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DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS

Discurso do sr. deputado Pires de Lima, proferido na sessão de 12 do corrente, e que deveria ler-se a pag. 314 col. 1.ª d'este Diario

O sr. Pires de Lima: — Não posso infelizmente ser tão breve como o meu collega e amigo o sr. deputado Pereira de Miranda, que me procedeu n'esta discussão. Tenho de apresentar algumas considerações, não sobre a generalidade da proposta do governo, que aceito tambem, mas sobre o artigo 11.°, o qual me parece estar formulado de um modo muito generico. E desde já peço desculpa á camara, se tiver de cansar por algum tempo a sua attenção. As considerações talvez longas que tenho de adduzir são indispensaveis para justificar duvidas que me occorrem a respeito do artigo ao qual acabo de me referir.

O sr. ministro da fazenda diz no artigo 14.º da sua proposta «são revogadas todas as isenções de sêllo feitas por leis especiaes». A illustre commissão de fazenda, mantendo este pensamento, formula-o da seguinte maneira no artigo 11.°: «São revogadas todas as isenções de pagamento do imposto de sêllo, feitas por leis especiaes, e não comprehendidas na tabella n.º 4, annexa ao regulamento de 2 de dezembro de 1869, na parte em que não é alterada na presente lei».

A fórma é differente, a idéa é a mesma. O sr. ministro da fazenda e a illustre commissão estão de accordo em acabar com todas as isenções de sêllo feitas por leis especiaes, sem excepção. de uma só, e portanto se o artigo 11.° for approvado pelos corpos legislativos, tal como está, fica revogada a disposição actualmente em vigor do artigo 13.° da lei de 20 de julho de 1839, que diz assim: «serão tambem isentos de direitos... de sêllo todas as encommendações, ou provimentos temporarios de parochias, coadjutores, etc.».

Pela legislação actual nem aos coadjutores, nem aos encommendados se exije o pagamento de sêllo pelas cartas ou diplomas que se lhes passam pelas camaras ecclesiasticas, e em virtude dos quaes vão tomar posse e exercer a jurisdicção, de que são investidos pelos prelados; mas se o artigo 11.° for approvado, os coadjutores e encommendados entram na lei commum, e para uns e outros cessa a isenção ou privilegio de que até agora têem gosado. E esta innovação estou muito longe de a reputar justa e conveniente.

Sou em geral adversario de todos os privilegios, entendo que os privilegios são odiosos; mas quando graves rasões de conveniencia publica os aconselham, parece-me que ao legislador corre imperioso dever, não só de os conservar, mas até de os ampliar e crear, se tanto for necessario.

Eu quero a igualdade, mas a verdadeira igualdade não é a igualdade material, a verdadeira igualdade é, como diz um economista distincto, e antes d'elle affirmava já a sã rasão, aquella que trata desigualmente os seus desiguaes.

Se os coadjutores e encommendados estão em circumstancias excepcionaes, justo é que a lei attenda a ellas, e mantenha as isenções que até agora com toda a rasão lhes concedia.

Pertencem a duas classes distinctas os funccionarios ecclesiasticos, com cujas isenções pretende acabar o projecto da commissão — os coadjutores e os encommendados. Fallarei primeiro d'aquelles, para depois me occupar d'estes.

Segundo as prescripções do direito canonico, nas freguezias, onde o parocho é insufficiente para só por si accudir a todas as necessidades espirituaes dos fieis, sujeitos á sua jurisdicção, deve haver um ou mais sacerdotes, escolhidos livremente por aquelle, approvados pelos prelados, e incumbidos da missão de auxiliar o parocho no desempenho dos seus deveres pastoraes. A estes presbyteros, cooperadores dos parochos, é que se dá o nome de coadjutores.

Conforme com estes principios, a lei de 20 de julho de 1839 marca no artigo 2.° quatro casos, em que estes cooperadores ou auxiliares devem existir junto dos parochos. Os quatro casos são: população superior a 800 fogos, area muito extensa, dispersão dos parochianos, e finalmente difficuldade de communicações.

Os coadjutores, como a sua propria designação está inculcando, e como a lei canonica e a civil dizem claramente, têem nas freguezias, ou antes devem ter em relação aos parochos uma missão verdadeiramente secundaria. Os coadjutores devem servir para ajudarem os parochos, para cooperarem com elles na edificação moral dos freguezes, para coadjuvarem os pastores estaveis e permanentes das freguezias, para desempenharem as obrigações que os parochos não podem pessoalmente cumprir, para supprirem as faltas d'estes, para emfim acudirem, onde o zêlo e a dedicação dos parochos não póde chegar.

O parocho, que tem a instituição canonica, é inamovivel; o coadjutor, nomeado e escolhido livremente pelo parocho, póde ser todos os annos substituido. O parocho não depende do coadjutor, tem a posse do beneficio, em que está collado, e essa posse só a póde perder nos casos e pelo modo marcado em direito. Pelo contrario, o coadjutor, cuja nomeação dura apenas um anno, e é feita pelo parocho, fica na inteira dependencia d'este, que o póde despedir arbitrariamente, sem ter necessidade de provar nem mesmo allegar rasões, podendo depois escolher outro ecclesiastico que lhe inspire mais confiança e melhor lhe faça a vontade.

A dependencia em que vive o coadjutor faz com que elle sinta a necessidade de respeitar todas as vontades do parocho, cumprir todas as suas ordens, sujeitar-se em tudo a elle, desempenhar os deveres mais arduos da freguezia, fazer o serviço mais penoso, ser emfim, não o auxiliar e o ajudante do parocho, mas o verdadeiro parocho, o verdadeiro pastor da freguezia.

Um distincto litterato nosso, talvez o mais eminente, a cujo talento e a cujo caracter eu folgo de prestar homenagem n'este logar, o sr. Alexandre Herculano, chama o