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na qual o Congresso ha de mostrar a sua justiça e imparcialidade.
Prescindo agora do facto da recusação da Rainha ao juramento da Constituição considerado em si mesmo; das circunstancias de que o mesmo facto he revestido; e das impressões que havia de fazer em o publico; por isso que ja não tem remédio algum. A Rainha obstinou-se no proposito de não prestar o juramento, e, agora não pode ja jurar. Quanto ao procedimento do Governo estamos em diversas circunstancias. Seria politico ou não que o Governo, tomasse o arbitrio que tomou relativamente a recusação da Rainha? Seria o Governo demasiadamente exacto e rigoroso? Não o pretendo decidir; nem isso agora me importa; porque se elle obrou dentro dos limites dos poderes que lhe forão dados, a elle pertence o louvor ou deslouvor dos actos que praticou, e inutilmente o Congresso os examinaria e qualificaria. Por tanto a questão única que temos a considerar he se o procedimento do Governo foi justo, isto he, conforme ou não conforme com a Constituição, e com a lei. Se foi conforme, ainda que fosse muito impolitico, nos o deveriamos sustentar; mas se elle não foi conforme com a Constituição e a lei, nos o devemos notar como tal, para ser rejeitado e desapprovado. He pois o verdadeiro estado da questão que vou a tratar. Se o procedimento do Governo, relativamente a Rainha, [...] e por isso começo e acabarei as minhas [...] com os actos praticados no dia quatro de Dezembro, isto he, com os dois decretos referendados pelo Ministro dos negocios do Reino, e com o relatorio que os acompanhou, e que o dito Ministro remetteu as Cortes. He necessario porem que esta materia se discuta com toda a delicadeza, e ao mesmo tempo com todo o sangue frio e imparcialidade, porque não se trata aqui nem de defender ou de combater a Rainha, nem de defender ou de combater o ministerio: trata-se só de averiguar a justiça e a verdade. A questão he gravissima; já mediarão quasi dois mezes desde o seu principio até hoje, e convém que se considere com frieza as razões que ha de uma e outra parte fim de que demos uma decisão tal, que nos [...] coberto da nossa propria responsabilidade para com os nossos concidadãos, e para com a posteridade.
Entrando pois no assumpto, parece a primeira vista que o negocio da Rainha estaria decidido no artigo 30 da Constituição que trata da divisão e independencia dos poderes. Representa-se logo a quem considera esta matéria que tratamos de uma lei, tratamos de um facto que esta em opposição com essa lei, tratamos da pena imposta ao que commette esse facto; e em consequencia temos facto, lei, e pena; o que suppõe a necessidade de um processo e de uma sentença. Se isto he assim, então evidentemente a desisão do Governo foi uma decisão injusta, porque deveria este negocio ter levado ao conhecimento do poder judiciario, o qual, segundo he expresso no artigo 176 da Constituição, he privativo dos juizes, sem que as Cortes, nem o Governo possão intrometter-se de maneira alguma no processo judicial.
Esta foi a opinião da pluralidade dos vogaes do Conselho d'Estado, porém o relatorio do Ministro dos negocios do Reino, referindo-se a ella, accrescenta, que este negocio não devia pertencer ao poder judiciario, porque não era duvidoso que a Rainha por ser chamada a presidir a Regencia, no caso do artigo 149 da Constituição, e pela qualidade de possuidora de bens nacionais, era obrigada a jurar: e por outra parte não se tratava da applicação de pena a facto illicito, mas sim das consequencias naturaes do acta livre de não adherir a Rainha ao pacto social. Sobre cada um destes argumentos farei algumas reflexões.
Diz primeiramente o Ministro, que não havia duvida alguma, que a Rainha fosse obrigada a jurar. Supponhamos que não havia duvida; ainda mesmo nesta hypothese era necessario o processo e sentença. Nos crimes notorios, e por mais notorios que sejão, necessario he o processo, necessaria he a sentença; e seria na verdade uma cousa de muito mao exemplo, e contraria a liberdade dos cidadãos, que com o pretexto de notoriedade de crime, immediatamente podesse o Governo applicar a lei ao facto. Ainda pois que não podesse haver duvida nenhuma sobre a obrigação que a Rainha tinha de jurar, assim mesmo era necessario um processo, assim mesmo era necessario que houvesse sentença.
Diz a Commissão que a Rainha era a propria que confessava, que tinha obrigação de jurar. He verdade que a Rainha disse que conhecia a lei, e se sujeitava a pena; mas isto não basta para fazer desnecessario o processo e a sentença. Prescindamos das razões que teria a Rainha para julgar que a lei a obrigava; pergunto eu, se a persuasão da Rainha fosse em contrario deveria só por si valer a favor della? E se fosse certissimo que a Rainha estava isempta de jurar, e apegar disso ella se confessasse sujeita a obrigação e não jurasse, por ventura diriamos, que a lei lhe era applicavel, e que em consequencia deveria sair de Portugal? Parece que não. Logo a confissão parte ainda que ella se julgasse comprehendida na lei não pode embaraçar a que se faça um processo, que se de uma sentença.
Mas, diz-se, que a lei manda, que todo o que não jurar a Constituição, por esse mesmo facto perca os direitos de cidadão, e immediatamente saia do territorio portuguez. Estas expressões parecem denotar que aqui não ha necessidade alguma de processo, e com effeito ja vi não sei aonde, que ellas erão trazidas para provar isto. Mas as nossas leis tem especies muito particulares analogas a este caso, e eu desejaria que ellas tivessem sido tomadas em consideração por quem tratou este negocio. Ha uma lei muito conhecida, que he a ordenação do livro 2.º til. 37 a qual determina que a mulher que tiver bens de corte, e casar sem licença d'ElRei, por este mesmo facto perca esses bem. Apezar desta lei, e apesar de ser tão facil de provar o facto do casamento, com tudo não se applica a pena, sem que haja um processo, e uma sentença. Esta he a pratica do foro, e as leis marcão qual he a pessoa que pôde oppor perdimento de bens em que incorra a mulher que casa deste modo, e qual o juizo onde se deve conhecer deste facto. Ha outra especie ainda a notar, e vem a ser a ordenação do livro 2.º til. 15, pela qual os que