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DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS

Mas, sr. presidente, esta questão do legalidade é a mais pequena, porque é a que menos move a curiosidade publica. O que sobretudo importa saber é se o governo defraudou os interesses do estado. Tratemos, pois, da questão economico-politica. Pôde esta questão formular-se da seguinte maneira:

A concessão feita ao sr. Filippe de Carvalho, do ramal do Pinhal Novo á quinta do Conde, depreciou a linha do estado ao sul do Tejo, no seu rendimento actual ou no seu valor venal? Respondo que não, apoiado nos mesmos documentos em que se apoiou a opposição para dizer que sim. Esses documentos são as consultas da junta consultiva de obras publicas, e os pareceres dos homens competentes.

Examinando-as bem, vê-se que em todas ellas ha duas partes distinctas. N'uma, que é a primeira, demonstra se até á sociedade que a linha do Barreiro não póde arreceiar-se de uma concorrencia séria por parte da linha que o sr. Filippe de Carvalho requer. Na outra, que é a segunda, conclue-se que o governo não deve fazer uma similhante concessão. Na primeira parte ha argumentos, ha raciocinios, ha considerações. A segunda parte é mysteriosa, dogmática.

Sobre a asserção, de que a linha do governo não póde temer concorrencia do ramal do Pinhal Novo, todos devem estar de accordo. Effectivamente, todos os passageiros e mercadorias que se dirigirem de Lisboa para as provincias do Alemtejo e Algarve e vice-versa, irão buscar a estação do Barreiro e seguirão pela linha do governo.

Porque? Porque em questão de transporte procura-se a maior commodidade e esta deriva da barateza do preço e da brevidade do tempo. Desde que a distancia do Pinhal Novo ao Barreiro é apenas de 15 a 16 kilometros, emquanto que a linha do Pinhal Novo a Cacilhas mede 32, desde que só o preço de transporte do Pinhal Novo a Cacilhas é mais elevado que o do Pinhal Novo a Lisboa, é evidentissimo que ninguem procurará a linha de Cacilhas. A differença que ha no percurso fluvial de Cacilhas a Lisboa, a favor da linha de Cacilhas, não compensa de fórma alguma a differença contra esta linha, no precurso do caminho de ferro. Acresce a isto, como affirma o sr. Correia Paes, ser menos seguro para a navegação o Tejo entre o pontal de Cacilhas e Lisboa. Ha, porém, uma categoria de passageiros e mercadorias que deixarão de procurar o Barreiro, que até aqui procuravam: são todos aquelles, provenientes de Cezimbra, Cacilhas, Azeitão, Seixal, n'uma palavra, de toda a zona comprehendida entre Cacilhas, Cezimbra e a quinta do Conde, e que se dirigirem para as provincias do sul e vice-versa.

Mas tão insignificante se calcula este prejuizo, que não vale a pena de enumera-lo quando, por outro lado se attende a que largamente será compensado com o maior movimento que necessariamente assumirá a linha do estado do ponto do Pinhal Novo para baixo. E mister não considerar só o movimento ascendente da linha, mas o descendente.

Isto sem fallar no imposto de transito e no augmento da riqueza.

Apoiado na consulta da junta consultiva de obras publicas, apoiado nos pareceres dos homens competentes, apoiado, sobretudo, nas rasões intrínsecas que se derivam da materia, digo eu, e vé-se, que não póde haver de fórma alguma prejuizo para o estado pelo facto da concessão do ra mal do Pinhal Novo á quinta do Conde. (Apoiados). Mas qual será a rasão porque a junta consultiva de obras publicas, apesar d'isto, que é evidente, que ella mesma confessa, aconselha todavia a que se não faça a concessão? Visto que o não dizem, é necessario que o investiguemos.

Será porque a junta consultiva de obras publicas teme para a linha do Barreiro a concorrencia da linha do sr. Filippe de Carvalho? Não póde ser, segundo acabámos de ver.

Será porque a junta consultiva de obras publicas pensa Sessão de 8 de fevereiro

que esta concessão impossibilita a idéa de no futuro construir-se em Cacilhas a testa dos nossos caminhos de ferro do sul? Tambem não póde ser. A concessão do ramal do Pinhal Novo, não impede esta idéa; o que a impede, o que a impediu, foi a concessão feita, ha dois annos, da linha de Cacilhas a Cezimbra, mas essa concessão foi feita com annuencia inteira da junta consultiva! (Apoiados.)

A junta matou essa idéa no dia em que aconselhou o governo a que fizesse a concessão de Cacilhas a Cezimbra. (Apoiados) fez-se, e então ninguem reclamou, ninguem veiu dizer que a junta preterira os interesses do estado; e, todavia, se alguma rasão havia para o dizer, seria n'essa occasião. (Apoiados.)

Não é, pois, o temor da concorrencia, não é a impossibilitação de formar-se em Cacilhas a testa dos caminhos de ferro do sul, que obriga a junta a pensar d'esta sorte. O que será? Julgaria a junta conveniente a formação da estação terminal do sul n'um ponto intermediario entre o Barreiro e Cacilhas, como affirma o sr. Correia Paes? Mas esta idéa não é prejudicada pela concessão. No canal de Coina haverá logar para isso. Verdade seja que o sr. Pinheiro Chagas nos disse que em Coina tambem estava o sr. Filippe de Carvalho. Mas não é exacto. O sr. Filippe de Carvalho está, segundo nos diz o mappa geographico, a mais de 2 kilometros da origem do rio Coina. E note-se que não seria na origem d'este rio que teria de construir-se a estação, mas no ponto, ainda mais distante, onde elle mais engrossasse, e onde elle mais facilmente podesse offerecer condições de embarque e desembarque. (Apoiados.)

Não sei descobrir que motivos actuaram no animo da junta para considerar inconveniente a concessão. Creio mesmo que ninguem o sabe. A opposição tambem o não diz. Por mim, francamente o declaro, tambem os não sei encontrar.

Mas pergunta-se: quaes são as vantagens que o governo tirou de uma similhante concessão? Argumenta-se que ainda ninguem disse nada a respeito dos interesses que esta concessão podem resultar para o publico. Pois é preciso dize-lo? Pois não ha uma zona importantissima de terra, uma região fertilissima entre Cacilhas, Cezimbra e o Pinhal Novo? Pois quando ellas sejam cortadas por uma linha ferrea não irá esta dar alimento e animação á industria, ao commercio e á agricultura? Pois contesta alguem as vantagens e as utilidades provenientes de um caminho de ferro? (Apoiados.)

Se houvesse algum prejuizo, alguma perda para o estado, de accordo. Ficasse Cacilhas com o seu carvão e as seus madeiras, Cezimbra com a sua praia de banhos, ficasse Albufeira com o seu aquário e a Arribada com os seus mármores. Demonstrando-se, porém, que não ha prejuizo, não mostrando a opposição que o haja, qual ha de ser a rasão por que não havemos de ter uma linha ferrea n'aquella parte do territorio portuguez?

Argumentou ainda o sr. Mariano de Carvalho com a maneira escondida, secreta e maliciosa porque o sr. Filippe de Carvalho obteve a concessão. Não sei, não quero saber, nem isso importa para a questão, quaes os meios de que se serviu o sr. Filippe de Carvalho; o que sei e posso dize-lo, porque todos o sabem, é que todos os documentos respeitantes a esta questão foram publicados no Diario do governo e nos jornaes da capital. E n'este procedimento de completa publicidade não vejo processos subterraneos, vejo antes a luz, a luz da verdade. Mas quando houvesse malicia da parte do sr. Filippe de Carvalho, que tinha o governo que ver com isso se d'ahi não resultava, como não resultou, prejuizo para os interesses do estado? (Apoiados.)

Sr. presidente, preciso ainda de responder a uma Insinuação saída d'aquelle lado da camara. Disse o sr. José Luciano de Castro que, quem quizesse obter favores e graças do governo, fosse deputado da maioria e tivesse um jornal para defender os actos d'esta situação. Eu não sei