866 DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS
se debata [ilegivel.] no parlamento taes asserções, sem rogo se ver o funesto resultado.
Custa a acreditar, mas o lamentarei facto deu-se!
O certo é que nos pontos mais afastados da capital, dos centros da politica e da politiquice, lá ao longe, aonde se não comprehende que se lance mão de taes artes e expedientes de má lei, só para atacar um projecto em discussãO, a insidiosa noticia causou profundo alarme e levantou duvidas, a ponto de se ter perguntado da provincia, que rasão ou fundamento ha para que tal se diga e affirme!
E isto não admira, sr. presidente, desde que aqui se diz o projecto é tão mau, prejudicial e odioso, que chega á extrema crueldade de ír roubar o pão aos orphãos, ás viuvas, aos hospitaes e estabelecimentos pios, e a todos aquelles que têem direito a receber o juro do papel de credito que adquiriram e é o seu único rendimento!
É extraordinario que tal cousa aqui se diga, e que se
não queira pesar a enorme responsabilidade de quem assim de animo leve espalhou o tenor e pretende augmentar o descredito dos titulos da divida publica!
Para mim não ha duvida alguma de que a inexacta affirmação que tão asperas censuras merece, feita pelos illustres deputados opposicionistas, não tem o minimo valor, não passando de uma transparente artimanha para pretender justificar os seus violentos ataques ao projecto que combatem, mas que não discutem nem procuram melhorar.
Entretanto, entendo conveniente e indispensavel mesmo, que o nobre ministro da fazenda para tranquillisar a opinião alarmada, o espirito publico mal impressionado, faça com a anotoridade da sua palavra e a do logar que occupa, a declaração sincera, leal e honrada, que o importante assumpto exige, e se digne dizer á camara e ao paiz, em seu nome e no do governo, se pelo facto de se approvar e converter em lei o projecto em discussão a que me estou referindo, poderá advir algum prejuizo para os credores da nossa divida interna, que affecte ou diminua o valor dos seus títulos ou o dos juros que actualmente recebem, e se esses juros poderão deixar de ser integralmente pagos no praso marcado, como se ousou affirmar, dizendo-se não haver meios para se fazer face ao pagamento n'estes tres annos mais proximos...
Uma voz: - Correm esse risco.
O Orador: - Não correm tal! A approvação do projecto não lhes tira nenhuma garantia, nem lhe diminue o rendimento.
Outra voz: - Lá vem no projecto a consignação das receitas.
O Orador: - Receitas especiaes e muito inferiores aos encargos. Eu sei tudo isso; mas não se podia nem devia fazer uma tal affirmação infundada e sem base justificavel, que augmentou a desconfiança dos portadores da divida interna, lançou a perturbação no mercado, nas bolsas, e deu mais um golpe no nosso já enfraquecido credito, espalhando um panico que podia ter consequencias graves. (Apoiados.)
O governo respeita igualmente e ha de manter, todos os direitos dos credores internos e em nada perigará a sua situação, creiam! (Apoiados.}
Uma voz: - Retirem o projecto. (Apoiados.}
O Orador: - Não é o projecto que se deve retirar, que esse é destinado a poder-se remediar o grande mal presente que nos assoberba e muitos futuros que se finge não ver! O que se deve retirar e evitar dizer, são argumentos insidiosos, pregões de descredito, affirmações menos exactas e proprositadamente feitas para irritar a opinião publica lá fóra, para dar vulto a suspeições injustas, para accender odios que a todos podem attingir, para inconveniente, criminosa e anti-patrioticamente fomentar a desordem e a revolta, sem se attentar nos perigos de se estar brincando com o fogo o fogo, este systema de opposição, é que era preciso retirar, corrigir, emendar, discutindo serena e proficientemente o projecto.
(Áparte do sr. Luciano Monteiro, que não ouviu bem.}
Não é preciso berrar; mas é preciso fallar claro e alto, e dizer-se a verdade toda! Se os ouvidos de s. exa. se melindram com ouvil-a, sinto-o muito más não estou resolvido nem a callar-me, nem a deixar passar sem protesto energico e digno, esse acervo de insinuações malevolas, de insidias, de invenções phantasiosas, de falsidades, com que menos correctamente se está pretendendo malsinar o governo e a maioria, a proposito de um projecto que não podem, não querem, ou não sabem discutir, para o corrigir, aperfeiçoar ou substituir por cousa melhor!
Em logar de repetidas e estafadas bravatas patrioticas, que para nada servem, em tom mais ou menos violento, tetrico e aterrador, evitando o debate, melhor fôra que estudassem, analysassem e apreciassem devidamente o projecto submettido ao seu exame, criticando-o com argumentos serios e attendiveis, é não com adjectivos bombasticos, com indignações á sopreposae, com declamacões banaes, fugindo cautelosamente do assumpto principal!
Isto é que era patriotico, digno, correcto, e á altura da elevada missão que a opposição tem a cumprir n'esta assembléa!...
O sr. Presidente: - Peço ao sr. deputado que falle e para a presidencia.
Uma voz: - Não se irrite o illustre deputado.
O Orador (voltado para a opposição): - Eu não me irrito, está v. exa. enganado; fallo muito serenamente e digo o que penso e sinto, no tem um pouco acalorado do meu feitio e temperamento. Mas é que já me vae enfadando como a toda a camara, e a tolerancia tem limites, esta inutil campanha, de palavriado, em que ha tantos dias se está, sem nenhum proveito para a discussão do projecto, dizendo-se d'esse lado da camara o que aqui se não póde nem deve dizer, afeiando o triste quadro da nossa situação e contribuindo cada vez mais para o nosso descredito lá fóra, e dando cá dentro mais armas aos nossos inimigos e das instituições para ámanhã nos ferirem desapiedadamente...
O sr. Presidente: - Tem a bondade de fallar para a presidencia.
O Orador: - Sim, senhor, fallo para a presidencia e muito serenamente, como v. exa. está vendo. E se me dirigi aos meus illustres collegas da opposição, é que não posso deixar de responder aos seus continuos ápartes e interrupções, que sempre lhes permitte, que em nada me incommodam, e que a v. exa. parecem infundir receios que não tem rasão de ser.
Não é a primeira vez que tenho a honra de occupar este logar, e não sendo parlamentar novato, nem timido, se me falta a competencia que a tantos illustra, tenho a boa vontade e a experiencia, que alguma, cousa valem, e costumo não deixar nunca sem a condigna resposta, é dos meus habitos, os que me fazem a honra de se me dirigir. Sabe-o v. exa. e a camara. E tambem não costumo nunca exceder-me mesmo quando tenho muita razão, nem eximir-me a quaesquer responsabilidades.
O sr. Presidente: - Peço licença para lembrar ao sr. deputado que, embora esteja no uso pleno do seu direito, pois que antes da ordem do dia se póde qualquer sobre qualquer assumpto de interesse geral, e portanto abrangendo o que está dado para ordem do dia, é certo no entretanto que geralmente não se pratica isso, e assim tem sido interpretado o regimento.
Pedia, pois, ao sr. deputado a possivel concisão, e ainda porque pouco tempo falta para se passar á ordem do dia.
O Orador: - Peço perdão a v. exa. Parece-me que não fui alem do que é permittido, usando de um direito
que me assiste, referindo-me a um projecto que se discute na ordem do dia.