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tratos com capitalistas estrangeiros, sabe muito bem, e os srs. Fontes e Casal Ribeiro ainda melhor, que, accusando aqui com a vehemencia da argumentação que lhe conhecemos, o sr. Casal Ribeiro, por motivo do emprestimo Erlanger, aquelle cavalheiro respondeu que = ninguem aconselharia a subscripção entre nós, porque entre nós não avulta o capital =. Assim respondeu o illustre deputado, o sr. Casal Ribeiro, e triumphantemente. Prestei muita attenção quando, no seu aprimorado discurso, o illustre deputado disse: «Pois vós levantaes mil e tantos contos dentro do paiz a preço vantajosissimo, e receiastes levantar mais 100:000 libras?»

O nobre ministro da fazenda, muito feliz em ter tido occasião de levantar, em boas condições, mil e tantos contos dentro do paiz, mas se houvesse de levantar o capital de mil e tantos contos e mais 100:000 libras, talvez que não fosse tão feliz, nem tão facil e vantajosa a operação. Não digo que se não fizesse, não tenho os convenientes dados estatisticos, não conheço mesmo os nossos capitalistas... cousa singular, que devo declarar á camara. Não conheço nenhum capitalista n'este mundo, nem nacional nem estrangeiro; não tenho relações com a classe. Mais ainda: nada sei d'estas operações que discutimos, nada absolutamente. Não fallei mesmo com o sr. ministro, desde o encerramento da sessão, senão uma ou duas vezes que o encontrei em actos publicos. Estou aqui a fingir que sou relator da commissão sem conhecer das operações de 1862 e 1863 senão aquillo que consta dos documentos officiaes ou officiosos que têem sido publicados (apoiados). N'esta parte ninguem póde dar testemunho mais solemne e autentico do que o proprio sr. ministro da fazenda. (O sr. Ministro da Fazenda: — Apoiado, é verdade.)

Tenho para mim, sr. presidente, que não deve causar estranheza que um paiz pequeno, pouco agricultado, sem industria fabril e com pequeno commercio não tenha grandes capitães. O que é o capital? É o producto do accumulado á presente pelas anteriores gerações. E não admira que n'um paiz, nas circumstancias do nosso, não haja a grande accumulação que engrandece e nobilita outros paizes. Se v. ex.ª for um dia á nossa praça de commercio, torreão Oriental do Terreiro do Paço, e saír d'ali para o paquete e for ao Stok-exchange, firma logo as suas idéas sobre o assumpto. Entretanto é lisongeiro para todos nós que os capitaes vão apparecendo no paiz e, sobretudo, que se desenvolva entre nós o espirito de associação, unica maneira que os capitaes têem de sobresaír. As fortunas estão, felizmente, muito divididas em Portugal, e eu não julgo por isso menos propicia a nossa situação, se para ter certo numero de grossos capitalistas é necessario á roda d'elles milhões de proletarios miseraveis (apoiados). Prefiro este nosso estado. Em Portugal não ha fortunas colossaes, mas tambem não ha a repugnante miseria que afflige e envergonha outros paizes. Não vejo que nos abata ou deprima o declararmos que não temos tantos capitaes como tem, por exemplo, a Inglaterra (apoiados). A muitos outros paizes, guardadas as devidas proporções, acontece outro tanto. Ao mercado de Londres recorrem quasi todas as nações quando precisam de levantar capitaes. Os nossos recursos economicos, e consequentemente a acção dos capitaes, têem se immensamente ampliado n'estes ultimos annos; mas já houve tempo, e recente, em que as pretensões dos nossos chamados capitalistas eram um tanto exaggeradas. Os capitalistas portuguezes podiam então comparar-se, e eu tinha o costume de o fazer, á antiga nau dos quintos. Não sei se v. ex.ª sabe o que era a nau dos quintos? (Riso.) Era o capital e o credito dos tempos antigos; a nau dos quintos nunca navegou nem existiu, era um mitho. Toda a gente fallava, acreditava e tinha esperança fagueira na nau dos quintos. Nossos avós tiveram um sebastianismo politico, e outro sebastianismo financeiro. A crença, quando sincera, nos nossos capitaes era ainda ha poucos annos a partilha dos nossos sebastianistas financeiros.

O que ha de mais singular n'esta discussão é que, de cada accusação dirigida contra o nobre ministro da fazenda, resulta sempre motivo de grande louvor para s. ex.ª Vejamos. Accusa-se o sr. ministro por occasião do emprestimo Foster, e demonstra-se na discussão que = ás boas condições com que o illustre ministro tinha obtido o emprestimo acrescentou a da reserva das 500:000 libras =, d'onde veiu o grandissimo lucro de entrar nos cofres do estado, alem do preço convencionado, a quantia de setenta e tantos contos, sonante.

Accusa-se mais tarde o nobre ministro por occasião do emprestimo de 1863, e prova se nos debates que o sr. ministro obteve mais 1/2 por cento addicional ao valor convencionado, isto é, cincoenta e tantos contos de réis de lucro para o thesouro.

Accusa-se finalmente o nobre ministro por não ter recorrido aos capitaes nacionaes no emprestimo de 1863, e veiu o illustre deputado, o sr. Carlos Bento, dar testemunho de que o governo fizera uma operação vantajosa de mil e tantos contos de réis dentro do paiz. Felicito o nobre ministro.

Disse o illustre deputado meu antagonista que = quando o sr. Fontes em 1856 fez um contrato em Londres, veiu logo á camara pedir auctorisação para o pagamento de 3:000 libras, que se compromettêra pagar =. Este negocio das 3:000 libras é muito differente. Sabem todos que o nobre deputado, o sr. Fonte =, então ministro, tinha feito um accordo em Londres, por virtude do qual o governo devia pagar a somma de 40:000 libras. Esta somma subiu mais tarde a 43:000 libras em consequencia de novo accordo. S. ex.ª veiu pedir auctorisação ao parlamento para aquelle pagamento. Não ha nada mais simples e mais constitucional. «E qual é a rasão, pergunta o sr. Carlos Bento, porque o sr. Lobo d'Avila não veiu similhantemente pedir auctorisação para o pagamento das 2:000 libras?» A ratão é muito obvia, é porque o sr. Lobo d'Avila não tinha feito accordo algum quanto ás taes 2:000 libras.

O sr. Fontes tinha feito um contrato solemne, e o sr. Lobo d'Avila não tinha contratado cousa alguma nem com o sr. Youle nem com o sr. Stern. Os serviços do sr. Youle foram mais designadamente á casa do banqueiro do que a ninguem. Todavia os serviços prestados á casa do banqueiro, em similhante conjunctura não podiam deixar de reflectir no credito publico.

Ora, como a venda das 500:000 libras era feita á vontade e como e quando quizesse o banqueiro, que assim era o convenio, o estado recebia o que o banqueiro lhe entregasse, e tudo era lucro o que excedesse ao preço contratado dos titulos. O banqueiro entendeu que devia abater do preço da venda das 500:000 libras o que tinha gasto em corretagens e gratificações, e effectivamente tirou o que entendeu necessario para gratificar e pagar os serviços do sr. Youle; e feio assim porque o podia fazer, emquanto o sr. ministro não se podia oppor, nem para isso tinha direito.

Disse mais o illustre deputado que = deviamos limitar a divida fluctuante =, e n'esse ponto...

O sr. Carlos Bento: — Fixar.

O Orador: — E n'esse ponto perfeitamente de accordo. São as idéas do relatorio de mr. Fould...

O sr. Carlos Bento: — Ha muito tempo que se fixa a divida em França.

O Orador: — Sim, senhor; mas o relatorio faz mais do que isso, é trabalho perfeitissimamente elaborado, e as idéas d'elle têem reflectido n'esta discussão. E ainda bem que se elucida a questão. A verdade venha d'onde vier é sempre a verdade.

Tambem o illustre deputado fez ligeiras considerações quanto ao projecto da liberdade do commercio do tabaco. Apesar da muita largueza que, segundo o meu pensar, se deve dar a esta discussão da resposta ao discurso da corôa, n'ella não se podem comprehender todas as discussões. A discussão d'este grave negocio ha de ter logar opportunamente (apoiados).

Apesar de ter estado de ouvidos attentos, não pude perceber qual era o systema do nobre deputado...

O sr. Carlos Bento: — Em chegando a discussão.

O Orador: — É o mais seguro. N'estas questões as boas regras parlamentares e a diplomacia recommendam que não haja compromettimentos.

Pelo que me diz respeito a mim, eu não tenho duvida nenhuma em comprometter desde já o meu voto, absolutamente nenhuma. (Vozes: — Muito bem.)

Essa medida, no meu modo de ver, é de um tal alcance e utilidade, que é digna de ser votada pela camara que votou a liberdade da terra e outras grandes medidas de civilisação e progresso que fazem honra ao paiz (apoiados. — Vozes: — Muito bem.); essa medida é de um tal alcance e utilidade que nobilita para sempre o sr. ministro da fazenda, e entrega de um modo honroso o seu nome á posteridade, sejam quaes forem as consequencias (apoiados).

Tenho assistido á discussão do projecto na commissão de fazenda, da qual me honro de ser membro.

Quando o negocio vier á camara nós trataremos d'elle. Não é negocio sobre que se passe tangencialmente, é demasiado grave.

E quando tratarmos a questão havemos conseguir provar á camara que com a adopção da medida augmentam os recursos do thesouro (apoiados), melhoram as condições do consumidor (apoiados), e rendemos o preito que devemos, nós os progressistas, aos bons principios (muitos apoiados).

Descance o illustre deputado que a discussão ha de vir, e ha de vir breve (apoiados).

Tinha eu dito hontem, quando comecei a fallar, que faria algumas ligeiras reflexões, ao discurso do sr. Serpa na parte em que me parecia que não havia ainda sido rebatido.

Um dos primeiros reparos do illustre deputado procede da abundancia de projectos que se annunciou na falla do throno, e em cuja discussão s. ex.ª não confia.

Deus levanta os humildes e abate os soberbos!

Em que vieram a dar aquellas increpações de outro tempo, de que = este ministerio não tinha iniciativa, não tinha idéas, não tinha pensamento governativo, nem tinha rasgo, que hybernava! = Está tudo mudado. Agora a opposição como que receia esta superabundancia de pensamentos de projectos, de medidas, com que o ministerio afflige o parlamento.

Mas diz-se: «Não se hão de discutir!» E porque? Porque não dá v. ex.ª para ordem do dia esses projectos?

Pois será o ministerio tambem responsavel pelas morosidades, pelos attritos do systema parlamentar?

E porque as medidas se não discutem seria isso rasão para que se não apresentassem?

Pois apresentando-nos todos os srs. ministros o resultado das suas investigações, dos seus estudos; apresentando-nos os seus projectos em primeiro logar cumprem o seu dever, e em segundo logar fornecem uma excellente base, quando menos, para a discussão. Porventura as necessidades pungentes do paiz hão de estar occultas, não se hão de conhecer, não as hão de annunciar os srs. ministros? E isso o que elles fazem, a nós cabem-nos outros deveres.

Mas apesar de tantas medidas apresentadas com que me parece que o meu nobre amigo, o sr. Antonio de Serpa, disse que = se queria armar á credulidade =, não sei se da camara ou de quem, apesar de tantas medidas, ainda assim s. ex.ª lamentou que faltavam duas. Faltavam-lhe duas, uma sobre o commercio dos vinhos e a outra sobre o commercio dos cereaes.

Eu tenho uma memoria infeliz, infelicissima; mas figura-se-me que o illustre deputado coffre tambem alguma cousa da molestia (riso).

Pois então esse projecto sobre o commercio dos vinhos não foi trazido á camara na sessão passada?

O sr. Camara Leme: — Foi adiado.

O Orador: — Já lá vou. Eu conheço-o melhor do que o illustre deputado. Esse projecto foi trazido á camara, e foi á commissão que deu parecer. Todavia occorrencias extraordinarias e motivos justificadissimos imperaram no animo do nobre presidente do conselho para que, sem desistir do pensamento que tinha presidido aquelle projecto, pedisse o seu adiamento.

Ora eu devo declarar a v. ex.ª e á camara que considero esta questão do commercio dos vinhos do Douro uma das mais graves que temos sobre a téla (apoiados), prendem n'ella os interesses de todo o paiz, e principalmente os interesses do Douro, e quando fallo no districto do Douro não me refiro a essa divisão administrativa que tenho por absurda; segundo a qual um rio parte ao meio um paiz que tem a mesma estructura economica e os mesmos interesses, para sacrificar metade d'elle ao districto de Villa Real e outra metade ao de Vizeu, districtos importantes, mas em antagonismo formal com os interesses do Douro vinhateiro (apoiados). Esta simetria topographica da nossa divisão territorial tem grandes inconvenientes, e se na parte politica já estão remediadas pela lei eleitoral, na administrativa ainda subsistem e são graves.

Ora começarei por declarar, que não tenho no Douro nem propriedades, nem parentes, nem amigos; não tenho ali nada. Servi ali como engenheiro director das obras publicas durante algum tempo; sou um admirador d'aquelle bello paiz. Observei-o, estudei-o, e d'ahi procede a veneração que consagro aquelle bom povo, aquelle grande povo que vive sobre as margens vinhateiras do Douro! Parece impossivel, sr. presidente, como n'aquellas montanhas se levantasse pela força da intelligencia e do braço uma industria que representa annualmente cerca de 8.000:000$000 réis; n'um tão curto trato de terreno, como é o que vae da barca do Bernardo, fallo diante do meu nobre collega o sr. Affonso Botelho...

O sr. José de Moraes: — Então já tem amigos no Douro.

O Orador. — Até á quinta da Figueira ou Riba Longa! Este paiz pouco extenso e muito intenso tem um valor collectavel excedente ao da maior parte dos districtos do reino que tem centenares de leguas quadradas! (Apoiados.) O valor collectavel do Douro não é, senhores, o que vem n'essa cousa a que dão o nome de matrizes. Não posso pois deixar de prestar o louvor devido á iniciativa do sr. Antonio de Serpa, no projecto a que alludiu. Parece-me que foi s. ex.ª quem iniciou essa medida no tempo que esteve á frente dos negocios publicos, não me lembro bem, mas fosse quem fosse, devo observar a v. ex.ª que um dos homens que mais e melhores serviços prestou ao commercio dos vinhos do Douro foi o ministro que reduziu os direitos de exportação (apoiados). Não sei se foi o sr. Fontes, que reduziu esses direitos de 12$000 ou 15$000 reis a 2$400 réis (salvo erro) por pipa. E para v. ex.ª ver como tudo se torce e sophisma, direi que esta medida foi guerreada e combatida, dizendo-se que os Vinhos não deviam ir baratos para Inglaterra, porque só os lords e pessoas ricas os deviam beber! E então era bom que chegassem lá caros!! Isto dizia o Commercio do Porto, e se lerem os jornaes d'esse tempo, lá hão de apparecer estas idéas que não são minhas. Era assim que se combatia uma medida de tanto alcance para a lavoura e não menos para o commercio.

A liberdade do commercio dos vinhos interessa mais ao Douro do que a ninguem (apoiados). Desejo do coração, sr. presidente, que o principio da liberdade do commercio seja inaugurado para aquelle commercio, eu que não sou homem de theorias, mas de factos; comtudo, sr. presidente, não desejo impor ao Douro a liberdade de commercio com forca e galés. Note bem isto, v. ex.ª e a camara, declaro me partidario acerrimo da liberdade de commercio, porém quero a liberdade para tudo e para todos, e desejo que essa liberdade de cominei cio seja sustentada pela força da opinião, que é a base verdadeira do governo constitucional (apoiados).

É necessario respeitar a opinião, e direi mesmo os preconceitos dos povos, e estes não se atacam de frente, flanqueiam-se. No Douro ha preconceitos; e o que é mais singular é que eu tambem os tenho a respeito daquelle grande paiz, sou muito partidario da liberdade do commercio, e todavia não gosto dos projectos que até hoje têem sido apresentados para resolver aquella importantissima questão do Douro; não me parecem adequados, e sobretudo porque não estão dispostos os animos nem preparadas as cousas para inaugurar o principio da liberdade do commercio. O Douro tem prejuizos, é verdade, mas tambem interesses vitaes que são peculiares d'aquelle paiz, e é por isso que eu louvo o governo em ter adiado aquella questão para mais bem e devidamente a apreciar, porque me parece que a questão dos vinhos ainda está verde, em consciencia o digo. Mal parece estar eu a fallar de um negocio a que soa tão estranho, mas peço perdão, vou concluir. Já vi no Douro vender uma pipa de vinho de segunda qualidade, vinho muito regular, por 12$000 réis, preço que os illustres deputados que são do Douro sabem que não dá para o grangeio.

As apprehensões dos lavradores do Douro têem referencia a tempos de calamidade por que tem passado aquelle paiz. E necessario implantar o principio da liberdade do commercio, mas é tambem necessario salvar os lavradores do Douro dos ardis da especulação dos chafariqueiros e de outras classes que os exploram. Sr. presidente, o governo, que tutela todos os interesses, tem rigorosa obrigação de tetular aquelles que são tão legitimos.