póde negar que d'este lado da camara nos temos cingido strictamente ao regimento, que o sr. presidente tem cumprido com imparcialidade. (Apoiados.) Não temos praticado nenhum acto que represente violencia, nem vontade de obstar ao exercicio dos seus direitos; antes pelo contrario. O regimento é feito por v. exa., e temol-o cumprido pontualmente, com o maior rigor, dando a v. exa. garantia plena e completa de que seja acatada a lei.

Sr. presidente, o nobre deputado não apresentou rasão nenhuma para combater a minha proposta.

Disse s. exa. que a camara se tinha constituido tarde. O nobre deputado sabe que a culpa não foi nossa, mas da lei, a que não me referirei agora, porque não quero pôr uma nota de caracter politico na discussão.

S. exa. não fez objecção nenhuma á proposta, e apenas pediu ao sr. presidente que designasse os dias de sessão de fórma que não fossem estorvados os seus estudos a respeito das diversas propostas de lei.

O sr. presidente tem dado provas completas o cabaes de que sabe quaes são os interesses da camara, de que sabe conciliar os direitos da maioria com os interesses da maioria, e, portanto, espero que os srs. deputados não terão rasão nenhuma para se queixar. (Apoiados.)

(S. exa. não reviu.)

O sr. Presidente: - Vae ler-se a proposta do sr. Alpoim para se votar.

Leu-se na mesa.

O sr. Presidente: - Vae votar-se.

(Pausa.)

Está approvada.

O sr. Eusebio Nunes: - Sr. presidente, recorri ao expediente de mandar para a mesa um aviso previo, pretendendo interrogar o sr. ministro da justiça, para ver se assim me chegava a palavra, pois póde bem considerar-se um verdadeiro jubileu o poder usar da palavra um deputado da direita antes da ordem do dia, depois que as perguntas aos srs. ministros se transformaram em verdadeiras interpellações.

Foi por isso que recorrendo ao expediente de interrogar o sr. ministro da justiça, por meio do um aviso previo, para d'este modo ter a fortuna de poder usar da palavra, deseja saber se s. exa., por parte do governo, acceiterá um projecto meu de lei, que tem por fim o restabelecimento na importante e laboriosa villa de Campo Maior do tabellionato, que foi extincto em virtude do fallecimento do ultimo serventuario, de nome José Maria Nogueira, em 26 de fevereiro de 1897.

Sr. presidente, não é preciso um grande esforço de intelligencia para mostrar á saciedade quanta justiça assisto aquelle povo na representação que dirige a esta camara, e que vou ter a honra de mandar para a mesa, solicitando o restabelecimento do tabellionato n'aquella importante povoação alemtejana.

Para isso basta que saibamos, que a população da laboriosa villa do Campo Maior orça por 6:000 almas, e a sua distancia de Elvas regula por 17 kilometros e Eivas é a cabeça de comarca.

O numero de instrumentos officiaes lavrados, nos ultimos annos em as notas do extincto tabellionato de Campo Maior, attinge, segundo os dados estatisticos fornecidos pelos livros respectivos, a importante média de 349.

Isto, sr. presidente, não se fazendo o calculo de outros actos da vida civil e juridica, nos quaes intervem o tabellião para a sua authenticidade, como reconhecimentos de certidões, de attestados e documentos particulares de que não ficam vestigios em as notas.

Por isso, e em virtude das poderosas razões allegadas pela camara municipal de Campo Maior, tenho a honra e enviar para a mesa um projecto de lei que espero será, recebido pelo nobre e illustrado ministro da justiça, por parte do governo, e pelos membros d'esta camara, porque não venho aqui pedir um acto de favoritismo politico, mas um acto do justiça que se deve áquelles povos; e assim tenho a honra, se v. exa. m'o permitte, de ler o resumido relatorio que antecede o projecto de lei que submetto á esclarecida apreciação e sabedoria d'este parlamento.

(Leu.)

Sr. presidente, continuando com a palavra e como está presente o illustre o nobre titular da pasta da fazenda, tenho a honra de mandar para a mesa um projecto de lei, que submetto ao esclarecido criterio, e alta competencia d'esta camara.

Por isso, aproveitando a occasião, peço licença para dizer a v. exa., ao governo e a esta camara, que, no meu concelho, o sr. D. José Garcia, subdito hespanhol, mandou construir, no anno do 1895, uma fabrica para a laborarão do amido, que custou, com os machinismos e depois de prompta, a importante cifra de 45 contos de réis.

Montada no concelho de Elvas, na quinta denominada do Correia, esta fabrica com machinismos caros, adquiridos no estrangeiro, começou a funccionar em 1895, e em janeiro de 1896 viram-se os proprietarios obrigados a suspender os trabalhos industriaes pelo grande prejuizo que lhes occasionavam os direitos alfandegarios sobre a materia prima - o arroz partido - que era indevidamente equiparado ao arroz para consumo.

Requereram a Sua Magestade, reclamando contra o excessivo direito pautal a camara municipal de Elvas, a que presido, a associação commercial, industrial e agricola, e

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ainda ou operarios empregados no serviço d'aquella fabrica, emquanto a empreza representada pelo sr. D. José Garcia reclamava junto do governo.

Sr. presidente, diz a philosophia moderna, n'um dos seus capitulos, que abrir uma escola é fechar uma cadeia, (Apoiados.) é fechar um antro do vicio e do crime. (Apoiados)

Perguntarei agora, sr. presidente, o que representa na sociologia moderna o facto extranho de se fecharem as portas de uma fabrica depois de aberta á sua actividade industrial, não porque essa empreza fallisse, ou os seus proprietarios, abandonassem o seu estabelecimento industrial, mas, porque o Estaco, descaroavel, injusto e cruel na protecção, que deve a todos os cidadãos, não reconhecendo sempre os verdadeiros interesses das classes, nem importando-se muitas vezes com a devida protecção á dispensar as industrias, foi aggravar n'uma exorbitancia, sem nome, os direitos alfandegarios, porque, segundo me foi declarado pelo meu amigo o sr. consul geral ao Mexico, Luiz Breton y Vedra, que tambem é amigo dedicado dos proprietarios da fabrica, esse direito com as suas alcavalas e adminiculos regula por 42 réis em kilogramma, motivo por que o sr. Qintze Ribeiro, na sua proposta de lei n.° 7 apresentada ao parlamento na sessão de 16 de março de 1896, attendia ás reclamações da camara municipal de Elvas, muito justas e muito bem fundamentadas, assim como ás da associação commercial, industrial e agricola d'aquella cidade.

A paginas 92 do relatorio do sr. Hintze Ribeiro, de 1896, estabelece-se muito equitativamente o seguinte:

«Succos e materias vegetaes não especificados em bruto, ou preparados, comprehendendo o arroz partido, 7 por cento ad valorem.»

Sr. presidente, ha dezoito mezes que a importante fabrica industrial de amido tem as suas portas fechadas, e os operarios da cidade de Elvas que n'ella tinham amparo e pão para si e suas familias, vêem-se hoje privados d'essa collocação, em virtude de um direito pautal que obrigou os proprietarios a fechar, como digo, as portas d'aquella importante fabrica, a mais importante, segundo me consta, do nosso paiz, n'este genero, pensando os seus proprietarios, alem da fabricação do amido, em estender a sua industria ao fabrico da pó de arroz para iguaes, se os direitos alfandegarias sobre o arroz partido não fossem precisamente iguaes aos do arroz para consumo.

Sr. presidente, em nome dos interesses economicos do meu concelho e dos interesses da nação que tenho obrigação de defender tambem, mas especialmente agora, em nome dos interesseis do circulo que tenho a honra de representar n'esta casa, venho apresentar um projecto de, lei, que o nobre ministro da fazenda já teve a bondade de declarar que acceitava, tal é a justiça que assiste aos meus constituintes impetrantes, tal é a justiça que assiste ao meu, pedido. (Apoiados.)

Esse pedido que faço não é por politica, mas sim pelo cumprimento do meu dever, e pelo espirito de bem fazer, e por isso peço ao parlamento que proteja, como deve e como lhe cumpre, as classes desfavorecidas da sorte, a classe do operariado, a classe dos jornaleiros, porque n'aquella fabrica todos, mais ou menos, tinham emprego.

O projecto que tenho a honra de submetter á esclarecida apreciação do parlamento, ao seu saber, e á sua justiça, vem precedido de um relatorio despretencioso e simples, simples como eu, por ser um caloiro, na phrase do sr. João Franco.

O sr. Teixeira de Vasconcellos: - Isso é menos exacto, por não se ter pronunciado tal palavra.

O Orador: - Mas seja como for, é um simples relatorio que venho apresentar, sem pretenções algumas, trabalho de um humilde e obscuro soldado do partido progressista, onde já milito ha vinte e sete annos, procurando sempre servil-o com dedicação igual ao provado desinteresse, mas collocando sempre acima, de tudo os sagrados interesses da patria.

Vozes: - Muito bem, muito bem.

O sr. Teixeira de Vasconcellos: - Para desfazer qualquer equivoco, peço licença para dizer que ninguem fez referencia a v. exa. Fallou-se em calor e não em caloiro.

O Orador: - Muito bem. Não foliemos mais n'isso.

Com permissão de v. exa., posso a ler o simples e despretencioso relatorio que precede o meu projecto de lei.

(Leu.)

Tenho dito.

Vozes: - Muito bem, muito bem.

(O orador foi muito cumprimentado por muitos srs. deputados.)

Os projectos de lei ficaram para segunda leitura.

O sr. Ministro da Fazenda (Ressano Garcia): - Se fosse, necessario demonstrar que o illustre deputado estava longe de ser um dos mais humildes e obscuros membros d'esta camara bastaria citar o discurso eloquente que s. exa. acaba de proferir, na defeza dos legitimas interesses do seu circulo.

O illustre deputado mandou para a mesa dois projectos do lei; um relativo ao restabelecimento do tabelllionato na villa de Campo Maior e outro relativo ao direito de importação de arroz partido.

Pelo que respeita ao primeiro darei conta ao meu collega da justiça das considerações feitas por s. exa. em defeza do referido projecto.

Pelo que toca ao arroz partido, o governo emittirá a sua opinião no seio da commissão a que o projecto for enviado, mas desde já declaro que, em principio, estou do accordo com o projecto, porque temos necessidade de desenvolver a industria nacional. Tenho, porém, duvidas sobre se o arroz partido serve hoje para consumo ou se é apenas destinado ao fabrico do amido.

Como disse, estou perfeitamente de accordo, em principio, com o projecto, porque elle tende a fomentar e manter uma industria que já existia e, por assm dizer cessou. Na commissão de fazenda estudarei o projecto e espero que o respectivo parecer lhe seja favoravel.

(S. exa. não reviu.)

O sr. Eusebio Nunes: - Agradeço ao illustre ministro, da fazenda as suas nobres e patrioticas palavras.

O sr. José de Alpoim: - Mando para a mesa o parecer da commissão de negocios estrangeiros e internacionaes, sobre a renovação de iniciativa do projecto de lei apresentado em sessão de 28 de abril de 1896, determinando que possam ser nomeados consules de 1.ª classe, independentemente do concurso estabelecido para estes funccionarios, os consules de 2.ª classe, vice-consules, enviados e chancelleres de consulados de 1.ª classe, todos de nacionalidade portugueza, em exercicio antes do decreto de 12 de novembro de 1891, quando tenham completado dez annos de bom e effectivo serviço n'aquellas qualidades.

Mandou-se imprimir.

O sr. Presidente: - Tem a palavra o sr. Simões Ferreira.

Tenho a prevenir s. exa. de que se entra na ordem do dia ás tres horas e vinte minutos.

O sr. Simões Ferreira: - Manda para a mesa uma proposta de renovação de iniciativa do projecto de lei n.° 2-B, da primeira sessão do corrente anno, relativa á isenção de direitos para o material destinado á illuminação a luz electrica da cidade da Guarda.

Manda igualmente, para a mesa uma representação da camara municipal da Guarda, fazendo o pedido a que elle, orador, attende, apresentando aquella renovação de iniciativa.

Declara por ultimo que vae mandar lançar na caixa

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respectiva um requerimento de José Maria da Cruz Sousa, antigo militar, que deseja ser admittido na reserva, para o que tem habilitações legaes.

A renovação de iniciativa ficou para segunda leitura

O sr. Simões Bayão: - Desejo chamar a attenção do sr. ministro da fazenda para o facto de se acharem, ha sete mezes, sem receberem os seus vencimentos os empregados da camara municipal de Ceia. E chamo a attenção de s. exa. para este facto porque elle não é da responsabilidade da camara municipal, mas do delegado do thesouro no districto da Guarda.

Como se sabe algumas das contribuições municipaes são cobrados cumulativamente com as contribuições do estado, e depois de realisada a cobrança faz-se a destrinça e entregam-se á camara municipal os rendimentos que lhe pertencem.

É esta a unica funcção dos empregados de fazenda, sendo a camara municipal a unica entidade competente para a applicação das suas receitas.

A camara municipal de Ceia solicitou do delegado do thesouro a entrego dos receitas municipaes d'aquella proveniencia e o delegado do thesouro exigiu que a camara lhe dissesse qual era a applicação que queria dar áquelles fundos, ao que a camara justamente se recusou, resultando d'aqui não poder pagar aos seus empregados ha muitos mezes, nem satisfazer outros compromissos.

Ora o delegado do thesouro não tem attribuições para fiscalisar a applicação das receites municipaes; (Apoiados.) cumpre-lhe apenas fazer a destrinça das contribuições e entregar á camara municipal a parte que lhe pertence. Outras não são n'este assumpto as suas attribuições.

Não quero fazer censura a este funccionario, que se é, quem eu supponho, tenho até pelo seu caracter muita consideração pessoal.

De certo que da sua parte houve má interpretação legal a este respeito, mas a verdade é que por sua causa estão os empregados da camara municipal de Ceia sem receber os seus ordenados ha mezes.

É, pois, para este facto que eu chamo a attenção do sr. ministro da fazenda a fim de dar ordem ao delegado do thesouro do districto da Guarda para que entregue sem demoro á camara municipal de Ceia os fundos que lhe pertencem.

O sr. Ministro da Fazenda (Ressano Garcia): - Em resposta ás considerações feitas pelo illustre deputado vou pedir informações a esse respeito, que de certo hão de confirmar o que o illustre deputado expoz, e darei as providencias necessarias para acudir ás reclamações de s. exa.

(S. exa. não reviu.)

O sr. Ministro das Obras Publicas (Augusto José da Cunha): - Eu não pude assistir ao começo da sessão do hontem por motivo de negocios urgentes de serviço publico de que tive de me occupar; soube porém, por intermedio de um dos meus collegas, que o illustre deputado pelo Algarve, o ar. Joaquim Tello, fez algumas considerações relativamente ás obras da barra de Lagos, e eu para ser agradavel a s. exa., apresso-me a responder a essas considerações para desfazer os receios que s. exa. tem de que estas obras sejam suspensas.

O fundamento da apprehensão do illustre deputado não tem rasão de ser; não se deu nenhuma ordem de suspensão d'aquellas obras, que são de importancia capital para a cidade de Lagos; o que succedeu foi afrouxar um pouco a remessa de fundos, mas agora ha nova distribuição do fundos para obras publicas, e aquellas obras hão de ser contempladas com uma verba um pouco superior, porque é preciso aproveitar o tempo proprio para a sua construcção, e esse tempo é exactamente aquelle em que estamos.

Portanto, póde ficar s. exa. socegado a respeito do assumpto para que chamou a minha attenção.

(S. exa. não reviu.)

O sr. Joaquim Tello: - Agradeço as explicações do sr. ministro das obras publicas.

Folgo de que não sejam absolutamente exactas as informações que recebi, e tenho toda a confiança nas categoricas promessas que s. exa. acaba de fazer n'esta camara, para que as obras do porto de Lagoa sejam agora, com a nova dotação orçamental, continuadas com a actividade e extensão que requerem taes obras.

Aproveito o ensejo paro declarar, que foi o ministro das obras publicos transacto, o sr. Campos Henriques, que deu a ordem para o começo d'aquellas obras, e fel-o de certo, porque se convenceu da sua justiça e urgencia, mas tenho o desvanecimento de crer tambem que foram instancias muito repetidas e impertinentes da minha parte, que não tive duvida em solicitar directamente de s. exa. a ordem paro se realisar esta obra, que determinaram ou cooperaram no fim indicado, o que n'este momento reconheço e agradeço.

Folgo de levar aos meus patricios a nova de que chegou o momento de serem attendidos nas suas justissimas reclamações, porque são de absoluta fé e confiança, para mim e para todos, as palavras proferidas pelo nobre ministro das obras publicas, e meu distincto amigo o sr. Augusto José da Cunha, e em nome dos meus constituintes desde já agradeço a s. exa. o empenho que mostra em acceder ao meu pedido e as phrases que me dirigiu.

O sr. Presidente: - Os srs. deputados que tiverem papeis a mandar para a mesa podem fazel-o.

O sr. Frederico Ramires: - Mando para a mesa um parecer da commissão de fazenda e de marinha relativamente á proposto de lei n.° 22-D, que concede a Margarida Ramos, residente na ilha da Boa Vista, Cabo Verde, como recompensa do acto de abnegação prestado com sacrificio de vida, por seu filho Manuel Antonio Ramos, a pensão annual de 72$000 réis.

Foi a imprimir.

O sr. Barbosa de Magalhães: - Mando para a mesa o seguinte

Requerimento

Requeiro que, pelo ministerio da guerra, seja remettido a esta camara o processo que serviu de base á reforma do capitão de cavallaria Antonio Baptista Lobo, por decreto de 4 de abril de 1894. = Barbosa de Magalhães.

Mandou-se expedir.

O sr. Fialho Gomes: - Mando para a mesa uma representação dos terceiros distribuidores da estação telegrapho-postal de Beja, pedindo augmento de vencimento.

A representação vae por extracto no fim da sessão.

O sr. Carlos Ferreira: - Mando para a mesa uma representação dos terceiros distribuidores telegrapho-postaes de Castello Branco, pedindo augmento de vencimento.

A representação vae por extracto no fim dá sessão.

O sr. Alvaro de Castellões: - Mando para a mesa duas representações dos proprietarios de padarias dos concelhos de Espozende e de Villa Novo de Famalicão, pedindo modificações na lei dos cereaes.

A representação vae por extracto no fim d'esta sessão.

O sr. Dias Costa: - Mando para o mesa um projecto de lei reformando o quadro do secretariado militar.

Mando tombem para a mesa a seguinte

Participação

Tenho a honra de participar a v. exa. e á camara, que n'esta data lancei na caixa de petições quatro requerimentos de capitães de infanteria, pedindo que seja revogado o decreto dictatorial n.° 7, de 10 de janeiro de 1895, mantido o quadro do generalato, estabelecido pelo decreto de 30 de outubro de 1884, e modificada a carta de lei de 13 de maio de 1896 por fórma que se fixe um ou limite

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de idade para todos os postos de oficial do exercito. = F. F. Dias Costa, deputado pelo circulo n.° 34 (Arouca).

O projecto de lei ficou para segunda leitura.

ORDEM DO DIA

Continuação da discussão do artigo 1.° e tabella das receitas do orçamento geral do estado para o anno economico de 1897-1898

O sr. Teixeira de Sousa (continuando): - Na sessão passado propunha-me eu demonstrar que o orçamento apresentado ás côrtes pelo sr. Hintze Ribeiro em 18 de janeiro tinha sido elaborado segundo os preceitos do regulamento da contabilidade publica, e começava eu então o apreciar as correcções que foram feitas no orçamento rectificado que está em discussão.

Como v. ex. se recorda, essas correcções baseavam-se principalmente na verbo de cambios augmentada de 1:256 contos de réis para encargos da divida publica fundada, 300 contos de réis, para os encargos de emprestimos novos 301 contos de réis que o sr. ministro da fazenda calculava de prejuízo paro o thesouro do decrescimento nos rendimentos dos direitos aduaneiros em 1897-1898; mais 600 contos de réis destinados á dotação dos edificios publicos, 376 contos de réis de augmento de despeza no ministerio da guerra e 175 contos de réis de augmento de despeza no ministerio da marinha.

Dizia eu n'essa occasião que era porá notar o singular circunstancia de os ministros, que na opposição tinham empregado todos os esforços para escalar o poder, servindo-se de todos os meios, mesmo d'aquelles que tornam hoje o governo mais odioso aos seus alliados de hontem, não trazerem na sua bagagem de homens de estado medidas attinentes a resolver a questão economico e financeira, cuja gravidade se traduz pelo baixa consideravel nos cambios e pela dificuldade que o thesouro encontro no satisfação dos seus encargos no estrangeiro, e sobretudo dos encargos da divida publica externa.

Dizia eu que até o sr. ministro da fazendo, apesar do seu enorme talento, que sou o primeiro a reconhecer, não nos tinha dado senão o diffamação politica dos seus adversarios em documentos officiaes, (Apoiados.) e umas propostas de fazenda que se fossem convertidas em lei e postas em execução fariam a ruina do paiz, dobre de finados da autonomia da administração portugueza, que eu espero não se fará ouvir, devido á viva resistencia do paiz e á intransigencia absoluta que algumas d'essas propostas hão de encontrar d'este lado da camara. (Apoiados.)

O sr. presidente do conselho communicou á camara que o governo estava na resolução de não insistir nas propostos que encontrassem viva intransigencia d'este lado da camara e que irritem o espirito publico. Pois como o paiz pensa ácerca das propostas de fazenda sabe-o muito bem o governo quando se convence de que já todos os soldados são poucos paro ficarem de prevenção nos quarteis. (Apoiados.)

Dizia o illustre relator do parecer que está em discussão, o sr. Laranjo, que a questão de fazendo era grave, que consistia na inconvertibilidade do nota e na divida fluctuante.

Eu discordo absolutamente e peço licença a s. exa. para tocar na arca santa dos seus conhecimentos especiaes sobro, finanças e economia politica.

Dizia s. exa. que a questão de fazenda consistia na inconvertibilidade da nota e na divida fluctuante. Isto é preparar o campo paro as propostas de fazenda, ruinosas para o thesouro e perigosas para a economia publica, apresentadas pelo sr. Ressono Garcia, mas não abona o professor, muito distincto e erudito é certo, mas que põe de parte o resultado dos seus estudos e o que a suo consciencia lhe dieta para dar a sua palavra ao serviço de uma causa inteiramente perdida para o governo, porque contra ella o paiz se pronunciou.

A inconvertibilidade da nota é o effeito e não o causa da questão de fazenda. A gravidade da situação financeira vem das enormes dificuldades com que o thesouro lucta para satisfazer os seus encargos no estrangeiro, sobretudo n'esta occasião, com o estado actual dos cambios, o qual prende com a situação economica, que abandonada a si durante muitos annos, attingiu hoje uma excepcional gravidade. (Apoiado.)

A inconvertibilidade da nota vem dos fins de 1891, mas a questão de fazenda já era grave no começo d'esse anno, em que para se fazer um emprestimo tivemos de hypothecar um dos principaes rendimentos do estado. A questão financeira está inteiramente ligada com a questão economica e separal-as, quando é preciso conjurar dificuldades é na minha opinião um gravissimo erro. O desequilibrio orçamental, corrigido até certo ponto pela reexportação de mercadorias das provincias ultramarinas, ainda produz um deficit de ouro que não se póde calcular era menos de 6:000 contos de réis, que juntos aos encargos que o governo tem a satisfazer no estrangeiro e aos que tem a satisfazer a companhia das aguas, a dos tabacos, a companhia dos cominhos de ferro norte e leste e a do caminho de ferro de Ambaca, dão um deficit de ouro que não póde ser calculado em menos de 15:000 contos de réis. Aqui é que está o inimigo que é preciso combater com energia, em o que o desenlace da crise não se fará esperar nem deixará de ter funestas consequencias para o paiz.

Poderá dizer-se que o desiquilibrio economico vem de largos annos e que todavia a questão financeira nunca foi tão grave como é hoje, mas a verdade é que os seus effeitos foram durante muito tempo cobertos por emprestimos pedidos ao credito, que hoje não temos, e pelas remessas de ouro vindas do Brazil e que hoje não podem effectuar-se em virtude da baixa de cambio dependente das circumstancias economicos e politicas d'aquelle paiz que não podemos ter a pretensão de modificar.

Peçam as credito dez ou vinte mil contos de réis; o thesouro ficará apparentemente alliviado por algum tempo, mas depois ninguem hesitará em dizer que está gravemente compromettida a autonomia da administração portugueza com todos os perigos para o paiz e com o que de mais humilhante póde haver para a honra nacional. (Apoiados.)

Hoje temos livre o receita dos phosphoros, a receita dos assucares, uma parte da receita dos tabacos, a receita dos caminhos de ferro, e conhecemos as dificuldades com que o thesouro lucta para satisfazer os seus encargos, embora já muito reduzido.

Se amanha formos prender estas importantes receitas, ao serviço de emprestimos novos, v. exa. comprehende, que se são graves as dificuldades para que o thesouro possa, satisfazer os seus encargos no estrangeiro hoje, amanhã serão gravissimas e insuperaveis; (Apoiados) e o resultado final será para o nosso paiz a administração estrangeira, com todos os seus horrores e desgraças, com tudo quanto tem de deprimente e humilhante para a honra, nacional. (Apoiados.)

É por isso que tenho a opinião de que a questão financeira está intimamente ligado á questão economica.

E que faz o governo, para resolver a questão economica?! O que faz o governo para dar vida ao commercio, que dia a dia se definha; para animar a industria, cujos productos não passam alem das nossos fronteiras; paro o desenvolvimento á nossa agricultura e arrancal-a da rotina, que tão prejudicial lhe tem sido; o que faz fim, em materias do tratado de commercio, pelas quaes se possa obter facil collocação dos nossos productos nos mercados estrangeiros?! Nada! (Apoiados).

Trouxe-nos aqui o sr. ministro das obras publicas, umas

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propostas de fomento, que a critica mordaz classificou de fomentação!

Expressão até certo ponto verdadeira; (Apoiados) por que essas propostas não passam de uma fomentação anodyna na nossa situação economica!

Ha até quem queira ver n'essas propostas um meio delirado de que s. exa. ao serviu para mostrar até que ponto discorda dos processos do sr. ministro da fazenda. Emquanto que o sr. ministro da fazenda pede muito simples auctorisações para oito emprestimos, quatro monopolios, treze caminhos de ferro, conversão da divido externa, com algum tanto de administração estrangeira, o sr. ministro das obras publicas, que tem em decretos com força de lei a maior porte do que propõe, e que tem auctorisações para fazer o resto, leva os seus melindres e escrupulos até ao ponto de não executar as leis que encontrou e do não se servir das auctorisações que tem, por estar convencido de que o processo das auctorisações é o peior e mais nefasto que póde haver para a administração publica. (Apoiados.)

O que é certo é que essas propostas, fracas como são, dormem nas respectivas commissões, sem que, francamente, ninguem reconheça a vantagem de ir despertal-os! É o que v. exa. vê, o que tem sido a vida do governo.

Feliz apenas o sr. ministro da marinha, que d'esta vez apenas provocou uma nota de um governo estrangeiro, a proposito da proposta para melhoramentos no porto de Lourenço Marques, que pela porta que abria ao estrangeiro, podia ser o renegação da nossa historia, o desprezo pelo nosso futuro colonial, pelo sangue ali derramado pelos nossos soldados e pelo memoria d'aquelles, que resvalaram para o tumulo, defendendo o honra do paiz e a integridade do nosso territorio. (Vozes: - Muito bem.)

O sr. Ministro da Marinha (Barros Gomes): - V. exa. diz que eu recebi uma nota do estrangeiro, a proposito da proposta para as obras e melhoramentos em Lourenço Marques?!

O Orador: - Não tenho duvida nenhuma a esse respeito.

O sr. Ministro da Marinha (Barros Gomes): - Pois declaro ao illustre deputado que o governo não recebeu nota alguma a esse respeito.

O Orador: - Antes assim.

É isto o que tem sido a vida do governo!

Do que resulta que o descredito sobe de ponto, a confiança falta, e a ordem publica está, segundo se diz e o proprio governo não nega, gravemente ameaçada (Apoiados.) produzindo tudo isto o aggravamento da crise que se traduz na baixa de cambios.

Mas pergunto, como perguntava o meu amigo o sr. Mello e Sousa ao sr. ministro da fazenda:

O sr. ministro da fazendo preciso de 1:256 contos de réis para a differença de cambios destinados ao encargo da divida publica fundada? Não precisa o sr. ministro da fazendo dos 1:256 contos do réis, como não precisa mesmo da verba que no orçamento de janeiro foi pedida pelo sr. Hintze Ribeiro.

O sr. ministro da fazenda, segundo affirmou toda o imprensa affecta ao actual governo, fez saber que o governo não só estava habilitado com oiro para satisfazer todos os seus encargos no estrangeiro, em todo o anno, mas até estava habilitado para satisfazer os encargos que particulares lá fóro tinham. (Apoiados.)

Ninguem ignora que, ao cambio de 37, foi offerecido á companhia dos tabacos, á companhia real dos cominhos de ferro e á companhia de Ambaca uma somma, que o sr. Mello e Sonsa calculou em 583:000 libras. Não ha duvida a este respeito.

Ninguem fará ao sr. ministro da fazenda a injustiça de acreditar que s. exa. se desfazia do oiro de que precisava para satisfazer os encargos do thesouro, para o dar o companhias, para que essas comprassem mais barato oiro para satisfazer os seus encargos.

Não havia rasão alguma para que se viesse augmentar a verba dos cambios. S. exa. apenas quiz augmentar a despeza calculada no orçamento de janeiro para mostrar esse orçamento não se fechava com saldo, mas com deficit.

Mas eu vou mostrar o v. exa. como o sr. ministro da fazenda, avolumando a verba de cambios, apenas se preoccupou em fazer o descredito dos seus antecessores, e não em habilitar-se a, sem difficuldades, solver os encargos do agio do oiro.

No orçamento apresentado ás côrtes pelo sr. Hintze Ribeiro, alem da verbo do agio do oiro poro os encargos da divida publica fundado, foi descripto a verba de 500 contos de réis destinado a fazer face ao agio no pagamento de outros encargos.

Mas quer v. exa. saber o que o sr. ministro da fazendo fez?

Elevou o calculo do agio do oiro de 30 a 60 por cento na parte relativo aos encargos da divida publico, pedindo assim mais os 1:256 contos de réis a que me tenho referido, e conservou, sem alteração a verba de 500 contos de réis descripta no orçamento de 18 de janeiro! (Apoiados.)

Isto é serio? (Apoiados.) Isto é legitimo e decoroso? (Apoiados.)

Este facto é tão extraordinario, que só teria explicação se o sr. ministro do fazenda nos podesse convencer de que o oiro para o divida fluctuante externa, por exemplo, ou para as despezas diplomaticas e consulares é mais Barato do que o destinado ao pagamento dos juros da divido fundada! (Apoiados.)

Mas fez mais do que isso. O sr. Hintze. Ribeiro no orçamento do anno de 1896-1897, e que corresponde á lei de 13 de maio de 1896, calculou o agio do oiro em 27 por cento e governou-se com elle; e o sr. Ressono Garcia, que entrou no principio de fevereiro, governou-se com o agio de 27 por cento até 30 de junho!

Bem sei que o sr. ministro da fazendo, se me désse o honra de responder, abafava o meu argumento, dizendo: "Eu tive necessidade de abrir creditos especiaes para cobrir a differença da verba destinada a agio de oiro para os encargos da divido publica fundada."

Pois n'esses creditos encontrei eu uma das rasões para me convencer de que na organisação d'este orçamento rectificado não houve a seriedade que devia haver; s. exa. apenas tratou de desacreditar os seus adversarios!...

Eu digo já a v. exa. porque. O credito aberto por decreto de 14 de julho é na importancia de 358 contos de réis. Tendo calculado o sr. Hintze Ribeiro que o agio do oiro era de 30 por cento, o sr. Ressono Garcia prevendo que iria a 50 por cento calculou a verbo de 1:256 contos de réis para differença de cambios nos encargos da divido publica fundada.

O sr. Hintze Ribeiro calculou no orçamento de 1896-1897 o agio do oiro em 27 por cento, mas o media de cambios no anno economico findo foi de 38 por cento: logo havia uma deficiencia de 11 por cento, que correspondia a uma verba de 659 contos de réis, e não 358, para que o sr. ministro da fazenda pedia credito especial. (Apoiados.)

Já vêem que rasão tinhamos nós para affirmar que o sr. ministro da fazenda apenas teve uma preoccupação: avolumar as despezas calculadas no orçamento de 1897-1898 apresentado á camara pelo sr. Hintze Ribeiro e não organisar o orçamento com a possivel exactidão em documentos d'esta natureza.

Assim o deficit de 2:697 contos de réis que o sr. ministro da fazenda foi encontrar no orçamento do sr. Hintze Ribeiro fica logo reduzido a 1:441 contos do réis, tal é o differença entre 2:597 e 1:256 contos de réis.

O. sr. ministro da fazenda descreve no seu orçamento

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rectificado 300 contos de réis destinados a fazer face a emprestimos novos.

O que são os emprestimos novos?

São o das classes inactivas, que o sr. Hinze Ribeiro não tinha contratado nem pensava em contratar, o destinado a obter dinheiro para edificios publicos, entre outros o grande palacio de justiça que nunca o sr. Hintze Ribeiro nem os seus antecessores pensaram construir; o destinado a completar o porto artificial de Ponta Delgada, cuja necessidade o governo anterior nunca reconheceu, e por isso tambem nenhuma necessidade tinha o sr. Hintze Ribeiro, se não quizesse phantasiar, de trazer para o seu orçamento esta verba de 300 contos de réis. (Apoiados.) Fica assim reduzido o deficit a 1:141 contos de réis.

O sr. ministro da fazenda fez outra correcção. Calculou que o rendimento dos direitos de differentes generos de mercadorias devia ser, no anno economico de 1897-1898, menos 602 contos de réis, e acrescentava que a cobrança do anno corrente seria igual á effectuada no anno de 1894-1895.

Aqui está mais um outro erro que eu poderia aproveitar, se quizesse, para demonstrar que falseado está o orçamento do sr. Ressano Garcia.

O rendimento a que me refiro foi de 12:916 contos de réis em 1895-1896, e em 1894-1895 de 11:606 contos de réis, sendo, portanto, a differença de 1:350 contos de réis. Se o sr. ministro da fazenda quiz calcular o rendimento de varios generos e mercadorias em 1897-1898 pela cobrança realisada em 1894-1895, deveria fazer uma correcção de 1:350 contos de réis e não de 602 contos de réis, como arbitrariamente fez, de fórma a offerecer-nos este montão de falsidades sobre que está a versar a discussão.

Ora, como procedeu o sr. Hintze Ribeiro? Procedeu em harmonia com os preceitos do regulamento da contabilidade publica, trazendo para o orçamento de 1897-1898 a cobrança do anno de 1895-1896, a unica apurada áquella data. (Apoiados.)

E n'este ponto vou responder a um argumento apresentado na sessão passada pelo sr. Laranjo. S. exa., no seu afan de defender a obra do sr. ministro da fazenda, veiu aqui dizer que o sr. ministro apenas cortou o que o sr. Hintze Ribeiro havia arbitrariamente calculado a mais dos rendimentos aduaneiros.

Não é assim. S. exa. devia ver que o sr. Hintze Ribeiro procedeu de harmonia com os preceitos do regulamento da contabilidade publica; (Apoiados.) e o sr. Laranjo teria encontrado esta explicação se a fosse procurar a pag. 85 do orçamento apresentado pelo sr. Hintze Ribeiro em 18 de janeiro. (Apoiados.) E assim, o deficit calculado pelo sr. ministro da fazenda em 2:697 contos de réis, fica reduzido a 840 contos de réis! (Apoiados.)

Para edificios publicos o sr. ministro da fazenda pediu mais 600 contos de réis. Para que? Evidentemente para avolumar a despesa, porque o seu fim nem sequer foi favorecer os operarios. (Apoiados.)

O sr. Hintze Ribeiro, no orçamento de 18 de janeiro, já tinha augmentado a verba para edificios publicos, elevando a dotação a 650 contos de réis; e o sr. Ressano Garcia dá-nos esta verba agora de 600 contos de réis com uma mão e tira-a com a outra, descrevendo, como compensação de despesas, 735 contos de réis, que pede ao credito para edificios publicos. (Apoiados.) Aqui tem v. exa. o deficit de 2:697 contos de réis reduzido a 240 contos de réis! (Apoiados.)

E se v. exa. se recordar dos argumentos produzidos pelo sr. Mello e Sousa, verá que o que s. exa. calculou a mais para os ministerios da guerra e da marinha vae encontrar muito approximadamente o saldo que o sr. Hintze Ribeiro calculou no seu orçamento de 18 de janeiro.

Não teve o sr. Hintze Ribeiro a preoccupação de reduzir as despesas o augmentar as receitas com o fim de que o accusaram, de que se preoccupou apenas com arranjar saldo positivo, porque o modo como s. exa. calculou a receita proveniente do sêllo, do real de água e do imposto do consumo prova exactamente o contrario, (Apoiados.) prova que o sr. Hintze Ribeiro apenas teve a preoccupação de organisar o seu orçamento segundo os preceitos que regulam assumptos d'esta natureza. (Apoiados.)

Ora, veja v. exa.:

Importo Cobranças em 1895-1896 - Contos de réis Orçamento de 18 de janeiro - Contos de réis

Sêllo 2:018 2:019

Real de agua 1:030 1:031

Imposto do consumo 2:056 2:056

O sr. ministro da fazenda é que fugiu dos preceitos legaes para se atirar ao arbitrio, augmentando os rendimentos do sêllo, imposto do consumo e real de agua respectivamente em 90, 80 e 50 contos de réis, do que resultam consequencias que eu em breve exporei á camara.

O sr. ministro da fazenda, impressionado pelo augmento d'este imposto nos ultimos mezes do anno economico findo, sem bases seguras para assim proceder, calculou o augmento dos impostos, a que acabo de referir-me, por modo arbitrario e illegal.

Repito, o sr. Hintze Ribeiro teve apenas a preoccupação de organisar o orçamento de harmonia com a lei da contabilidade.

Póde ter havido algum erro de previsão?

Póde, visto que se trata moitas vezes de receita e despeza por sua natureza variaveis. Foi para isso que a lei de 25 de junho de 1881 estabeleceu o orçamento rectificado, a lei de 30 de junho de 1891 estabeleceu os créditos extraordinarios, e foi, para a hypothese de não estarem reunidas as côrtes, que a lei de 13 de maio de 1896 estabeleceu os creditos especiaes.

Partindo do principio de que são verdadeiros os processos e principios de que o sr. ministro da fazenda se serviu para chegar a demonstrar que o orçamento apresentado ás côrtes em 18 de janeiro não tinha o saldo de 110 contos de réis, mas um deficit de 2:697 contos de réis, eu vou mostrar a v. exa. que o saldo de 132 contos de réis descoberto pelo sr. ministro da fazenda e perfilhado pela commissão do orçamento se transforma n'um deficit superior a 3:000 contos de réis, e é facil a demonstração.
(Apoiados.) Como disse, o sr. ministro da fazenda calculou em 602 contos de réis o decrescimento que deveria haver na cobrança dos direitos de importação de varios generos e mercadorias em 1897-1898, e eu já puz em evidencia o erro commettido quando o sr. Ressano Garcia disse que essa cobrança se approximaria da realisada em 1894-1895, e que a diferença devia ser não de 602 contos de réis, mas de 1:350 contos de réis. Vae vi exa. saber qual é a differença. O sr. ministro da fazenda foi levado pela cobrança dos ultimos mezes do anno economico findo. Quiz assentar o calculo do orçamento rectificado na cobrança de 1896-1897. Vou dizer o que foi essa cobrança.

Quadro comparativo do rendimento de direitos de importação de varios generos e mercadorias, com excepção de tabacos e cereaes, nos annos de 1895-1896 e 1896-1897:

1895-1896 1896-1897 Amenos

Julho a dezembro 6.830:700$000 5.995:475$000 836:282$000

Janeiro 1.058:980$000 885:960$000 173:020$000

Fevereiro 1.023:008$000 903:689$000 119:368$000

Março 1.151:563$000 983:975$000 167:587$000

Abril 1.829:475$000 1.061:608$000 267:867$000

Numeros redondos 11.892:000$000 9.927:000$000 1.563:000$000

Eu não pude obter os boletins estatisticos de maio e junho ultimos, creio mesmo que ainda mio foram publica-

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dos, mas é-me facil obter o rendimento d'esses mezes por um processo indirecto.

O decrescimento de rendimento nos dez primeiros mezes do anno economico findo foi:

Julho a dezembro 12%

Janeiro 16%

Fevereiro 11%

Março 14%

Abril 18%

Media do decrescimento - 14 por cento.

Contos de réis

Calculado no orçamento de 18 de janeiro para 1897-1898 (o que foi cobrado em 1895-1896), relativamente a varios generos e mercadorias (excluidos tabacos e cereaes) 13:590

Cobrado nos dez primeiros mezes de 1895-1896 11:392

Differença correspondente aos mezes de maio e junho de 1895-1896 2:198

Mas nos dez primeiros mezes de 1896-1897 houve um decrescimento medio da cobrança de 14 por cento.

Applicando esta percentagem de reducção a 2:198 contos de réis, ou sejam 307 contos de réis, temos que o decrescimento no rendimento de varios generos e mercadorias (com excepção de cereaes e tabacos) foi:

Contos de réis

Julho a abril de 1896-1897 1:563

Maio e junho de 1896-1897 307

Total 1:870

Mas o sr. ministro da fazenda já deduzira 602 contos de réis; logo, ha ainda para deduzir 1:268 contos de réis. Como, porém, pela lei de 20 de maio de 1893, pertence aos credores da divida externa metade do excesso do rendimento das alfandegas sobre 11:400 contos de réis, segue-se que na receita do thesouro ha a deduzir 634 contos de réis.

E assim o deficit de 2:697 contos de réis, descoberto pelo sr. ministro da fazenda, passa já a ser avolumado com mais 634 contos de réis, ou sejam 3:331 contos de réis. (Apoiados.)

Vamos aos cereaes.

O sr. ministro da fazenda manteve no seu orçamento rectificado o calculo de 2:250 contos de réis, producto de direitos de importação de cereaes, exactamente a mesma verba que tinha sido calculada pelo sr. Hintze Ribeiro. Pois o sr. ministro da fazenda, que poz de parte os preceitos da lei de contabilidade publica para organisar o orçamento rectificado, levado apenas pela impressão que lhe produziu a cobrança dos ultimos tres mezes do anno economico findo, ha de ver que a correcção a fazer aqui é consideravel.

Vamos a saber pela cobrança do anno economico findo qual será a que terá logar no anno economico corrente.

Importado de trigo e direitos pagos no anno de 1896-1897:

Por decreto de 26 de novembro de 1896 foi permittida a importação de 40.000:000 kilogrammas de trigo para pannificação, 1.300:000 kilogrammas para mossas, pagando um direito de 8 réis por kilogramma; por decreto de 20 de fevereiro de 1897 foi permittida igual importação, pagando o mesmo direito; por decreto de 31 de maio de 1897 foi permittida a importação de 55.000:000 kilogrammas de trigo para pannificação e de 2.400:000 kilogrammas para massas, pagando um imposto de 10 réis por kilogramma.

Total: 140.000:000 kilogrammas.

Rendimento:

82.600:000 kilogrammas a 8 réis 660:800$000

57.400:000 kilogrammas a 10 réis 574:000$000

Total 1.234:800$000

Se a cobrança do anno economico corrente fosse igual á do anno economico findo, havia já aqui a fazer uma correcção para menos na receita de l:015 contos de réis, mas a correcção ainda é maior.

V. exa., que é muito illustrado, sabe que no anno economico findo houve necessidade de trigo para nove mezes e que no anno economico corrente não precisâmos de tal quantidade de trigo.

Ha dez ou doze dias, por meio de um requerimento, pedi informações officiaes ácerca da colheita cerealifera no anno corrente.

Não tive essas informações, mas sei que a producção cerealifera em alguns districtos é o quadruplo do anno passado, e em outros mais do triplo. Podemos affirmar que se o anno passado precisámos de trigo para nove mezes, este anno precisaremos, quando muito, para tres e calculando o imposto a 10 réis por kilogramma, temos que produzirá 400 contos de réis, menos 1:850 contos do que o calculo da receita, e n'este ponto devo dizer que o sr. Laranjo, que encontra remedio para tudo, para justificar o sr. ministro da fazenda de ter mantido 2:250 coutos que o sr. Hintze Ribeiro tinha calculado, disse - eleva-se o imposto - sem se lembrar que para conseguir esta quantia era preciso elevar o imposto a 50 réis por kilogramma. Assim, como v. exa. vê, o deficit passa de 2:697 contos a 5:181 contos de réis. (Apoiados.)

Não ficam, porém, aqui as correcções a fazer ao orçamento rectificado apresentado pelo sr. ministro da fazenda, e já agora, dê-me v. exa. licença para, por incidente, me referir a uma exclamação que o sr. ministro da fazenda fez, querendo mostrar que a situação transacta tinha deixado uma epidemia no thesouro e que tinha encontrado uma grande divida fluctuante. Encontrou, como a situação presidida pelo sr. Hintze Ribeiro tinha encontrado tombem, mas o que v. exa. não sabe, sr. presidente, é que quando o sr. ministro da fazenda entrou, a divida fluctuante estava em 34:432 contos de réis, o que no fim de junho estava em 40:197 contos de réis, isto é, experimentou um augmento de 5:725 contos de réis em cinco mezes, mais de 1:100 contos de réis em cada mez! (Apoiados.)

Mas vejâmos se a divida fluctuante nos obriga ou não a fazer correcções ao orçamento rectificado do sr. Ressano Garcia.

Obriga. Em primeiro logar a divida fluctuante era de 31:542 contos de réis em fevereiro, em junho era de 33:414 contos de réis; houve, portanto, um augmento de 1:172 contos de réis na divida fluctuante interna. Em janeiro a divida fluctuante externa era de 2:930 contos de réis, em junho 4:083 contos de réis. Augmentou 1:153 contos de réis!

Este augmento é segundo uma nota official mandada para a mesa pelo sr. ministro da fazenda. Mas hoje o augmento é muito maior! Ou eu não sei ler o quadro que se refere á divida fluctuante, e não admira, porque tenho muito pouca pratica d'estes negocios, ou o sr. ministro da fazenda não escripturou o supprimento das 600:000 libras, a que se refere no seu relatorio; e se não escripturou, e não escripturou de certo, houve um augmento na divida fluctuante externa de 3:853 contos de réis.

Ora a divida fluctuante, quer interno, quer externa, vence juros; e a divida fluctuante externa, sobre os juros, tem do receber o respectivo agio do oiro; e é esta a correcção que vou fazer, calculando o juro a 6 por cento. Sei que 600:000 libras, fornecidas ao sr. ministro da fazenda em supprimento, foram a 6 1/8 por cento; mas calculando a 6 por cento, sobre o augmento de 1:872 contos de réis

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na divida interna, ha a inscrever, como despeza, mais 112 contos de réis, alem de 231 contos de réis correspondentes ao juro de 6 por cento de 3:853 contos de réis, que foi o augmento que houve na divida fluctuante externa.

Na divida fluctuante externa, ha de inscrever, como confessa o sr. ministro da fazenda, mais 231 contos de réis. Mas como estes 231 contos de réis correspondem a pagar os encargos da divida fluctuante no estrangeiro, hão de ser pagos em oiro, e tomando o agio, segando o calculo do sr. ministro da fazenda, ha a inscrever mais ll5 contos de réis, o que eleva o augmento do encargo da divida fluctuante que tivera logar, desde que o sr. ministro da fazenda subiu aos conselhos da corôa, em 458 contos de réis o que eleva o deficit a 5:639 contos de réis.

Divida fluctuante e encargos:

Interna:

Contos

Janeiro (1897) 31.542:765$000

Junho 33.414:772$000

ou + 1.872:000$000

Externa (escripturada):

Janeiro 2.930:000$000

Junho 4.083:000$000

Ou + 1.153:000$0000

Externa (por escripturar):

£ 600:000 ou 2.700:000$000

Augmento na divida fluctuante externa:

- 1:153 + 2:700 = 3853 contos

Contos

Juro de 6 por cento de 1:872 contos (augmento interno) 112:000$000

Juro de 6 por cento de 3:853 contos (augmento externo) 231:000$000

Agio de 50 por conto em 231 contos 115:000$000

Augmento de encargo 458:000$000

Como eu disse, o sr. ministro da fazenda não corrigiu a verba de 500 contos de réis destinados, ao agio do oiro de outros encargos que não são os da divida publica fundada. A correcção, correspondente á elevação do agio de 30 a 50 por cento, é de 330 contos de réis, o que eleva o deficit a 5:969 contos de réis.

Eu não sei se o sr. ministro das obras publicas conseguirá, que se convertam em lei as suas propostas. Mas, se a despeito da minha espectativa, as auctorisações pedidas na lei de receita e despeza forem votadas, n'esse caso, havemos de trazer para encargos do orçamento de 1897 a 1898 a verba de 240 contos de réis, que é o augmento despeza, que s. exa. calcula resultar das suas medidas de fomento, e teremos então um deficit de 6:209 contos de réis.

Obtenha os 1:800 contos de réis para as classes inactivas; obtenha os 735 contos de réis destinados aos edificios publicos; obtenha os 150 contos de réis destinados ás obras do porto artificial de Ponta Delgada, esprema como quizer a receita dos conventos supprimidos, mas o sr. ministro da fazenda ficará ainda com um deficit de 3:379 contos de réis! (Apoiados.)

Já se vê, sr. presidente, que servindo-me dos mesmos principios que o sr. ministro da fazenda entende serem os mais proprios para organisar o orçamento, com tanta exactidão quanta é possivel em trabalhos d'esta natureza, longe do saldo de 132 contos de réis, que calcula e que a commissão do orçamento perfilhou, temos um deficit de 3:379 contos de réis! (Apoiados.)

Passemos, agora, sr. presidente, a outro ponto, que não deixa de ser tão interessante, apesar do ter sido já muitissimo bem tratado pelos meus illustres amigos, os srs. Mello e Sousa e Franco Castello Franco.

O sr. ministro da fazenda, comparando as despezas que descreve no seu orçamento rectificado para o exercicio de 1897-1898, excluindo o juro, amortisações a cargo do thesouro, encargos da divida publica fundada, e a diferença de cambios, e comparando essas despezas com as que s. exa. diz, que se fizeram no anno economico findo de 1896-1897, o sr. ministro da fazenda vem dizer terminantemente, que fez uma valiosa economia de 2:801 contos de réis.

Oh! sr. presidente... muito talento tem o sr. ministro da fazenda, sou o primeiro a reconhecer, mas tão grande é o seu talento como a sua andacia. (Apoiados.)

Pois o sr. ministro da fazenda augmenta o computo das despezas ordinarias em 1:828 contos de réis; augmenta o computo das despezas extraordinarias em 707 contos de réis e, sem fazer economias que não fossem as que resultaram da salda dos empregados temporarios da caixa geral de depositos e da junta do credito publico, vem dizer que fez uma economia de 2:801 coutos de réis!

Mas como se fez isto, sr. presidente? Entram em scena os chamados creditos extraordinarios, que o sr. ministro da fazenda obteve pelo decreto de 25 de fevereiro, destinados a legalisar despezas pagas e a cobrir, como s. exa. disse, o que se tinha gasto a mais nas verbas de despeza.

Embora de passagem, não posso deixar de protestar contra a illegalidade d'aquelles credites extraordinarios. A lei de 25 de junho de 1881 dá ao governo a faculdade de os abrir para dotar serviços que não tenham sido previstos na lei annual de receita e despeza ou em leis especiaes e quando sejam de natureza urgente. Ora, todas estas despezas para que o sr. ministro da fazenda pediu creditos extraordinarios estavam previstas nas leis de receia e despeza e nenhuma d'ellas era de natureza tão urgente, que não podesse esperar pelo anno economico futuro.

Alem d'isso esses credites eram illegaes pela rasão de que a mesma lei não permitte a abertura do creditos extraordinarios para legalisar despezas dos exercicios correntes ou findos e o sr. ministro da fazenda destinou, se bem me recordo 1:690 contos de réis, ao pagamento de despezas já feitas.

Não tenho tempo para apreciar o decreto de 25 de fevereiro, relativo aos creditos extraordinarios; mas não desejo terminar sem ter perguntado qual seria a rasão que determinou o sr. ministro da fazenda a pedir esses creditos.

Temos dito, e d'isso estamos convencidos, que s. exa. apenas teve em vista desacreditar a administração transacta, accusando-a de viver de orçamentos falsos. Esta impressão resulta da proposta do governo e do relatorio que precede o orçamento era discussão o ainda do que precede as propostas de lei apresentadas pelo sr. ministro da fazenda. E para quê? Se a intenção do sr. ministro foi apenas desacreditar os seus adversarios politicos accusando-os de menos serios no calculo da receita o no da de esbanjadores dos dinheiros publicos, até ao ponto de ser preciso cobrir com creditos extraordinarios o que gastaram a mais nas verbas de despeza, devo dizer com a franqueza que me caracterisa, que o facciosismo do sr. ministro venceu as qualidades do estadista. (Apoiados.)

O sr. Presidente: - Devo advertir o sr. deputado que já falla ha uma hora e mais um quarto e que tem cinco minutos para poder concluir o seu discurso.

O Orador: - Se v. exa. me dá licença, eu digo só mais meia duzia de palavras.

Eu censuro que o sr. ministro seja o primeiro a ir perante o estrangeiro, perante os nossos credores, de cuja

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confiança precisâmos, apresentar as administrações portuguezas como vivendo de orçamentos falsos. (Apoiadas.)

S. exa. deve ter reconhecido a breve trecho o erro que praticou. Lá fóra não sei só s. exa. obteve uma libra; cá dentro quando quiz contrahir um emprestimo por intermedio dos bancos de Lisboa, não o conseguiu, porque de certo não confiavam na solvabilidade do thesouro. (Apoiados.)

Mas seria só esta a rasão?

O sr. ministro da fazenda tinha um plano financeiro; queria emprestimos, muitos emprestimos destinados de certo a dar ao governo o dinheiro preciso para viver algum tempo em condições desafogadas. (Apoiados.) E como com dinheiro para um ou dois annos, e com uma auctorisação para reformar os serviços e os quadros, garantia de grande jubileu para a clientella politica, a vida do governo correria sem difficuldades; e como estes emprestimos só podiam ser obtidos em condições onerosissimas, o sr. ministro da fazenda vinha então pintar com as mais carregadas cores o quadro da nossa situação financeira a fim de dispor o pais para os sacrificios. (Apoiados.)

Pois fez mal. (Apoiados.) E se a má sorte do paiz for até a desgraça de ver convertidas em leis e executadas as propostas do sr. ministro da fazenda, elle será o primeiro a reconhecer o grave erro que commetteu (Apoiadas.) porque o seu relatorio e as suas propostas de fazenda deram a todos cá dentro o lá fóra a idéa de que estamos em vesperas da grande liquidação nacional. (Apoiadas.)

O sr. ministro da fazenda quiz supprimentos, teve de cauciona-los; quiz fazer emprestimos com os bancos de Lisboa, nada poude conseguir; e teve do recorrer ao banco de Portugal, servindo-se d'elle como seu fiador á rasão de 6 por cento de 4:500 contos. Agora pedem-lhe a hypotheca dos caminhos de ferro, o rendimento dos phosphoros, a renda dos tabacos e o rendimento dos direitos sobre o assacar; (Apoiados.) e s. exa. esquecendo-se do que deve a si e ao paiz deixa aos agiotas a escolha dos penhores. (Apoiados.)

O sr. Presidente: - Lembro ao sr. deputado que já terminou o tempo que o regimento lhe concede para usar da palavra.

O Orador: - Sr. presidente eu termino dizendo que o procedimento do governo não lhe grangeou glorias, antes produziu uma grande impopularidade e a indignação que vae pelo paiz fóra, não lucrando o paiz outra cousa que não fosse maio um duro golpe nos seus interesses e no sou credito.

Vozes: - Muito bem.

(O orador foi muito cumprimentado.)

O sr. Dias Costa: - Não esperava, depois de ter ouvido, n'uma das sessões anteriores, declarar o sr. Franco Castello Branco, que nas questões de ordem publica a opposição estaria ao lado do governo, que s. exa. viesse agora, n'uma discussão d'esta ordem, de natureza financeira e economica, pôr a questão politica, e pela fórma irritante, porque o tem feito.

Não acompanhará a par e passo o discurso proferido pelo sr. Teixeira de Sousa, a quem tem de responder, porque não deseja incorrer na mesma falta que critica á opposição. Limitando-se, por isso, a responder unicamente á parte do discurso em que s. exa. apreciou algumas das verbas contidas no orçamento; não póde comtudo, a respeito das considerações por s. exa. feitas, relativamente á colligação liberal, deixar do dizer que o partido progressista não tem de que arrepender-se por ter entrado n'esse caminho, visto que da colligação saíu como havia entrado, sempre fiel aos seus principios monarchicos.

Devo ainda dizer que o tal compromisso a que s. exa. alludiu, compromisso que permitte aos republicanos fazerem livremente essa propaganda, reduziu-se á promessa formal, publicamente feita pelo partido progressista na opposição, de que quando fosse poder respeitaria as leis e a liberdade dos cidadãos.

E aludindo á phrase de um antigo estadista regenera, dor - quem não tinha sido republicano aos vinte annos tinha falta de senso - declara pela sua parte que nunca o foi, nem é hoje. Pertence a um partido monarchico, embora reconheça que a differença que existe entre a monarchia constitucional representativa e a republica democratica consiste apenas em usar o Rei capacete e o presidente da republica chapéu alto.

Justifica depois as correcções introduzidas no orçamento pelo sr. ministro da fazenda o apresenta a seguinte

Moção

A camara dos senhores deputados, considerando que o estudo e apreciação dos assumptos de ordem financeira e economica, submettidos ao seu exame, se impõe como sendo um alto dever patriotico, e que o projecto de lei em discussão, e as propostas de fazenda apresentadas pelo actual governo, se baseiam no honrado proposito de attenuar eficazmente a crise que de ha muito pesa sobre a nação, resolve continuar na ordem do dia. = F. F. Dias Costa, deputado pelo circulo n.° 34 (Arouca).

Admitida.

(O discurso será publicado na integra guando s. exa. o restituir.)

O sr. Teixeira de Vasconcellos: - Lamenta que um deputado monarchico viesse declarar na camara, exatamente no momento em que os animos andam exaltados, que a differença essencial entro a republica e a monarchia está apenas na cobertura da cabeça; consiste unicamente em usar o Rei capacete e o presidente da republica chapéu alto! Poderá assim concluir-se que, sendo tão pequena a differença, não vale a pena quebrar lanças pelas instituições que nos regem.

Similhante asserção, porém, não é verdadeira.

A differença essencial entre os dois regimens não está simplesmente no uniforme; está nas tradições, está no espirito conservador de um povo, que não soffre uma transformação sem grandes prejuizos, como tem succedido no Brazil, onde, apesar da monarchia não ter sido deposta pelas armas, a convulsão experimentada foi tão grande que, ainda hoje, aquelle paiz sente os seus effeitos.

Entrando depois na analyse do orçamento, cuja rectificação era desnecessaria, e que, a seu ver, só podia ter sido motivada pelo desejo de apresentar um orçamento com deficit, para assim se justificar o plano financeiro, apresentado ao parlamento, declara que, se estivesse convencido de que essas propostas, quando devidamente modificadas, podiam salvar o paiz dos apuros em que se encontra, não teria duvida em votal-as; mas tal convicção não tem, antes está convencido de que ellas só poderio servir para preparar o caminho á administração estrangeira.

Conclue mandando para a mesa a seguinte

Moção

camara, reconhecendo que não póde votar o artigo 1.° em discussão, por incluir receitas que dependem da approvação de propostas de lei pendentes da resolução parlamentar, continúa na ordem do dia. = Teixeira de Vasconcellos.

Admittida.

(O discurso será publicado na integra quando o orador restituir as notas tachygraphicas.)

O sr. Fialho Gomes (sobre a ordem}: - Sr. presidente, a moção de, ordem, que, em obediencia ao regimento, vou ler e mandar para a mesa, é a seguinte:

"A camara, considerando que o orçamento, apresentado pelo sr. ministro da fazenda, está elaborado em harmonia

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com os preceitos da lei de contabilidade publica, continúa na ordem do dia."

Sr. presidente, por defeito ou virtude do meu temperamento e pelo muito amor que tenho á minha larynge, não acompanharei o distincto orador, que me precedeu, no tom gritado e batido que elle deu ao seu discurso.

S. exa., que é um parlamentar com muito justas aspirações, quiz, mais uma vez, affirmar a sua fé monarchica, e para isso aproveitou uma phrase do notavel discurso do meu velho amigo sr. Dias Costa, e, interpretando-a a seu modo, bordou uma serie de considerações, muito eloquentes e muito sentidas, mas completamente alheias ao assumpto que se debate. (Apoiados.)

Tenho a maior consideração pelo illustre deputado, mas consinta-me s. exa. que eu não tome parte no incidente. (Apoiados.)

Nem a phrase, proferida pelo sr. Dias Costa, tinha o sentido que o sr. Teixeira de Vasconcellos quiz attribuir-lhe, nem s. exa. precisava, d'estas solemnes affirmações, para nós termos a certeza do seu muito amor pela monarchia.

Eu bem sei que ao illustre deputado, tudo convinha, menos fallar do orçamento e ver-se obrigado a repisar a fraca argumentação com que tem sido combatido, por parte dos seus amigos, o importante diploma que está submettido á consideração da camara. (Apoiados.)

Ao seu esclarecido espirito devem repugnar estas exigencias da disciplina partidaria, e por isso não me admira que s. exa. procurasse um assumpto menos escabroso, para mais uma vez nos mostrar os recursos do seu engenho.

Sr. presidente, ha pouco mais de um anno, em 9 de julho de 1896, um dos mais notaveis homens publicos do nosso paíz, publicou um artigo, que eu, desde logo, cuidadosamente archivei, do qual vou ler á camara alguns períodos, pedindo aos srs. tachygraphos o favor de os transcreverem em duas notas.

Dizia elle:

"... e então, preparada pelos actuaes ministros agrando crise, os vereis, sendo ella de sua inteira responsabilidade, clamarem que são inhabeis os futuros ministros e que d'elles é a culpa exclusiva de tudo quanto de desastrado e vergonhoso nós Venha a succeder."

Accrescentava:

"Este é o grande golpe da politica do gabinete Hintze Ribeiro ..." (Vozes: - Ouçam, ouçam.)

Dizia mais:

"... arranjam, preparam e provocam conscientemente esse enorme desastre financeiro, attribuindo-o depois aos seus successores..." (Vozes: - Ouçam, ouçam.)

E concluia:

"... a estes processos governativos chamam elles habil politica..."

Está perfeita e completamente realisada a prophecia do eminente publicista! (Vozes: - Muito bem.)

Os habeis, hontem na imprensa e hoje no parlamento, tratam já de vibrar o grande golpe; e, para isso, principiam a reeditar os velhos tropos, as objurgatorias, as apaixonadas diatribes, com que, alguns d'elles, fizeram a sua carreira politica, até ás bancadas ministeriaes, e que, para todos, constituo, a mais alta qualidade, para merecerem as boas graças, do sr. João Franco Castello Branco. (Riso.) S. exa. não perde os velhos habitos! (Riso.) Quatro vezes ministro, conselheiro de estado, mais ou menos chefe de um partido, empenha-se em conservar a linha correcta e serena que mais convem á sua alta posição; mas, ao mais ligeiro incidente, os seus nervos vencem a sua vontade, e eil-o gritando e gesticulando como nas seus bons tempos de 1887 (Riso. - Vozes: - Muito bem, muito bem.)

Assim como mr. Jourdaim fazia prosa sem se sentir, o (illustre deputado fez arruaça sem mesmo querer. (Hilaridade. - Vozes: - Muito bem, muito bem.)

Pois, ás diatribes, vamos nós responder com a singela eloquencia dos factos, sem azedumes, nem paixões, (Apoiados.) sem phrases equivocas, (Apoiados.) sem ironias; não venha alguem castigar-nos, como ainda ha dois dias, o sr. conde de Burnay, tão merecidamente castigou o sr. João Franco. (Apoiados. - Riso) E o paiz, que nos escuta, julgará, em ultima instancia, tanto os que prepararam o descalabro do nosso credito e o desmoronamento das nossas finanças, como tambem aquelles, que, com a maior abnegação, com o mais alevantado patriotismo, metteram hombros á escabrosa e ardua tarefa da nossa regeneração economica, financeira e politica. (Apoiados.)

As accusações feitas ao illustre ministro da fazenda pelos oradores que se sentam d'aquelle lado da camara (apontando para a esquerda), são tres.

1.ª Ter apresentado ao parlamento, um conjunto de propostas, que, a serem approvadas, trarão a ruina para o paiz, e o descredito financeiro e moral para o governo;

2.ª Procurar arranjar credito á custa do descredito dos adversarios;

3.ª Tendo encontrado todas as facilidades de credito-a dentro e fóra do paiz, não tem, no fim de cinco mezes, maneira de arranjar vintem.

Vejamos qual foi a herança que nos legaram os austeros censores dos actos do sr. conselheiro Ressano Garcia, para podermos apreciar bem o alcance d'estas accusações feitas pelos unicos responsaveis da tremenda crise preparada e sustentada pela mais perdularia e criminosa administração que tem havido em Portugal. (Apoiados.)

Façâmos historia retrospectiva, que bem precisa é ella agora para edificação de quem nos ouve!

Recordemos os desatinos onerosissimos, com que elles assignalaram sua passagem pelo poder, na pratica dos maiores erros e dos maiores crimes, de que ha memoria nos annaes da politica portuguesa. (Apoiados.)

Liquedemos todas as responsabilidades, hoje, que voltamos a ter parlamento (Apoiados) depois que, ha tres annos, os vimos fugir curvados ao peso das mais graves accusações, e precisamente n'uma occasião, em que se debatiam assumptos que envolviam a responsabilidade politica e moral de todo o ministerio! (Vozes: - Muito bem, muito bem.)

A historia é longa, mas é edificante!... E toda ella está já feita nos eloquentes discursos dos oradores que se sentam d'este lado da camara e no admiravel relatorio de fazenda, apresentado pelo sr. conselheiro Ressano Garcia, logo depois da sua subida ao poder, quando teve de pedir os creditos extraordinarios, para legalisar despezas que elles tão illegalmente fizeram. (Apoiados.)

Leiam-o e terão a prova cabal e completa de que foi a nefasta administração, do mais nefasto dos governos! (Vozes: - Muito bem.)

E, assim como, em dezembro de 1894, o ministerio Hintze Ribeiro, com fins de pura estrategia politica, fazia affixar nas portas das administrações dos concelhos e camaras municipaes de todo o paiz, aquelle inaudito manifesto que precede os decretos dictatoriaes e que ha de ficar na historia como documento da maior offensa feita aos principios liberaes, ao systema parlamentar e ás leis fundamentaes do reino, do mesmo modo, o actual ministerio, devia ter feito affixar, em todos os legares publicos e distribuir profusamente, o relatorio do sr. ministro da fazenda, para que o paiz conhecesse bem a serie de escandalos e abusos, de esbanjamentos e crimes, praticados em detrimento da fazenda publica, do credito e honra do nome portuguez. (Vossas: - Muito bem, muito bem.)

Sr. presidente, no campo meramente politico e administrativo, sabe bem a camara, a situação passada desorganisou todos os ramos da administração do estado, desprezou todas as leis, (Apoiadas), escarneceu de todos os principios (Apoiados) esmagou a justiça (Apoiados) violou

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as garantias constitucionaes (Apoiados) e affrontou o docoro nacional! (Longos e prolongados applausos).

A enumeração de tudo quanto elles fizeram, essa enorme serie de violencias e desacertos (Apoiados) levar-me-ia muito longe e afastar-me-ía do assumpto que se discuto.

Não perdem com a demora, porque não faltará occasião o opportunidade de lhes tomarmos severas contas!

Por agora, occupar-me-hei apenas do que elles fizeram em prejuizo du economia nacional e das finanças do estado, depois que o sr. conselheiro Fuschini, foi obrigado a abandonar as cadeiras do poder e a pauta da fazenda, onde prestou importantes serviços ao paiz e ao credito publico, mas onde estava sendo um obstaculo á politica de interesses e de loucas prodigalidades, que urgia inaugurar, para conquistar adeptos e premiar amigos, como s. exa. é o proprio a affirmar a pagina 310 das Liquidações politicas, dizendo que: "os seus projectos e opiniões, só aram avaliados, em conselho de ministros, pelo unico criterio da conveniencia eleitoral e partidaria." (Vozes: - Ouçam, ouçam, muito bem, muito bem.)

Recommendo a todos os meus collegas, a leitura do livro do antigo ministro da fazenda.

Ha ali muito que aprender e meditar.

Livres do sr. Fuschini, réu do grande crime de "querer neutralizar a pasta da fazenda em todas as questões e luctas eleitoraes" e recomposto o ministerio, principiou a longa serio de desperdicios e esbanjamentos que nos trouxeram á triste situação em que nos achâmos, e da qual só elles são os responsaveis. (Apoiados.)

É quasi impossivel, ainda hoje, precisar bem a cifra, até onde cresceu a divida publica, durante aquella desastrada gerencia. Póde porém affirmar-se, com dados seguros, que o augmento foi superior a 40:000 contos.

Assim, a divida fluctuante, que era, em 21 de fevereiro de 1893, quando subiram ao poder, na importancia de 18:413 contos, foi gradualmente crescendo, como se vê no seguinte quadro: (Vozes: - Ouçam, ouçam.)

Contos

21-2-93 18:4l3

30-6-94 25:154

31-12-94 27:114

31 -12-95 29:418

6-2-97 31:000

Augmento: 12:587 contos.

A divida fluctuante, no estrangeiro, estava, quando deixaram o poder, em 650:000 libras, que, ao cambio de 45 por cento, dá 4:225 contos.

Em emprestimos e venda de titulos 10:251 contos. Em letras, cuja existencia nunca foi Recusada nas contas da gerencia (Vozes: - Ouçam, ouçam!) e que andavam, de mão em mão, pelos correctores ingleses, l milhão e meio de libras, ou sejam 9:750 contos ao cambio de 45 por cento. Despezas feitas e não pagas: 1:196 contos. Divida á imprensa nacional: 600 contos. Calotes a empreiteiros e fornecedores, só pelo ministerio das obras publicas: 1:000 contos. Verbas gastas por antecipação, n'este mesmo ministerio: 900 contos.

Total: 40:509 contos!

Mas, ha mais ainda, sr. presidente, ha as dividas a quasi todas as camaras municipaes do reino (Apoiados.) e muitos outros calotes por diversos ministerios. (Sensação. - Vozes: - Muito bem, muito bem!)

Eu disse, um dia, aqui, no parlamento, na sessão de 1894, que o sr. deputado Franco Castello Branco, então ministro do reino, tinha a idiosyncracia da posta. Hoje, depois do discurso do sr. Mello e Sousa, futuro ministro da fazenda, veio que o grupo, de que s. exa. faz parte, tem tambem a idiosyncracia do calote. (Apoiados.)

O sr. deputado Mello e Sousa, condemnando o pagamento das diversas dividas a empreiteiros e fornecedores e preconisando o regimen do calote, como expediente de boa administração, faz-me recear pelo futuro do paiz. (Apoiados.) S. exa., quando um dia, que Deus afaste para bem longo (Riso.) sobraçar a pasta da fazenda, não encontra quem lhe fie um real. (Riso.) E, por isso, eu, que, antes de tudo, sou portuguez e desejo que o meu paiz continuo a ter credito, peço ao sr. João Franco que o risque da lista dos seus futuros ministros. (Riso.) Creio
que os illustres deputados o meus amigos, os srs. Teixeira e Vasconcellos e Teixeira de Sonsa, não duvidarão juntar os seus aos meus rogos e gostosamente me auxiliarão, n'esta cruzada, contra o seu correligionario, sr. Mello e Sousa. (Hilaridade. - Vozes: - Muito bem, muito bem!)

Já vejo que foi s. exa. e não outro quem aconselhou o sr. João Franco, quando ministro do reino, a não pagar ao confeiteiro o chá e os bolos com que, nas reuniões da maioria, se regalavam as forças vivas do paiz. (Riso.- Apoiados.)

Entretanto, apesar de todas estas economias de novo systema, as despezas publicos cresciam vertiginosamente (Apoiados.) Gastava-se á larga! Empenhava-se e vendia-se tudo quanto se encontrava á mão. (Apoiados.) Illudia-se o paiz, apresentando-lhe o orçamento equilibrado, e, por artes de orçamentologia pratica, dava-nos o sr. Hintze Ribeiro a doce consolação de um saldo positivo... no papel. (Riso. - Apoiados.)

Quer a camara saber como o sr. conselheiro Hintze Ribeiro arranjava o equilibrio orçamental?... Por um processo muito simples. Eu lhes conto. (Riso.)

No capitulo das despezas, não incluia as dividas a empreiteiros o fornecedores, averba a dispender com as obras do Porto de Lisboa, e muitas outras. (Riso. - Apoiados.)

No capitulo das receitas, incluia, por exemplo, os lucros da amoedação da prata, uma operação que tinha sido feita em l891 a l892. ( Riso. - Vozes: - Ouçam, ouçam!) E quando este curioso processo, de organisar orçamentos, não era bastante, tiravam-se das despezas algumas verbas ao ocaso, e depois, durante o anno, recorriam ao artificio dos creditos extraordinarios! (Riso: - Vozes: - Muito bem, muito bem!)

Durante o anno economico de 1895 a 1896 foi-lhes preciso abrirem quarenta e tres creditos extraordinarios na importancia de 5:975 contos (Vozes: - Ouçam, ouçam!) para pagamento de diversas despezas não mencionadas no orçamento!

Em 1893, a divida do thesouro ao banco de Portugal era de 10:363 contos, em fevereiro de 1897 estava em 17:474 contos.

Apenas um augmento de 7:111 contos!

Quando, em fevereiro, foram obrigados a largar as redeas do governo, tinham já dispendido todo o orçamento de 1896 a 1897, que devia chegar até 30 de junho ultimo! (Votes: - Ouçam, ouçam!)

Durante esta nefasta gerência as despezas publicas augmentaram 11:000 contos!

As despezas illegaes, feitas por despachos surdos, pelos ministerios da marinha, guerra e obras publicas, nos ultimos dois annos, attingiram a enorme cifra de 2:622 contos. (Votes: - Ouçam, ouçam!)

E para que tão altos feitos não transpirassem, as contas eram arranjadas a dedo, faziam-se pagamentos por antecipação, sem registo, sem voto do tribunal de contas, sem nenhuma das formalidades legaes. (Vozes: - Ouçam, ouçam!) Nunca se viu um regabofe tão completo! (Apoiados.)

A par d'isto, o nosso descredito no estrangeiro ia, successivamente, augmentando. A situação economica aggravava-se dia a dia! (Apoiados.)

O deficit commercial, em dois annos, subia a 26:650 contos de réis !...

Lá fóra, apesar de todas as instancias, era-nos recusada a cotação para os bonds externos de 3 por cento; e

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SESSÃO N.º 22 DE 29 DE JULHO DE 1897 439

para obtermos a cotação das obrigações dos tabacos, tinhamos de acceitar condições humilhantes e oncrosissimas, (Apoiados.) taes como: a desistencia dos direitos devidos pela companhia real, por importação de material na importancia de 300 contos de réis; a adjudicação, a casas francezas, da construcção de dois cruzadores, por mais 175 contos de réis do que o preço pedido por outras casas (Vozes: - Ouçam, ouçam); a indemnisação de 100 contos de réis a Bartissol; isto é, 575 contos de réis, ou seja 13 por cento do capital que podiam render as 70:000 obrigações dos tabacos! (Sensação. - Vozes: - Ouçam, ouçam.)

E foi assim que as despezas publicas íam n'um crescendo assustador! (Apoiados.)

No ultimo anuo economico, de 1895-1896, chegaram a 55:387 contos de réis, alem dos creditos extraordinarios!!

Gastaram mais 6:127 contos de réis do que em 1894-1895 e mais 7:341 contos de réis do que em 1893-1894!

As despezas ordinarias augmentaram 3:147 contos e e as dos diversos ministérios 2:315 contos de réis.

Não ha memoria de uma situação similhante! (Apoiados.)

Duplicaram a divida fluctuante! augmentaram os encargos do paiz, no estrangeiro; elevaram de 48:000 a 58:000 contos de réis a circulação das notas; e de 44:000 para 55:000 contos de réis as despezas annuaes do estado! (Vozes: - Ouçam, ouçam.)

Foi a mais funesta das administrações que têem gerido os dinheiros da nação! (Apoiados repetidos.)

O credito nacional perdido! e ninguem sabe quando resurgirá! (Apoiados. - Vozes: - Muito bem.)

O emprestimo dos 3:000 contos de réis, um desastre! Andaram dois mezes, entre supplicas e empenhes, e, por fim, contentaram se com o que quizeram dar-lhes!

Esta é a obra do governo passado!... (Muitos e repetidos apoiados.)

Nada para bem da situação financeira e economica do paiz! (Apoiados.)

Legaram-nos o descredito, a ruina, a miseria e a fome!... (Apoiados. - Vozes: - Muito bem.)

Nem um só projecto de fomento!... (Apoiados.)

Nem uma só medida de fazenda! (Apoiados.)

A desordem em tudo, no ultramar e na metropole, na administração e nas finanças, (Apoiados.) no commercio, na industria, nos espiritos! (Apoiados - Vozes: - Muito bem.)

E é depois de tudo isto, quando o sr. conselheiro Ressano Garcia lucta e trabalha, para restabelecer o credito que elles deixaram perder; (Apoiados.) quando procura resolver o gravissimo problema d'esta enorme crise que elles, tão criminosamente, prepararam (Apoiados.) é então que a politica desalmada e impenitente ousa levantar embaraços e crear dificuldades á execução do honrado plano financeiro do sr. ministro da fazenda. (Apoiados. - Vozes: -Muito bem, muito bem.)

São os taes processos governativos, a que me referi no principio do meu discurso! É a habil politica! (Apoiados.) É o grande golpe, previsto, um anno antes, por quem os conhecia bem na sua vida e nos seus processos!...

Disse.

Vozes: - Muito bem, muito bem.

O orador foi cumprimentado pelo sr. ministro da fazenda e por quasi todos os srs. deputados da direita.

Leu-se na mesa a seguinte

Moção de ordem

A camara, considerando que o orçamento, apresentado pelo sr. ministro da fazenda, está elaborado em harmonia com os preceitos da lei de contabilidade publica, continúa na ordem do dia. = Litania Antonio Fialho Gomes.

O sr. Marianno de Carvalho: - Sr. presidente, já deu a hora?

O sr. Presidente: - A hora ainda não deu, faltam tres minutos.

Hoje ha sessão nocturna. Não sei se s. exa. quer que lhe conceda a palavra para aproveitar agora estes tres minutos e ficar depois com a palavra reservada?

O sr. Marianno de Carvalho: - Como faltam ainda tres minutos, peço a v. exa. que me conceda a palavra.

O sr. Presidente: - Tem v. exa. a palavra sobre a ordem.

O sr. Marianno de Carvalho (sobre a ordem): - Ficarei com a palavra reservada, depois d'estes tres ou quatro minutos que restam de sessão; mas tinha o maximo empenho em ter a palavra n'esta sessão, em que estamos.

Mando para a mesa uma proposta para que sejam eliminadas do orçamento da receita diversas verbas, que estão calculadas contra os preceitos do regulamento de contabilidade publica e contra todas as probabilidades possiveis e admissiveis, mas o meu empenho em fallar agora é muito differente.

Fallou e muito bem, como costuma sempre, o sr. Dias Costa; e eu confesso agora que commetti um erro e incorri n'uma culpa, quando fallava tão conspicuo orador. Dizia-me o espirito que fosse para aquelle lado da camara, para onde podesse ouvir s. exa.; mas dizia-me o corpo, cansado do calor, que me deixasse estar onde estava. Resultou d'este facto, porque nau é o sr. Dias Costa, orador cujos discursos não devam ser ouvidos e escutados, (Apoiados.) que no discurso de s. exa. escapou sem protesto immediato, umas asserção qualquer, de que só tive conhecimento pelas palavras do sr. Teixeira de Vasconcellos, de que, nem o sr. Franco Castello Branco nem qualquer dos meus collegas do ministerio de 1891 teve, alem de mim, qualquer responsabilidade no adiantamento feito á companhia real dos caminhos de ferro portuguezes.

Quem a teve só, fui eu. Para mim a reservo, e emquanto tiver penna ou palavra, não consentirei que a ninguem se imponha essa responsabilidade. (Vozes: - Muito bem.)

O que digo não precisa proval-o. Ha um, vivo, que é o sr. Franco Castello Branco, os mais todos, que intervieram n'esse crime, João Chrysostomo, provecto de annos e carregado de serviços ao paiz, levou-o Deus; Lopo Vaz, no vigor da vida, já lá vae tambem; Carlos Valbom, que era uma esperança do futuro, perdido está para nós; Marçal Pacheco, outro explendide talento, caíu nas sombras de um tumulo; restâmos, o sr. Franco Castello Branco e eu. Maas, repito, tomo a inteira responsabilidade d'esse acto, e tomo-a eu só.

Se ainda hoje querem allegar proveitos, quando fallam de receita de obrigações de caminhos de ferro, a mim m'o devem; mas fiquem com os proveitos para lá, que as responsabilidades são minhas. E digo agora ao illustre deputado, que d'essas responsabilidades não me arrependo, porque, talvez se não as tomasse, não podesse um deputado monarchico dizer no parlamento portuguez, que a monarchia só differe da republica em o chefe usar capacete ou chapeu de côco.

Tomei a responsabilidade d'esse adiantamento e não me arrependo.

Na sessão nocturna continuarei o meu discurso, promettendo não me afastar da discussão do orçamento.

(O orador não reviu as notas tachygraphicas).

O sr. Presidente: - O sr. Dias Costa pediu s palavra para explicações; vou consultar a camara, sobre se permitte que lhe conceda a palavra.

(Consultada a camara resolveu afirmativamente.)

O sr. Dias Costa: - Pediu a palavra para explicações, porque, pertencendo a ura partido monarchico, não deseja que se dê a uma phrase sua interpretação que ella realmente não tem. Se das suas palavras só elle tivesse a responsabilidade, nada diria, porque nunca foi cortezão de grandes nem de pequenos.

Disse, e confirma, que a differença entre uma monarchia constitucional e representativa, como a portugueza,

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e uma republica democratica, como a francesa, é apenas de mero formalismo, o que não quer dizer que, dando a monarchia todas as garantias liberaes, se deva pôr de parte esse regimen para se adoptar um outro.

(O discurso terá publicado na integra quando o orador restituir as notas tachygraphicas.)

O sr. Presidente: - Hoje ha sessão nocturna ás nove horas, sendo a ordem da noite a continuação da que vinha para hoje. A sessão durará tres horas.

Está levantada a sessão.

Eram seis horas e cinco minutos da tarde.

Documentos mandados para a mesa n'esta sessão

Representações

Da associação da classe dos refinadores de assucar de Lisboa, reclamando contra a concessão do exclusivismo para a fabricação e refinação do assucar de beterraba, segundo a proposta de lei apresentada pelo sr. ministro da fazenda na sessão de 12 de julho corrente; e no caso que seja concedido, pedem garantias analogas ás dos manipuladores de tabacos.

Apresentada pelo sr. presidente da camara Eduardo José Coelho, e enviada á commissão de fazenda.

Da camara municipal do concelho do Campo Maior, pedindo o restabelecimento no concelho de Campo Maior do antigo tabellionato, nas mesmas condições, como existia desde tempos quasi immemoriaes até ao fallecimento do seu ultimo serventuario.

Apresentada pela sr. deputado Eusebio Nunes, e enviada á commissão de legislação civil.

Dos terceiros distribuidores da estação telegrapho-postal de Beja, pedindo augmento de vencimento.

Apresentada pelo sr. deputado Fialho Gomes, e enviada ás commissões de obras publicas e de fazenda.

Dos terceiros distribuidores telegrapho-postaes de Castello Branco, pedindo augmento de vencimento.

Apresentada pelo sr. deputado Carlos Ferreira, e enviada ás commissões de obras publicas e de fazenda.

Da camara municipal do concelho de Arronches, pedindo auctorisação para dividir, por meio de aforamento, pelos habitantes da freguezia matriz, a propriedade denominada "Coutada do povo".

Apresentada pelo sr. deputado Eusebio Nunes, e enviada á commissão de fazenda.

Dos proprietarios de padarias dos concelhos de Espozende e de Villa Nova de Famalicão, pedindo modificações na lei de cereaes.

Apresentadas pelo sr. deputado Alvaro Castellões, e enviadas á commissão de artes e industrias.

Da camara municipal do concelho da Guarda, pedindo a isenção de direitos de todo o material que for importado para a installação e serviço do fornecimento de luz electrica da cidade da Guarda.

Apresentada pelo sr. deputado Simões Ferreira, e enviada á commissão de fazenda.

Justificado de faltas

Declaro que por incommodo de saude deixei de comparecer a algumas das ultimas sessões d'esta camara. = O deputado, Mattoso Côrte Real.

Para a secretaria.

O redactor = Sá Nogueira.

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B

EM 29 DE JULHO DE 1897 (noite)

Presidencia do exmo. sr. José Augusto Correia de Barros (vice-presidente)

Secretarios - os exmos. srs.

Joaquim Paes de Abranches
Carlos Augusto Ferreira

Fez-se a chamada.

O sr. Presidente: - São nove horas e dez minutos e apenas estão presentes 38 srs. deputados, numero inferior ao necessario, segundo o regimento, que exige 40, pelo menos, para poder a camara funccionar.

Não póde, portanto, haver sessão e a immediata será ámanhã, fazendo-se a primeira chamada ás duas horas da tarde.

A ordem do dia é a mesma que estava dada para a sessão nocturna de hoje.

O redactor = S. Rego.

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