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DIARI0 DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS
me encontro, não tenho que combater, e as explicações que tenho que dar á camara, por isso que tendo tratado esta questão em 1875, hoje tenho algumas modificações a fazer ao meu voto de então; digo, essas modificações apresental-as-hei quando o projecto se discutir na especialidade. (Apoiados.)
N'essa occasião apresentarei a minha opinião, e portanto parece-me que o que havia a fazer, era votar o projecto na generalidade, e quando vier á discussão, de novo então fallarei.
Como eu não tenho a quem combater, por isso que todos que se seguiram fallaram a favor, cedo por isso agora da palavra.
Vozes: — Votos, votos.
O sr. Avila: — A hora está muito adiantada e a camara parece-me tão fatigada e impaciente, que se não fosse o convencimento que tenho de que é conveniente fazer sobre este importante assumpto algumas considerações, que ainda não foram apresentadas pelos illustres oradores que me precederam, eu desistiria da palavra; mas tendo tambem assignado com declarações o projecto que se discute, corre-me a obrigação de explicar a rasão do meu voto.
Não trato de marear preferencias entre as duas linhas da Beira Alta e da Beira Baixa, mas na questão que se debate, cumpre-me dizer que estou de accordo a respeito das vantagens que devem resultar do estabelecimento de uma linha ferrea que atravesse a região da Beira Alta; não só porque é de esperar um largo desenvolvimento na queza agricola e industrial d'aquella provincia com um tão poderoso instrumento de progresso, mas ainda porque em relação ás nossas communicações intornacionaes, esta linha ferrea representa um notavel melhoramento, encurtando de cerca de 500 kilometros o percurso entre Lisboa e a fronteira franceza.
Mas se estou de accordo emquanto á conveniencia da construcção d'esta linha, não succede o mesmo com relação á opportunidade da sua construcção.
Diz-se que é uma necessidade inadiavel construir o caminho de ferro da Beira Alta; é n'este ponto que principalmente discordo da opinião dos meus illustrados collegas das commissões de fazenda e obras publicas. Para mim ha uma necessidade que se deve primeiramente considerar sempre que se trate do emprehendimento de obras d'esta importancia, é a de attender ás condições da fazenda publica e examinar se ella póde satisfazer aos encargos de taes commettimentos.
Vejamos pois quaes serão os encargos, e do exame ha de resultar, segundo me parece, que não é acto de boa administração emprehender nas circumstancias actuaes a construcção d'esta linha.
No relatorio que precede a proposta de lei, sobre a qual recaíu o parecer que se discute, dizem os srs. ministros da fazenda e das obras publicas que o custo do caminho de ferro da Beira Alta não será, inferior a 7.500:000$000 réis.
Estava inteiramente de accordo com esta primeira opinião de s. ex.ªs; o caminho de ferro da Beira Alta ha de custar uma somma superior a 7.500:000$000 réis, e muito. Mas hontem o illustre ministro das obras publicas disse-nos que da revisão dos orçamentos e da sua comparação com obras identicas dos caminhos de ferro do Douro e Minho, tinha resultado para os distinctos engenheiros os srs. Matos e Eça, e para s. ex.ª, a convicção de que o caminho de ferro da Beira Alta não custaria uma somma superior a 34:800$000 réis por kilometro, ou 35:000$000 réis, cifra redonda.
Eu, não podendo estar de accordo com a primeira opinião de s. ex.ª, não posso de modo algum concordar com a segunda.
Mas, admittindo que a obra custa sómente 7.500:000$000 réis, como s. ex.ª se propõe a levantar esta quantia por uma emissão de titulos com o encargo maximo de 7 por cento, titulos similhantes aquelles que foram emittidos para a construcção dos caminhos de ferro do Douro e Minho, não sei qual tenha sido a base do calculo de s. ex.ª para nos fallar em uma annuidade de 525:000$000 réis durante cincoenta e seis annos!
A annuidade de 522:000$000 réis em cincoenta e seis annos produz não 7.500:000$000 réis, mas representa réis 31.400:000$000!
Segundo a proposta do governo é esta a quantia que nos vae custar este caminho de ferro!
Os 31.400:000$000 réis são na hypothese do caminho custar 7.500:000$000 réis; segundo os calculos que o sr. ministro das obras publicas nos apresentou hontem, como o custo da linha seria apenas de 35:000$000 réis por kilometro, e como por consequencia a annuidade se reduziria a 402:000$000 réis, a importancia d'esta annuidade em cincoenta e seis annos já não representa réis 31.400:000$000, mas sim 29.460:000$000 réis. Qualquer d'estes resultados merece ser seriamente meditado.
Ha ainda outra circumstancia a attender. E que, na hypothese de que o caminho custaria 7.500:000$000 réis, como esta somma ha de ser obtida por uma emissão de obrigações, e como essas obrigações não serão collocadas ao par segundo todas as probabilidades, o encargo não será de 525:000$000 réis, conforme e calculo de s. ex.ª; mas ha de ser de 525:000$000 réis mais o encargo das obrigações, que se emittirem a mais dos 7.500:000$000 réis nominaes para perfazer realmente esta quantia. Mais uma rasão para que o custo d'este caminho de ferro não seja aquelle que s. ex.ss calculam.
O illustre ministro das obras publicas, nas proficientes considerações que fez hontem ácerca das causas que determinaram a consideravel elevação do custo kilometrico das linhas do Douro e Minho, não fez mais do que explicar o seu extraordinario augmento sobre o custo kilometrico calculado.
Mas o facto é que a linha do Douro nos custa talvez réis 55:000$000 por kilometro, e a do Minho custa-nos uma somma que excede tambem muito o orçamento primitivo.
Eu sei perfeitamente quaes foram as causas que principalmente influiram para, que o custo kilometrico das linhas do Douro e Minho subisse tanto sobre o preço calculado, e devo mesmo dizer algumas d'ellas, que são tambem communs ao caminho de ferro da Beira Alta.
Tanto n'um como n'outro caminho foi necessario fazer um grande numero de obras de arte para atravessar a região percorrida por estas linhas, que principalmente na linha do Douro é muito accidentada. N'este ultimo caminho, e refiro-me de preferencia ao do Douro, porque comquanto o sr. ministro das obras publicas conheça ambos, é aquelle que s. ex.ª especialmente conhece, visto que esteve por muito tempo sob a sua alta direcção, foi preciso fazer entre outras obras, dez tunneis todos revestidos com 4:270 metros de extensão; doze viaductos, ou grandes pontes, com 1:922 metros de comprimento, e desde que o caminho entra no Valle do Douro, os muros de supporte succedem-se quasi sem interrupção.
A perfeição com que foram executadas as obras é tambem causa do augmento do custo kilometrico do caminho, mas uma circumstancia que infiuiti muito consideravelmente para este augmento, foi a elevação extraordinaria dos salarios e do custo dos transportes, augmento que não póde deixar de se dar sempre que se trate do emprehendimento de grandes obras n'um paiz pequeno.
Por consequencia, se o governo pretende construir agora o caminho de ferro da Beira Alta, sem estarem concluidos os caminhos de ferro do Douro e Minho, esta circumstancia que tanto influiu no augmento do custo kilometrico d'aquelles caminhos, ha de necessariamente contribuir para que nos fique muito mais caro o caminho de ferro da Beira Alta.
Ora, os caminhos de ferro do Douro e Minho custam-nos
Sessão de 12 de fevereiro de 1878