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Bekman e Caldas, Ferreira de Moura, José Liberato, José Lourenço da Silva, José Maximo, Neves Mascaranhas, José Pereira Pinto, José Teixeira de Sousa, Barreto Feio, Rodrigues d'Andrade, Luiz da Cunha, Martins Basto, Pinto da França, Aleixo Duarte, Manoel Antonio de Carvalho, Mendes Leite, Pimenta d'Aguiar, Corrêa de Lacerda, Pinto da Veiga, Dias Se Sousa, Felix de Veras, Gomes Quaresma, Felgueiras Senior, Manuel de Macedo, Manoel Pedro de Mello, Rocha Couto, Serpa Machado, Franzini, Pato Moniz, Alvares Gato, Almeida Serra, Sousa Castel-Branco, Aquino de Carvalho: e contra elle os Srs. Martins Ramos, Telles da Silva, Accursio das Neves, Araujo Costa. Não forão aprovadas as emendas que o Sr. Pato Moniz tinha offerecido sobre os mesmos pareceres.
O Sr. Presidente deu pára ordem do dia da seguinte sessão segundas leituras dos projectos, que estiverem nos termos disso, e a continuação dá discussão do projecto n.º 37, sobre isenções do recrutamento; e levantou a sessão depois das tres horas da tarde. - Thomaz de Aquino de Carvalho, Deputado Secretario.

SESSÃO DE 28 DE DEZEMBRO.

Aberta a sessão, sob a presidencia do Sr. Moura, leu-se a acta da antecedente, que foi approvada.
Passou o Sr. Secretario Felgueiras a dar conta dos negocios do expediente, e mencionou.
1.º Um officio do Secretario de Estado dos negocios da justiça, acompanhando as leis sobre a regencia do Brasil, nova eleição de deputados na divisão eleitoral dos Arcos de Val de Vez, gratificações dos empregados civis despachados para o Ultramar, e nomeação dos membros do tribunal da liberdade da imprensa, sanccionadas todas pelo Rei: as quaes se mandárão guardar no arquivo das Cortes.
2.º Um do dos negocios da marinha com a parte do registo do porto, de que as Cortes ficarão inteiradas.
3.º Uma carta do Sr. Deputado Freitas Branco, participando o seu estado de molestia, pedindo alguns dias de licença, e se lhe concederão oito,
4.º Outra do Sr. Deputado Borges Leal, pedindo dez dias de licença pelo mesmo motivo, os quaes lhe forão concedidos, assim como tambem ao Sr. Deputado Gouvêa Durão, que participou ainda não estar restabelecido da molestia que tem soffrido.
5.º Uma do Sr. Deputado Fortunato Ramos, participando que por molestia deixará de assistir ás sessões de segunda e terça feira, e que pelo mesmo motivo continuará a faltar a outras: da qual participação ficarão as Cortes inteiradas.
6.º As felicitações das camaras da villa do Bispo, do concelho de Gestaço, da villa de Arronches, da villa de Alcacer do Sal, da da Mecejana, da da cidade do Funchal, da villa da Figueira, e de Colares, das quaes todas se mandou fazer menção honrosa.
7.º As felicitações do juiz ordinario do concelho de Villa Pouca de Aguiar, dos juizes ordinarios, e substituto da villa do Bispo, do juiz ordinario da villa de Abful, do substituto do juiz de fóra de Aldêa Galega, do substituto do juiz de fóra da villa d'Atouguia, do juiz de fóra de Niza, dos lentes da academia da marinha, e do professor de gramatica latina da villa de Arroches: as quaes todas forão ouvidas com agrado.
Procedeu-se á verificação dos Srs. Deputados presentes, e se achárão 84, faltando sem causa motivada 27, os Srs. Gomes Ferrão, Peixoto, Antonio José Moreira, Bispo do Pará, Ledo, Borges de Barros, Aguiar Pires, Assis Barbosa, Moniz Tavares, Margiochi, Villela, Lyra, Ferreira da Silva, Lemos Brandão, Berford, Cirne, Fernandes Pinheiro, Lourenço da Silva, Alencar, Varella, Castro e Silva, Zefyrino dos Santos, Marcos Antonio, Vergueiro, Bandeira, Macedo, Accursio das Neves; e com causa motivada 24, os Srs. Gouvêa Durão, Cruz Conceição, Domingos José da Silva, Pessanha, Bettencourt, Queiroga, Seixas, Almeida e Castro, Fortunato Ramos. João Pedro Ribeiro, Pinto de Magalhães, Mendes Velho, Segurado, Rodrigues Basto, Sá, Manoel Antonio Martins, Borges Carneiro, Grangeiro, Manoel Patricio, Borges Leal, Araujo Lima, Vaz Quina, Silva Branco, Sousa Castello Branco, Novaes.
O Sr. Presidente: - Eu vejo-me obrigado a fazer uma reflexão a respeito de licenças, visto que a falta he tão grande, declaro que de hoje em diante não concederei mais licenças, senão por motivos de molestias, apresentando os Srs. Deputados Certidão de medico. (Apoiado).
O Sr. Soares Franco: - Realmente nisso ha um grande engano: verdade he que ha muita gente doente; mas a maior parte dos que faltão são os Srs. Deputados do Brazil, os quaes não tem vindo porque hão querem.
O Sr. Castello Franco: - Peço palavra. Observo que nada se diz a respeito de apresentar certidão de medico: ainda que eu vi um apoiado geral; isto toca alguma cousa com o brio de cada um dos Membros deste Congresso. Isto não só he contra os nossos costumes, mas até mesmo contra o que se pratica nos tribunaes. Em qualquer tribunal um ministro que está doente, nunca he obrigado a apresentar certidão de medico; basta a sua palavra. Pois então está-se pela palavra de um Desembargador, por mais insignificante que elle seja, e não se ha de estar pela de um Representante da Nação? Um Deputado deste Congresso descer á baixeza de justificar perante o mesmo Congresso os motivos que o impossibilitão de podei comparecer! Não acho isto decoroso. De mais o que se segue se elle faltar pela sua pouca exactidão! He que os povos que o nomearão se enganarão com elle, e então não o tornarão a nomear mais. Entre tanto á reputação de cada um de nós pede, que se festeja pela nossa palavra. (Apoiado).
O Sr. Serpa Pinto: - Estas faltas Ao Congresso tem feito grande sensasão nas provincias; e eu peço a Vossa Excellencia, que proponha uma medida que

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seja sufficiente para justificar estas faltas, que já são muito escandalosas.
O Sr. Presidente: - Proponho se basta a declaração de um Sr. Deputado estar doente para se estar por ella. (Basta, dissera o alguns Senhores).
O Sr. Xavier Monteiro: - Eu digo que basta que um Deputado diga, que está doente para se lhe conceder a dispensa necessária; mas o que eu queria lie, que não se concedessem licenças para tratar de negócios particulares, ou de familia; porque talvez que a maior parle das licenças que existem sejão para tratar de dependencias desta natureza.
O Sr. Serpa Machado: - Isto he um objecto de regulamento: não devemos inverter a ordem do dia. Será bom que isto se proponha por escrito para depois de seguir os trânsitos do costume entrar á discussão.
O Sr. Presidente: - Então ficamos como estava-mos; entre tanto eu declaro que não concederei mais licença alguma.
O Sr. Serpa Pinto: - Eu me encarrego de apresentar amanha uma indicação por escrito a este respeito.
Passou-se á ordem do dia, e se fez segunda leitura da seguinte

INDICAÇÃO.

O infeliz e não esperado acontecimento, que deu lugar ao decreto de 5 do corrente mez, magoando sobre maneira os bons Portugueses, ainda mais penaliza o benefico coração do incomparável Rei, que temos a felicidade de possuir, e que tão sinceramente se tem identificado com a vontade geral da Nação portugueza, dando as mais irrefragaveis provas de que não conhece sacrificio superior ao unico sentimento predominante de seu coração, quero dizer, a vontade de ver felizes s todos os Portuguezes.
A illustre consorte de S. M. deixando de cumprir com a formalidade, que a lei exige, que a Nação esperava, e de que S. M. o Sr. D. João VI, e sua augusta familia derão um tão nobre exemplo, perdeu os direitos civis, e politicos, que lhes concedia a Constituição, e por consequência todos os rendimentos de sua casa, os quaes vão reverter para o thesouro nacional; porem não obstante as consequências politicas que resultão de tão fatal allucinação, nem por isso perde a qualidade de esposa do magnanimo Rei da Nação Portuguesa, o qual jamais poderá deixar de prover á decorosa manutenção de sua illustre consorte, qualquer que seja o teu futuro destino, do que resultará um desfalque na dotação de S. M., aliás modica pelo apurado estado dos rendimentos nacionaes.
Em taes circunstancias julgo digno da attenção do augusto Congresso, que tomando em consideração o exposto, encarregue a illustre Commissão, que deve fazer o relatório sobre este assumpto, ou outra qualquer, de lhe propor a quantia que deverá pôr-se annual, e extraordinariamente á livre disposição de Sua Magestade, o Sr. D. João VI, para que possa satisfazer do modo que julgar conveniente a um dever exigido pela dignidade da Nação, e d'ElRei. - Paço das Cortes 9 de Dezembro de 1822. - O Deputado Franzini.
Mandou-se para a Commissão encarregada de examinar o relatório do Governo sobre a recusação da dita Senhora a prestar o juramento á Constituição, a fim de ella lhe dar a consideração que julgar conveniente.
Fez-se segunda leitura do seguinte

PROJECTO.

O estabelecimento que até agora se intitulava Torra do Tombo, e que no projecto que eu vou apresentar he denominado Archivo Nacional c Real, tem sido, e he aquelle onde, desde os principios da Monarquia portugueza, se depositão, se guardão, e se conservão os titulos e documentos mais preciosos e interessantes aos Reis, e á familia Real, a muitas familias e individuos particulares, e em geral ao throno e á Nação; e desde meados do seculo passado começou de ser mais importante para o aproveitamento das academias e dos literatos; assim foi elle em augmento, até que em 1807, péla invasão dos Francezes, se dispersou, e se reduziu o numero de seus empregados, paralisando-se por isso mesmo os trabalhos em modo que, ames do que uma reducção, bem podemos dizer ter-se feito a destribuição e ruina deste importantissimo estabelecimento, que inda agora permanece no estado ruinoso em que o então deixarão. Daqui se conclue, que a reforma da Torre do Tombo, a começar por seu titulo, que deve mudar-se no de Archivo Nacional e Real, he talvez de maior urgencia, e de mais absoluta necessidade, que a de nenhuma outra repartição publica, e as causas são essencialmente quatro; 1.ª porque já em 1807 quarenta e tantos escriturarios que então havia não podião dar vencimento aos trabalhos que ficarão paralizados, e que erão indispensaveis, sendo muitos delles copias de documentos, que por antigos, e mal conservados, se ião perdendo, e que só por copia se podem salvar: 2.ª porque dessa época para cá tem accrescido muita remessa de livros e documentos, havendo aliás muitos outros, que por lei, por pratica, e conveniência publica, se devem reclamar, e de que he preciso ordenar os respectivos indices para mais prompto expediente das partes: 3.ª porque actualmente mais do que nunca está o Governo carecendo e reclamando copias de diversos documentos para as competentes Secretarias d'Estado, tanto assim, que ainda em Novembro ultimo se expedirão para esse effeito diferentes portarias pelas duas secretarias dos negócios do reino e da justiça: 4.ª porque he absolutamente impraticável que todos esses trabalhos possão fazer-te com só treze empregados que inda agora conta o Archivo, segundo a reducção que se lhe fez em 1808; numero este que seria sempre diminuto, e que he muito mais insufficiente, por isso que quatro desses mesmos empregados podem dizer-se nullos por decrepitos e invalidos. De tudo isto se segue, que pelo actual estado de abandono do Archivo Nacional e Real se estão soffrendo faltas e prejuizos de grande ponderação, e que serão irremediaveis toda a vez que

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se lhe não acudir com efficaz e prompto remedio. Em consequencia proponho o seguinte

Projecto de decreto.

As Cortes, tomando em consideração que o Archivo da Torre do Tombo he um dos mais antigos e importantes estabelecimentos da Monarquia portuguesa, e que ate agora se lhe não deu regimento que regule o numero, a graduação, os trabalhos e vencimentos dos seus respectivos empregados; decretão o seguinte:
Art. 1.º A Torre do Tombo desde a promulgação do presente decreto, se ficará denominando Archivo Nacional e Real.
2.º Haverá um archivista, um official maior, oito officiaes, e oito amanuenses; uns e outros, quatro de primeira, e quatro de segunda classe: um porteiro, três continuos, e um varredor.
3.° Para o logar de archivista proporá o Conselho d'Estado, na forma dos artigos 123 e 168 da Constituição, pessoa em quem concorrão virtudes, talentos, e adhesão ao systema constitucional, e os mais amplos conhecimentos especificos do mesmo arquivo. O arrhivista obterá carias d'elRei.
4.º O official maior e os outros officiaes, assim de primeira como de segunda classe, serão propostos ao Governo pelo archivista, em lista dupla, e todos nove obterão tambem carta d'ElRei, de que pagarão novos direitos, assim como o archivista, o official maior, e os outros oito officiaes.
5.º O archivista, o official maior, e os oito officiaes são vitalicios, e só poderão ser demittidos pelo Governo depois de julgados, competentemente convencidos do crime ou prevaricação.
6.° Todos os outros empregados serão amoviveis e providos por portaria do archivista, o qual, sob sua responsabilidade, attenderá a que as suas propostas e provimentos recaião em pessoas, com aquellas qualidades e condicções que para taes empregos se requerem, e não dará portaria aos amanuenses sem preceder concurso por espaço de trinta dias.
7.º O archivista vencerá por anno 1:200$000 rs., pago em mezadas; o official maior 1:000$000 de reis: os quatro officiaes de primeira classe, 700$000 reis; os quatro de segunda 600$000 reis: os quatro amanuenses de primeira classe 360$000 reis: os quatro de segunda 180$000 reis: o porteiro 288$000 reis: os continuos 144$000 reis: o varredor 120$000 reis.
8.º Todos os empregados no archivo ficão inhibidos de perceber algum outro vencimento pelo thesouro nacional.
9.° O serviço do archivo terá reputado igual ao tia Secretaria dos negocios do Reino, guardando os mesmos dias feriados: porem trabalhando nos casos «k» urgencia em horas extraordinárias, porem nunca usando lume.
10.° A distribuição dos trabalhos do archivo, e as obrigações de cada um dos seus empregados serão regulados por um regimento interior, feito e assignado pelo archivista, e approvado pelo Governo.
11.º Haverá no archivo um cofre onde se guardem todos os emolumentos, e d'ahi sahirão as despezas miudas do messo archivo: porem no fim de cada seis mezes será o remanescente dividido, respectivamente segundo seus vencimentos, pelo archivista, official maior, e officiaes, e amanuenses de primeira e segunda classe.
12.° O archivista remetterá mensalmente no thesouro uma folha por elle assignada, com os nomes, empregos, e quantias do vencimento de cada um dos empregados: cumprirá as ordens que lhe forem expedidas pelas secretarias de Estado, e por qualquer delias, segundo competir, poderá representar quanto lhe parecer a bem do serviço nacional; e será responsavel pela boa arrecadação dos livros e documentos que em dia e no fim de cada reinado se devem arrecadar no archivo.
13.° Quando se impossibilitar ou fallecer algum empregado distincto por seus serviços, o archivista dará disso ao Governo uma conta circunstanciada, propondo para elle, ou para sua mulher, filhos, ou irmãas uma pensão correspondente ao seu logar e aos teus serviços; e sendo concedida, será satisfeita pelo thosouro nacional.
14.° O expediente for-se ha como ategora com os emolumentos estabelecidos na provirão de 18 de Outubro de 1816, menos a assignatura do archivista, e o papel, que tudo será gratuito, e para se passarem certidões precederá somente o despacho do archivista, ao modo porque se pratica nas secretarias de Estado.
15.° Fica revogada toda a legislação em contrario do presente decreto.
Paço das Cortes etc. - Nuno Alvares Pereira Pato Moniz.
O Sr. Antonio Vicente Carvalho e Sousa: - Opponho-me a que seja admittido á discussão este projecto, e fundo o meu voto em duas razões, que expenderei com a brevidade que costumo: 1.ª porque he desnecessario: 2.ª porque he prejudicial á fazenda. He inutil e desnecessario porque eu não conheço estabelecimento publico que esteja em melhor arranjo: ali as certidões ou outros quaesquer documentos prontificão-se sem demora alguma: por consequencia de que serve a refórma? O illustre autor do projecto no seu preambulo não lhe nota erros ou defeitos essenciaes, que mereção reforma, logo ella he desnecessaria, e o projecto inutil. Diz o illustre autor que os officiaes actualmente existentes não são sufficientes, e passando a enumerar os que são necessarios, não lhe aumenta nenhum, e muda-lhe somente o nome. Por tanto já se vê que he inutil semelhante reforma. Vamos á 2.ª razão. He prejudicial á fazenda, porque importando os ordenados dos empregados actuaes em 3:453$000 re., os mesmos empregados que lhe quer dar o illustre Deputado fazem a despeza de 10:112$000 rs. v indo a aumentar-se na despeza roais 6:696$000 rs. annuaes sem proveito da Nação. Ora no tempo em que nós tratamos de economia aumentar despezas, sem uma absoluta necessidade pareceria ate um desvario. Por tanto voto pela rejeição do projecto. Seja-me licito accrescentar uma idea. Este estabelecimento está tão bem arranjado, que os escriturários vencem 600 rs. por seis horas de trabalho, e por cada quarto de hora que faltão perdem meio tos-

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tão, ora um estabelecimento com tal regularidade necessitar de reforma, parece incrível! Por tanto voto que seja rejeitado até mesmo para se poupar a despeza da impressão. Cuidemos Sr. Presidente, da fazenda, e deixemos estas reformas para tempos mais felizes.
O Sr. Pato Moniz: - O que acabou de dizer o illustre Preopinante prova duas cousas: a primeira he que não sabe o estado em que se acha a torre do tombo, e a segunda que não examinou bem o projecto. A desnecessidade da reforma, e a regularidade actual daquelle estabelecimento, que são os dois motivos por onde o Sr. Deputado pertende a rejeição do projecto, bem pelo contrario são antes esses mesmos os motivos principaes porque o projecto deve necessariamente ser admittido. Que o projecto houvesse de soffrer muitas modificações, isso esperava eu; porem que se dissesse que e lie não devia ser admittido á discussão por ser desnecessária a reforma, isso então confesso que nunca esperei de o ouvir dizer, e que muita me admira. Diz o illustre Preopinante que este estabelecimento está na maior regularidade possível. Em verdade não sei eu como isso possa ser, pois que, tendo elle sido em 1808, assim como outras muitas repartições, protegida á franceza, de quarenta e tantos escriturários que linha, ficou reduzido a treze, sem nenhuma escolha, e assim se tem conservado atégora: de maneira que os empregados no archivo precisão saber alguma cousa de diplomacia, e muito de paleografia; porém a maior parte dos que lá estão não sabem cousa nenhuma disso. Demais: entre esses mesmos empregados ha quatro ou cinco que estão impossibilitados por sua idade septuaginaria, e por molestias: do que te segue, que o tempo vai deteriorando c consumindo muitos documentos preciosos, cuja perda se não pôde reparar porque não ha quem saiba fazer as copias; e que o Governo está fazendo, e necessitando fazer continuas requisições a que se não pôde satisfazer. Inda assim, se este estabelecimento importasse agora tanto como nos primeiros tempos da monarquia, menor seria a perda, porque então somente ali se arrecadavão os tombos da coroa; porem agora, e já de ha muitos tempos não he isso assim. Chamou-se torre do tombo porque primitivamente se estabeleceu na torre do castello, e porque guardava os tombos da coroa; e eu proponho no projecto que se chame archivo nacional, porque ali se guardão ha seculos muitos documentos importantes á Nação: sendo muito para notar-se que este estabelecimento em todos os tempos mereceu grande consideração, e foi reputado de muita importancia; tanto assim que Elllei D. Manoel pôz grande cuidado e desvelo na sua reforma, para o que mandou fazer muitos livros de leitura nova, e concedeu privilégios aos seus officiaes; e inda não satisfeito com isto, o deixou recommendado em seu testamento. Correrão os tempos, e o estabelecimento foi mais ou menos favorecido, porém sempre tido em muita conta e consideração; e depois que foi visitado por ElRei D. João V, começou a ser de maior aproveitamento para as academias, e em geral para os litteratos. Sobreveio a invasão dos francezes, e ficou o estabelecimento reduzido a treze empregados; ora ainda que todos esses treze empregados fossem bons, impossivel seria que elles pudessem dar vasão ao trabalho, e que o archivo estivesse bem regulado: porem, como eu já disse, alguns estão impossibilitados, è outros são incapazes, porque alguns delles tem sido ali introduzidos á força de patrocínios, e não por seu merecimento. Se fosse preciso dar provas disto, facilmente se podião produzir ale com testemunhas: houve tal que depois que para ali entrou he que foi aprender duas lambuçadas de latim, ou de outra cousa mais; porque em fim para ser empregado publico he preciso saber alguma cousa. Diz o Sr. Preopinante que o estabelecimento deve continuar com os meamos empregados, e que o projecto apenas lhe muda o nome, e não os aumenta: ora eis-ahi o que he estar bem certo no projecto! Os actuaes escriturários são treze, e ha lugares vagos: eu proponho vinte e tres empregados, e estabeleço uma escala para graduações e ordenados, a fim de haver um estimulo para o bom serviço; porque não havendo alguma cousa que estimule os homens, elles de ordinario não servem bem. E então como se póde dizer que he inutil o projecto, e desnecessaria a reforma? Podem sim fazer-se algumas modificações no que respeita aos ordenados, assim como em todo o projecto. Porém que elle seja inútil, e que não deva ser admittido á discussão, isso com effeito he o que eu nunca me persuadi que teria de ouvir dizer.
O Sr. Manoel Aleixo: - Eu levanto-me sómente para dizer, que não se devem augmentar despezas, porque nos não estamos em circunstancias de o poder fazer, salvo quando for de absoluta necessidade: além disso, Srs., o tempo he precisoso, e he preciso que nós não nos esqueçamos que temos a tratar cousas de grande transcendencia. Não digo com isto que não se deva tratar deste negocio, porém nós temos outros que são mais necessários: he preciso remediar males respectivos á agricultura, e ás nossas finanças; e tudo isto leva tempo.
O Sr. Presidente propoz se este projecto devia ser admittido á discussão; e se venceu, que não.
O mesmo Sr. Secretario continuou a segunda leitura de um projecto da Commissão de agricultura, sobre a cultura dos terrenos maninhos; e de um da Commissão de fazenda, sobre a introducção das escomilhas de França: os quaes forão admittidos á discussão.
Passou-se á continuação da discussão de projecto n.° 37, sobre isempções do recrutamento, e entrou em discussão o artigo 4.°
O Sr. Serpa Pinto: - Parece-me que se não devia tratar disto em quanto a Commissão militar não apresentasse redigido o § 3.º Conseguintemente proponho que se deixe a discussão deste 4.° e 5.º artigo; e que se passe a tratar dos outros.
O Sr. Pereira Pinto: - Parece-me que se póde entrar na discussão do 4.°, porque o 3.º entrará na redacção do 5.º
O Sr. Derramado: - Eu substitui uma emenda ao artigo 4.°, ella deve estar sobre a mesa; peço a V. Exca. que a mande ler.
O Sr. Pereira Pinto: - Eu não posso deixar de apoiar o artigo 4.º; elle diz respeito aos grandes la-

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vradores, e isto no caso que lance á terra tres moios de semente. Ora a Commissão militar teve em vista o § 24 da lei de 24 de Fevereiro de 1764; e parece-me que quando um lavrador deita á terra tres moios de semente, e tem quatro pessoas isentas, he muito sufficiente; porque se tem mais semente que lançar á terra, tem os singeleiros e outros criados a quem paga, os quaes não servem mais do que tres mezes ao anno: ale o mesmo lavrador não ha de querer pagar a tantos criadas. Alem de que aquelle lavrador que tem quatro criados bentos são considerados grandes lavradores, e estes quando precisarem mais criados não sei qual ha de ser o motivo porque os não, hão de escolher daquelles que estiverem isentos por qualquer motivo. Por tanto o meu voto he, que o artigo não precisa de addição alguma, porque elle está assás amplo.
O Sr. Alberto da Silveira: - Para approvar a doutrina deste artigo he preciso absolutamente ignorar o que são os lavradores do Alem tojo. Todos os lavradores consideráveis do Alemtejo são os que deitão de cinco moios para cima. Os lavradores que lavrão com quatro , ou cinco arados, tem não só cinco juntas de bois, mas tem quinze e vinte: por consequencia he evidente que todo o homem que lavra com estes arados precisa para elles outros tantos criados, porque de que serve a um homem que tem de lançar á terra grande quantidade de semente para pagar trinta ou quarenta moios, como ha de elle fazer isto se se lhe conceder a isenção de um só criado? Isto não serve de nada. Pois he o que verdadeiramente se lhe concede neste paragrafo, porque elle diz: se o filho, o abegão, e um criado. "Isto he um erro, porque se suppõe que o lavrador he casado, e que sendo-o tem um fübo: e se nada disto acontecer? Então neste caso já se lhe não concede isento senão o abegão, e o criado. Ora alem disso os lavradores do Alemtejo tem não só a sua manada de bois de que precisão para o serviço da lavoura, mas tem tambem uma manada de vacas para a criação; tem tres, ou quatro rebanhos de porcos de cem a duzentos cada, um, tem tambem dois e tres rebanhos da ovelhas, e nada disto póde subsistir sem ter os ganadeiros necessarios. Ora isto de ganadeiros não se julgue uma cousa tão insignificante como parece, porque não he nada menos de que um officio, o qual depende de muitos conhecimentos praticos: estes homens são os que sabem quaes são as horas mais proprias para pôrem o gado a pastar, e quaes os pastos que lhe devem servir de alimento; porque por um descuido póde de repente morrer tudo, e o lavrador ficar perdido, uma vez que os seus ganadeiros não sejão capazes. Por consequencia digo, que esta classe de homens he necessario que seja isenta, senão queremos destruir a lavoura do Alemtejo. Ora alem dos ganadeiros ha outra qualidade de homens que he necessario isentalos, e vem a ser os feitores. Ninguem pense que os lavradores do Alemtejo sejão tão robustos, que possão suportar a vigia das suas lavouras; e por isso necessariamente devem ter um homem, que se chama feitor, o qual tem á sua disposição as terras, os gados, e vigia todos os criados e trabalhadores que servem na lavoura. O mesmo digo a respeito dos abegões: elles não suo mais do que carpinteiros rusticos, que se empregão continuamente na construcção dos instrumentos de lavoura: ora que execução pôde dar o lavrador á sua arte, se elle não tiver os instrumentos praprios para isso? Devem por tanto estes serem igualmente isentos, porque são muito necessários.
Em quanto á restricção que tem o paráarafo, de ser preciso que o criado tenha servido por mais de um anno com o mesmo amo; isto acaba de destruir as isenções que se pertendem; porque os criados andão sempre da casa de um para a casa de outro, com a tenção de melhorarem de fortuna; e a epoca em que elles se costumão ajustar he pelo S. Miguel, e Santo Agostinho. Por consequencia voto contra todo o artigo, porque elle não se póde approvar tal qual está concebido, porque aliás iria destruir a maior parte do Alemtejo. Eu Sr. Presidente tenho a fazer tuna indicação sobre este objecto de recrutamento, e parece-me que estaremos a trabalhar em vão sobre exercito, se se não fechar a porta que está aberto, de se passarem para a Hespanha aquelles que estão nas circunstancias de ficarem sujeitos ao recrutamento; e por isso penso que he necessario fazer um contracto o nosso Governo com o de Hespanha, para que elle nos mande entregar todos aquelles que por similhante motivo se passarem para lá. Se isto for approvado pelo Congresso, passo a escrevela, e a mandarei para a meza,
O Sr. Correa de Lacerda: - O illustre Deputado acabou de falar dando uma grande amplitude á lavoura. Todavia a mim parecer me que nas circunstancias presentes se tem dado demasiada extensão á agricultura, e com isso está-se abrindo uma grande brexa á liberdade: a minha opinião he que se restringa, e te diga, que qualquer criado de servir que se encontrar dentro da idade de 18 a 25 annos, fica sujeito ao recrutamento; porque da idade destes pars diante ha muitos que se possão empregar na agricultura. He preciso que se não tolha o recrutamento com isempções. Nós temos he vedado duas grandes necessidades á vista: uma de promover a agricultura, que he muito justo; mas a outra he manter o nosso código fundamental contra as despotas. Na nossa guerra pastada estava a Beira deserta, mas logo que veio a paz tornou-se a restituir ao seu antigo estado;, mas á liberdade não acontece assim, porque uma vez que ella se perca, tarde ou nunca se torna a resgatar. Em quanto ao filho, direi, que se isempte muito embora um filho aquelle lavrador que se achar no caso do ao ligo antecedente, mas nunca á sua escolha. Este he o meu voto.
O Sr. Jose Maximo: - He perciso ignorar quaes são os verdadeiros principios era que se fundão os interesses geraes, de um Estado para impugnar a doutrina deste artigo. A Commissão de guerra contemplou quanto foi possivel a agricultura. Não sei que haja lei alguma que obrigue o lavrador a servir-se sómente com creados que tenho sómente de 18 ate 25 annos, e que sejão solteiros. Pelo contrario sei e sabemos geralmente, que esses homens que devem ter conhecimentos praticos de agricultura e ganadaria ex-

TOM. I. LEGISLAT. II. Oo

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istem tambem nas idades anteriores a dezoito, e nas posteriores a 25 annos. para o recrutamento que se vai fazer póde muito bem ser (segundo a somma de celibatarios, que o Sr. Franzins suppõe nos seus calculos de estatistica) que se achem todas as recrutas necessarias na idade de 18 até 19 ou 20 annos, e ficarão fóra do recrutamento todos os outros. De mais com a economia que havemos de ter em quanto ao licenciamento, não se póde recear que faltem consideravelmente homens que trabalhem na agricultura. Por tanto digo que não tem o lavrador razão de queixa, e que o artigo deve passar tal qual, com a emenda já lembrada quanto aos creados estiverem assolados por anno.
O Sr. Galvão Palma: - Voto para serem excluidos do recrutamento todos os filhos e creados dos lavradores, que lançarem á terra cinco moios de pão. Nós estamos legislando em tempo de paz, e he de justiça, que sejão previligiadas aquellas classes mais interessantes, e que melhor promovem a publica prosperidade. Ninguem duvída, que o primeiro elemento dellas he a agricultura, que esta está definhada e moribunda, concorrendo para isto muitas cousas, entre ellas a nenhuma consideração, e falta de braços: o meio pois he dar-lhos, e não lhos tirar por meio do recrutamento. Obrando deste modo, seguimos a marcha da Prussia, que apezar de nação diz Mirabeau, com a agricultura: outro tanto praticou a França antes da revolução; he o mesmo que aconteceu em Portugal nos felizes tempos dos Affonsos, e Dinizes, e porque isto assim acontecia, os campos do Alémtejo erão habitados pelos grandes, e poderosos, de que hoje ainda restão parte dos castellos, fortes e palacios em que vivião, e desses campos safão, como dos de Roma, Camillos, Fabios, e Cincinatos. Vejamos agora, Sr. Presidente, o differente quadro que elles apresentão: fome, miseria, charnecas incultas, apenas povoadas por féras, e salteadores, que com a fazenda roubão o sangue do misero indefeso passageiro. Quando há pouco tive a honra de vir assentar-me nesta cadeira, observei no pequeno espaço de quatro léguas, que há entre Evora, e S. Thiago de Escoiral um grande numero de herdades sem que nellas entre o arado, e demolidos os seus montes, e até uma tapada espaçosa, que tem lugar de se cultivar para manter as ovelhas da diocese, ella sómente produz porcos montezes, veados, e corsas. Sejamos pois indulgentes, e se he possivel, generosos, para a classe agricola. Sr. Presidente, eu não advogo a causa da minha provincia, mas a de toda a Nação; não advogo a causa do Alémtéjo, mas a da capital; faltando a agricultura, ou o que he o mesmo, os braços para ella, o commercio, a industria, as artes não se podem desenvolver; gemerão na miseria os proprietarios cujos fundos em regra se derivão da agricultura; gemerão os pobres que apenas enchem a barriga no monte do lavrador; gemerá a população pois lhe falta o seu primeiro elemento. Eu advogo a causa do systema constitucional, pois á proporção que felicitarmos as sobreditas classes levantarão as mãos ao Ceo a favor da nova ordem de cousas, que as prosperou; conseguindo isto terei o prazer, quando regressar para a minha provincia, de observar o lavrador levantar ao Ceo aquellas mãos, que manejão a charrua, pedindo-lhe bençãos a favor dos Representantes da Nação; terei a satisfação de ouvir dizer ao lavrador, sentado ao seu lar, dizer aos filhos: = Chegou essa idade, feliz idade, de que tanto me falavão meus avós, em que os campos estavão em consideração, e os lavradores contemplados, como a classe mais distincta, e privilegiada da sociedade.
O Sr. Pinto da França: - Alguns illustres Preopinantes tem fallado contra o artigo achando-o em extremo escasso para com a agricultura, que assás desejão proteger; outro Sr. porém falou contra elle porque o achou em extremo extenso, em beneficio particular da lavoura e disse que se devia fazer alguma restrição. Tenho por tanto para sustentar o artigo de combater differentes ou oppostas opiniões.
Eu sendo o primeiro sustentador de que a agricultura deve ser protegida quanto em nossas forças combater; mas se esta proposição for tão absoluta que não deixe restricção alguma, nós nos veremos na necessidade de fazer injustiças e violencias. Eu assignei este projecto, não sem que procedessem serias reflexões, e ouzo dizer, que neste artigo houve toda a conciliação de favor e justiça, e se teve toda a attenção com a lavoura, sem destruir o mais que faz parte da sociedade. Sim, teve-se attenção com a agricultura, e á primeira reflexão se conhece que he a provincia do Alemtéjo pelas suas circunstancias a mais contemplada; nas provincias do norte de Portugal não temos lavradores que deitem á terra mais detres moios de semeadura, com tudo a soma destes que de certo semêa indisivelmente maior quantidade não tem um só creado isento por este principio; não se queixem pois os Srs. do Alemtéjo, aliás seremos atardidos com os justos queixumes das outras provincias, aos quaes eu por mim não saberia responder sem culpar-me na destribuição da justiça; torno a dizer, attendeu-se á lavoura, não esquecêrão differenças de provincia, mas para nos lembrarmos de uma, não podemos esquecer-nos dos outros, nem por nos lembrarmos de uma classe mergulhar no esquecimento todas as outras. Passo agora a responder ao illustre Preopinante, que quer restricção no artigo, pela qual não vinha a conceder ao lavrador alguma izenção de um só creado, quando não esteja fóra da idade do recrutamento: se o inimigo estivesse já em marcha para as nossas fronteiras, talvez nos não lembrassemos de isenção alguma, talvez, ou de certo nenhum bom potuguez a quereria, esse mesmo sexo timido e delicado quereria correr ás armas, e não seria a primeira vez que mulheres portuguezas se cobrissem de gloria marcial, mas o perigo não nos ameaça tão de perto, e por isso me parece que podemos cuidar do exercito, como do nosso dever he, sem tanto rigor no recrutamento; parece-me que feito esta, segundo o projecto, não se pertubará o necessario sono ao lavrador, o artista não fechará a sua officina, em fim a maquina da sociedade não será estorvada no seu andamento. Concluo pois que não podendo concordar com os Srs. que querem mais isenções para a lavoura, nem convir com o illustre Preopinante, que pertende menos, voto pelo artigo tal qual se acha.

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O Sr. João Victorino: - Eu pouco direi, pois costumo ser breve em meus discursos, não porque me pareça que isto he pouco interessante, mau sim porque julgo que este artigo esta sufficientemente discutido. Por tanto só accreacentarei, que se concedermos a isempção a todos os creados que servem na lavoura, acontecerá que, aproveitando uma porta, que tão facilmente sé lhe franqueia para illudirem a lei, e privilegiarem a quem lhe agradar os lavradores terão somente os criados, que se acharem comprehendidos na idade, e nas mais circunstancias, que a lei requer para effectivas recrutas, e por este modo não se poderá achar uma só recruta em toda a provincia do Alemtéjo. Se agora um illustre Preopinante ponderou, que elles fogem para a Hespanha, por este modo elles se deixarião estar em casa do lavrador, aonde sem incommodo são privilegiados. Ora tem-me admirado de ver fazer uma pintura tão desgraçada do Alem-Téjo, quando as outras provincias tem melhorado tanto depois das calamidades da guerra. Todas as províncias se vão reparando: a sua agricultura está muito melhorada; e seria para desejar que os illustres Deputados do Alem-Téjo se dessem ao encommodo de examinar quaes são as verdadeiras causas da desgraça da agricultura daquella provincia; e tal vês que elles então achassem que ha immensas terras que não tem dono, è que outras lendo-os, estes as não cultivão, ou apenas lá tem algum gado, ou touros. Não se lembrarão os, illustres membros, que aquella provincia he quasi toda de morgados? Para que procurão então em outra parte a causa da sua despopulação, da sua incultura, e desgraça. Porque não tem elles apresentado um projecto para a abolição desta barbara instituição? Não, não he o recrutamento o causador destes males. Por consequencia o artigo favorece muito a lavoura do Alemtéjo concedendo-lhe a isempção de quatro pessoas fora o lavrador, e o meu voto he que não se gaste mais um instante com esta discussão, e que se approve o artigo tal qual elle se acha concebido.
O Sr. Merciano offereceu uma nova redacção do artigo a qual mandou para a meia.
O Sr. Liberato Freire: - Sr. Presidente, eu levanto-me para reprovar o artigo, porque o não acho bastantemente protector da agricultura. Creio que em todos os paizes os mais bem instruídos em economia política, onde ha industria, sempre se olhou com particular cuidado para a agricultura: ella he que produz as matérias primas donde provem a industria, e a manufactura; e se a agricultura he a base de todas as artes, nós devemos conceder-lhe quantos privilégios ella carecer para poder prosperar. Além disso as artes, e manufacturas não se podam fazer de repente, e a agricultura póde-se, uma vez que seja bem protegida. A minha opinião seria, que o agricultor, ou aquelle homem que trabalha em lavrar a terra, não se deve pegar nestes homens para serem recrutados; pois que elles são tão necessários para sustentar o mesmo exercito. Verdade he que he preciso fazer-se o recrutamento; mas elle deve ser o mais suave possivel; e deve ser reservada aquella classe que mais trabalha a bem do Estado, e mesmo para que se empreguem melhor, he que lhe deveremos conceder todas as isempções. Ha um grande numero de vadios, e homens que não são empregados em cousa alguma; estes he que devem ser chamados com preferencia; e depois que não haja desta gente, então he que se deve recorrer á que se emprega na agricultura, e não irmos primeiro pêlos lavradores. Conseguinte mente torno a repelir, que se lhe concedão todos os privilégios ; porque nós não podemos fazer a guerra, nem sustentar exercito sem termos agricultura.
Além disso o recrutamento feito pelo modo proposto pôde produzir um effeito moral, c nós devemos ter toda a circunspecção com isso; porque não devemos avaliar o interesse que observamos aqui na capital pela causa da liberdade, e esse amor da Constituição, com o das provincias, lá não he tão geral; e eu creio que isso se deve apouca adbesão dos empregados públicos, e por elles não concorrerem a excitar nos povos o amor da liberdade, conseguintemente tudo o que pôde concorrer para accender este amor nos povos se lhe deve conceder. Nós vamos fazer ura recrutamento de guerra t e se logo no principio o fizermos sem isempções, talvez cause isso algum descontentamento: he perciso irmos de vagar, porque vamos a fazer um ensaio. Se nós estivessemos nas circunstancias de uma necessidade absoluta por o inimigo se achar aparte, então nós diríamos , portugueses he necessário resistir-lhe; porém elle está ainda muito longe. Por tanto concluo dizendo, que o lavrador deve ser o ultimo que se chame as armas , e por isso eu reprovo este artigo, visto elle não ser muito a favor da agricultura.
O Sr. Franzini: - Um dos maiores defeitos que tem havido até ao presente em todos os systemas de recrutamento, tem sido abranger um grande numero de indivíduos para se fazer um pequeno recrutamento, e he este radical defeito o que promove grandes desasocegos e prejuizos á Nação, o que he fácil evitar, restringindo-se o recrutamento somente a certas idades. He este o único methodo, cuja lembrança se deve á França, pelo qual se obtém um regular recrutamento, sem perturbar a industria de uma nação, afugentando a totalidade dos homens productivos, para no fim haver poucas recrutas. Em quanto ao nosso projecto de lei, o qual não segue exactamente estes systema, eu vejo que se pretendem fazer tantas excepções que provavelmente pouca gente restará que possa ser chamada ao serviço militar. O methodo de se restringir o recrutamento a certas idades nunca se observou em Portugal, e he esta a razão por que quando aqui se pretende fazer qualquer pequeno recrutamento se espalha o terror nos campos, nas cidades, e nas officinas, com o mais grave prejuizo dos interesses nacionaes. Ora se rigorosamente se estabelecesse o principio que eu proponho, deveria então haver mui poucas isenções, como acontece na lei da concepção. Eu já aqui disse, que segundo as mais bem fundadas avaliações, devem existir na idade de dezoito a dezenove annos vinte e um, a vinte e dois mil homens. Seria pois necesessario que a Com missão de guerra determinasse exactamente o numero que deve ser recrutado: eu sustentei que serião sufficientes doze mil homens; porém segundo o que se acha resolvido, está autori-

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zado o Governo a levantar vinte mil, que he o parecer da Commissão, e que eu julgo excessivo e pezado ao estado da nação. Ora por um calculo bem fundamentado o Alemtéjo contem um onze avos de população do Reino, e então o Alemtéjo deveria dar mil e cem homens, o que não seria difficultoso haver-se escolhido sómente entre as pessoas comprehendidas na idade de dezoito a dezenove annos.
Em quanto aos vagabundos nada he mais facil do que dizer-se que elles devem ser recrutados com preferencia; porem a difficuldade consiste toda em os poder descobrir e conhecer, porque existindo estes pela maior parte nas cidades populosas, encontrão ali mesmo os meios de se occultarem, e de se subtraírem ao recrutamento. Por tanto eu voto pelo artigo tal qual se acha concebido.
O Sr. Serpa Pinto: - A decadencia da agricultara do Alemtéjo não provem do recrutamento; a decadência vem de outras causas, porém dos grandes morgados, e da falta de aguas que ha naquella provincia, e de outros objectos mais. Porém passando ao artigo, digo, que regeito tudo quanto for isenção: a lei devo ser igual para todos, e o recrutamento deve ser baseado nessa mesma igualdade, por isso me opporei sempre a tudo quanto forem isenções.
O Sr. Manoel Aleixo: - Eu louvo muito os sentimentos dos illustres Preopinantes que tem impugnado o artigo por o acharem muito restricto. Eu possuo suo iguaes sentimentos, e tambem desejaria que a agricultura fosse priviligiadissima; mas quando eu vejo que esta lei está quasi nas circunstancias da lei de 1764, parece-me que em se executando as portarias subsequentes no que dizem respeito ao Alemtéjo, temos frito quanto he bastante. Tenho observado que apezar de se ter feito recrutamentos no Alemtéjo, elle sempre viveu ao mesmo modo; por isso não posto deixar de approvar que este recrutamento se fassa na mesma conformidade. Acho que o artigo está bem concebido, e que havendo estas isenções, não ha razão nenhuma para se dizer que elle causa vexame. Em outro tempo eu via, que todos os regimentos erão licenceados, e que todos os soldados erão dados a agricultara; agora já se não licenceião, e estão de continuo occupados no exercicio das armas, e na guarnição dar praças; não lei porque no tempo de paz se não ha de fazer isto mesmo que se fazia em outro tempo. Por isso, Senhor Presidente, parece-me que em lugar de estarmos aqui a gaitar tempo com isto, era melhor, que se determinasse que este recrutamento se fizesse na conformidade da referida lei de 1764, porque não ha de então sentir falta a agricultura, e o nosso exercito ha de se pôr em pé: e muito mais, nós sabemos que a classe que dá roais recrutas, he a lavoura, e se fizessemos isenção desta ciaste, he que talvez não podessemos completar o exercito. Voto pois pela approvação do artigo, e digo que a Nação ha de ficar muito contente.
O Sr. Fernando Antonio: - O artigo 4. creio que não póde passar do modo que está concebido, porque he desigual, e contrario á justiça. Diz o artigo (leu-o). Se este filho, e criados se entendem dos que são empregados na lavoura, he desnecessario fazer-se aqui expressa menção, mas eu creio que se entende, que elle fica isento pelo simples facto de ser filho de um lavrador, que deita tres moios de semente a termo. Esta isenção não pôde passar Do artigo por ser confraria á igualdade. Pela portaria de 1813 erão isentos não só estes criados da lavoura, mas ate mesmo alguns criados de empregados publicos. Logo he contrario á igualdade conceder se a uni lavradores a isenção de um criado, quando isto se não concede aos outros. O mesmo digo a respeito dos filhos: quando o projecto aqui fala a respeito do commercio, diz (leu o artigo). Logo para este filho ser isento requer que elle seja matriculado na junta do commercio. Por tanto tambem he contra a igualdade; porque não requer isto mesmo a respeito do lavrador. De mais este projecto não póde aproveitar em geral, porque hcnecessário fazer a differença dos terrenos, e do modo, por que em alguns se costuma fazer a agricultura; e do contrario não virião a ficar isentos os lavradores de Campo de Ourique, o de outros sítios, apezar de terem uma abegoaria igual á dos lavradores do Alemtéjo. Na provincia do Alemtéjo para se estrumar as terras, costuma-se fazer com o ovelhal; o milho tem duas sachas, e estas costumão-se fazer em um tempo muito differente. Diz o artigo: "aquelles que tem existido por mais de um anno com o mesmo anno". Isto era o mesmo que hão se conceder tal isenção, e direi que pela portaria de 1813 te fazia isto mais amplamente: porque me parece que comprehende os de mesmo districto. Por tanto julgo desnecessarias as clausulas "criado, e filho do lavrador, etc."
O Sr. Presidente observou que era necessário economisar o tempo, porque todos os Senhores pretendião falar, e que alguns segunda vez; e que deste modo não teria nunca termo a discussão do projecto.
O Sr. Derramado: - Não se lamente o tempo que se gasta na discussão d'uma materia de tanta transcendencia; ella he tão importante, que tem chamado a attenção d'um tão grande numero de illustres Deputados, e todavia não he possível liquidar uma opinião; isto prova a necessidade que havia de estabelecer-se uma escala de isenções a respeito da economia rural, accomodada, ás diversas provincias do Reino. Os illustres membros da commissão de guerra, apesar do seu patriotismo, não acertarão com o verdadeiro meio de poderem favorecer a agricultura nas circunstancias presentes. Alguns dos Senhores que tem apoiado o artigo 4.° tem laborado em dois principios falsos; o primeiro de supporem que eu e meus illustres collegas do Alemtéjo requeremos isenções exclusivas a favor d'agricultura da nossa província; e o segundo que o artigo em questão concede a isenção de três indivíduos a todos os lavradores que semeião mais de três moios. Mas ao contrario, eu e todos os Srs. Deputados do Alemtéjo, tem sempre querido que estes privilégios sejão extensivos a todas as províncias. Os illustres autores do projecto tiverão sim intensão de conceder tres individuos isentos; porém verdadeiramente não concedem mais do que um, quando o lavrador não tiver filho, nem abegão; dois quando tiver abegão, ou filho; e tres aos poucos que tiverem filho, abegão, e

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criados. Portanto concede-se a isenção a tres individuos, o que em geral eu tenho mostrado, que não vem a ser a mais de um, e diz-se que por esta lei se concede grande favor á agricultura. A lei de 1764 concedia grandes isenções aquelles lavradores que semeassem de seis moios para cima; e a de 1813 concede-lhes tantos criados quantas forem as juntas de bois com que lavrarem. O projecto em questão he certamente mais mesquinho. Creio que tenho mostrado que effectivamente não se estabelecem as isenções que os illustres autores do projecto pretendem conceder; e que de mais a mais nem ao menos se estabelecem aquelles que até aqui e sempre tem havido. De mais que ideas vamos nós dar das nossas forças, se para pôr o nosso exercito em pé de paz, he necessario derogar isenções sempre entre nós concedidas? Igualmente noto, que o artigo propõe uma base que não he exacta, e que mesmo não poderá ser exequivel, que he a do numero de moios que o lavrador deitar á terra: parece-me que seria melhor estabelecer a das juntas de bois com que lavra o lavrador, porque então por este modo he que as camarás poderão com facilidade fazer effectivo o privilegio. Em quanto á clausula de ser necessario que o criado tenha estado por mais de um anno, já se mostrou que isso tambem era impraticavel. Ora parece-me que está assas demonstrado que o artigo não pode passar tal qual está concebido: logo se elle não pode passar, creio que se póde approvar a minha indicação, que concede aos lavradores consideraveis todos os filhos e criados d'anno; e isto he conceder-lhes menos do que lhes concedia a portaria de 1813; porque os lavradores de lote que tem mais de quinze, vinte, e trinta juntas de bois, tem incomparavelmente menor numero de filhos e criados d'anno; todavia por esta fórma ficão mais bem reguladas as isenções, porque se comprehendem os ganadeiros, os mais importantes criados f e mais difficeis de supprir. Muito teria a dizer sobre esta importante materia, mas não quero abusar da paciencia deste augusto Congresso.
O Sr. Silveira: - Approvando-se todas as isempções que tem sido propostas, então he escusado estarmos a gastar mais tempo: he melhor dizer, que se não faça o recrutamento; porque mesmo com as isempções que estabelece o artigo, talvez se veja para o futuro o quanto ha de ser difficultoso e poder-se completar. Concedendo-se a isempção de todos os criados dos lavradores, em breve tempo não haveria um só que não fosse da idade: além disso eu não vejo motivo algum para que sejão mais favorecidos os lavradores de mais grande cultura, do que aquelles que são delirais pequena. Eu não digo, que a agricultura não seja favorecida; mas não se póde dizer que o não he, quando se lhe concede filhos, criados, e os maiores dos seus rebanhos. Por tanto torno a dizer, se queremos que se conceda mais alguma isempção então o melhor he deixar-mos-nos de recrutamento.
O Sr. Protextato: - Que a agricultora seja favorecida, e que o deve sempre ser, isto para mim he um axioma de eterna verdade; porém tenho visto tantos embaraços para se fazer isto, que me proponho a fazer uma emenda, e vem a ser: cala marcado o prazo, ou idade em que se deve fazer o recrutamento, e he de 18 a 25 annos. Ora quizera eu que a favor da agricultura, em lugar de haver estes 7 annos de differença, houvesse unicamente 3; e as outras classes fossem então quem ficassem incluidos nos 7 annos. Se esta emenda for do agrado do Congresso eu estimarei muito, e a proporei por escrito se for necessario.
O Sr. Leite Lobo: - Requeiro a V. Exca. que queira mandar ler a acta para se saber o que está decidido a respeito do segundo artigo; porque creio que disso provem a maior parte das objecções que se tem feito.
O Sr. Secretario Basilio Alberto leu a referida acta.
O Sr. Pato Moniz: - Em quanto a mim acho, que o projecto tem um defeito capital, que talvez tem sido causa de com elle desperdiçarmos tanto tempo. O projecto estabelece primeiro ai excepções do que a regra: vem primeiro 17 artigos de isempções, e somente no §. 18 he que diz "todos os individuos não comprehendidos nos artigos antecedentes cujas idades sejão entre 18 e 25 annos, etc." Parece-me que nós deviamos tomar por bate a idade; e então não sei qual he o motivo, porque se não ha de dizer logo no principio do projecto "são comprehendidos no recrutamento todos os indivíduos de 18 a 25 annos" e depois passar-se a marcar as excepções. Mas tambem, sendo certo, como disse o Sr. Franzini, que na classe dos moços de 18 a 19 annos temos 20 a 21 mil homens e nas outras pouco mais ou menos o mesmo numero; e sendo, como se tem dito que vamos fazer um recrutamento provisorio, para o qual sómente se necessitão L2 a 13 mil homens, julgo que se poderia emendar o prazo para o recrutamento, determinando-o sómente da idade tal até tal, não abrangendo mais de 3 até 5 annos, e declarando-o logo no principio. Se isto se fizesse assim, parece-me que correria facil a discussão, serião approvados, e eu mesmo não duvidaria approvar os artigos quasi a fluxo.
O Sr. João Francisco d'Oliveira: - Tudo quanto he privilegio he anti-constitucional. Um magistrado, um advogado defende o credito, e a propriedade; o medico protege a saude; o negociante o commercio; e a agricultura promove a abundancia; mas a tropa he quem defende tudo, e á sombra da sua defeza, he que se exercitão todas as artes. Por tanta parece-me que ninguem deve ser privilegiado, quando se trata de sustentar a causa da Nação. He perciso que todos os povos que reconhecerão a necessidade do regime constitucional, facão unia mama para mostrarem aos déspotas, que nos estamos prompto para defender a Constituição, que nos libertou, e talvez que este systema em breve vá libertar a Europa inteira. As guerras constitucionaes, não são guerras de caprichos, porque isto já acabou; assim como a avidez de conquistar. Portanto o meu voto he, que visto achar-se feito o senso da Nação, esta lei volte á Commissão para a formar sobre outra base, que deve ser a da idade; e depois fazer-se um sorteamento. Igualmente digo, que o soldado não deve servir menos de tres annos, nem mais de cinco.

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O Sr. Barreto Feio: - A primeira lei he existir, a segunda, que he da mesma data que a primeira, he defender-se. para um povo existir he preciso cultivar a terra, e para se defender he preciso arruinar-se: por isso quando se trata de recrutar o exercito não se deve perder de vista a agricultura. Convencidos da exactidão destes principios, nós temos aos pequenos lavradores a insempção de um filho ou creado, favor que se julgou proporcionado ás precisões do seu pequeno trafico; e agora que se trata dos grandes lavradores, isto he daquelles que lavrão com cinco arados, ahi para cima não deveremos partir do mesmo principio, e seguir a mesma proporção, concedendo-lhes um favor igual às suas preciões? Ou temos injustos, quando aos que lavrão concedemos a isempção de um filho, eu creado, ou, o seremos agora, senão concedermos maior isempção aos que lavrão com mais de cindo arados. De duas, uma: ou se há de adoptar o methodo da conscripção, e nenhum cidadão ser insempto do recrutamento, senão aquelle que por sua idade ou incapacidade fysica for inspto para o serviço confiar: ou se há de continuar a seguir aquelle, que entre nós está em pratica, de obrigar a servir aquelles que fazem menos falta na sociedade. O 1.º he sem duvida o mais conforme com a rasão, e com a justiça; mas permittirão as nossas circumstancias que nós o adoptemos desde já: Parece-me que primeiro he preciso vencer alguns obstaculos, que só por meio de uma sabia legislação podem ser destruídos. As propriedades achão se nas mãos de poucos: he ...... o numero dos não proprietarios: aquelles estão ligados ao terreno, estes não tem vínculo algum que os prenda á sociedade,. Em taes circumstancias se estabelessemos a conscripção, resultaria que os ultimos nada tendo que perder fugirão do paiz, para não serem soldados, os discritarião depois de o serem, e os primeiros serião obrigados a servir em logar destes, sendo por este modo a pagar por si e pelos outros.
De todas as nações da Europa he a França a unica, que tem adoptado a conscripção: mas era também a França aquella, que estava em circumstancias de a adoptar; porque em nenhuma outra as terras estão mais bem divididas, em nenhuma outra he maior o numero dos pequenos proprietarios. Quando nós estivermos em iguaes circumstancias então adoptaremos também a mesma medida.
Ora não sendo possível adoptar-se já a conscrpção, só temos a lançar mão do methodo até agora seguido, abolado os privilegios pessoaes, que já pela constituição se achão extinctos; e neste sentido foi concebido o projecto.
Tem dito alguns illustres Prepinantes, que os que se tem opposto ao artigo pertende um privilegio exclusivo para o Alemtejo. Não se pertende privilegio algum exclusivo: propõe-se uma medida geral; e vem a ser, que os filhos e creados dos lavradores que lavrarem com cinco arados e dahi para cima, de qualquer provincia que sejão fiquem isemptos do recrutamento. Onde esta aqui o privilegio exclusivo?
Outros tem tribuido a falta de população á esterilidade desta provincia he este um erro de facto em que só pode incorrer quem nunca passou o tejo. Eu tenho transitado por quasi toda a superficie de Portugal, e à excepção dos campos de Riba Tejo, não tenho encontrado terreno tão fertil como o daquella provincia. Nenhum de he tão facil de cultura, nenhum he de maior producção, nenhum de tão cortado de ribeiras, nenhum de mais abundante de fontes, e os juncos nascidos por toda a parte estão dizendo ao passageiro sequioso que ás duas cavadellas achava agua. Mas, apezar de ser esta provincia tão favorecida pela natureza, está reduzida à um deserto. Donde provem a causa deste fenomeno? A causa está na legislação.
A Beira Alta e o Minho, que são as provincias mais povoadas do reino, são podem competir com a d'Alemtejo em fertilidade: o seu terreno he difficil de cultura, precisa ser arroteado, e depois de um trabalho de quatro ou cinco annos, para produzir alguma cousa necessita ser ajudado com adubos. Na Beira são poucos os rios, rarissimas as fontes; e os seus habitantes para tarem uma gota d'agua para beber são obrigados a abrir poços de 30 e 100 palmos de prufundidade, e a rasgar as entranhas das serras para tirar uma pequena veia d'agua, que por aqueductos subterraneos conduzem a rogar um pequeno valle.
Donde vem que, sendo estas provincias menos ferteis, sejão as mais povoados! A causa he conhecida. Como estas provincias forão as primeiras conquistados aos Mouros, os povos fugirão da oppressão, vinhão de toda a parte ali refugiados, e a pouco a pouco se são estabelecendo. Os donativos forão afourando as terras, que não podião cultivar, e as corporações de mão morta, que tão feitas tem sido em toda a parte do mundo, também não deixão de concorrer muito para o aumento da agricultura (faça tem sido os erros dos nossos legisladores!) porque tendo-lhes sido feitas grandes danções de terrenos, e não podendo ellas resistir senão á conta dos vivos, tratarão logo de os aforar. Todo o homem robusto que se apresentava as portas d'um convento pedindo terra para cultivar, sem intervenção dos magistrados nem do desembargo do paço, obtinha logo a sua carta de aforamento, e passava a ser proprietário. E por este modo vierão aquellas provincias e povoar-se rapidamente.
O Alemtejo, sendo a ultima provincia conquistado, foi divida entre quatro grandes, que á maneira de nos conquistadores, não só não tem querido alternar porção alguma dos seus domínios, mas tem sempre procurado entendelas. Os homens nascem naquella provincia, mas não achão um palmo de terra onde possão fixar-se. he doloroso ver annualmente os differentes districtos della mudarem de habitantes, ver um lavrador que por muitos annos tinha cultivado uma herdade, porque o senhorio lhe levanta a renda, os porque elle não pode pagar aquella em que a trazia, ser expulso, e ir sem saber para onde com seus filhos e com seus gados.
Ora, sendo estas se circumstancias daquellas provincias, quem não vão que, se ficarem sujeitos ao recrutamento os filhos e criados dos grandes lavradores, a agricultura vai de todo a extinguir-se, e a provincia a ficar inteiramente deserta. Nem se pense que este favor he demasiado, os que se possa abusar dei-

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le; porque nenhum lavrador pode ter mais criados que aquelles que absolutamente lhe são indispensaveis. Por tanto, reprovando o artigo, approvo a indicação do Sr. Derramado.
Julga a materia sufficientemente discutida, o Sr. Presidente procedeu à votação sobre o artigo 4.º, e foi apoprovado substituindo às palavras = e o criado tentado pode mais de um anno existido com o mesmo anno, e empregados effectivamente na lavoura = as seguintes = e o ercado de anno tenhão sido empregados regulamente na lavoura. = Entrou em discussão o artigo 5.º, que depois de discutido se decaiu que fosse supprimido. Entrou em discussão o 6.º que foi approvado com a supressão das palavras = que viver com sua mãi = e com o seguinte additamento, proposto pelo Sr. Braxado de Brito.
A mesma isenção se entenderá com o filho unico ou um, todo mais, do pai que pela sua idade, ou molestia, tiver impedimento permanente de trabalhar, servindo he de amparo, e alimentando-o.
Entrou em discussão o 7.º sendo porém chegado a fim da sessão sem se julgar sufficientemente discutido, ficou adiado.
Distruibuírem-se pelos Srs. Deputados os projectos impressos numeros 13, 23, 24, e 25, e dando o Sr. Presidente para ordem do dia a continuação da discussão sobre o mesmo projecto numero 37, e a leitura das indicações para a ultima hora levantou a sessão depois das duas horas da tarde. Basilio Alberto de Sousa Pinto, Deputado Secretario.

Resoluções e Ordem das Cortas.

Decretos.

As Contas decretão provisoriamente o seguinte:
1.º Seria conservados os provadores nomeados pela Companhia para provarem alternadamente os vinhos em os respectivos districtos, segundo o uso estabelecido.
2.º Cada uma das camaras do Douro elegerá annualmente na primeira semana do mez de Novembro um provador dos vinhos do seu districto, e um substituto, que suppra as suas vezes. Nem um nem outros, poderão escusar-se sem causa legítima verificada pela camara.
3.º Os provadores eleitos pelas camaras prestarão juramento perante ellas de bem cumprirem seus decretos, e sem outra formalidade, ou alguma dependencia da Companhia, entrerão no exercicio de seus cargos, unindo-se cada um em seu districto aos provadores nomeados pela Companhia, a fim de que por todos sejão provados os vinhos que nelle existem.
4.º Em cada uma das freguezias do Douro haverá também um provador, o qual se juntará nos supramencionados no acto de entrarem na freguezia, para provas os vinhos que nella houver juntamente com elles. Será eleito annualmente na igreja paroquial em o primeiro Domingo do mez de Dezembro, depois da nossa conventual, pelo methodo estabelecido para as eleições das camaras em o decreto de 20 de Julho do corrente anno. Terá um substituto, que será o immediato em votos. O paroco da freguezia presidirá a esta eleição, na qual serão somente admittidos a votar os proprietários de vinhas na freguezia.
5.º Não poderão ser reeleitos em o anno immediato assim os provadores dos districtos das camaras, como os eleitos pela freguezias.
6.º O vinho se provará por amostras, que serão tiradas dos toneis em presença dos escrivães da Companhia, do deu fiscal e do provador da freguezia, e guardadas em garrafas uniformes, em cujo fundo estará um bilhete voltado para dentro com declaração do nome do lavrador, numero do tonel e adega.
7.º Todas as garrafas de provas serão fechadas em caixões de duas chaves, uma das quaes ficará em mão do commissario da Companhia, e outra na do provador da freguezia, sendo dahi tiradas no acto das provas por ambos os clavincultarios, de maneira que não haja dele, nem se conheça por quaesquer signaes qual seja o lavrador a que pertencem.
8.º Cada provados terá seu caderno feito na forma costumada, e uma carteira com pequenos quadrados de papel, fornecidos pela Companhia, em uns dos quaes esteja impresso a letra - A - que quer dizer approvado; em outros a letra - R - que quer dizer refugado; e em outros - T - que significa terceira qualidade. Cada um dos provadores, logo que tiver provado o vinho, lançará em cima de uma meza o seu voto, dobrado o papel de modo que se não veja a letra. Na qualidade de regugado incluirão os provadores os vinhos frescos e defrituosos, que não merecem a terceira qualidade. Assistirão as provas os commissarios da Companhia no districto, os quaes abrirão os votos depois de os misturarem; e a qualidade dos vinho ficará definida pela maioria. No caso de empate de votos decidirá o commissario.
9.º As provas se farão em uma casa da freguezia, o que o provador da mesma terá pronta para esse fim. Os provadores se farão annunciar por editores na forma costumada; e os escrivães e fiscal da Companhia, com o provador da freguezia, terão prontas as amostras de modo que os provadores se não demorem.
10.º Depois de feitas as provas de todas as amostras, e dados os votos segundo o artigo 8.º, se despegarão os bilhetes do fundo das garrafas, e os provadores associarão em seus cadernos o resultado das provas declarando em frente a adega, tonel e lavrador a quem pertence.
11.º Os commissarios assistirão à prova, que será feita á porta aberta, e terão um livro já pronto como os cadernos, no qual lançarão a qualidade vencida, e o numero do tonel adiante do nome do lavrador, depois de abrirem os bilhetes na forma do artigo 8.º
12.º Feita a prova em cada freguezia, os provadores, que a ficarão, assignarão o livro dos commissarios logo por baixo dos nomes dos lavradores no mesmo inscriptos, para o que haverá espaço conveniente.
13.º Os commissarios da Companhia darão aos lavradores bilhetes assignados pelos tres provadores na forma do costume.
14.º A Companhia fornecerá os impressos e livros

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necessarios, como até agora; e bem assim as garrafas para as amostras.
15.º He proihido aos provedores dizerem qual foi seu voto, ou fazerem signaes que o indiquem, durante a votação.
16.º Para que a presente lei tenha desde já a sua devida execução, ficão prorogados por mais quinze dias, no corrente anno sómente; os periodos determinados no decreto de 11 de Maio de 1822 para a remessa do juizo do anno, e para abertura da feira.
17.º Fica revogada qualquer legislação na parte em que for opposta ás disposições da presente lei.
Paço das Cortes 13 de Dezembro de 1822. - José Joaquim Ferreira de Moura, Presidente; João Baptista Felgueiras, Deputado Secretaria; Agostinho José Freire, Deputado Secretario.

As cortes decretão provisoriamente o seguinte:
Nas divisões eleitoraes de Aveiro, Trancoso, e Leiria, se procederá, segundo o methodo prescripto na Constituição, á eleição de um Deputado Ordinario, que falta por cada uma dellas, e dos substitutos correspondentes, na fórma da tabella, quer acompanhando o decreto de 11 de Julho do corrente anno, recorrendo-se as assembleias primarias em o terceiro domingo do mez de Janeiro de mil oitocentos e vinte e trez.
Paço das Cortes 14 de Dezembro de 1822. - José Joaquim Ferreira de Moura, Presidente; João Baptista Felgueiras, Deputado Secretaria; Agostinho José Freire, Deputado Secretario.

As Cortes decretarão provisoriamente o seguinte;
1.º A Regencia do Brasil residirá na cidade da Bahia enquanto lhe não parecer conveniente transferir-se para outra parte do Reino.
2.º Todas as provincias do Brasil ficão sujeitas á Regencia, excepto as do Pará e Maranhão em quanto ella residir ao sul do Cabo de S. Roque. Qualquer outra provincia poderá ficar immediatamente dependente do Governo de Portugal, e as Cortes assim o resolverem em virtude de representações, que para esse fim lhes sejão dirigidas.
3.º Cada um dos Membros e Secretaria da Regencia do Brasil terá o tratamento de Excellencia, e vencera de ordenado annual a quantia de quatro contos de réis.
4.º Cada Secretaria da Regencia do Brasil será composta de um oficial maior, dois oficiais ordinarios e dois officiaes, um de primeira, outro de Segunda classe: terão uns e outros as mesmas graduações e vencimentos que se achão regulados para as Secretarias de Estado pelo decreto de 12 de Junho do presente anno.
Lisboa Paço das Cortes 17 de Dezembro de 1822. - José Joaquim ferreira de Moura, Presidente; João Felgueiras, Deputado Secretaria; Agostinho José Freire, Deputado Secretario.

As Cortes, havendo declarado nulla a eleição dos arcos de Val de Vez, decretão que naquella divisão eleitoral se proceda, segundo o methodo prescripto na Constituição, á eleição de quatro Deputados, e de outros tantos substitutos, que lhes correspondem, na forma da tabella que acompanhou o decreto de 11 de Julho do corrente anno, reunindo-se as assembléas primarias em o terceiro domingo do mez de Janeiro proximo futuro.
Lisboa Paço das Cortes 18 de Dezembro de 1822. - José Joaquim Ferreira de Moura, Presidente; João Baptista Felgueiras, Deputado Secretario; Agostinho José Freire, Deputado Secretario.

As Cortes decretão provisoriamente o seguinte:
1.º A todos os empregados civis que forem despachados para o Ultramar, ainda que tenhão graduações militares, se adiantará a quarta parte de seus ordenados annuaes, a qual lhes será descontada, apenas cheguem a seus destinos, pela Sexta parte de seus vencimentos mensaes.
2.º O transporte dos referidos empregados será feito á custa da Nação, mas nada lhes dará a titulo de comedorias.
3.º Ficão revogadas quaisquer disposições na parte em que forem appostas á da presente lei. - José Joaquim Ferreira de Moura, Presidente; João Baptista Felgueiras, Deputado Secretaria; Agostinho José Freire, Deputado Secretaria.

Sessão de 30 de Dezembro.

Aberta a sessão, sob a presidencia do Sr. Moura, leu-se a acta da antecedente, que foi approvada.
Mandarão-se lançar na acta as seguintes declarações de voto: 1.ª Declaro que na sessão de 28 de corrente foi de voto que devião ser isentos do recrutamento da tropa de linha os filhos, e creados d'anno dos lavradores que lavrassem com mais de cinco juntas de bois; sendo uns e outros regularmente empregados no serviço da agricultura. - Derramado, Cordeiro da Silveira, Calado Palma, Barreto Feio.
2.ª Na sessão de 28 do corrente propuz a fui de voto, que a isenção do recrutamento concedida ao filho unico de viuva, ou tendo mais, aquelle que for seu amparo, comprehendesse tambem os filhos de mulheres solteiras que achassem nas mesmas circunstancias; sendo estas doentes, ou tendo cincoenta annos de idade. - Fernando Antonio de Almeida Tavares de Oliveira.
O Sr. Secretario Felgueiras deu conta do expediente, mencionando
1.º Um officio do Ministro da Marinha, com a parte do registro do porto, tomada aos navios, Marquez d'Angeja, e Vulcano, no dia 28 do corrente; de que as Cortes ficarão inteiradas.
2.º Outro officio do mesmo Ministro, com a parte do registro do porto tomada ao navio S. Boaventura, no dia 29 do corrente. Ficarão as Cortes inteiradas.

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