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SESSÃO DE 7 DE FEVEREIRO DE 1876

Presidencia do ex.mo sr. Joaquim Gonçalves Mamede

Francisco Augusto Florido da Mouta e Vasconcellos Barão de Ferreira dos Santos

SUMMARIO

Apresentação de propostas de lei, requerimentos e representações. — Proposta do sr. Pereira de Miranda para ser adiado o projecto relativo á creação da caixa dos depositos até serem ouvidas a junta do deposito publico e as associações commerciaes de Lisboa e Porto. Ficou para segunda leitura, depois de algumas observações do sr. ministro da fazenda. — Explicações dadas pelo sr. ministro dos negocios estrangeiros em resposta ao sr. deputado Barros e Cunha, com respeito ao nosso ministro em Inglaterra. — Ordem do dia, continuação da discussão do projecto n.º 107.

Presentes á chamada 52 senhores deputados.

Presentes á abertura da sessão — Os srs.: Adriano Sampaio, Braamcamp, Pereira de Miranda, Antunes Guerreiro, Avila Junior, A. J. Boavida, A. J. de Seixas, A. J. Teixeira, Cunha Belem, Pereira Carrilho, Ferreira de Mesquita, Mello Gouveia, Zeferino Rodrigues, Barão de Ferreira dos Santos, Correia da Silva, Carlos Testa, Vieira da Mota, Conde de Bretiandos, Conde da Graciosa, Filippe de Carvalho, Vieira das Neves, Fonseca Osorio, Francisco Mendes, Pinto Bessa, Guilherme de Abreu, Quintino de Macedo, Paula Medeiros, Palma, Illidio do Valle, Jeronymo Pimentel, Ferreira Braga, Barros e Cunha, J. M. de Magalhães, Vasco Leão, Gonçalves Mamede, J. J. Alves, Matos Correia, Correia de Oliveira, Pereira da Costa, Figueiredo de Faria, Namorado, Luciano de Castro, Pereira Rodrigues, Mexia Salema, Julio de Vilhena, Luiz de Lencastre, Luiz de Campos, Bivar, Faria e Mello, Manuel d'Assumpção, Pires de Lima, Mello Simas, Mariano de. Carvalho, D. Miguel Coutinho, Pedro Franco, Pedro Jacome, Julio Ferraz, Thomás Ribeiro, V. da Arriaga, V. da Azarujinha, V. de Carregoso, V. de Quedes Teixeira.

Entraram durante a sessão — Os srs.: Osorio de Vasconcellos, Rocha Peixoto (Alfredo), Teixeira de Vasconcellos, Rodrigues Sampaio, Neves Carneiro, Francisco de Albuquerque, Mouta e Vasconcellos, Guilherme Pacheco, Pinto Bastos, Pinheiro Chagas, Cunha Monteiro, V. de Moreira de Rey, V. de Sieuve de Menezes, V. de Villa Nova da Rainha.

Não compareceram á sessão — Os srs.: Agostinho da Rocha, Cardoso Avelino, Arrobas, Telles de Vasconcellos, Barjona de Freitas, Falcão da Fonseca, Augusto Godinho, Sousa Lobo, Forjaz de Sampaio, Eduardo Tavares, Francisco Costa, Camello Lampreia, Van-Zeller, Perdigão, Ribeiro dos Santos, Cardoso Klerck, Dias Ferreira, Moraes Rego, J. M. dos Santos, Nogueira, Lourenço de Carvalho, Camara Leme, Freitas Branco, Rocha Peixoto (Manuel), Alves Passos, Marçal Pacheco, Pedro Roberto, Placido de Abreu, Ricardo, de Mello, Thomás Bastos.

Abertura — A uma hora e meia da tarde.

Acta — Approvada.

EXPEDIENTE

Officios

1.° Do ministerio da guerra, acompanhando cento e vinte exemplares das contas do ministerio da guerra, relativas á gerencia de 1874-1875 e ao exercicio de 1873-1874.

Mandaram-se distribuir.

2.° Do ministerio das obras publicas, acompanhando, em satisfação a um requerimento do sr. José Luciano, copia do officio em que a companhia real dos caminhos de ferro portuguezes propõe ao governo o projecto da nova tarifa, que começou a vigorar no 1,° de julho de 1875.

A secretaria.

Representações 1.ª Dos distribuidores do Diario do governo e do das Sessão de 7 de fevereiro

camaras legislativas, pedindo augmento de vencimento. (Apresentada pelo sr. deputado Illidio do Valle.) A commissão de fazenda.

2.ª Da camara municipal de Miranda do Corvo, pedindo que seja derogada a lei de 16 de abril de 1874 e mais decretos, substituindo-a pela reforma de 21 de maio de 1841. (Apresentada pelo sr. deputado Pires de Lima.)

A commissão de legislação civil.

3.ª De cidadãos, camaras municipaes, tribunaes administrativos e judiciaes, etc. da provincia de Angola, pedindo que por aquella provincia sejam eleitos quatro deputados. (Apresentada pelo sr. deputado A. J. de Seixas.)

4.1 Dos representantes do gremio dos merceeiros da cidade de Lisboa, pedindo para que a sua corporação seja transferida da 5.ª para a 6.ª classe nas respectivas tabellas da contribuição industrial. (Apresentada pelo sr. deputado Pereira de Miranda.)

Requerimento

Requeremos que, pelo ministerio da fazenda, sejam enviados a esta camara, com urgencia, todos os documentos relativos a um inquerito a que procederam ultimamente em Lisboa os escrivães de fazenda, com o fim de conhecer da justiça com que a classe dos merceeiros tem pedido modificação na taxa da contribuição industrial.

Sala das sessões, 5 de fevereiro de 1876. = Pereira de Miranda = Antonio José de Seixas = Joaquim José Alves = Quintino de Macedo.

O sr. Presidente: — Consulto a camara se quer que sejam publicadas no Diario do governo duas representações; uma dós merceeiros de Lisboa, apresentada na ultima sessão pelo sr. Pereira de Miranda, e a outra dos habitantes de Angola, apresentada pelo sr. Antonio José de Seixas.

A camara resolveu que fossem publicadas.

O sr. J. M. de Magalhães: Mando para a mesa uma representação dos escripturarios da repartição de fazenda do concelho de Leiria, na qual ponderam as difficuldades com que lutam para poderem viver, em vista dos seus diminutos ordenados, e do augmento, sempre crescente, do preço das subsistencias.

Pedem, pois, á camara para que attenda á sua petição augmentando-lhes os seus vencimentos quando se tratar da discussão do orçamento, e eu junto a minha supplica á d'elles, pedindo a V. ex.ª queira mandar a representação á illustre commissão respectiva para dar o seu parecer, e reservando-me eu para quando este negocio vier á discussão apresentar algumas considerações ácerca da justiça que julgo assistir aos supplicantes.

O sr. Osorio de Vasconcellos: — Mando para a mesa uma representação da camara municipal de Grandola, contra a ultima divisão comarca.

Acho esta representação de toda a justiça, e peço que ella seja remettida á commissão competente, e que seja publicada no Diario do governo.

O sr. Pereira de Miranda: —...(O sr. deputado não restituiu o seu discurso a tempo de ser publicado n'este logar.)

O sr. Ministro da Fazenda (Serpa Pimentel): — Este projecto não está em discussão, mas quando elle se discutir direi as rasões que tive para o apresentar.

Ha mais de um anno que este projecto foi trazido á camara, e já tinha sido apresentado pelo sr. Anselmo Braamcamp outro igual contendo as mesmas disposições, creio que ha quatro annos. Por consequencia o publico conhece

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este assumpto, e quando elle for discutido a camara julgará então se 6 ou não conveniente adia-lo. O que não parece regular é estar a adiar um projecto antes de entrar em discussão, com o pretexto de serem consultadas quaesquer corporações.

Não tenho duvida, e julgo que a camara tambem não terá, em dar a mais ampla discussão a este projecto, que é muito importante; e quando elle se discutir, attender-se-hão os pareceres das differentes corporações que, desde que a proposta de lei foi apresentada ao parlamento, já tinham tempo de meditar e estudar os inconvenientes que ella lhes podia trazer.

Não tenho a honra de ser membro d'esta camara, mas se o fosse não votaria que se adiasse um projecto antes de ser discutido.

Ha poucos dias apresentou-se aqui uma proposta analoga, mas não no sentido em que o illustre deputado apresentou esta. Então não se disse que se esperasse que fossem ouvidas corporações estranhas, pediu-se só que se desse tempo para que estas corporações e todos os interessados podessem reclamar sobre o projecto, e o sr presidente disse então que não o daria para ordem do dia sem ter passado o tempo para todos poderem reclamar.

Por consequencia, repito, parece-me que não é esta a occasião propria para se tratar da proposta apresentada pelo illustre deputado o sr. Pereira de Miranda.

O sr. Lencastre: — V. ex.ª e a camara sabem que ha mais de um mez o meu collega e meu amigo o sr. Van-Zeller veiu, e com a nobreza que o caracterisa, sujeitar ao julgamento d'esta camara se o seu procedimento, acceitando um emprego, o tinha feito perder o logar de deputado, e até hoje ainda a illustre commissão de verificação de poderes não apresentou o seu parecer, declarando se o sr. Van-Zeller pertence ou não a esta camara.

Eu não quero censurar aquella commissão, que é composta de cavalheiros muito respeitaveis e cujos membros são todos meus amigos. Consta-me que é relator d'este parecer o meu particular amigo e collega o sr. Eivar, exemplo e honra da magistratura (apoiados); e basta pronunciar o nome de s. ex.ª, para se ver que o parecer ha da ser fundamentado e muito rasoavel quando vier á discussão.

Já disse que não quero irrogar censura á illustre commissão, mas o que é verdade é que o parecer ainda não veiu, de certo por motivos ponderosos, e eu peço que elle seja apresentado com a possivel brevidade, porque não deve deixar-se o sr. Van-Zeller na duvida de se pertence ou não a esta camara.

O sr. Bivar: — Começo por agradecer ao meu illustre amigo, o sr. Lencastre, as expressões muito lisonjeiras que me dirigiu, assim como os apoiados de alguns dos meus illustres collegas a essas expressões, que são uma provado benevolencia tanto da parte do meu illustre amigo, como da parte dos illustres deputados a quem me refiro.

Emquanto ao objecto a que o illustre deputado se referiu, tenho a informar s. ex.ª, por parte da commissão de verificação de poderes, de que elle já foi estudado e discutido na commissão.

Ha da parte de alguns membros da commissão divergencia nas suas opiniões, e outros tem faltado por doença na camara e nas sessões da commissão, de maneira que o parecer não teve ainda maioria, e por esse unico motivo elle não tem sido já apresentado; mas creio que o será com muita brevidade, talvez ainda hoje, porque é este o maior empenho da commissão.

Creio que s. ex.ª ficará satisfeito com as explicações que acabo de dar.

E por esta occasião mando para a mesa um requerimento de José Vicente Augusto Pereira, escripturario da capitania do porto de Faro, no qual com toda a justiça pede que, em attenção ao pesado serviço que desempenha, lhe seja elevado o vencimento.

Peço a V. ex.ª que este requerimento seja enviado á illustre commissão de marinha, que o terá na consideração que merecer.

O sr. Thomás Ribeiro: — Nada tenho a acrescentar ao que o sr. Bivar, meu collega na camara e na commissão, acaba de declarar.

Á commissão entende que, para privar ou não privar um membro d'esta casa de assistir ás sessões parlamentares e tomar parte nos seus trabalhos, é preciso um estudo muito meditado que não se faz perfunctoriamente sobre o joelho.

A commissão tem tido mais de uma reunião para verificar se o sr. Wan-Zeller e outros deputados, a quem se referem as communicações do governo, têem perdido ou não o seu logar n'esta camara. Eu tenho opinião assente a este respeito, assim como tambem os srs. Bivar e Mexia; mas, como V. ex.ª sabe, o sr. Nogueira tem estado doente ha muito tempo, e bem assim o sr. Carneiro, não podendo por isso nenhum n'elles assistir ás sessões da commissão; e por estas rasões não tem sido possivel apresentar o parecer.

Estou, porém, persuadido de que ainda hoje a commissão poderá apresentar o seu trabalho; no entanto parece-me que por um estudo maia demorado nem a commissão nem a camara perderão em que se adie por mais alguns dias a discussão de um objecto de tanta gravidade.

O sr. J. J. Alves: — Achando-se presente o sr. ministro da fazenda, chamo a attenção de s. ex.ª para um projecto de lei que apresentei no anno passado, auctorisando o governo a proceder á reforma da casa da moeda e papel sellado.

Quando elaborei esse projecto entendo que, sem augmentar a verba votada para aquelle estabelecimento, se lhe podia dar melhor organisação, não esquecendo que se deve tornar extensiva aos jornaleiros a disposição do artigo 24.° da lei de 7 de dezembro de 186-1, que concedeu aposentação a todos os empregados, exceptuando com manifesta injustiça os jornaleiros.

Ora estes servidores, que nenhuma garantia encontram na lei quando adquiram impossibilidade de trabalho por qualquer enfermidade, doença, ou desastre ocorrido no serviço, é justo que sejam equiparados em vantagens aos de outras repartições do estado.

Folgarei de que o sr. ministro da fazenda, advogando no seio da commissão a causa d'estes infelizes, a habilite a apresentar á camara uma medida no sentido de lhes melhorar a sua sorte.

O 3r. Ministro da Fazenda: — O objecto, de que acaba de fallar o illustre deputado, foi á commissão de fazenda. Ainda não se tratou d'este assumpto na commissão; quando elle se tratar eu estudarei com a commissão o projecto de s. ex.ª e darei a minha opinião, que ainda hoje não posso dar, porque, repito, não estudei o assumpto.

O sr. Pedro Franco: — Peço a V. ex.ª que tenha a bondade de me reservar a palavra para quando estiver presente o sr. ministro do reino.

Sei que não é essa a praxe, porém eu não posso fallar a este respeito sem s. ex.ª estar presente.

Desejo referir-me ainda aos acontecimentos de Cascaes, aonde se estão cobrando á força de armas os impostos que o sr. ministro do reino affirmou que se estavam pagando voluntariamente, e que os povos não podiam ser obrigados a pagar, porque foram tumultuariamente lançados, não estiveram patentes as matrizes, não deixaram reclamar contra esse lançamento e não houve relaxe em tempo competente, conforme manda a lei.

Os contribuintes vão reclamar contra este abuso, mas a unica resposta a essas reclamações é o que em França se chamava no tempo absoluto «as drago nadas ».

Não posso continuar n'estas observações, porque não está presente o sr. ministro do reino, por isso peço a V. ex.ª que me reserve a palavra para quando s. ex.ª estiver presente. O sr. Cunha Belem: — Mando para a mesa um re-

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querimento de alguns ajudantes de praça de 2.ª classe, pedindo que se lhes melhorem as condições da classe a que pertencem, dando direito a algum accesso.

O sr. Visconde de Guedes Teixeira: — Mando para a mesa um requerimento, pedindo esclarecimentos ao governo.

O sr. Ferreira Braga: — Mando para a mesa uma representação doa escrivães de fazenda do districto de Beja, pedindo que sejam tomados em consideração os seus serviços garantindo-se-lhes a reforma.

O Sr. Luciano de Castro: — Mando para a mesa duas representações da camara municipal do concelho de Castello de Vide, que reclama contra a divisão comarca ultimamente decretada, e pede que n'aquella localidade seja creada uma comarca.

São tão sensatas e ponderosas as considerações em que se firmam estas representações, que eu não posso deixar de recommenda-las á benevolencia da camara, 'a de pedir a V. ex.ª se digne manda-las publicar no Diario do governo.

Peço á illustre commissão, a que forem remettidas, que sobre ellas dê com brevidade o seu parecer.

Aproveito esta occasião para dar uma explicação pessoal sobre algumas palavras, que se dizem proferidas por mim n'uma conversa particular, e que foram reproduzidas n'um impresso pobre a concessão do ramal do Pinhal Novo, assignado pelo sr. Filippe de Carvalho, e ha poucos dias foi distribuido n'esta camara.

N'este impresso diz-se o seguinte. (Leu.)

Se n'estas palavras se houvesse allusão á minha pessoa, eu não me queixaria do abuso de confiança, de que fui victima com esta revelação publica de uma conversa particular. As minhas conversas podem sempre repetir-se-me publico, sem que da publicidade haja de arrepender me ou envergonhar me. Não é d'isso que venho aggravar-me perante a camara. Nem este seria o logar proprio para tal reclamação.

Ha, porém, uma circumstancia que me obriga a rectificar e explicar n'este logar as palavras que o sr. Filippe de Carvalho poz na minha bôca. É que n'essas palavras vae envolvido o nome de um cavalheiro distincto, e um notavel estadista, o sr. marquez d'Avila, victima innocente das revelações do sr. Carvalho, que não póde nem deve padecer por minha causa. Por isso me apresso a restabelecer a verdade.

Lendo-se as palavras, que o sr. Filippe de Carvalho me attribue, póde acreditar-se que a opposição levantou aqui a questão do caminho de ferro de Cacilhas ao Pinhal Novo, para ser agradavel ao sr. marquez d'Avila, que estava zangado com o sr. Carvalho. É isto o que se infere do escripto a que alludo.

Não me recordo bem das palavras que proferi em conversa particular nos corredores da camara. Recordo-me, porém, de que as proferi por mero gracejo. Aquellas ou outras foram pronunciadas sem nenhuma intenção séria. Nem outra cousa podia ser. Ha muito tempo que não fallo com o sr. marquez d'Avila. Apenas ha poucos dias o procurei na camara dos pares para lhe entregar um trabalho do sr. Alexandre de Seabra sobre o projecto do codigo do processo civil, pendente n'aquella camara. Não fallamos n'outro assumpto. Não sei, portanto, como s. ex.ª pensa a respeito do sr. Filippe de Carvalho, e da concessão que lhe foi feita.

As palavras, pois, que o sr. Filippe me attribue, se as disse, não podiam ser consideradas senão como inoffensivo gracejo, que de nenhum modo devia ser trazido a publico, e que em caso nenhum póde prejudicar o nome e o credito do distincto estadista a quem alludo.

Não tenho mais que dizer.

O sr. Ministro da Fazenda: — Mando para a mesa a proposta de lei que passo a ler. (Leu.)

N.» 10H

Senhores. — O presidente dos Estados Unidos da America do Norte proclamou que, por deliberação do congresso, se celebrasse o centenário da independencia d'aquella vasta e florescente republica, inaugurando-se na cidade do Philadelphia uma exposição universal e internacional de artes, manufacturas, productos agricolas e de minas, no anno de 1876.

N'esta conformidade foram dirigidos convites ás differentes nações, e este novo concurso industrial ha de inaugurar-se no dia 10 de maio do anno corrente.

Desde 1851 têem sido celebradas na Europa cinco exposições universaes e internacionaes das industrias o artes, duas em Londres, duas em París e a ultima em 1873, em Vienna de Austria, e Portugal tem sempre tomado parte n'estas notaveis festas do trabalho humano pelos motivos ponderosos apresentados sempre ao corpo legislativo em differentes propostas de lei.

A exposição, que na epocha indicada deve ser inaugurada, é a primeira de caracter universal celebrada na America, circumstancia esta digna de ser attendida.

O governo de Sua Magestade, per motivos de conveniencia publica, que facilmente se comprehendem, hesitou, por muito tempo, em acceitar o honroso convite que lhe foi feito.

Rasões attendiveis o aconselharam a não acceitar a responsabilidade de uma intervenção official em tão importante assumpto, esperando, antes de tomar uma resolução definitiva, conhecer o modo do proceder das nações que se acham em circumstancias analogas ás nossas.

Verificando-se que o convite do presidente dos Estados Unidos fóra, a final, favoravelmente acolhido, mesmo por algumas nações que haviam hesitado na acceitação, convenceu-se o governo de que a nossa completa abstensão seria inconveniente, e, na ausencia do parlamento, e vista a estreiteza do tempo, deliberou declarar ao representante dos Estados Unidos que Portugal, seguindo os precedentes das exposições de 1851, 1855, 1862, 1867 e 1873, tomaria parte no concurso industrial de 1876, e solicitou que lhe fosse reservado o necessario espaço para a representação da nossa industria fabril e agricola.

Forçoso era, dadas as circumstancias que mencionamos, tomar tambem desde logo as deliberações necessarias para o colleccionamento dos productos nacionaes; e n'este sentido se está trabalhando com actividade.

É porém sabido que os governos de todas as nações, ainda mesmo d'aquellas em que a iniciativa particular dos industriaes representa um papel importantissimo, quando têem concorrido ás exposições mencionadas, prestaram valiosos auxilios pecuniarios; mas nós e todos os paizes que se acham em circumstancias identicas ás nossas, pouco podemos confiar na iniciativa dos expositores, e somos forçados sempre a fazer por conta do estado todas as despezas indispensaveis para a regular representação das nossas industrias.

É esta uma tão evidente verdade que inutil nos parece insistir na sua demonstração.

E por este motivo os auxilios, que, por occasião das exposições já mencionadas, os differentes governos têem solicitado do corpo legislativo, têem sido sempre importantes.

Tomando, pois, por base para os calculos da despeza provavel da exposição de Philadelphia o que temos despendido nas exposições de Londres, París e Vienna de Austria, e attendendo á distancia, que nos separa da America, julgámos necessario um credito de 30:000$000 réis para que as industrias do paiz sejam regularmente representadas.

Podemos asseverar que a exposição da nossa secção será feita com a maxima economia, mas esta não póde ir alem de certos limites.

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Por estas breves considerações temos a honra de apresentar á vossa illustrada deliberação a seguinte

Proposta de lei

Artigo 1.° E o governo auctorisado a applicar, até á quantia de 30:000$000 réis, para as despezas necessarias para que os productos da industria nacional possam concorrer na exposição universal, que ha de realisar-se em Philadelphia no mez do maio do anno corrente.

Art. 2.° O governo dará conta ás côrtes do uso que fizer d'esta auctorisação.

Art. 3.° Fica revogada a legislação em contrario.

Ministerio das obras publicas, commercio e industria, 4 de fevereiro de 1876. = Antonio de Serpa Pimentel = Antonio Cardoso Avelino.

O sr. Ministro da Marinha (Andrade Corvo): — Mando para a mesa a seguinte proposta de lei.

N.° 10 - G

Senhores. — Ha muito que se reconhece a insufficiencia para o serviço dos quadros legaes do corpo de engenheiros machinistas e o dos seus auxiliares; esta insufficiencia aggravada de anno para anno com o augmento das machinas de vapor dos nossos navios, torna-se hoje de tal modo sensivel, que já não é possivel adiar por mais tempo um acrescimo de pessoal que realmente em nada importa á fazenda, e que só tem por fim remover as difficuldades e transtornos que resultam para o serviço, e muitas vezes o prejuizo da fazenda pelos meios extraordinarios a que tem de recorrer a administração.

Com effeito o quadro legal decretado em 6 de setembro de 1854 não póde satisfazer as mais strictas necessidades de hoje; bastará comparar os navios de vapor que ora possuimos, com os que n'aquella epocha contava a marinha, tanto em numero como em importancia de machinas, para se evidenciar esta verdade.

D'aqui a necessidade de inscrever no orçamento as verbas indispensaveis para o pessoal que tem de tripular os navios mencionados no mappa da força naval. Este addicionamento ao quadro legal eleva se já a um numero de individuos quasi igual ao do quadro, e como tem de ser composto de pessoas estranhas á corporação, é claro que se torna menos economico para a fazenda, e menos vantajoso para o serviço e disciplina pelo caracter de provisorio e de contratado, do que se constituisse quadro legal.

Provada assim a indispensabilidade de augmentar o quadro do pessoal do corpo de engenheiros machinistas navaes e b dos seus auxiliares, e provado tambem que este augmento em nada acrescentará a despeza publica, limitando ou tornando em um só os dois quadros inscriptos no artigo 6.º do orçamento, entendi dever formular e submetter á vossa illustrada apreciação a presente proposta de lei.

Entendi tambem dever tornar iguaes aos dos officiaes da armada os vencimentos dos engenheiros machinistas de 1.º, 2.º e 3.ª classe de iguaes graduações, quando em analogas commissões de serviço. As differenças que podem resultar são quasi nullas, e d'esta providencia resultam vantagens de ordem administrativa a que convem attender.

Sendo os ajudantes de 3.ª classe antes alumnos do que servidores, tenho por mais conveniente deixar dependente das necessidades do serviço o numero de individuos que annualmente devem admittir-se n'esta classe.

Outro tanto julguei vantajoso fazer quanto aos fogueiros e chegadores, ainda que fui levado a assim proceder por diversas considerações; podendo variar o numero destes individuos, que se torne indispensavel para tripular os navios, e não se dando identidade nem similhança de rasões ao que succede nas classes de engenheiros machinistas e dos seus ajudantes, pareceu-me mais economico regular por

essas necessidades a admissão dos fogueiros e chegadores.

Estas laboriosas classes estavam excessivamente mal retribuidas e d'ahi provém as difficuldades que tem havido muitas vezes para encontrar quem queira servir n'ellas; por isso proponho um pequeno augmento de vencimento, com o qual julgo que se removerão as difficuldades encontradas e se pratica um acto de verdadeira justiça.

As outras providencias de natureza propriamente administrativa são de tão evidente conveniencia que não carecem de justificação.

Proposta de lei

Artigo 1.° O quadro do corpo de engenheiros machinistas navaes compõe-se de:

Engenheiros machinistas de 1.ª classe, 10.

Engenheiros machinistas de 2.ª classe, 9.

Engenheiros machinistas de 3.ª classe, 20.

Art. 2.° Os auxiliares do corpo de engenheiros machinistas navaes constam de:

Ajudantes machinistas de 1.ª classe, 20.

Ajudantes machinistas de 2.ª classe, 30.

§ unico. O numero de ajudantes machinistas de 3.ª classe, bem como dos fogueiros e chegadores e determinado pelas necessidades da admissão ao serviço fixado annualmente pelo governo.

Art. 3.° As promoções desde ajudante machinista de 3.ª classe até machinista de 1.º classe, e de chegador a fogueiro effectuam-se, havendo vacatura, pelas regras e condições estabelecidas na legislação em vigor.

Art. 4.° Os individuos que se matricularem no primeiro anno do curso de machinistas e forem nomeados ajudantes machinistas de 3.ª classe ficam obrigados a servir na armada por espaço de seis annos, ou a indemnisar o estado de todas as quantias que tiverem recebido.

Art. 5.° Aos engenheiros machinistas navaes de 1.ª, 2.ª e 3.º classe, embarcados ou desembarcados em qualquer outra commissão são abonados todos os vencimentos que em iguaes condições de serviço pertencem aos officiaes de marinha, cuja graduação tiverem.

Art. 6.° Os ajudantes machinistas, os fogueiros e os chegadores terão os vencimentos fixados no mappa junto.

Art. 7.° Poderão ser readmittidos ao serviço da armada e nas posições que occupavam os ajudantes machinistas que tendo servido dois annos, pelo menos, em commissões de embarque, com boas informações dos seus commandantes forem julgados aptos pela junta de saude naval.

Secretaria d'estado dos negocios da marinha e ultramar, em 31 de janeiro de 1876. — João de Andrade Corvo.

Mappa dos vencimentos das praças auxiliares do corpo de engenheiros machinistas navaes

Embarcados

“VER DIARIO ORIGINAL”

Os fogueiros e chegadores, como praças de prol, não têem augmento de vencimento nas estações.

Secretaria d'estado dos negocios da marinha e ultramar,

em 31 janeiro de 1876. = João de Andrade Corvo.

O sr. Pereira de Miranda: —... (O sr. deputado não restituiu o seu discurso a tempo de ser publicado n'este logar.)

O sr. Ministro da Fazenda: — Eu não considerei a proposta do illustre deputado como uma trica parlamentar, faço justiça da intenções de s. ex.ª A questão de que se

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trata faz muita differença da questão das pautas que foi adiada ha dois annos para serem ouvidas varias corporações estranhas a esta camara e varios empregados.

Tratava-se da reforma de toda a pauta; era uma questão muito minuciosa e vasta, sobre a qual não havia ninguem mais apto para informar do que os verificadores das alfandegas e as associações commerciaes, de certo competentes para esclarecerem este assumpto.

Hoje trata-se de um unico ponto, muito conhecido, que ha mais de um anno foi apresentado, e cujo alcance póde facilmente ser apreciado pelos interessados sem novos estudos.

Eu no entanto não digo que o projecto da commissão é o mesmo que eu apresentei o anno passado, porque tem algumas alterações, mas são de pura fórma, porque na sua essencia não foi alterado.

E parece-me que, por elle, não se vae fazer concorrencia á industria bancaria.

Eu, quando se discutir este projecto, que aliás não está em discussão, hei de provar a inconveniencia do seu adiamento, e que nós não deveriamos nunca attender aos interesses de uma classe com prejuizo das outras, mas sim aos interesses publicos da communidade.

Diz o illustre deputado que ha dias approvou-se aqui uma proposta analoga á actual. Mas ali tratava-se dos direitos do assucar, assumpto que a commissão tinha alterado profundamente. Por consequencia, era um objecto completamente novo e era conveniente que todas as pessoas interessadas fossem ouvidas. Aqui não se trata d'isso, aqui trata-se de uma parte importante do projecto que em nada alterou a proposta governamental.

Portanto não ha motivo nenhum para se adiar o projecto, e póde entrar em ordem do dia quando V. ex.ª determinar.

O sr. Barros e Cunha — Mando para a mesa uma representação do sr. Antonio Vicente Peixoto Pimentel, o qual deseja estabelecer um hospital na ilha das Flores. Para esse fim offerece este cidadão uma casa conveniente, de que é proprietario, e pede á camara que habilite o ministerio do reino a poder conceder um auxilio pecuniario a fim de realisar, em condições vantajosas, o estabelecimento e a fundação do hospital, porque n'aquella ilha não ha absolutamente casa nem local em que possam ser recebidos os doentes, que têem de ser transportados para o hospital da ilha do Faial. Isto é muitissimo grave. Pedia a V. ex.ª que mandasse imprimir esta representação e a mandasse enviar ás commissões competentes para ellas, de accordo com o governo, tomarem a resolução que julgarem justa a este respeito.

Mando igualmente para a mesa outra representação dos industriaes que se occupam do fabrico do arame, os quaes representam á camara para que seja transformado o direito ad valorem, proposto pelo governo, por um direito especifico.

Peço tambem a V. ex.ª que esta representação seja mandada publicar, para que a camara tenha conhecimento d'ella. E quando se tratar da discussão d'este assumpto empregarei todos os recursos, fracos são elles, de que posso dispor, para provar que é fundada e justa, e que deve ser attendida a representação d'estes industriaes.

Mando ainda para a mesa uma nota de interpellação ao sr. ministro da fazenda, a fim de que s. ex.ª venha responder, perante o parlamento, ácerca da legalidade com que houve por bem resolver, n'uma portaria de 30 de outubro de 1875, as duvidas que se levantaram ácerca da applicação do artigo da pauta a respeito dos assucares que se achavam em deposito na alfandega do Porto.

Espero que s. ex.ª se dê por habilitado para responder a esta interpellação com a maior brevidade possivel, porque devendo-se discutir em poucos dias um projecto de, lei que se refere tambem aos assucares, póde d'esta interpellação resultar informações que possam dar logar a mudar

da idéa em que estou ácerca da resolução que o parlamento deve tomar sobre este complicado e gravissimo assumpto dos assucares refinados e não refinados.

Eu desejava muito que o sr. ministro das obras publicas fosse prevenido por algum dos seus collegas, que se acham presentes, de que desejo pedir a s. ex.ª explicações ácerca do methodo pelo qual se tem contratado o fornecimento dos carris de ferro para as linhas que o governo tem construido no Douro e Minho.

O sr. ministro das obras publicas allega no seu relatorio que «a elevação do custo kilometrico d'aquelle caminho de ferro proveiu de uma grande differença que houve no preço, por tonelada, dos carris de ferro». Mas eu tenho informações de que por parte do estado se não procedeu conforme é conveniente, no fornecimento do material de que o governo carece para os caminhos de ferro que está construindo; porquanto me consta, que se não fizeram publicas as condições do fornecimento de carris de ferro, de que o governo precisava, e que se contratou em Lisboa o fornecimento dos carris do caminho de ferro do Minho, com exclusão de propostas rasoaveis, que já anteriormente se tinham apresentado, com differença de preço muito consideravel contra o thesouro.

Tendo essas casas a esperança de que no districto do Porto se abrisse licitação para esse fim, e se desse conhecimento a todos os que eram interessados em concorrer para fazerem este fornecimento ao estado, ao contrario, se contratara sem licitação em Lisboa, e tiveram em resposta, quando foram saber o resultado das suas propostas, que os desenhos que acompanhavam essas propostas não eram tão perfeitos como os que tinham apresentado a casa com quem o contrato se tinha realisado.

Creio que em assumpto de carris de ferro os desenhos são talvez parte, de tal maneira insignificante, que não podem justificar por modo nenhum a differença de preço que vae de 9 libras e 10 schillings para 11 libras e 10 schillings, o que n'um grande numero de toneladas de carris de ferro dá contra o thesouro, e em favor da elevação do custo kilometrico de cada linha ferrea, uma importantissima differença, pela qual creio que a camara dos deputados deve ter toda a attenção, e examinar se os processos que o governo emprega nas suas construcções são aquelles que mais convem que se observem para proteger os interesses do thesouro.

Creio que a publicidade e o concurso não estão de maneira alguma em desharmonia com a ordem publica, com as instituições liberaes, com o progresso, nem com a instrucção primaria, nem emfim com as outras cousas a que o governo actual se dedica, e pelo que merece todo o conceito e todo o apoio da situação a que pertence.

Aproveito a occasião para fazer uma pergunta ao nobre ministro dos negocios estrangeiros. Tenho expressamente adiado tratar este assumpto pela gravidade que elle em si contém.

A nação portugueza acha-se hoje, na pessoa de um seu representante, debaixo do juizo de um tribunal da corte de Inglaterra. Ha muito que tenho na mão as publicações que se têem feito.

Diz-se que contra um homem chamado Albert Grant e outros se levantou, por parte dos accionistas do tramway, que de Lisboa se dirigia a Torres Vedras, uma acção de querela por abuso de confiança, em consequencia d'esses individuos terem subtrahido do capital de 200:000 libras, 40:000, as quaes, segundo é publico nos jornaes inglezes, se dizem distribuidas entre esse Albert Grant e outros individuos que dirigiram a operação financeira, e o nosso representante na corte de Inglaterra. Tão longe tem ido este negocio que o ministro da America, sendo implicado n'uma operação de igual ordem, chamada Emma mine, houve por bem apresentar como desculpa do facto que tinha praticado que, o que tinha feito o valente feld - marechal Saldanha, representante da nação portugueza o do

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Sua Magestade Fidelissima, no negocio do Larmanjat, não podia ser criminoso no general Schenck.

Sr. presidente, eu creio que este assumpto é gravissimo (apoiados), creio que o ministro de Portugal na corte de Londres deve estar completamente isento e puro de qualquer d'estas miserias humanas, que são companheiras indispensaveis da humanidade em toda a parte e dos individuos, mas que não são de certo indispensaveis nos representantes de uma nação, e principalmente no representante da nação portugueza junto da sua mais antiga e fiel alliada — a Inglaterra.

Eu não sei se d'aqui se terão levantado algumas difficuldades diplomaticas, não sei se com verdade se diz que a retirada de lord Lytton e a sua nomeação para governador da India, seria porque a Inglaterra entendeu, ou porque o governo inglez entendeu, não dever continuar a ter, depois dos factos que se passam em Londres, ministro acreditado junto da corte de Portugal.

V. ex.ª sabe muito bem que nas altas regiões da diplomacia estas cousas se passam de maneira que os effeitos se sentem, mas do modo menos sensivel que possa ser.

Eu não peço ao sr. ministro que dê actualmente informações publicas. O negocio é grave, e portanto talvez fosse conveniente que s. ex.ª o tratasse em sessão secreta. (Apoiados.)

Se o sr. ministro disser que «não é possível» eu estimo muito, porque só desejava poder cumprir o meu dever sem suscitar ao governo do meu paiz difficuldades de qualquer natureza.

E como nós os membros da opposição somos accusados pelo que fazemos e pelo que deixamos de fazer; pelo nossos ataques ao poder executivo e pela nossa abstenção quando não atracámos, prefiro acceitar a responsabilidade que posso acceitar, tomando em todos os negocios que são da minha competencia a parte que na minha consciencia eu entender que devo tomar, para esclarecer o paiz ácerca de assumptos que creio que ninguem póde considerar de somenos gravidade como aquelles que dizem respeito ás nossas relações internacionaes. (Apoiados).

O sr. Ministro dos Negocios Estrangeiros (Andrade Corvo): — Vou responder ao illustre deputado que acaba de fallar, e a minha resposta é tão simples que não exige nem sessão secreta nem que se estudem documentos, porque os não ha.

O illustre deputado não accusa o governo de faltar ao seu dever, mas insiste no assumpto referindo se a artigos de jornaes. Mas póde ser que alguem que faltasse ao seu dever queira lançar a responsabilidade a quem perante os tribunaes não póde ser chamado á autoria.

Não ha prova que demonstre a existencia do facto, e posso affirmar que ao illustre marechal duque de Saldanha não póde ser lançada em rosto nenhuma accusação d'esta ordem. (Apoiados.)

Já se tem accusado o illustre marechal de ter sido o concessionario dos caminhos de ferro Larmanjat, mas d'essa accusação estou eu prompto a defende-lo, porquê ella não foi nunca considerada uma offensa aos deveres da elevada posição em que s. ex.ª se acha por nenhum dos partidos do paiz, nem por aquelle que actualmente gere os negocios publicos, nem pelos outros que o precederam. De passagem observarei, que essa concessão foi feita em epocha, na qual nenhuma responsabilidade cabe ao actual gabinete.

Depois o illustre marechal tendo a concessão, cedeu-a a uma companhia que se constituiu e com a qual nada tem absolutamente.

Mas diz se: «Ha no fundo de tudo isto alguma cousa de grave, porque o distincto diplomata, que era representante de Inglaterra em Portugal, foi despachado para governador geral da índia». Por maior que fosse a gravidade do assumpto, de certo não podia ser este o motivo para o governo britannico elevar ao mais alto posto de administração ingleza aquelle diplomata. Lord Lytton foi nomeado governador geral da ludia pelas suas superiores faculdades e qualidades, que são respeitadas e conhecidas, não só em Inglaterra, mas por todo o corpo diplomatico da Europa.

Acrescenta-se ainda, que «o governo inglez não quer nomear representante para Portugal». Pois o illustre deputado não sabe que, segundo as praxes diplomaticas, não se deixa de nomear representante para um paiz com quem se conservam boas relações, porque desagrada o representante d'esse paiz e se deseja propôr a sua substituição, sem primeiro se ter feito sentir que aquelle representante não convem na corte onde está acreditado?

Tal facto, porém, não existe; nunca o governo inglez, nem directa nem indirectamente, indicou que o sr. duque de Saldanha estava mal n'aquella nação.

Isto não se deu nem se podia dar sem a nomeação de um representante de Inglaterra em Portugal ter sido precedida de avisos feitos nos termos em que esses avisos se fazem, isto é, muito respeitosos e com muita consideração, mas que admittem replica.

Tenho respondido. Estes são os factos que apresento com toda a singeleza. (Apoiados.)

Se o illustre deputado tem provas em contrario, eu ficarei verdadeiramente satisfeito de as examinar, porque não quero que Portugal seja representado por quem não seja digno d'essa honra. (Apoiados. — Vozes: Muito — bem.)

O sr. Presidente: — A hora está muito adiantada, vae entrar-se na urdem do dia. Se alguns srs. deputados têem requerimentos ou outros papeis a mandar para a mesa, podem manda-los.

Differentes srs. deputados reclamam a palavra.

O sr. Presidente: — Estão inscriptos; não podem fallar todos; agora vae-se entrar na ordem do dia. Eu peço aos srs. deputados que tenham a bondade de concorrer ás sessões mais cedo; de outra fórma vejo-me obrigado, não havendo nu mero á hora competente, a declarar que não ha sessão e a mandar publicar no Diario os nomos dos srs. deputados que. estiveram presentes.

O sr. Pedro Franco: — Peço a V. ex.ª que convide tambem os srs. ministros a virem mais cedo.

O sr. Barros e Cunha: — Eu creio que V. ex.ª me devia dar a palavra; mas V. ex.ª não quer, fica para outro dia.

O sr. Presidente: — Está inscripto. Passa-se á ordem do dia.

ORDEM DO DIA

Continuação da discussão do projecto sobre a instrucção primaria

, Lido e approvado o artigo 59° sem discussão, passou-se ao artigo 60.°

O sr. Barros e Cunha: — Eu não pedi a palavra para fallar sobre este artigo, porque o projecto tem de ir á commissão, tem de ser discutido de novo, as indicações e emendas que se tem apresentado são tantas e de tal modo variadas, eu tenho andado tão fóra d'esta discussão, porque faltei bastantes dias á camara por impossibilidade, que na realidade seriam deslocadas quaesquer considerações que eu agora podesse fazer ácerca de um artigo que se liga com todo o projecto, que tem soffrido tantas e tão profundas modificações.

Não desejava que na reforma da instrucção primaria se fosse alem d'aquillo que apresentei á camara em duas sessões consecutivas, isto é, crear escolas com a capacidade necessaria para poderem receber os alumnos das differentes circumscripções parochiaes; retribuir bem os professores; e deixar á junta consultiva de instrucção publica e ao governo a faculdade de fiscalisarem dia a dia, hora a hora, minuto a minuto os progressos do ensino, á medida que as reformas se fossem applicando, porque creio que a instrucção primaria se não torna proveitosa, que se não diffunde

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sem gastar dinheiro e muito dinheiro, e esta luta e esta avareza com que se regateia a instrucção elementar aos filhos do povo não é uma excepção no nosso paiz.

A instrucção primaria elementar tem sido regateada em toda a parte com uma tenacidade, á qual nós não devemos ter inveja de qualidade alguma. Na Allemanha, na Italia, na Russia, na Hespanha, e (para não deixar de fallar n'ella) na Inglaterra, quando lord Russell apresentou o primeiro bill ao parlamento para elevar a 700:000 libras a dotação da instrucção primaria, teve uma opposição tal que apenas venceu o bill por cinco votos, sendo necessario que mr. Macaulay, com a sua grande palavra, entrasse a fundo no debate, triumpho que lhe custou impopularidade tal, que nas seguintes eleições geraes não póde ser reeleito.

Como, porém, a commissão entende e o governo tambem que deve levar avante esta sua proposta de instrucção primaria, que estava combinada com a reforma administrativa, sem levar avante a mesma reforma administrativa, eu contento-me em que d'esta lei resulte alguma cousa boa, por mais insignificante que seja, e o meu proposito unico é poder contribuir para que mais alguma cousa boa lhe possa ser addicionada; e em harmonia com estas idéas, mando para a mesa um novo artigo, que offereço ao projecto, e o qual recommendo á benevola protecção do illustre relator e do meu honrado e velho amigo o sr. ministro do reino.

Estes dois cavalheiros, que creio interessados em promover quanto lhes seja possivel o progresso da instrucção primaria, e a opposição tambem quer a instrucção primaria (apoiados), não podem deixar de acceitar com sympathia a idéa do artigo que passo a ler e que offereço ao projecto, o qual peço que seja collocado no logar mais conveniente, por isso que não lhe designo numeração. (Leu.)

Peço ao meu amigo, o sr. ministro do reino, que proteja esta idéa, que a estude e modifique, se acaso a fórma pela qual a apresento não lhe parecer utilmente praticável; o que, porém, é necessario é que aos filhos do povo, que nas differentes circumscripções escolares se distinguirem por um talento notavel, o governo lhes facilite meios para que possam proseguir na carreira publica, cultivar o seu talento em utilidade do paiz e abrir-lhes assim o caminho para que possam competir com os filhos dos outros cidadãos que têem meios de poderem adquirir a educação litteraria, de que aquelles ficariam privados unicamente por falta de recursos. Não seria o primeiro exemplo de muitos d'estes filhos do povo humilde que unicamente pelo seu talento se têem tornado uteis, e muito uteis, á prosperidade das nações a que pertencem. (Muitos apoiados.)

O outro artigo é de menor consideração, e até desejaria que não fosse necessario. Refiro-me á faculdade que eu desejo que o governo tenha de designar os livros para a escola primaria, e escolher outros quando os auctores desses livros ou os seus editores elevarem o preço com que primitivamente tinham sido postos á venda. Na realidade está-se fazendo tal especulação industrial com a mudança constante, variando, alterando as edições dos livros elementares de instrucção primaria, que creio que é necessario tomar alguma precaução para que este abuso se não torne mais grave; eu contento-me já em que fique no que está.

O artigo é o seguinte. (Leu.)

Isto por este anno, e por esta discussão é tudo quanto eu posso e devo dizer ácerca do assumpto que se debate. Creio que este projecto de lei, ou este codigo, quando se realisar a reforma administrativa terá de soffrer ainda profundas alterações. Emfim, nós principiámos agora a olhar com mais algum cuidado e largueza, e a trabalhar com mais vontade, para a instrucção primaria; ella principia a ser um assumpto que por semanas de sessões seguidas tem occupado a attenção do parlamento e da imprensa. Estas cousas não se levam de assalto; e especo que, se continuarmos a olhar com muito cuidado e dedicação este assumpto, que

é um dos principaes e mais graves que deve merecer a attenção dos poderes publicos e do parlamento, elle virá occupar o logar que lhe pertence nos debates d'esta casa. Foram lidas as seguintes

Propostas

O governo é auctorisado a conceder um premio de réis 300$000 em cada circumscripção escolar, que será conferido triennalmente ao estudante que durante este periodo tiver concluido o curso de instrucção primaria, tornando-se notavel pelo seu extraordinario talento e que necessitar d'este auxilio para continuar os seus estudos. = Barros e Cunha.

O governo designará biennalmente os livros que hão de servir de compendios e de leitura nas escolas primarias do reino, d'entre os approvados, e ouvida a junta consultiva de instrucção publica.

§ unico. Se o editor ou auctor do livro, durante este praso, levantar o preço ao livro adoptado, o governo mandará proceder á escolha de outro. Barros e Cunha.

Foram admittidas, e ficaram conjuntamente com o artigo em discussão.

O artigo 60.º foi approvado.

O sr. Teixeira de Vasconcellos (por parte da commissão de instrucção publica): — Pedi a palavra para mandar para a mesa um requerimento, pedindo a V. ex.ª que consulte a camara sobre se ella consente que sejam aggregados á commissão de instrucção publica os srs. Thomás Ribeiro, Alfredo da Rocha Peixoto e Luiz de Lencastre.

Alguns membros d'esta commissão estão ausentes, e ha difficuldade em funccionar a commissão. N'esta difficuldade se funda o pedido.

Leu-se na mesa o seguinte

Requerimento

Por parte da commissão de instrucção publica requeiro que V. ex.ª consulte a camara sobre se consente que á mesma commissão sejam aggregados os srs. deputados Thomás Ribeiro, dr. Alfredo Felgueiras da Rocha Peixoto e Luiz de Lencastre. Este pedido funda-se na ausencia de alguns dos vogaes da commissão, a qual difficulta o serviço.

Sala das sessões, 7 de fevereiro de 1876. = 4. A. Teixeira de Vasconcellos.

O sr. Presidente: — Os srs. deputados acabam de ouvir o pedido que o sr. Teixeira e Vasconcellos acaba de fazer por parte da commissão de instrucção publica, para que lhe sejam aggregados os srs. Thomás Ribeiro, Alfredo Peixoto e Luiz de Lencastre. Os srs. deputados que approvam este pedido tenham a bondade de se levantar.

Está approvado.

Está na mesa outro pedido da commissão diplomatica, que ainda não foi votado, que vae ler-se. Leu-se na mesa o seguinte

Requerimento

Por parte da commissão diplomatica requeiro que V. ex.ª consulte a camara sobre se consente que á mesma commissão sejam aggregados os srs. deputados Ferreira de Mesquita e Julio de Vilhena, que ali se tornaram necessarios pela especialidade de alguns assumptos affectos á mesma commissão. — A. A. Teixeira de Vasconcellos, presidente da commissão.

Este requerimento foi tambem approvado.

Entrou em discussão o artigo 61.º

O sr. José Guilherme (sobre a ordem): — Mando para a mesa a minha moção. (Leu.)

Não é preciso fazer considerações algumas sobre esta proposta, por isso mesmo que ella tem de ir á commissão, e espero que a attenderá convenientemente, tendo em consideração que na actualidade os municipios não estão em circumstancias de poderem supportar os encargos que esta lei lança sobre elles.

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Leu-se na mesa a seguinte

Proposta

Considerando que da approvação e conversão em lei do projecto em discussão advirão incalculaveis vantagens para o paiz, pela diffusão da instrucção, que tão necessaria se torna;

Considerando, porém, que os encargos que advém não podem ser lançados sobre as municipalidades, attentas as circumstancias em que se acham, e os minguados recursos de que dispõem para poder supportar tão pesadíssimos onus; e

Considerando tambem que não é conveniente sobrecarregar o thesouro com um excesso de despesas sem o dotar convenientemente dos meios indispensaveis para lhe fazer face:

Proponho que, no projecto em discussão, se consigne a disposição de que fica a cargo do thesouro a continuação do pagamento de toda a despeza proveniente d'este projecto, a qual será satisfeita pelas receitas que as côrtes votarão annualmente sobre proposta fundamentada do governo, fazendo-se no projecto 33 alterações e modificações convenientes a harmonisar as suas disposições com este principio. = José Guilherme.

Foi admittida.

O sr. Pedro Franco: — Mando para a mesa a seguinte proposta. (Leu.)

Este artigo impõe ás camaras municipaes taes obrigações que dentro de pouco teremos em todas ellas conflictos iguaes aos que se têem dado em Cascaes, povoação que faz parte do circulo que eu tenho a honra de representar n'esta casa.

É impossivel que as camaras municipaes concorram para a instrucção primaria da fórma que o governo quer, continuando com os encargos que actualmente têem.

Para os recursos que têem já não é pouco pagarem aos administradores do concelho, amanuenses, officiaes da administração, etc. quanto mais satisfazerem ainda as despezas com a instrucção. (Apoiados.)

Por consequencia, eu desejo que este artigo seja adiado até que se trate da reforma administrativa.

Emquanto não for creada a receita, não podemos obrigar as camaras municipaes a satisfazer encargos para que não têem os meios necessarios. (Apoiados.)

Leu-se na mesa a seguinte

Proposta

Proponho o adiamento do artigo 61.° emquanto se não votar a reforma administrativa. = Pedro Augusto Franco.

Foi apoiado e admittido á discussão o adiamento.

O sr. Presidente: — Fica em discussão conjuntamente com o artigo.

O sr. Illidio do Valle: — Visto que com o artigo 61.° se discute o artigo 62.°, e para que eu possa responder ás observações que os illustres deputados quizerem fazer sobre elles, peço a V. ex.ª tenha a bondade de consultar a camara sobre se permitte que estes doía artigos estejam conjuntamente em discussão, e eu responderei depois em globo, mas resumidamente e como poder, ás observações que se fizerem com respeito a estes dois artigos.

O sr. Presidente: — O sr. relator da commissão propõe, que se discutam conjuntamente os dois artigos 61.° e 62.°, por terem entre si intima ligação. Vou consultara camara.

O sr. Pedro Franco: — Peço a palavra sobre o modo de propôr, porque me parece que a proposta do sr. relator da commissão não póde ter logar.

O sr. Presidente: — O sr. relator da commissão pediu uma cousa que se tem feito muitas vezes, e que está nas praxes parlamentares (apoiados). Os dois artigos discutem-se conjuntamente, mas votam-se separadamente.

O sr. Pedro Franco: — Eu mandei para a mesa uma proposta de adiamento do artigo 61.° Vejo que a praxe

aqui adoptada, salvo o respeito devido, não é bonita, o é, depois de apresentada uma proposta de adiamento, estar este sendo discutido com a materia principal.

V. ex.ª disse, que se discutia juntamente a minha proposta de adiamento com o artigo 61.°, pois eu peço agora a V. ex.ª que ponha á votação o adiamento: se for rejeitado, continua a discussão do artigo 61.°; se for approvado, não ha que discutir este artigo, e segue se o artigo 62.° Não me parece logico que se possa votar o artigo sem se dizer uma palavra primeiro sobre o adiamento, e este ser votado. A proposta de adiamento recáe sobre um artigo serio e grave, que traz ás camaras municipaes encargos superiores desde já a 469:000)>000 réis, e as camaras não têem meios. Vão impor-se-lhes despezas sera se votarem receitas e sem se votar a reforma administrativa. Se tivesse vindo primeiro á discussão essa reforma, já se sabia como as camaras haviam de crear receita para satisfazer a estes encargos, que são muito onerosos, muito graves e muito serios para as camaras e mesmo para as juntas de parochia (apoiados).

O sr. Presidente: — O illustre deputado não disse uma unica palavra sobre o modo de propôr.

O sr. Pedro Franco: — Pedi e peço a V. ex.ª que ponha á votação a minha proposta de adiamento; se for rejeitada, discute-se o artigo. Parece-me que isto é que' é regular.

O sr. Presidente: — Já foi annunciado pela mesa, que a proposta de adiamento apresentada pelo illustre deputado estava em discussão com o artigo, e quando a discussão findar vota-se primeiramente a proposta de adiamento, e se for rejeitada, vota-se o artigo a que elle diz respeito.

Agora vou consultar a camara sobre se permitte que se discutam os artigos 61.° e 62.° conjuntamente, como foi proposto pelo sr. relator da commissão

Constatada a camara, resolveu afirmativamente.

O sr. Pedro Franco: — Sr. presidente, sou forçado a dar as ratões por que apresentei a minha proposta de adiamento. A ratão é porque entendo que as camaras não podem com esta despeza sem se lhes dar liberdade para crearem receita, ou allivia-las de outros encargos.

O sr. presidente quer que se discuta o artigo conjuntamente com a proposta de adiamento; seja feita a sua vontade. Passarei a discutir o artigo 61.°

As camaras municipaes não podem satisfazer a este encargo, que é muito superior já a 400:000$000 réis, e d'aqui a pouco a 1.000:000$000 ou 1.200:000$000 réis, porque em as camaras pagando aos professores, V. ex.ªs verão quantas cadeiras novas se criam. Acreditem V. ex.ªs que de boa vontade ellas satisfariam a tal encargo se tivessem receita para fazer face a essa despeza; mas não podem, a não ser que as alliviem de outros encargos que não pertencem ao municipio, como, por exemplo, o pessoal administrativo.

As camaras, em geral, têem este encargo, que, alliviadas d'elle, chegaria para pagar aos professores de instrucção primaria; ou então dêem-lhes receita, como póde ser, por exemplo, o imposto do real de agua que o governo cobra.

As camaras tinham já a seu cargo a viação municipal, mas agora têem-a de um modo mais restricto e obrigatorio, que lhes impoz a lei de 6 de junho de 1864; e pela lei que estamos discutindo são tambem os paes, tutores, ou mestres de fabricas obrigados a pagar multas quando não mandem os filhos, pupillos, ou aprendizes á escola, multas que são cobradas a dinheiro pelas juntas de parochia, ou em trabalho pelas camaras municipaes.

As camaras têem já a terça do seu rendimento applicada á viação, bem como a decima parte de toda a receita municipal, e alem d'isso a receita das multas.

Toda esta receita tem restricta applicação á viação; emfim, ás camaras municipaes restam nos pequenos rendimentos que mal chegam para acudir aos incêndios, chafarizes, limpeza, illuminação, pessoal da camara, recenseamentos, casas para juizes ordinarios, verba para expostos,

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que é importante, para as creanças desamparadas, que tambem importa n'uma verba muito consideravel, e eu não sei d'onde ha de vir a receita para fazer face a tanto encargo! E ao passo que se vêem estas difficuldades, impõem-se multas aos vereadores que não pagarem aos professores mensalmente! Isto não póde ser.

E por isso que eu tenho pena de não ver primeiro discutir a reforma administrativa, para depois se poderem descentralisar os encargos para as camaras municipaes. (Apoiados.)

Quer V. ex.ª saber como as camaras municipaes vivem? Temos, por exemplo, a camara de Cascaes, que tem de rendimento 3:000$000 a 4:000$000 réis: como se pretende que ella satisfaça aos professores, se não tem meios? Ainda ha pouco o administrador do concelho commetteu um abuso, senão um crime, para crear receita para si e para a camara municipal, executando contribuições que foram lançadas em 1866 e 1867, e não relaxadas senão agora!

O administrador e mais empregados, se cobrarem tudo, arranjam de custas o seu 1:000$000 réis, e a camara 500$000 réis!

Aqui tem V. ex.ª como se cria receita.

O povo não quiz pagar estas contribuições, porque não tinham sido lançadas com as formalidades legaes, nem relaxados os conhecimentos em tempo competentes Hão se fizeram as matrizes, não estiveram patentes, não houve reclamações; n'uma palavra, não se cumpriu a lei n'um só dos artigos. Por consequencia o publico, que não teve conhecimento algum d'estas contribuições, não as quiz pagar.

Um advogado de Cintra foi com os contribuintes pedir ao administrador do concelho providencias, e porque um dos contribuintes se riu perante áquelle magistrado, foi logo preso!

Houve reclamações de varios individuos, e de pessoas as mais distinctas, que se queixaram de lhe estarem executando uma contribuição que não deviam, e a resposta foi a prisão arbitraria dos reclamantes.

Já ainda ha pouco o disse, sr. presidente; os impostos assim cobrados foram denominados em França, no tempo absoluto, «as dragonadas».

O administrador do concelho, para fazer respeitar a sua auctoridade, requisitou pelo telegrapho a força armada, que lhe foi immediatamente enviada pelo sr. ministro do reino.

E diz s. ex.ª que o povo está pagando voluntariamente!

Agora vou dizer á camara como se lançou esta contribuição.

No anno de 1866-1867 foram á matriz industrial e predial, e collectaram em dois e tres ¦ dias de trabalho todos os individuos que pagavam contribuições, sem ter em attenção a lei de 6 de junho do 1864, que determina que a nenhum individuo se possa lançar mais que tres dias de trabalho e n'uma distancia até seis kilometros. Lançou-se, pois, a contribuição de trabalho a homens e mulheres, e até a creanças, que hoje são soldados, e que estão sendo intimados para o pagamento.

Não se relaxou essa contribuição em tempo competente, e no fim de dez annos executa-se á força de armas! Isto é despotico, é anti-constitucional. (Muitos apoiados.)

(Susurro. — Vozes: — Ordem, ordem.)

O Orador: — Peço um momento de attenção á camara, porque isto é grave e serio.

A lei de 10 de junho de 1843 diz no artigo 3.° que não sendo relaxadas as contribuições municipaes, trinta dias antes de findar a gerencia das camaras, tornam-se os vereadores responsaveis por essas dividas, e é para elles vereadores que reverte toda a acção fiscal, e não para os originarios devedores.

Ora se a lei é má, emendem-a, mas emquanto estiver em vigor, e for lei do paiz, não poda á força de armas estar a fazer-se pagar o que se não deve. (Apoiados.)

Quer V. ex.ª saber como em Cascaes se cumpre e se interpreta esta lei? O administrador recebeu da camara municipal os conhecimentos relaxados em dezembro de 1875; as contribuições foram lançadas tumultuariamente, sem matriz, sem estar patente, sem haver reclamação de especie alguma, finalmente sem ninguem saber, senão agora, no fim de dez annos; e o administrador, executando administrativamente estes conhecimentos que não foram relaxados em devido tempo, faz uma violação da lei, porque deve executar os vereadores, e não os originarios devedores.

Eis aqui o motivo dos tumultos de Cascaes; e aos individuos que foram pedir justiça, respondeu-se-lhes obrigando-os a pagar com a força armada, o que ainda está succedendo, embora diga o sr. ministro do reino que elles pagam mui voluntariamente. Lá está a administração do concelho ainda rodeada de soldados, e é tal a influencia dos que pagam voluntariamente que ainda a tropa lá se conserva!

Serão estes os meios que as camaras municipaes terão para lançar impostos, a fim de satisfazer os encargos da instrucção? (Apoiados.) Se este artigo se votar, dentro em pouco as camaras municipaes hão de crear receita, não pelos meios legaes e ordinarios, mas á força de vexames, para não pagarem multas de seu bolso.

(Interrupção que se não percebeu.)

Se o sr. ministro do reino me affirmasse que trazia aqui a reforma administrativa, ainda dentro d'esta sessão, eu não tinha duvida de votar este artigo; de contrario voto contra, porque vejo que é a morte da instrucção publica e a morte dos municipios (apoiados); ou dêem poderes ás camaras municipaes para crearem receita, ou aliás é melhor acabar com as camaras; é melhor que o sr. ministro do reino as nomeie, acabe-se com a eleição popular, faça dos vereadores seus empregados com os respectivos ordenados, e dê-lhes então as suas ordens, e imponha-lhes quantas multas quizer. Quem é que ha de querer ser vereador com similhantes encargos? O que até aqui era considerado como um cargo honroso, é agora um empregado do sr. ministro do reino para ficar sujeito ás multas se não pagar aos professores, quer tenha quer não tenha dinheiro!

Pois se o ministro da corôa não é responsavel; quando não pague aos seus empregados, porque é que ha de ser um vereador de uma camara municipal responsavel quando não pague aos professores? Não comprehendo este modo de legislar. A lei deve ser igual para todos; isto é que é constitucional.

Se o sr. ministro do reino se dignar dizer alguma cousa em relação á promessa que ha tanto tempo fez a respeito da reforma administrativa, eu então direi o que se me offerecer a tal respeito; por agora limito-me a declarar que voto contra o artigo 61.°, não obstante estar, convencido que este projecto é tão inexequivel, que, findo o debate, vae invernar nas carteiras da illustre commissão de instrucção publica.

O sr. Mariano de Carvalho: —... (O sr. deputado não restituiu o seu discurso a tempo de ser publicado n'este logar.)

O sr. Visconde de Guedes Teixeira —...(O sr. deputado não restituiu o seu discurso a tempo de ser publicado n'este logar.)

O sr. Presidente: — A ordem do dia para ámanhã é a continuação da de hoje.

Está levantada a sessão.

Eram cinco horas da tarde.

Sessão de 7 de fevereiro

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