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imperão provisões de Roma contra as graças concedidas a ElRei ou a Rainha, por isso mesmo ficão desnaturalizados, e perdem a fazenda que tiverem ou esperarem herdar. Mas apezar da expressa disposição da lei ainda neste caso não se pôde incorrer na pena sem processo e sentença, do que com effeito temos exemplos assas conhecidos no foro. De maneira que se pode estabelecer em regra, que quando as leis dizem, que o que commetter tal facto, por isso mesmo soffrera tal pena, apezar de se explicarem assim, necessariamente ha de haver um processo e sentença; e so quando a lei diz, que sem processo e sentença, se deve executar a lei, de que também temos exemplos na nossa legislação, so então he que não he necessario o processo e a sentença. Temos pois, que o primeiro principio que estabelece o Ministro dos negocios do Reino no seu relatorio, de que não havia duvida, que a Rainha devesse prestar o juramento, não he por si mesmo suficiente.
Vejamos porém se he exacto, isto he, se a Rainha tinha obrigação de jurar por algum dos dois motivos que o ministro aponta, ou por ser chamada a regencia provisional do reino, ou por possuir bens nacionaes. A Rainha he chamada a regencia provisoria do reino pelo art. 149 da Constituição, mas he excluída pelo art. 148 da regencia permanente, o que faz que seja muito duvidoso, que a Rainha deva ser considerada como funccionario publico, pois facil he de perceber que por outro mui diverso motivo he que a Constituição a chama para presidir a uma regencia que só tem lugar quando as Cortes não estão reunidas, e que deve durar mui poucos dias, em quanto ellas se não reunem extraordinariamente. Mas o caso he que ainda quando a Rainha he chamada para presidir a regencia provisional, só então he que he obrigada a prestar o juramento na forma do artigo 151: d'onde parece seguir-se, que antes disso não tinha obrigação de prestar o dito juramento na qualidade de regente provisoria.
O segundo motivo he um pouco mais difficil de decidir: consiste elle em ser a Rainha possuidora de bens nacionaes? Por mais que se diga em contrario, nada se diz que mereça attenção; pois que eu estou persuadido de que a Rainha he possuidora de bens nacionaes e uma verdadeira donataria da coroa. A casa da Rainha provém da coroa, e se não em todo, ao menos em grande parte. As Rainhas de Portugal a possuem de tempos antiquissimos; nellas exercitavão até agora amplíssima jurisdicção, que so lhes podia provir da coroa ; e esta posse e exercício durava por toda a sua vida; porque so em virtude do artigo 137 da Constituição seria a actual Rainha a primeira que perdesse a casa no caso em que viuvasse: porém esta situação que fez a Constituição não tira a Rainha a qualidade de donataria, ou de possuidora de bens nacionaes, em quanto ElRei seu marido for vivo; pois que não he da essencia das doações da coroa serem ellas feitas de juro e herdade, ou em vidas de uma ou mais pessoas, ou por outro qualquer espaço de tempo. Além disto as nossas leis sempre considerão as Rainhas como donatarias, e a Ordenação Manoelina determina em dois titulos separados como as Rainhas usarão da jurisdicção que por ElRei lhes he dada, e o regimento de que deve usar o ouvidor das suas terras. Supprimirão-se estas disposições na Ordenação Filippina, por isso mesmo que pela occupação do Reino feita pelos Reis Catholicos a casa das Rainhas se incorporou na Coroa, apezar disso em um ou logares desta Ordenação se considerão as Rainhas como donatarias; e he sem duvida que ElRei D. João IV logo que subio ao trono, fez doação a Rainha D. Luiza da antiga casa das Rainhas da maneira que ellas a tinhão e possuão, fazendo incorporar na carta de doação os dous titulos da ordenação manoelina que ja mencionei. He logo a Rainha uma verdadeira donataria e possuidora de bens nacionaes; e por isso nesta qualidade esta no caso da lei de 10 de Outubro, e deve prestar o juramento a Constituição? Mas qual sera a razão, porque a Rainha devera ser excluída de prestar este juramento como outros pertendem?Sera por ventura por ser Rainha inviolavel? Isto he uma cousa inteiramente pueril, porque a Rainha não so pela nossa Constituição, mas pelo direito antigo portuguez sempre foi sujeita as leis civis da Nação. Sera porque a lei fala das mulheres, e não especifica as mulheres casadas? Parece-me isto de pouco pezo, porque as mulheres casadas posto que para a maior parte dos effeitos se julguem representadas por seus maridos, nem por isso fazem com elles uma pessoa moral; algumas cousas ha em que especialmente se requer o seu consentimento: por exemplo, he preciso citar a mulher quando se move contra o casal alguma acção de revendicação; e exige-se o seu consentimento para a hypotheca e venda convencional ou judicial de bens de raiz. Por isso d'ElRei ter jurado a Constituição, não se segue que a Rainha não a deva jurar, sendo ella como alias he uma verdadeira donataria.
A única razão forte que me move a duvidar se a Rainha he ou não obrigada a jurar, he a sua qualidade de estrangeira: e eis-aqui o que ainda não achei notado em nenhum dos escritos que tratão desta materia, e que me parece observação inteiramente nova. A lei de 10 de Outubro diz muito expressamente no artigo 11 que "os cidadãos portuguezes que se acharem em paizes estrangeiros, possuidores de bens nacionaes nos termos do artigo 1.º, dem o juramento a Constituição." O artigo 12 diz que "os portuguezes que desfrutão bens d'antes denominados da coroa, serão delles privados se não mostrarem haver jurado a Constituição, "E continua o artigo 13 que "todo aquelle (portuguez dizia a fonte d'onde este artigo foi tirado) que sendo obrigado pelo presente decreto a jurar a Constituição, recusar cumprir tão religioso dever perdera a qualidade de cidadão, e saira immediatamente do territorio portuguez." He pois expressissimo, que somente os cidadãos portuguezes, que possuem bens da coroa, são obrigados a prestar juramento; e que todos aquelles que não são cidadãos ainda que por dispensa de lei possuão bens dos chamados da coroa e ordens, e ainda que por isso sejão rigorosos donatarios, não tem pela lei obrigação alguma de jurar, nem lhe pode ser applicada a pena de saírem para fora do reino.
Se a Rainha he ou não cidadã portugueza, isto

Tom. I. Legislat. II. Ii