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DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS

«Considerando, por fim, quanto importa a exacta o fiel execução das leis, e a remoção dos inconvenientes, das fraudes e abusos, que impunemente têem sido praticados, em prejuizo da justiça, da moralidade e do serviço publico:

«A camara dos deputados declara, que deve manter-se em pleno vigor o principio fundamental da lei de 17 de abril de 1873, que revogou toda a legislação, que facultava as fianças e remissões por dinheiro, e entende que n'este sentido deve ser executada a lei vigente, ficando de nenhum effeito as portarias em contrario.

«Sala das sessões, em 8 de fevereiro de 1876. = O deputado, Antonio José Boavida.»

Peço a V. ex.ª e á camara que me permittam, no intuito de fundamentar a minha proposta, adduzir algumas reflexões; e d'esta fórma responderei tambem ás observações ligeiras, que sobre este assumpto fez o sr. ministro do reino.

Disse s. ex.ª que a sua portaria não era alteração, mas consequencia da lei.

Eu não posso comprehender como, de premissas diversas, possam tirar-se as mesmas consequencias! Não posso comprehender como, de principios diametralmente oppostos, possam deduzir-se as mesmas conclusões! (Apoiados.)

Este milagre de logica, que Genuense não saberia operar, operou-o o sr. Antonio Rodrigues Sampaio! Mas" o que admira é que s. ex.ª, só passados tres annos, venha tirar as consequencias de uma lei, que votou e referendou em 1873! (Apoiados.)

Hei de demonstrar, que essas consequencias não se contem nas premissas, pois que a portaria do sr. ministro do reino é contraria, não só á letra, mas ao espirito da lei, actualmente em vigor. (Apoiados.)

Eu não faço questão da palavra remissão ou substituição. No campo em que s. ex.ª collocou este assumpto, acceito qualquer d'estas expressões, á escolha de s. ex.ª, porque ambas exprimem a mesma idéa, e dão o mesmo resultado pratico. (Apoiados.)

Pois, que importa que se diga que qualquer mancebo recrutado foi remido ou resgatado da obrigação do serviço militar, entregando o preço da remissão, conforme se permittia na lei antiga, hoje revogada, ou que elle se resgata d'essa obrigação, apresentando um substituto, ou entregando a somma necessaria para contratar esse substituto?! Que differença essencial ha n'isto?! (Apoiados.)

(Interrupção do sr. Manuel d'Assumpção.)

O pensamento da lei de 1859 era a remissão, e a remissão tinha por fim contratar tambem substitutos. (Apoiados.)

(Interrupção do sr. Camara Leme.)

Se não se executou a lei, a culpa não foi minha.

(Nova interrupção do sr. Camara Leme.)

Os mesmos inconvenientes, que se davam então, são os que eu receio, que se repitam agora. (Apoiados.)

Quer se chame remissão, quer se chame substituição, o resultado pratico é o mesmo (apoiados). O processo é que é differente. O systema antigo era mais summario e mais commodo. Agora a differença é para peior, porque se admitte, como intermediario, o fiador, que póde satisfazer as condições da lei do recrutamento, ou apresentando o recrutado, ou apresentando o substituto, ou finalmente apresentando a somma necessaria para contratar a substituição. (Apoiados.)

Por consequencia, temos resuscitadas as remissões ou substituições por dinheiro. Chamem-lhe como quizerem, não faço questão de palavras, como fez o sr. ministro do reino; e muito me surprehendeu, que s. ex.ª, que nós vemos muitas vezes arvorar-se em mestre da lingua portugueza, e ate da latina, não achasse outra desculpa e explicação para a sua portaria. (Apoiados.)

Disse, que havia de demonstrar que a portaria do sr. ministro do reino é contraria, não só & letra, mas ao espirito da legislação vigente, e para demonstrar isto, peço licença para ler a portaria e a lei, que ella pretende revogar.

«No intuito de facilitar aos mancebos recrutados para o serviço militar o cumprimento da respectiva obrigação, facultou a portaria de 5 de maio de 1862, publicada no Diario do governo n.º 101, a concessão do praso de oito dias para a apresentação de substitutos aos recrutados que, depois de approvados pelas juntas revisoras, manifestassem a vontade de satisfazer, por esta fórma, a obrigação do serviço; havendo, porém, a experiencia mostrado os inconvenientes, que resultam para o serviço do recrutamento, da concessão d'este beneficio e os abusos e fraudes que, & sombra d'elle, se têem praticado: manda Sua Magestade El-Rei declarar aos governadores civis dos districtos do continente do reino e das ilhas adjacentes, que d'ora em diante os recrutados, julgados aptos para o serviço militar pelas juntas revisoras, que preferirem fazer-se substituir, devem apresentar em acto continuo os substitutos para assentarem praça, desde logo, em seu logar; concedendo-se o praso, estabelecido na portaria de 5 de maio de 1873, unicamente aos recrutados que derem fiador idoneo, o qual se deve obrigar a apresentar o afiançado, ou o substituto nas condições de assentar praça, ou a pagar a somma que for necessaria para contratar um substituto.

«Paço, em 19 de janeiro de 1876. = Antonio Rodrigues Sampaio.»

N'esta ultima clausula parece-me ver o abuso, infracção de lei e até um escandalo, como hei de demonstrar, segundo a opinião do sr. presidente do conselho e do proprio sr. Sampaio. Permitta-me, pois, V. ex.ª que leia o artigo 3.° da lei de 17 de abril de 1873, que devia estar em vigor, se as leis se executassem fielmente.

E o seguinte:

«Desde a data da publicação da presente lei, nenhum individuo apurado para o serviço militar, no exercito ou na armada, qualquer que seja o contingente annual, a que tenha pertencido ou venha a pertencer, poderá remir-se da obrigação do mesmo serviço, salvo por meio de apresentação de um substituto, nos termos da lei vigente, podendo esta substituição ter logar quer antes, quer depois do alistamento do substituido.»

Os termos do artigo são muito claros, genericos e peremptorios. O artigo diz, que nenhum individuo poderá remir-se da obrigação de serviço, senão pela apresentação de um substituto. (Apoiados.)

Não vejo phrase alguma, que possa auctorisar, quer implicita, quer explicitamente, a substituição por dinheiro, e por consequencia, esta lei exclue a ultima clausula da portaria, de se poder remir por qualquer somma...

O sr. José Guilherme: — Não diz isso.

O Orador: — V. ex.ª não ouviu ler a portaria. Eu vou lê-la novamente: mas lerei sómente a ultima parte, que é onde está principalmente a illegalidade. (Muitos apoiados. — Leu.)

A idéa de fiador tambem não está na lei. (Apoiados.) A fiança tambem foi abolida por essa lei de 1873. As fianças, que eram permittidas pelas leis de 1855 e 1859, foram revogadas pela lei posterior; nem podiam deixar de o ser. N'essas leis permittia-se aos mancebos, que se ausentassem para paizes estrangeiros, que dessem fiadores; mas n'esse tempo todos sabem, que se permittia geralmente a todos os recrutados a remissão ou substituição por dinheiro, e por consequencia era o mesmo principio que se admittia no continente para todos. Mas, depois de 1873, seria uma injustiça e desigualdade conservar esse privilegio sómente para os que quizessem ausentar-se do paiz, offerecendo-se assim estimulo, garantias, e convite á emigração. (Muitos apoiados.)

Como disse, a portaria do sr. ministro do reino é contraria á letra e ao espirito da legislação vigente...

(Interrupção do sr. José Guilherme.)

Sessão de 8 de fevereiro