368 DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTAD0S
vão á commissão respectiva, e com o parecer d'esta volta o projecto e proposta á camara para novo debate. É isto o que se pratica.
A proposta do sr. Burnay ou quaesquer outras que se apresentem serão, n'esta conformidade, mandadas á commissão de fazenda.
O Orador: - Lê a seguinte moção:
"A camara, reconhecendo que o assumpto que se debate deve estar fóra da acção politica partidaria, e merece ser tratado com toda a serenidade e circumspecção, continua na ordem do dia. = Avellar Machado."
Não lhe tendo chegado a palavra sobre o artigo 1.°, deseja fundamentar o seu voto, porque, tratando-se de um assumpto tão vital para o paiz, que d'elle depende o seu futuro, não quer responsabilidades collectivas.
Rejeita in limine o projecto, porque, a seu ver, se elle for votado, seguir-se-lhe-ha a bancarrota material e moral: a bancarrota material, porque não podemos com os encargos que vamos tomar, e a bancarrota moral, porque estamos a illudir os governos estrangeiros, com promessas que não podemos cumprir.
Alem d'isto, por detrás do projecto, vê-se a administração estrangeira, e é quanto basta para que elle não deva ser approvado.
No seu entender, o projecto, que vem desacompanhado de todos os esclarecimentos, é apenas mais uma prova do egoismo do governo.
Dominado por este egoismo, o que é que elle tem feito?
Prometteu manter a liberdade de reunião, e prohibiu meetings; prometteu manter a liberdade de imprensa, e no anno da sua gerencia tem havido mais querelas do que nos vinte annos anteriores; promettêra tambem melhorar as circumstancias economicas do paiz, e o que tem feito é entreter-se com a questão da freguesia da Palhaça e com refermecas sem importancia.
O orador, proseguindo n'esta ordem de idéas, trata de mostrar que o governo, no seu egoismo feroz, é elle proprio que, para se manter mais algum tempo no poder, vae entregar os pulsos ás algemas, offerecendo a consignação do rendimento das alfandegas, que é a receita mais importante do paiz.
O que se vá é que se pretende regressar á lei de 26 de fevereiro de 1892, na parte já revogada, para se entregar ao banco de Portugal a arrecadação das receitas para pagamento dos encargos da divida no estrangeiro.
E aqui que está o grande perigo, porque, como aquelle banco póde ter caixas filiaes no estrangeiro, com administradores estrangeiros ou nacionaes, que podem interferir em todas as operações; e, como n'ellas, até se podem abrir fallencias, é claro que atrás de tudo isto póde estar a ruina do banco e a administração estrangeira.
Discreteia ainda o orador largamente para frisar os perigos que podem resultar da consignação do rendimento das alfandegas ao pagamento dos encargos da divida externa, assim como do facto de não se fixar um agio qualquer, quando é certo que não é possivel saber-se até onde poderá elle ír no mercado.
A consequencia será não se poderem pagar, dentro em pouco, os encargos da divida interna, o que representa incontestavelmente uma grande desigualdade.
Concluindo, diz que o projecto representa um grave erro economico e um grande perigo para o paiz. Se o governo teimar em o levar avante, a responsabilidade será exclusivamente sua.
(O discurso será publicado na integra, se exa. o restituir.)
O sr. Adriano Anthero (relator): - O illustre deputado que me precedeu entreteve-se mais em considerações geraes sobre a economia do projecto, de que na discussão especial do artigo 2.°; e por isso tambem durei poucas palavras em resposta a s. exa.
Com relação á economia geral do projecto, começou s. exa. por dizer que o sr. Mello e Sousa tinha demonstrado por projecto resultariam graves inconvenientes para o paiz, e que o mesmo sr. Mello e Sousa estava prompto a repetir ainda agora, e quantas vezes quizessem, essa demonstração.
Eu creio que, numa das vezes em que tive a honra de fallar n'esta assembléa sobre esta questão, provei, tambem com calculos irrefutaveis, que li e serão publicados como meu discurso, que da approvação d'este projecto resultava vantagem para o thesouro. Mas, para não fallar na minha argumentação, contraporei agora á argumentação do sr. Mello e Sousa a do meu amigo, o sr. Villaça.
Direi por isso, em resposta ao sr. Avellar Machado, que tambem o sr. Villaça demonstrou com calculos irrefutaveis e verdadeiros que effectivamente da approvação do projecto resultavam vantagens para o thesouro; e que s. exa. - creio eu, não contestará as minhas palavras - está prompto a repetir, uma e quantas vezes for preciso, essa demonstração.
D'esta maneira parece-me ter respondido cabalmente áquella consideração do meu amigo o sr. Avellar Machado.
S. exa. apresentou ainda outras considerações geraes para demonstrar que o projecto é inconveniente.
Uma "é que o sr. presidente do conselho não morre de amores pela freguezia da Palhaça! "
(Riso.)
Este argumento é claro que não carece de refutação. Outra "é que em geral todo o ministerio tem um grande egoismo e em especial o sr. ministro das obras publicas não tem apresentado medidas de fomento que dêem impulso vigoroso ao paiz!"
Ainda se não discutiram todas as medidas de fomento, apresentadas ao parlamento pelo senhor ministro das obras publicas; algumas param ainda no seio das respectivas commissões; e, como já tive occasião de dizer aqui, no anno passado, d'essas medidas ha de resultar augmento de receita e uma impulsão fertilisadora no paiz. (Apoiados.)
Mas seja como for, esse objecto é estranho ao assumpto que se debate.
A outra consideração apresentada por s. exa. "é que o sr. ministro da justiça não elaborou uma lei de imprensa, que correspondesse ás necessidades da opinião publicas."
V. exa., sr. presidente e a camara comprehendem bem que estes argumentos não tem resposta; e, quando digo isto, não quero de modo algum faltar ao respeito e consideração que devo ao meu illustre amigo, o sr. Avellar Machado. Pelo contrario, tenho a declarar que, embora e á primeira vista pareça impertinente similhante argumentação, é certo que s. exa., apresentando taes argumentos, mostrou simplesmente uma grande coherencia de caracter e um grande talento, porque já tinha o seu voto comprometido sobre esta materia, como eu farei ver; e assim, não podendo atacar de frente a questão, viu-se obrigado a ladeal-a por essa fórma.
Entrando sobre a especialidade do artigo 2.° do projecto, e emquanto a garantia dos rendimentos das alfandegas, s. exa. estranhou apenas que nos referissemos á lei de 26 de fevereiro de 1892, no sentido d'ella consignar garantia igual aquella aqui estatuida, quando, diz, essa lei está revogada pelo decreto de 18 de junho de 1892! Ora a citada lei de 26 de fevereiro de 1892 não está ainda revogada, e por isso e porque a auctorisacão que d'ella consta, em relação á garantia de que se trata, foi renovada na lei de 20 de maio de 1893, esse lado da camara e o governo transacto tem tambem a sua responsabilidade presa a esta disposição do projecto, exactamente como o governo actual. N'isto não lhes quero irrogar censura; trago este argumento porque folgo de me reforçar com tão valiosas auctoridades.
Vamos a ver a verdade d'esta affirmação.
Como v. exa. sabe, a lei de 26 de fevereiro de 1892