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DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS

Discurso do sr. deputado Silveira da Mota, que de veria ter sido publicado a pag. 232 da sessão de 7 de fevereiro

O sr. Silveira da Mota: — O facto a que se refere a interpellação que hoje se verifica, facto perfeitamente exposto pelo sr. Mariano de Carvalho, deve merecer deveras a attenção da camara,

Um medico illustre, pelo talento, pela sciencia, pela modestia, pelos assiduos e relevantes serviços prestados durante muitos annos no hospital de S. José, julgou conveniente publicar n'um jornal de medicina algumas justissimas considerações sobre as condições hygienicas e diversos serviços do referido hospital.

Eram nobres as intenções do individuo que assim sacrificava os seus interesses ao bem geral, foi sempre sensata, delicada e benevola a sua critica, mas não obstante isto, a administração d'esse estabelecimento de caridade entendeu dever queixar-se ao sr. ministro do reino contra o homem que, na ingenua confiança de que n'este paiz era livre a manifestação do pensamento, ousava dizer a verdade, que a muitos Convem encobrir.

Dada a queixa, o sr. ministro do reino, cedendo a sugestões apaixonadas, não teve duvida em expedir a portaria de que se trata, mandando reprehender o facultativo, não por qualquer falta praticada no hospital, como hoje allega, mas pelo uso discreto e legitimo de um direito incontestavel.

Tenho aqui a portaria publicada, em que se manda reprehender o sr. Alves Branco. Não ha n'ella indicação alguma de que a reprehensão se refira a falta de serviço, ha a prova manifesta de que apenas teve por fim punir o medico por ter publicado pela imprensa as considerações que julgou opportunas.

Hoje a defeza apresentada pelo sr. ministro do reino, defeza aliás improcedente, porque os factos indicados por si ex.ª estão - longe de ser verdadeiros, não é senão uma evasiva para se desculpar da portaria que estou persuadido que não leu. Fago justiça ao seu talento e á sensatez que tem mostrado nos actos da sua vida, para estar perfeitamente convencido de que s. ex.ª não leu, ou pelo menos não leu com attenção a portaria antes de a assignar.

O sr. Ministro do reino: — Li.

O Orador: — Mas ha mais ainda. O sr. ministro do reino expedindo este documento, digno de situações julgadas e condemnadas, e de tempos que. felizmente não hão de resurgir, quaesquer que sejam os esforços que para isso empreguem alguns pseudo amigos das instituições liberaes, offendeu o sr. Alves Branco no que ha de mais melindroso para o homem honrado — a consciencia da propria dignidade. Aquelle cavalheiro preferia a demissão ou qualquer outra pena a uma reprehensão, ridicula pelo modo porque foi determinada e pelo modo porque foi cumprida (apoiados).

Menciona o sr.'ministro do reino as differentes acusações que se fazem no artigo incriminado. Tambem quero referir-me a essas accusações. Vejamos o que n'ellas se allega.

Disse o sr. Alves Branco que os remedios applicados aos doentes eram mal preparados ou de qualidade inferior, a alimentação fria e mal feita, defeituoso o serviço das enfermarias, mal organisado o serviço medico, e tão más as camas que muitas vezes produziam chagas mortaes.

Examinemos o que ha de verdade n'essas acusações.

«Os remedaos applicados aos doentes, mal preparados, ou de qualidade inferior

É sabido que muitas vezes no hospital os remedios não surtem os mesmos effeitos que produzem cá'fóra, d'onde se infere, que ou elles são de inferior qualidade, ou não são preparados como era necessario que o fossem (apoiados). Os cirurgiões não podem examinar os remedios que se applicam aos doentes, porque muitas vezes para isso seria até necessaria uma analyse chimica demorada e difficil, mas pelos effeitos conhecem se as drogas com que os prepararam! são ou não as que deviam ser.

E evidente que na pharmacia do hospital devem todos os remedios ser bons. E evidente tambem, pela confissão dos medicos, que não succede assim. E note bem o sr. ministro dó reino que este facto não é de hoje, é facto conhecido ha muitos annos, e de tal modo conhecido, que a propria administração do hospital não leve duvida em nomear uma commissão de inquerito á botica, composta dos srs. doutores Cunha Vianna, Beirão e Alves Branco, os quaes entenderam que aquella repartição estava imperfeitamente organisada, e que o seu administrador era incompetente para as funcções que exercia.

E todavia uma grande parte dos defeitos notados subsistam ainda, e o administrador que então se julgava incompetente para gerir essa repartição, continua á testa d'ella.

«Alimentação fria e mal feita». Para isto basta saber-se que ha uma só cozinha no hospital de S. José, que d'essa cozinha vae a comida em taboleiros, sem luz nem agua quente, não só para os differentes andares do immenso edificio, mas ainda para os hospitaes da calçada de Sant'Anna e do Desterro (apoiados).

O sr. Alves Branco, dizendo que a alimentação muitas Vezes chegava fria ás enfermarias, nunca se referiu á sua propria, referiu-se aos factos conhecidos em relação ao hospital, que devia tornar mais publicos para que mais reclamado se tornasse o remedio.

«Deffeituoso o serviço das enfermarias. Para se conhecer quanto esse serviço é Deffeituoso, basta saber-se que durante a noite, quando os doentes precisam de vigilantes cuidados e muitas vezes de difficil curativo, não ha nas enfermarias senão os chamados praticantes, sem habilitações bem experiencia alguma, porque ninguem está encarregado de os ensinar! (Apoiados.)