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SESSÃO DE 6 DE FEVEREIRO.

Ás 9 horas é 45 minutos da manhã, pela chamada, a que procedêo o Sr. Deputado Secretario Ribeiro da Costa, se acharão presentes 83 Srs. Deputados, faltando, alem dos que ainda se não apresentarão, 19, a saber: os Srs. Camello Fortes - Leite Pereira - D. Francisco Almeida - Bettencourt - Trigoso - Izidoro José dos Sonctos - Ferreira de Moura - Costa Sampaio - Pinto Villar - Braklami - Gerardo de Sampaio - Mascarenhas Mello - Rebello da Silva - Luiz José Ribeiro - Pimenta d'Aguiar - Gonçalves Ferreira - Pereira Coutinho - Alvares Dias - todos com causa motivada; e Ribeiro Saraiva sem ella.

Disse o Sr. Presidente que estava aberta a Sessão. E, sendo lida a Acta da Sessão precedente, foi approvada.

O Sr. Bispo de Cabo Verde: - Tendo que offerecer á Camara um Projecto sobre as Ilhas de Cabo Verde, que pedem medidas Legislativas, peço a V. Exca. licença para o poder apresentar, quando for tempo.

O Sr. Presidente: -- Fica inscripto na lista das Proposições o Sr. Deputado.
Dêo conta o Sr. Deputado Secretario Ribeiro da Costa da Correspondencia seguinte: De um Officio do Ministro dos Negocios do Reino, remettendo os esclarecimentos , que lhe forão pedidos sobre o Requerimento de Jacob Dorhman Herol e Companhia, que se mandou remetter á Commissão de Petições, pela qual havião sido pedidos.

De outro Officio do mesmo Ministro, remettendo os Officios, que contem o
Projecto sobre a Divisão do Territorio Portuguez, com dezesete volumosos maços de Documentos, que tractão do mesmo objecto; tudo, em resposta ao Officio, que lhe fora dirigido em data do 1.º do corrente.

O Sr. F. J. Maya: - Parecia-me que todos esses Papeis, que vem da Secretaria d'Estado, deveriam ser remettidos ao Archivo, porque podem «ar úteis não somente á Commissão, por quem forão pedidos, senão a outra qualquer; e precisando d'elles podião-se lá ir procurar.

O Sr. Secretario Barroso: - A marcha adaptada he que seja o remettidos á Commissão, que os reclamou.

O Sr. Presidente: - Parece que quando uma Commissão pede quaesquer Documentos, e estes são remettidos á Camara, a primeira direcção he manda-los para essa Commissão.

Mandou-se remetter á respectiva Commissão para, depois de ser tudo por ella examinado, se guardar no Archivo.

Dêo mais conta de um Officio do Ministro dos Negocios Estrangeiros, restituindo o Requerimento de D. Maria Ingás de Mello e Castro, com todos os mais Papeis, que lhe havião sido remettidos, para dar sobre elles os esclarecimentos necessarios, que se mandou remetter á Commissão de Petições.

De um Officio do Sr. Marquez de Tancos, remettendo 138 Exemplares da Letra = D = das suas Actas impressas, que se mandarão distribuir. E de mm Officio do Sr. - Deputado Ferreira de Moura, participando que por doente não pode comparecer á Sessão.

Ordem do Dia.

Projecto N.° 101 , sobre a Liberdade do Commercio.

Entrou em discussão o Artigo 1.º, o qual foi lido pelo Sr. Secretario Barroso.
« Ficão abertos os Portos de Lisboa, e Porto a todos os Navios Mercantes de qualquer Paiz, com quem Portugal não estiver em Guerra; e, ainda no caso de Guerra, será respeitada a Propriedade Particular.»

O Sr. Pereira do Carmo: - O Artigo tem duas partes, na primeira se estabelece em principio, que os Portos de Lisboa, e Porto ficão abertos a todos os Navios Mercantes de qualquer Paiz, com quem Portugal não «estiver em Guerra: na segunda se faz uma ampliação deste principio ao caso de Guerra, a fim de que então mesmo seja respeitada a propriedade particular. Sustento a doutrina do Artigo em ambas as suas partes. Quando em 2 de Outubro de 1822 tive a honra de ser o primeiro, que propuz ás extinctas Côrtes o estabelecimento de um Porto Franco nesta Capital, tomei por tema da minha Indicação o seguinte: = devemos cuidar do nosso velho, e cansado, Portugal, agora mais do que nunca. = São passados quasi cinco a n nos, e vendo, com muito prazer meu, que se torna a fallar desta materia, não duvido fazer uso do mesmo tema, com o additamento de uma só palavra: = devemos cuidar do nosso velho, cansado, e dilacerado Portugal, agora mais do que nunca. - Forão estas sem duvida as intenções da Illustre Commissão de Fazenda, quando lançou com tanto acerto este primeiro Artigo do seu Projecto.

Sr. Presidente, a nossa posição politica, económica, e commercial he muito particular. Separou-se o Brasil, não por causa de uma facção, como se assoalhou com a mais sulina ignorancia, ou com a mais insigne má fé, mas porque assim o quiz a natureza das cousas: quando os Filhos chegão a ser tão ricos, e poderosos, como seus Pais, he muito difficil, para não dizer impossivel, que por longo tempo lhes obedeçam. O sistema colonial em todo o Continente Americano acabou por uma vez para todas as Nações da velha Europa. Os sucessos politicos tem-se precipitado uns sobre os outros com uma rapidez espantosa; e deste movimento geral surgem novos Estados, que se organizam naqueles mesmos Paizes,
que ainda ha pouco gemiam debaixo do jugo de outro Hemisferio. E, na presença do andamento apressado dos homens, e das cousas, será possivel que Portugal desande, ou se conserve estacionário, regulando-se por antigas, e carcomidas rotinas? De nenhuma sorte: altas perdemo-nos de todo. O que aconselha pois a sabedoria, he que tiremos partido, e façamos valer tudo o que ainda nos testa da vasta herança de nossos bons Maiores. Tiremos partido da nossa posição geográfica, das nossas costas, dos nossos portos, e particularmente desta bella, e vasta Enseada que temos á vista. Convidemos todas as Nações do Mundo a que, debaixo da protecção de Leis sábias, justas, e moderadas, venham enriquecer-se, e enriquecer-nos. Este convite he o que foz a Com missão de Fazendo no 1.º Artigo do seu Projecto.

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Houve porem n a Sessão de hontem um meu Illustre Amigo, (cujas luzes, e probidade muito respeito) o qual se oppoz ao Projecto, por não vir acompanhado de um: Regimento de fiscalisação, que desde logo nos livrasse do risco do contrabando.

Sr. Presidente: o primeiro passo que dou, quando examino qualquer Projecto, he pegar d'elle, leva-lo á medida pela bitola da utilidade publica; e, senão chega, rejeito-o immediatamente. A maneira de construir esta bitola he proceder a uma rigorosa analyse da Proposta em questão, descobrir as vantagens, e inconvenientes, que d'ella podem resultar, e pesar umas, e outras na balança do bom senso. Tal foi o caminho, que segui, quer do discuti comigo mesmo este Projecto do Commissão. As grandissimas vantagens, que nos pode trazer, são: vèrmos este magnifico Porto, até agora ermo, coberto de Navios; os estaleiros, até agora silenciosos, recobrando a soa actividade; as tercenas, e armazens, até agora occupados pelas moscas, e teias de aranha, cheios de fazendas. As Commissões, o emprego de muitos braços, o consumo dos productos da nossa agricultura, e industria; n'uma palavra, um movimento geral de vida commercial será em ultima analyse o effeito do Projecto convertido em Lei. Tambem me parece que os novos Estados d'America Meridional, não tendo ainda bem fixadas es suas relações commerciaes com a maior parte das Potencias da Europa, e carecendo de um deposito nesta parte do Mundo, se aproveitarão do Porto de Lisboa, que pode vir a ser, como já foi, o Emporio do Commercio do Universo. Taes são as vantagens do Projecto: vamos aos inconvenientes. Todos se reduzem a um só, o risco do contrabando. Confesso que me faz grande peso este inconveniente, attendendo á relaxação da moral publica, tão infelizmente generalisada. Ha todavia remedio, que he empregar es homens, dando-lhes bem de comer, pois quando a necessidade bate á porta, foge a virtude, pela janella, como já repeti em outras occasiões; e, se assim mesmo prevaricarem, sejão severamente punidos. Em quanto ao Regimento exigido pelo Sr. Derramado, se por ventura for necessario, sou de parecer que o faça o Governo, por duas razões: 1.º porque ao Governo compete, segundo a Carta, decretar as medidas indispensaveis para a boa, e pontual execução das Leis: 2.º porque, sendo necessario em semelhantes Regimentos descer ás mais pequenas miudezas em materia de facto, he evidente que o Governo está mais ao alcance dos factos, do que as Camaras Legislativas, em quanto á segunda parte do Artigo, tambem a approvo, porque produz confiança, que he a mais segura base do Commercio: demais, este principio esta consignado no Código das Nações, e pena he que se não generalize á propriedade particular, aprehendida sobre os mares, para não vermos em manifesta opposição o Direito das Gentes, que regula a guerra maritima, com o Direito das Gentes, que regula a guerra terreste.

O Sr. Derramado: - Levanto-me para sustentar o Artigo 1.º do Projecto; e não pareça que estou em contradicção comigo mesmo, havendo na Sessão de hontem rejeitado a sua adopção, e hoje defendendo alguns dos seus Artigos. Se o meu Illustre Amigo houveste conservado na lembrança os motivos, que expendi, conheceria que eu o rejeitei, não porque duvidasse dos principios, em que se fundamenta, nem da utilidade, que d'elle deve resultar á Fazenda Publica, e á nossa Industria, uma vez que seja fielmente executado; mas sim por julgar impraticável esta fiel execução, em quanto se não adoptarem parallelmente os Regulamentos necessarios para montar um semelhante Estabelecimento, de modo que se evitem os Contrabandos, e se fiscalizem exactamente os Direitos respectivos do Thesouro. Estes Regulamentos não cabem nas Attribuições do Governo, porque dependem de Medidas Legislativas, que reformem a Administração, os Administradores, e mais Empregados nestas Repartições; e Medidas Legislativas só cabem nas Attribuições das Côrtes.

Não ignoro, torno a dizer, as vantagens dos Portos Francos, bem que ente não tal no sentido stricto da palavra, mas antes um Deposito Real, segundo a fraze Franceza; mas firme na opinião, de que a utilidade de semelhante Estabelecimento se não ha de realisar antes de se estabelecerem as suas competentes Relações Administrativas com o Mercado geral do Mundo, e com o Mercado Nacional, todavia como o Projecto esta em discussão, irei fazendo a cada ura dos seus Artigos as observações, que me occorrerem. Admitto a primeira parle do que se discute; e, quanto á segunda, parece-me que exige maior clareza, porque provavelmente a Commissão quer que se entenda toda a Propriedade Particular, que se achar dentro do Porto, e nos Depósitos ao tempo da declaração de Guerra.

O Sr. Van-Zeller: - Todas as Leis devem ser muito claras, mas particularmente as Leis do Commercio (lêo parte do Artigo). isto he tudo relativo aos Navios (continuou d ler o Artigo) parece pois que esta Propriedade Particular se refere só aos Navios. Não posso duvidar que a Commissão tenha lido em vista estabelecer a mesma regra, a respeito das Mercadorias, que estabelecer a respeito dos Navios Mercantes; mas como não acho muito clara nesta parte a letra do Artigo, julgo que devia accrescentar-se depois das palavras Propriedade Particular = que existir de qualquer modo nos dictos Portos, e Depositos, = salvando a redacção.
O Sr. Marciano de Azevedo: - A materia do Artigo não he nova, já se acha espalhada em differentes Leis desde 1796; com indo contém hoje que appareça a doutrina do Artigo com toda a clareza, porque he preciso ser entendida tambem pelos Estrangeiros, e por isso mesmo he sobre tudo necessario declarar as ultimas expressões do Artigo, porque do modo que está concebido parece que se quer respeitar toda a propriedade, ainda a que vier depois de feita a declaração de guerra; por isso depois das palavras = será respeitada a Propriedade Particular = eu accrescentaria = e ainda no caso de guerra será respeitada a Propriedade Particular de qualquer mercadorias, e embarcações entradas nos Portos de Portugal antes de lhes ser conhecido o estado de guerra =.

O Sr. Mouzinho da Silveira: - O Sr. Derramado ainda insiste em a objecção dos contrabandos, e já me parecia que estava desprezada esta insistencia; segundo as minhas observações na materia geral, he preciso quasi repetir o que disse hontem, e vem a ser: a primeira cousa he fazer a Lei; a segunda declarar a quantas Alfandegas he applicavel; a terceira he dar

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Regulamentos proprios ás Alfandegas, que ficarem, ou a uma só, se a reunião tiver lugar; esta offerece poucas novidades sobre a possibilidade de contrabandos, que d'antes não tivessem lugar. O Alvará de 26 de Maio de 1812 contém o systema das re-exportações: o que há de differença são os direitos; por elle erão de 2 por 100 para os generos então Coloniaes, 4 por 100 para os Inglezes, e 5 por 100 para as outras Nações, agora são todos de 1 por 100; depois daquelle Alvará veio o de 4 de Junho de 1825, e por ele tiverão lugar depositos, e re-exportações de cousas de alto preço, e não teve lugar por isso regulamento novo; nem elle he preciso se não por causa do methodo, e no seu devido tempo; o Sr. Derramado póde descançar a esse respeito, o Governo cuida desse objecto.

Quanto a outras cousas, que tenho ouvido, declaro que o Artigo a respeito de Navios, e Bandeiras, he absolutamente geral; he por isso que nelle está escripta a idéa negativa = com que Portugal não estiver em guerra =.

Pelo que respeita á segunda parte do Artigo, declaro que foi escripto no sentido mais geral a exuberante = ainda no caso de guerra será respeitada a Propriedade particular = isto he da tal forma claro, que não sei como alguem achou nisto escuridade, ou restricção. Porque? Só Navios são propriedade? Propriedade he tudo o que tem dono; e Propriedade particular, he a que não pertence á Nação, mas a um individuo, ou a uma collecção de individuos della: nenhuma declaração he precisa, e todo o mundo sabe que cousa he Propriedade particular; a respeito dos Navios está claro na primeira parte que, existindo guerra, não podem entrar; mas podem estar no tempo da declaração, e são respeitados porque já entrárão; e a respeito de Mercadorias em Deposito, está a segunda parte do Artigo: ellas são também = Propriedade particular: depois da guerra declarada vindo em a Bandeira inimiga, estão excluidas; vindo em outra, entrão; não se tracta de restringir o Commercio geral; porque um Navio amigo pode trazer mercadorias da Nação inimiga, que tambem talvez já sejão do Capitão, ou de outras pessoas; he por tanto o Artigo muito claro, e não precisa de emenda alguma.

O Sr. F. J. Maia: - Já hontem declarei que não tinha concordado em parte da redacção deste Projecto. Dizem alguns Srs. Deputados que as Leis devem ser claras; e eu accrescento que as commerciaes devem ser clarissimas, para que possão ser entendias pelos Negociantes Nacionaes, e Estrangeiros, que tem de se governar por ellas nas suas transacções. O Illustre Deputado, que me precedeu a fallar, repetio alguns dos argumentos produzidos hontem para mostrar a grande utilidade desta Lei; assim como a pouca ou nenhuma consideração que merecião as reflexões, que então se fizerão sobre a necessidade de ser acompanhada logo de Regulamentos para a fiscalisação dos Contrabandos.

A este respeito direi unicamente que, se as Leis existentes se cumprissem, ellas serão sufficientes para evitar o contrabando que se recêa; mas, se não bastão, cumpre ao Governo Executivo, na forma da Carta, providenciar tudo o que for necessario para a exacta e devida execução das Leis. Se se attendesse a taes reflexões, seguir-se-hia o grande absurdo de não se fazer Lei alguma, porque de todas as Leis se podia abusar; mas eu digo o contrario, e vem a ser, que se fação as Leis que exigir a utilidade pública, e que se castiguem todos aquelles que as infringirem.

Desenganemo-nos, Senhores, e o defeito não está nas Leis, mas sim nos seus executores; e que a desmoralisação dos Empregados Publicos neste Ramo, tem chegado a tal ponto, que he por via delles, e por seu consentimento que fazem os Contrabandos os Negociantes que não tem probidade: e por isso, se o Governo não escolher pessoas dignas para os empregos, debalde se farão Regulamentos os mais bem meditados e calculados, porque todos serão illusorios, e frustrados na sua execução. Não sirva por tanto de embaraço e discussão deste Projecto semelhantes dúvidas ou reflexões.

Passando pois ao 1.º Artigo, digo que na primeira parte se estabelece que os Portos de Lisboa e Porto ficão abertos a todos os Navios mercantes, com quem Portugal não estiver em guerra; e na segunda parte que, ainda neste caso de Portugal estar em guerra com esse paiz, será respeitada a propriedade particular.

A primeira parte he uma Proposição geral, que me parece deverá ter uma única excepção, estabelecida no Direito de Guerra Maritima, que prohibe as Nações Amigas, ou Neutras receber nos seus Portos as Presas das Nações belligerantes; e seria de opinião que assim se declarasse.

Pelo que pertence á segunda parte, julgo necessario que se diga expressamente que a Propriedade Particular garantida, e respeitada he não somente a das Mercadorias depositadas nos Armazens, mas tambem a das Embarcações, e das Mercadorias a seu bordo, porque he esta a intenção do Projecto, e evitão-se questões, e duvidas sobre tão importante materia.

Parecia-me muito conveniente que se adoptasse a idéa, que propõe o Sr. Marcianno d'Azevedo, para que tambem fossem respeitadas as Embarcações, e Mercadorias, que viessem aos Portos de Lisboa, e do Porto depois de declarada a Guerra, e de cuja declaração não podessem ter noticia: e, apoiando esta Emenda, direi que ella seria uma prova decisiva da nossa boa fé, e justiça, e que muito concorreria para o fim, que o Projecto tem em vista; e não encontro motivo algum de prejuizo para que ella se não adopte, e muito mais determinando-se já um prazo de tempo, em que serião admittidas nesta forma as Embarcações Mercantes inimigas, depois da declaração da Guerra, conforme a distancia dos Portos, d'onde sahissem.

Eu quizera que a segunda parte deste Artigo fizesse um Artigo separado, que por ora numeraria 2.º, concebido nestes termos claros: = No tempo de Guerra fica garantida a Propriedade Particular, tanto das Embarcações Mercantes, como das Mercadorias a seu bordo.

Nos tractados existentes entre todas as Nações commerciantes se estipula um prazo de tempo para que os Subditos de qualquer dellas em occasião de Guerra possão retirar as suas Propriedades; e he porisso que as expressões vagas, e indeterminadas se deverião fixar mais, marcando-se o prazo conveniente para os Portos dos differentes Estados, seguindo-se neste objecto o que a outros respeitos se acha já estabelecido; o que a Commissão de Fazenda poderá fazer.

Approvo pois a Emenda proposta, e insisto que se

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facão todas as declarações necessarias; e, quanto possivel seja, em Artigos separados.

O Sr. Manoel sintonia de Carvalho: - Sr. Presidente, quando se tracta de opprovar, ou reprovar qualquer Artigo em particular, parece-me supérfluo trazer de novo á discussão as questões, e princípios geraes, que fôrão já ventilados, quando se tractou do Projecto em globo, como alguns dos Illustres Preopinantes tem feito: parece-me tambem que toda a discussão, para ser proveitosa, deve precisamente versar sobre a doutrina do Artigo, e sua intelligencia; e he neste sentido que me proponho fallar, restringindo-me a fazer ver, por meio da sua analyse, qual foi o espirito da Commissão, a que pertenço, quando o concebêo, e redigio. Vejamos pois o que diz o Artigo (lio). Vê-se por tanto que o Artigo tem duas partes tão destacadas, e distinctas, como as sentenças, que nellas se exprimem; e que por conseguinte não devera colher todos os argumentos, que &e fundarem na intima connexão, que de facto não existe: vê-se igualmente, em quanto á primeira parte, que ella foi concebida muito de proposito nos lermos, em que se acha, em attenção ás nossas actuaes circumstancias politicas, que não he necessario expender aqui; mas que, sem embargo disto, a sua. doutrina he ião explicita, e tão obvia, e clara a sua intelligencia, que não pode duvidar-se que a Commissão leve em vista abrir o caminho ao Commercio do novo Mundo, franqueando a entrada dos dous Portos de Lisboa, e Porto a todos os Navios Mercantes de qualquer Paiz, com quem por fortuna não estivermos em Guerra. Debaixo deste ponto de vista o Artigo he tão explicito, quanto o podia ser; e nem contém doutrina já estabelecida na Legislação posterior a 1796, como pertendêo o Sr. Marciano d'Azevedo, nem carece da Emenda do Sr. Maya, relativa ás Prezas, porque estas como taes ficão resalvadas, no caso preciso, pelas regras do Direito das Gentes, e Maritimo; bem como igualmente não admitte parle do Artigo, que garante a Propriedade Particular, ainda no caso de Guerra, eu convenho com os Srs., que me precederão, em que o Artigo nesta parte não he tão claro, e explicito, como se poderá, e deverá fazer; mas não posso convir em que de facto senão repute clara pelas razoes, com que o tem pertendido, ou seja porque esta parte do Artigo, como fica dicto, não he connexa com a primeira, e não pode por conseguinte entender se restrictamente aos Navios a garantia da Propriedade Particular mantida, ou finalmente porque quem diz - a Propriedade = diz o mesmo que = toda a Propriedade, = e debaixo desta expressão, tão ampla, e genética, não pode deixar de julgar-se comprehendida, tanto a que consistir em Navios, como em Mercadorias, maiormente combinando-se o que a respeito destas se dispõe no 2.° Artigo. Pondo por ora de parte esta questão, convém notar desde já quaes fôrão as intenções, que a Commissão tem em vista n'esta segunda parte do Artigo do Projecto, em que se propoz estabelecer entre nós um verdadeiro Deposito. Neste sentido devo declarar que a Commissão não teve só em vista garantir a Propriedade Particular, que e tivesse em Deposito, ou dentro do Porto na occasião da declaração da Guerra, por quanto, se assim fosse, teria a mesma Commissão faltado em grande parte no fim, a que se propunha, de estabelecer desde já um verdadeiro Deposito; pois que para este resultado se conseguir nas nossas presentes circumstancias politicas, e commerciaes, he de necessidade que não só seja respeitada a Propriedade, de que tenho faltado, mas igualmente aquella, que, depois da Guerra declarada, venha demandar o Deposito debaixo de Bandeira Amiga, ou Neutral, o que, como he obvio, só pode, e deve entender-se da Propriedade consistente em Mercadorias. Foi assim que eu sempre concebi, e entendi esta segunda parte do Artigo, e creio que toda a Commissão, a que tenho a honra de pertencer; porque de outra forma estaria em contradicção comsigo mesma, á vista da generalidade, em que se acha concebido o 2.º Artigo do Projecto, que he relativo ás Mercadorias.

A Commissão por tanto, quando diz = será respeitada a Propriedade Particular, = tem em vista tudo quanto deixo dicto. Nestes termos pode bem ser que a Camara julgue necessário esclarecer mais o Artigo na segunda parte; e, se assim acontecer, concordo com o Sr. Maya, em que esta matéria se destaque do 1.º Artigo, e que vá formar um 3.º depois do § 5.°, que desde já ofereço redigido nos seguintes termos: = O Deposito será Sagrado, e Inviolavel; e, ainda no caso de Guerra, será religiosamente respeitada toda a Propriedade Particular, que estiver dentro dos Portos, ou que de futuro venha a entrar debaixo de Bandeira Amiga, ou Neutral.»

Concluo votando em todo o caso pela doutrina do Artigo, que suponho de grande utilidade.

O Sr. Soares Franco: - Quando li este Artigo pela primeira vez julgo que o entendi bem ; a sua doutrina he relativa á America do Sul; os Navios desta parte do Mundo entram em Inglaterra, e em França; ha dons annos que tem entrada, posto que aquelles Governos estejão só reconhecidos de facto, mas elles não lhes importa o direito: por estas razões approvo o Artigo neste sentido, e até o approvo, porque Portugal precisa muito deste estabelecimento; a segunda parte não he mais do que uma idéa geral; não he aqui o lugar de se tratar de prazos, nem de Direitos das Gentes, e por consequencia deve approvar-se, e passar esta doutrina, porque he boa, e necessaria.

O Sr. Mouzinho da Silveira: - O Sr. Soares Franco, e o meu Collega me prevenirão em muitas cousas, a que eu era obrigado a dar esclarecimentos: o Sr. Soares Franco disse muito bem, que elle entendo o Artigo apenas o lêo a primeira vez, e ninguem pode deixar de o entender: muito gosto de clareia, e ainda mais na redacção das Leis; mas o Artigo he de forma claro, que não necessita ser mais; tudo que parece destinado a esclarecê-lo antes o torna mais confuso; rejeito portanto a Emenda do meu Collega; neste ponto sou de parecer differente, e não he preciso terceiro Artigo para nada: temos a maneira da entrada dos Navios, temos o respeito da propriedade, temos no 2.º o que se refere a mercadorias; o Artigo portanto deve passar como está, nem ha verdadeiramente questão sobre a doutrina.

O Sr. F. J. Maya: - Sr. Presidente. Concordo em que a palavra = mercante = limita a extensão da Artigo, e que ella se fazia necessaria, porque est*

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Lei he unicamente Commercial; mas ainda assim não concordo com o todo da redacção deste Artigo; e, sendo as minhas idéas exactamente conformes com as do Illustre Relator da Commissão da Fazenda, differimos somente no modo de as expressar. - Sei que aqui se não tracta do Direito das Gentes, mas tambem sei que a palavra = mercante = não exclue, como elle diz, de serem admittidas as Prezas: e não haverá pessoa alguma, que assim o entenda. Um exemplo bastará para aclarar a questão. Estando a França em guerra com a Hespanha, e tomando qualquer d'ellas uma Embarcação mercante no mar, e depois do tomada o Aprezador a mandar a algum dos dous Portos designados debaixo da sua Bandeira, que he amiga ( pois supponho que Portugal guarda neutralidade), esta Embarcação ha de infallivelmente ser admittida na forma do Artigo, porque ninguem duvidará que está no seu rigoroso sentido, de que he uma Embarcação mercante, e pertencente a uma Nação, sem quem Portugal não está em guerra.

Esta Lei vai ser lida em todo o Mundo, e he necessario que se faça recommendavel pela sua clareza, para que a entendão, não só os Negociantes, mas tambem todos os Governos das Potencias Estrangeiras, não deixando tão importantes objectos sujeitos a interpretações. Apresento portanto a minha Emenda (lêo); assim como que se fixe um tempo determinado, em que terão entrada nos dous Portos as Embarcações mercantes d'aquellas Nações, a quem declararmos guerra; porque taes Embarcações são carregadas debaixo de boa fé, e em tempo, e lugar, em que se não podia saber da declaração da guerra. Isto não he mais do que uma ampliação do que se pratica a respeito das Prezas em alto mar, aã quaes não são julgadas boas, senão depois de um prazo dado para se poderem fazer n'aquellas paragens.

O Sr. Pereira de Sá: - Sr. Presidente, Tenho uma observação que fazer a respeito da Emenda, que acaba de propor o Sr. Maya, e vem a ser: as Prezas podem ser feitas, ou a uma Nação inimiga, ou a uma Nação, com que estejamos em estado de neutralidade; no primeiro caso, segundo o Direito da Guerra, podem as Prezas ser admittidas, e até vendidas nos nossos Portos; e no segundo caso são excluidas, para não se infringirem as Leis da neutralidade; portanto acho que a Emenda proposta he superflua.

O Sr. Manoel Antonio de Carvalho: - Sr. Presidente, levanto-me para insistir novamente em impugnar as Emendas dos Srs. Maya, e Van-Zeller, porque não vejo necessidade de se fazer mais declaração alguma na primeira parte deste Artigo. O Artigo, como já disse, não só tem duas partes destacadas, mas ate estas contem duas sentenças mui distinctas; e por consequencia o argumento, com que o Sr. Van-Zeller pertende apoiar a sua Emenda, como fundado na connexão de doutrina, que não existe, não colhe por maneira alguma; accrescendo que não he este o lugar proprio para se fallar em Mercadorias, porque esta materia he pertencente ao Artigo 5.º, o qual he tão explicito, e amplo que não deixa por certo duvida alguma. Não he tambem necessaria a Emenda do Sr. Maya, que diz respeito ás Prezas; porque esta excepção, se he necessaria, fica resalvada pelos principios geraes do Direito Maritimo, e das Gentes, que nunca se podem entender revogados por uma Lei particular de Commercio, como he a presente. Em quanto á segunda parte do Artigo, não impugno que seja com mais clareza redigida; porem insisto em que em tal caso se destaque esta parte, e vá formar um terceiro Artigo, que seja pouco mais ou menos concebido nos termos, em que já o offereci.

O Sr. Pereira de Sá: - Sr. Presidente, eu tenho uma objecção, que fazer á Emenda do Sr. Deputado M. A. de Carvalho. A meu ver esta Emenda he inteiramente contra o Direito da Guerra universalmente seguido; demais, sendo o fim da Guerra causar ao inimigo o maior mal possivel, isto ficaria illudido, adoptando-se a Emenda proposta; porque o inimigo, á sombra de uma Bandeira neutra, faria a salvo seu Commercio, e lhe dariamos por este modo armas contra nós mesmos: ainda convenho que isto se Concedesse por um certo prazo depois da Guerra declarada, a fim de salvar a boa fé, com que os Navios neutros tivessem carregado, mas nunca por um prazo indefinido.

O Sr. Presidente fez as Emendas, que se offerecêrão na discussão, e são as seguintes. Do Sr. Van-Zeller, que diz - Depois das palavras = Propriedade particular = se accrescentará = que existir de qualquer modo nos dictos Portos, e Depositos = salva a redacção. Do Sr. Marciano d'Azevedo, que diz - E ainda no caso de Guerra será respeitada a Propriedade particular de quaesquer Mercadorias, e Embarcações entradas nos Portos de Portugal antes de lhe ser conhecido o estado de Guerra. Do Sr. Francisco Joaquim Maya, que diz - Declare-se no Artigo 1.º que são exceptuadas as Prezas feitas pelas Nações Belligerantes; devendo a segunda parte do mesmo Artigo formar um Artigo separado, que diga = no caso de Guerra será respeitada a Propriedade particular das Embarcações, e Mercadorias depositadas, e se marque um prazo de tempo, em que sejão admittidas depois da declaração da Guerra. E do Sr. M. A. de Carvalho, que diz - O Deposito será sagrado, e inviolavel; e, ainda no caso de Guerra, ser religiosamente respeitada toda a Propriedade particular, que estiver dentro do Porto, ou que de futuro venha a entrar debaixo de Bandeira Amiga, ou Neutral.
Julgada a materia suficientemente discutida, propoz o Sr. Presidentes 1.º Se se approvava a primeira parte do Artigo até ás palavras a: estiver em Guerra =? E foi approvada. 2.° Se deverá fazer-se no Artigo expressa excepção a respeito dos Navios particulares aprezados no mar? E se vencêo negativamente. 3.º Se a segunda parte do Artigo deverá voltar á Commissão para o redigir de novo, com attenção ás Emendas offerecidas? E se vencêo que não. 4.º Se se approvava a mesma segunda parte do Artigo com o Additamento offerecido pelo Sr. Van-Zeller E foi approvado nesta conformidade. 5.° Se se approvava a Emenda do Sr. Marciano d'Azevedo na parte ainda não prejudicada? E se vencêo que não. 6.º Se se approvava a Emenda offerecida pelo Sr. F. J. Maya, em quanto á segunda parte, que se não achava ainda prejudicada? E se vencêo negativamente. 7.° Se se approvava a Emenda do Sr. Carvalho e não fui approvada; resolvendo-se que o Artigo voltasse á Commissão para ser redigido novamente em conformidade do vencido.

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Entrou em discussão o Artigo 2.°

«Todas as Mercadorias de qualquer Paiz serão admittidas a Deposito com a livre faculdade de réis exportação, sem mais imposto do que 1 por 100, e sem mais despeza do que a dos trabalhos bracães.»

O Sr. Van-Zeller: - Não me cançarei a repetir que a incerteza e a arbitrariedade he a morte do Commercio: no Artigo não se acha dicto de que avaliação se deve tirar um porcento: que isto se deve estipular he evidente; alguns dos Srs. Deputados serão de opinião, que seja do preço corrente do Mercado, outros serão, que seja do preço do genero dentro dos armazéns; outros que seja deduzido do valor das Pautas: a minha opinião he que seja tirado do valor das Faduras. Não devemos só olhar para o ganho, que resultará ao Thesouro deste um por cento; não he esse o objecto principal, o objecto he chamar aos Portos de Portugal a maior som ma de Mercadorias que podermos, de todas as partes do Mundo. Talvez não será exaggerado dizer que 5 até 8 por cento virão a ficar em Portugal do valor de quantas Mercadorias e generos aqui entrarem; he esse lucro que devemos ter em vista para augmentar a nossa prosperidade, e não a lembrança desse um por cento somente. Seguindo-se o methodo, que proponho, um Negociante a muitos centos de leguas daqui pode facilmente fazer o seu calculo sem ficar sujeito a contingencias; sem esta certeza hesitará o mandar as suas mercadorias depositar-se a Lisboa; escolherá qualquer outro Porto, de que abunda a Europa, para esse fim, porque estará certo do que tem a pagar, e que hão vai a encontrar incertezas e arbitrariedades. Quando se tratar dasarmazenagens, tambem proporei que sejão estabelecidas, não por Tabeliãs, mas que seja um decimo por cento por mez do valor das mesmas facturas: limito-me pois por agora a mandar a seguinte Indicação para a Mesa = Proponho que este um por cento seja do Imposto das Facturas, devendo estas ter assignadas pelos proprios Consignatarios.

O Sr. F. J. Maia: - Este Artigo 2.º do Projecto necessita para maior clareza, que se repitão as palavras Lisboa, e Porto, depois da palavra admittidas, porque he somente nestes dous Portos que a Lei vai permittir os depositos, e re-exportações de que tracta ; para que se não entenda que tem entrada em todos os Portos do Reino, como facilmente se poderia entender á vista do Artigo, que sendo inteiramente separado do l.°, neste se encontravão, e naquell não. Desejaria que se declarasse que tambem havia de ser permittida a re-exportação reciprocamente entre os dous Portos, que a Legislação actual prohibe, e não que para tal haja razão attendivel, pois que entrando as Mercadorias dos outros Portos estrangeiros em qualquer delles, parece que na mesma razão estavão entre si os, dons Portos de Lisboa e Porto; e que poderia offerecer muitas vezes occasiões de emprego á nossa Navegação costeira. He absolutamente necesserio acabar com a differença entre Alfândega maior e menor, filha da ignorancia dos tempos, em que se estabelecêo, e que tonto entorpece o Commercio interno. O Alvará de 4 de Junho de 1825 já extinguio tão odiosa e prejudicial differença, que obrigava á segundo pagamento dos direitas do consumo, apezar de os ter já pago em outra do mesmo Reino. Sei que o Alvará assim o determinava, mas tambem sei que se não pratica assim; e que na Alfandega de Lisboa se exige dos generos, que a ella vem do Porto, e aonde pagarão 30 por cento de direitos, que tornem a pagar outros 30 por cento alem de emolumentos e despejas. Para obviar a estes males e incoherencias mando para a Mesa uma Emenda.

O Sr. Mouzinho da Silveira: - Faz bem, e não faz mal nenhum que eu ponha no Artigo o que acaba de dizer o Sr. Maya, e por isso estou perfeitamente de acordo; eu estava persuadido que o Artigo assim estava bom, porém como tem mais clareza vá, e ainda apezar na nota no fim da Tabella, que perfeitamente responde ao Sr. Maia. Em quanto ao um por cento, isto tem uma referencia ao Tractado com o Brasil, e ha na Alfândega regras para isto, ás quaes se refere; tambem as Leis anteriores dizião l por cento e nada mais; porque tudo o mais são regras administrativas, e não seria bom fazer uma excepção, e he necessario fazer uma regra geral. Este = ad valorem = algum cousa hepezado, e por isso, voltando o Artigo á Commissão, esta pode declarar que o l por cento será tirado da Pauta, quando houver Paula, e do valor livre de direitos, quando a não houver: eu mesmo emendarei o Artigo neste sentido; não porque seja necessario, mas para satisfazer o Sr. Van-Zeller, acabar seus escrupulos de calculo mercantil, e fazer saber em toda a parte como se tira esse um por cento.

O Sr. Van-Zeller: - Eu tambem convenho que nada de Facturas para outros casos; mas Facturas para este he o verdadeiro : eu só deixo á consideração da Camara, se o Negociante daqui mil legoas ha de esperar por uma Pauta, ou se ha do vir entregar-se na boa fé sem certeza alguma? Assim não vem cá ninguem. Eu tinha cm vista um outro Projecto, que de todas a; Mercadorias., que aqui viessem , vinhão a ficar no Reino 6 ou 8 por cento do seu valor; mas, para alcançar isto, o que nos deve guiar he dar a facilidade ao Negociante, para vir aqui depositar as suas fazendas; esta he a minha opinião, e a mesma será quando se tractar da armazenagem, propondo que seja um decimo por cento por mez do emporte das Facturas.

O Sr. Derramado: - Eu levanto-me para apoiar a Emenda do Sr. Van-Zeller: realmente o interesse fiscal directo não he o maior interesse deste Projecto; o grande interesse consiste nos lucros, que devem resultar a Portugal da maior affluencia dos Estrangeiros aos nossos Portos; do consumo que elles hão de fazer dos productos da nossa industria, dos alugueis dos armazaes, dos trabalhos bracaes, etc., etc. O direito d'admissão das Mercadorias Estrangeiras deve além disto ser tanto mais moderado, quanto «ao exageradas as despeitas da re-exportação, que são tão excessivas como se lê na Memoria de um Negociante probo e intelligente desta Cidade, que tenho na mão, e da qual peço licença de ler um lugar, que vem a proposito:» O que afugenta os Estrangeiros «dos nossos Portos são as restricções que ha para »se fazerem taes re-exportações nas excessivas despezas das Companhias, nos emolumentos dos Officiaes d'Alfandega, porque custa cada baldeação doze mil e tantos réis, seja de um só volume, seja de muitos, Guardas a bordo dos navios, obrigação de ao

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«apresentarem Certidões de descarga dos generos nos Portos, a que se destinão, ele.»

O Sr. F. J. Maya: - Tinha-me reservado para fatiar depois do Artigo 3.°, sobre o valor, de que se havião de deduzir todos os direitos, que se estabelecem neste Projecto, o que faço agora, por ver que esta materia está em discussão. O Sr. Van-Zeller na doutrina, que expendêo, tem em vista facilitar a concorrencia do Commercio Estrangeiro, podendo os Negociantes calcular o certo o total das despezas dos respectivos Portos; e nenhuma duvida teria em concordar com elle, pois que o presente Projecto não tem em vista o augmento da renda publica pelo direito de um por cento, mas sim pela grande e favoravel influencia, que ha de ter esta Lei em todas as fontes da riqueza nacional: com tudo, havendo outro meio mais exacto, e menos sujeito a arbitrariedades, eu o preferirei, e vem a ser: uma Pauta provisoria, que contenha os principaes generos com valores fixos, a qual eu requererei que se faça, não encontrando nisso grande difficuldade; e se a Illustre Commissão de Fazenda, pelos seus muitos trabalhos, se não poder encarregar disto, eu a farei. Lembro isto, porque um dos Membros da Commissão das Pautas asseverou que a Pauta Geral se não concluiria em tres annos.

O optimo he inimigo do bom, e tudo o que não tem regras certas he sujeito a enganos, e a maior numero de fraude: e se recusarmos as Facturas, por ser muito arbitrario, não deixemos por mais tempo a cobrança de Direitos ad valorem, que he igualmente viciosa. Repito: que se faça a Pauta, ao menos para os generos coloniaes; porque são estes que hão de formar a maior parte do deposito, e talvez em oitenta Artigos se possão comprehender os principaes, ou a maior parte dos ditos generos. Eu mandei para a Mesa uma Emenda, a que se quer dar o nome de Additamento, no que me não opponho, declarando que a tua materia he muito connexa com o Artigo.

O Sr. Manoel Antonio de Carvalho: - Eu creio que todos tem muita razão, menos a Com missão de Fazenda, á qual pertenço; e digo isto, porque vejo que, mesmo quando se tracta de um Artigo, cuja doutrina me parece tão simples, não ha difficuldades, e objeções, que se não opponhão na sua discussão. Que tem o Artigo com o que pertende o Sr. Maya sendo certo que o projecto sustenta toda a Legislação existente naquella parte, em que a não revoga? O Artigo foi redigido nos termos, em que se acha concebido, pelas lazões que sabiamente expendêo o Sr. Deputado Mouzinho, e que seria enfadonho repetir; bastando dizer-se que a Commissão entendêo que o Imposto de um por cento devia deduzir-se, segundo as regras da Legislação actual, que não ficão nesta parte alteradas; e isto porque julgou conveniente nada alterar sobre esta materia , por ter em vista o que se acha estipulado no Tractado com o Brasil, e a occasião que qualquer novidade podia dar a reclamações por parte dos Brasileiros. Não quiz por tanto a Commissão fazer excepção alguma á regra geral estabelecida; mas, ainda quando quizesse, não adoptaria por certo a doutrina proposta pelo Sr. Van-Zeller. Pertende elle que o Imposto de um por cento seja deduzido pela Factura, fundado em que os Negociantes Estrangeiros não podem por outra forma calcular os Direitos, que tem a pagar as suas Mercadorias.

Esta theoria he na verdade excellente; e seria muito para desejar que ha podesse ser adoptada na pratica, sem inconvenientes para a Fazenda Publica. He bem sabido que nem todos os Negociantes tão probos até o ponto de se poder confiar nas Mias Facturas, e por este modo viríamos a proteger o Commercio da trapaça, em manifesto prejuizo do de boa fé. Demais: perguntarei eu ao Sr. Van-Zeller, se não será possivel aos Negociantes o terem as nossas Pautas, bem como conseguirem dos seus respectivos Correspondentes todos os necessarios esclarecimentos, para com certeza calcularem, e dirigirem todas as suas especulações mercantis? Acresce que um por cento de Facturas viria a ser, pouco mais, ou menos, o mesmo que meio por cento ad valorem, ainda quando os Direitos fossem deduzidos, como a expressão indica: o que por certo não he necessario para convidar a concorrencia, e por tanto inadmissível. A vista de tudo, declaro pela minha parle que não posso convir senão com a Emenda proposta pelo meu Illustre Collega, o Sr. Mouzinho.

O Sr. Presidente propoz se devia conceder a palavra terceira vez aos Senhores, que já tinhão fallado duas vezes? (Assim se vencêo.)

O Sr. Van-Zeller: - Parece-me que no Tractado do Brasil se não diz que os Direitos sejão ad valorem; em segundo lugar diz o Sr. Manoel Antonio de Carvalho que, havendo uma Pauta, he muito melhor que os Direitos sejão regulados por ella: na Pauta, que nós agora temos, e na que se pode fazer, hão de haver Generos, que venhão depositar-se, que lá não estarão, porque não podem lembrar todos: já que V. Exca. me fez favor de mu deixar fallar terceira vez, lembrarei mais uma cousa: diz o Artigo = sem mais despeza que os trabalhos braçaes =; porem he necessario que hajão Guardas: e quem lhes ha de pagar? Por consequencia acho necessario que se declare tambem aqui os Guardas; se se não declarar isso, e se exigirem, poderão lambem exigirem-se caldeiradas, jantares, e outras despezas; deve pois ficar bem claro que nada disto haverá a pagar, a fim que jamais entre em duvida: proponho pois que no fim do Artigo adiante das palavras - trabalhos braçaes - se ajunte = e Guardas. =

O Sr. F. J. Maya: - Parecêo-me que a discussão sobre tal objecto não se deveria reputar fastidiosa, ou inutil á vista da sua importancia; e agradeço á Camara a palavra, que se me concedêo pela terceira vez, da qual me servirei unicamente para desfazer alguns equivocos do Sr. M. A. de Carvalho. Li varias rezes o Tractado de Independencia do Imperio do Brasil, e não tenho idéa de ver nelle a expressão ad valorem; mas entrando em duvida te me enganaria, ou não, mandei buscar a Collecção das Leis para novamente examinar o mesmo Tractado, e com effeito no Artigo 10 se não encontra a tal expressão ad valorem (lêo), Recordo-me agora que a Ordem para se cobrarem os Direitos ad valorem foi do Governo de Portugal; e não sei a razão desse procedimento, ou se delle tem resultado algum bem publico. Devo declarar á Camara que as Pautas existentes regulão para muito poucas cousas, porque em virtude de Provisões, Avisos, Decretos, e Ordens particulares se achão inteiramente alteradas, deixando-se á arbitrariedade dos Administradores, e Juizes das Al-

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fandegas o importantissimo objecto de marcar os valores, de que se hão de deduzir os Direitos: o que se demonstra palpavelmente pelo modo estabelecido de receber os mesmos Direitos quasi todos ad valorem. -

O Commercio exige exactidão, e certeza, e nada o embaraça mais do que a variedade da sue Legislação; e de tão defeituoso systema nascem muitas vezes graves queixas, e prejuizos, quando de um mesmo Genero em curto espaço de tempo são obrigados a pagar differentes Direitos os Negociantes, que o despachão. Este systema de receber os Direitos ad valorem concorre de certo parte a grande diminuição dos rendimentos das Alfandegas, porquanto os faz dependentes da probidade dos Empregados respectivos.

O Sr. Presidente: - Quando eu nego a palavra a algum Sr. Deputado não lie por fastio da discussão, he porque o Regimento não permitte que se falle mais que duas vezes?.

O Sr. Mouzinho da Silveira: - Eu offereço uma Emenda no Artigo desta maneira, que me parece satisfaz perfeitamente ás duvidas, que se tem posto.
(Lêo.)

O Sr. Manoel Antonio de Carvalho:- Sr. Presidente, sempre fui inimigo de responder ás increpações, que se me fazem, porque tenho como certo que disto nenhum proveito resulta á Sociedade. Entretanto, na presente occasião he forçoso, para meu desaggravo, que eu responda á pezada censura dos dous Illustres Deputados, que me precederão a fallar. Felizmente, para me justificar com a Assembléa, mostrarei que trago aqui escripto o Artigo 10.º do Tractado com o Brasil, o que me tenho referido; fazendo com isto ver que não só não ignorava o seu conteudo, mas até mesmo que o tinha bem presente. Diz o Artigo: =«Sessão restabelecidas desde lago as relações de Commercio entre ambas as Nações, Portugueza, e Brasileira, pagando reciprocamente todas as Mercadorias 16 por cento de Direitos de consumo provisoriamente; ficando os Direitos de baldeação, e re-exportação da mesma forma, que se praticava antes da separação.» = Ora: sendo esta a letra do Artigo, não ha duvida, a primeira vista, que tem razão os Illustres Deputados, que me arguirão, e que eu a tenho igualmente, por quanto, senão he expresso no Artigo que os 15 por conto devem ser deduzidos ad valorem, tambem não he expresso d'onde hão de deduzir-se; e por tanto ficava ao meu arbitrio dar aquella intelligencia ao Artigo, subentendendo nelle, em lugar de outra, a expressão ad valorem, como tenho Subentendido. Saiba todavia a Camara que nesta minha intelligencia não houve o menor arbitrio, por quanto a omissão da letra do Tractado foi posteriormente prevenida pelo Governo em Aviso expedido ú Junta do Commercio, no qual se ordenou que os Direitos fossem pagos ad valorem, como tenho dicto. He facto que assim se tem regulado o Despacho com acquiescencia do Governo do Brasil, sem dúvida porque tal era o espirito do Tractado no citado Artigo. Pelo quo respeita ás baldeações, e re-exportações, he bem evidente que o Artigo nada innovou, e que este objecto se ficou regulando pela Legislação anterior, que igualmente me justifica. Em quanto a increpação, de que não existem Pautas, bastará responder em meu abono que eu as tenho tido por muitas vezes na minha mão, e até em minha propria rasa, como Membro da Commissão respectiva. Ha por tanto Pautas, e não só manuscriptas, mas mesmo impressas, e tão publicas, quanto a Lei o permitte, porque he necessario confessor, para vergonha nossa , que não he licito passarem-se destas Certidões a quem as pedir. Disse mais o Sr. Francisco Joaquim Maya que nas Alfandegas se rege quasi tudo pelo arbitrio dos Administradores respectivos, ora, nem isto he exacto, nem mesmo quando o fosse teria lugar o produzir-se na presente occasião, em que se não tracta de fazer a censura de algum Empreendo, e menos do Governo, sobre quem em ultima analyse viria a recahir o maior pezo della, se o facto fosse verdadeiro, e elle o tivesse tolerado, e consentido.

O Sr. Presidente mandou proceder á leitora das seguintes Emendas, e Additamentos: do Sr. Van-Zeller, que diz: - O Direito de l por conto será do valor das Facturas, sendo estas assignadas pelo proprio Consignatario. - Do Sr. F. J. Maya, que diz: -será permittida a re-exportação das Mercadorias depositadas, de Lisboa para o Porto; e reciprocamente, quando assim convenha. E, tendo pago os Direitos de consumo em qualquer das dietas Alfandegas, não serão obrigadas a pagar outros nos Portos do Reino, em que foram importadas, abolindo-se a prejudicial differença de Alfandegas maiores, e menores.- Outra do Sr. Van-Zeller, que diz: - no fim do Artigo accrescente-se - e Guardas. - E do Sr. Mouzinho da Silveira, que diz: - Todas as Mercadorias de qualquer Paiz serão admittidas a Deposito com a livre faculdade de re-exportação nas Alfandegas de Lisboa, e do Porto, sem mais Imposto do que 1 por cento, deduzido do valor da Pauta nas Artigos della, ou do valor do Mercado, livre de Direitos, quando os Artigos não forem de Pauta; e sem mais despeza do que a dos trabalhos braçaes.-
Julgada a materia suficientemente discutida, propoz o Sr. Presidente - 1.° se se approvava a primeira parte do Artigo até á palavra = re-exportação = accrescentando-se á palavra = Deposito = as palavra = Dos portos de Lisboa e Porto? = E foi approvado nesta conformidade. - 2.º se se approvava a segunda parle do Artigo nas palavras = sem mais Imposto do que l por 100, com a declaração constante do Additamento offerecido pelo Sr. Mouzinho? = E foi approvado nesta conformidade. - 3.º se se approvava a terceira e ultima parte do Artigo, salvo o Additamento do Sr. Van-Zeller? - E foi approvada. - 4.º se se approvava o mesmo Additamento? - E se vencêo negativamente. - 5.° se se approvava que se mencionasse neste Artigo o Additamento offerecido pelo Sr. F. J. Maia na segunda parte, que ainda te não achava prejudicada ? - E se vencêo negativamente.

Passou-se ao Artigo 3.º

«Serão admittidas o despacho para consumo todas as Mercadorias, que na Tabella junta não são expressamente prohibidas, pagando os direitos actualmente estabelecidos. Os generos dos differentes Paizes da America, quando vierem em Bandeira Portugueza, ou de Paiz aonde forem produzidos, pagarão 24 por 100 de direitos vindo em direitura, e n pagarão 30 por 100 quando não vierem em direitura, qualquer que seja a Bandeira, ou quando vierem ainda que seja em direitura em Bandeira, que

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«não seja a Portuguesa, ou aquella do Paiz da producção.»

O Sr. Van-Zeller: - A primeira parte deste Artigo diz = serão admittidos para despacho e para consumo todas as Mercadorias, que na Tabella junta não são expressamente prohibidas. = O Artigo 10 revoga Iodas os Leis em contrario, e na Tabeliã em pane alguma se encontrão mencionados os Cereaes. Ficão pois por consequencia, segundo se deve colligir do que exponho, admittidos a consumo sem restricção alguma, o que certamente não pode ser a mente da Commissão; he pois indispensavel de duas uma, ou que se ponha na competente columna da Tabella, ou que se revogue primeiro a Lei dos Cereaes, pelo que respeita ao consumo; pois que quanto a deposito em tempa competente direi a minha opinião.

Parecia-me porem que seria melhor tractar de uma questão preliminar, antes de entrar o Artigo em discussão, e vem a ser; se os trigos devem ou não ser admittidos o consumo ou deposito, o que rogo a V. Exa. queira propor á Camara.

O Sr. Mouzinho da Silveira; - Ha de haver nesta Camara uma grande discussão sobre o artigo = Cereaes = parece-me por tanto, para bem da discussão, que V. exa. dissesse, que se tracto do Artigo como se não houvesse nelle Cereaes, e depois discutir-se o Artigo na sua generalidade, e assim torna-se a discussão mais facil. (Apoiado. Apoiado.)

O Sr. Serpa Machado: - Não sei pois como se possa desconhecer a intimidade, que tem entre si estas doutrinas. Tracta-se de admittir a maior parte das Mercadorias, e de exceptuar outras; entre estas reclamo eu a dos Generos Cereaes, que deve ser simultaneamente aqui tractada. Logo: nem deve ser questão preliminar, nem ficar reservada para depois.

O Sr. Mouzinho da Silveira: - Eu acho a questão bem simples, e tudo se decide em tirando daqui a palavra Cereaes: pode então o Artigo ser tractado desta maneira (lêo), e depois se fallará dos Cereaes, quando se tractar da Tabella.

O Sr. Serpa Machado: - Não concordo com o methodo da discussão proposto, que exige a separação de questões em si connexas. O Artigo refere-se á Tabella, a Tabella por consequencia faz parte integrante da primeira parte delle; e portanto tractemos dos Cereaes, que devem ser incluidos na classe dos Generos prohibidos para consumo, nos termos da Lei, que existe, ou que se melhorar.

O Sr. Mouzinho da Silveira:- O Artigo combina com a Tabella, mas nem por isso pode deixar de existir uma Convenção: nada do que disse o Sr. Serpa Machado deixa de ser verdade; mas podemos tractar primeiramente de uma cousa, e depois da outra: isto he o que me parece.

O Sr. Derramado:- Sr. Presidente, eu convenho no que disse o Sr. Mouzinho da Silveira; a Tabella não fica approvada, por se approvar o Artigo: reservemos pois a questão dos Cereaes para quando ella se discutir; e então espero mostrar que elles devem ser contados na columna dos Generos prohibidos, onde já os tenho escripto.

O Sr. F. J. Maya: - A Tabella ainda pode soffrer mais alguma demora, segundo me parece.

Propoz o Sr. Presidente se devia discutir-se a Questão preliminar, ou o Artigo? e á Camara resolvêo = que o Artigo =, ficando a Tabella para sé discutir no seu lugar.

O Sr. Presidente:- Entra em discussão a primeira parte do Artigo até á palavra = estabelecidos. =

O Sr. Derramado; - Não me parece conveniente nas circumstancias, em que nos achámos, ampliar a admissão, para consumo dos Generos chamados Coloniaes, de outros Paizes d'America, abolindo o exclusivo, de que ainda gozão semelhantes productos do Brasil. Bem sei que no Brasil não se admitte exclusivamente nenhum Genero de Portugal; mas, não tendo nós ainda feito Tractado de Commercio com este Imperio, talvez fosse prudente conservar as cousas, como estão; porque a continuação deste systema não nos prejudica, e talvez nos habilitasse para obtermos algum favor da admissão dos productos de Portugal no Brasil, ou dos productos estrangeiros, exportados para este Paiz depois do pagarem os Direitos de consumo nas nossas Alfandegas. Muitas são as razões, que temos para esperar um Commercio mais vantajoso com o Brasil, do que com qualquer outra Potencia Americana.

O Sr. F. J. Maya: - Nesta primeira parte do Artigo estipula-se que as Mercadorias, que se achavão admittidas a consumo, e o são agora em virtude desta Lei, paguem 30 por 100 de Direitos, exceptuando desta regra geral os productos da America: eu não sei a ratão desta differença, supponho não haver outra senão a conservação das Leis actuaes a este respeito: não me opponho, mas desejo que se declare de que modo, e de que valor se hão de receber esses Direitos. Lembro que não havendo Pautas regulares, e deixando-se ao arbitrio dos Administradores, ou Juizes das Alfandegas negocios de tanta importancia, corre-se o risco de grande dilapidação na Renda Publica, e de grande desigualdade para os Negociantes. Consta-me que a nova Pauta, a que se mandou proceder, não acabará em quatro annos. He preciso, Senhores, apartar de nós a idéa do Optimismo, ella he inimiga do bem: peço que immediatamente se proceda á formação de uma Pauta dos generos de maior consumo, para se restringirem, ao menos em parte, os defeitos, e inconvenientes de se deduzirem os Direitos at valorem. Da publicação desta Pauta juntamente com esta Lei devem resultar grandes bens: approvo portanto esta parte do Artigo.

O Sr. Moniz: - Como se esta tractando de alguns trabalhos sobre a Urzella, parece-me que este deve ser um dos generos, que deve entrar na Pauta.
O Sr. Presidente: - Quando se discutir a Tabella poderá o Sr. Deputado fallar a este respeito.

Posta á votação a primeira parte do Artigo foi approvada.

Entrou em discussão a segunda parte do Artigo até ás palavras = actualmente estabelecidos =.

O Sr. Van-Zeller: - Eu quimera que se dissesse assim (lêo) isto he, que se incluisse igualmente America Meridional, e Septentrional em lugar de se dizer America somente.

Sr. F. J. Maya offerecêo a seguinte Emenda - Os Generos da America pagarão 24 por 100 para consumo, sendo conduzidos em Navios Portuguezes, ou dos Paizes, que os produzirão, quando estes concedão igual reciprocidade aos Navios Portuguezes; aliás pagarão 30 por 100.

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O Sr. Moraes Sarmento: - Parece-me que os Illustres Membros da Commissão se explicárão com toda a exactidão usando da phrase = differentes Paizes da America, = como se lê no Projecto; e eu por essa razão a prefiro ás Emendas, que se acabão de offerecer. A America forma na Divisão da Terra uma parte della, em razão da sua extensão: costumão alguns usar da phrase = Americas, = porem a America he uma ; e a sua divisão em Meridional, e Septentrional não influe nas qualidades differentes de producções, porque em algumas Regiões da America Septentrional se produzem Generos igualmente da Meridional.

Usando-se da phrase do Projecto, vai a nossa Legislação abranger disposições para os Archipelagos de tão numerosas ilhas, como são aquellas, que pertencem a differentes Potencias, e cuja importancia, e riqueza são tão notorias. Por consequencia: eu acho que he conveniente adoptar-se a phrase geral, como está no Projecto. Não posso approvar a lembrança do Sr. Deputado Maya, que pertende se faça a Lei Condicional, dependendo para sua execução daquilo, que fizerem as Nações aqui mencionadas. Para esse fim seria mister entrarmos em Negociações. Parte dessas Nações são as antigas Colonias de Hespanha, hoje Povos, que se constituirão Independentes. Para fazer Tractados de Commercio íamos virtualmente reconhecer a Independencia dessas novas Nações; e eu vejo, pelo que nesta Camara respondêo já duas vezes S. Exa. o Sr. Ministro dos Negocios Estrangeiros, que a sua posição politica he delicada; e, supposto eu estimasse ver os nossos Portos cobertos de Vasos dessas Nações, ha um meio de conseguirmos o nosso fim mercantil, adoptando-se o Projecto; e, em phrase militar, tornearemos a posição principal, que he o conseguirmos abrir Relações de Commercio com esses Povos, que são descendentes de uma Nação mui parecida comnosco em lingua, Religião, e costumes; na mesma America, antigamente de Hespanha, he mui provavel que haja descendentes de Portugueses.

Eu não sei se com as Colonias Inglezas temos algum Tractado: he bem sabido o quanto ellas são importantes, não somente a Jamaica, como muitas outras Ilhas. A necessidade do Bacalháo tem aberto communicações entre este Remo, e a Terra Nova; porem entre o Canadá, e os Estabelecimentos da Nova Escocia, talvez conviesse que o nosso Governo desse a este respeito alguma obtenção, bem como lançando as suas vistas para um Tractado com os Estados Unidos, Nação hoje tão florescente como respeitavel. Tudo isto, Srs. , depende de sabedoria, e energia do Governo; e he de esperar que um dos grandes resultados das nossas presentes Instituições seja o de termos um Governo efficaz, e que tracte da sua obrigação, porque nada seria mais facil, como verdadeiro o dizer-se que Portugal desde o fatal anno de 1807 lem soffendo desgraças acompanhadas de um Governo vacillante; e só o estabelecimento de uma Administração firme, e energica poderá recobrar o perdido.

O Sr. Mouzinho da Silveira: - Dizer America, Indias Occidentaes, Novo Mundo, são termos synonymos; he dizer o genero, sem nomear as especies; porque no genero estão contidas as especies; he o mesmo que dizer, ouro, prata, etc., quando se pode dizer, os metaes: o Artigo nesta parte he muito claro, porque não pode ser entendido por dous modos differentes, e ha de entender-se sempre cada uma das partes da America, seja Meridional, ou Septentrional comprehendida no Artigo. Não tem por tanto lugar a Emenda. Pelo que respeita á questão de deverem pagar os Navios Portuguezes vinte e quatro por cento, e os dos differentes Paizes da America trinta por cento, he preciso observar que a maior parte dos Estados da America lem declarado que elles não farão differença quando não for feita contra elles; e tenho observado que a rivalidade do Commercio, que tanto Sangue, e tantas Guerras tem custado á Europa, não ha de penetrar na America, se não for desafiada pelos Europeos. Vejo alli estabelecidos os melhores principios de justiça, e reciprocidade; e ha muito tempo que os Estados Unidos desejão que nós os tractemos bem, para elles nos tractarem bem, e a sua reacção, a respeito do nosso Commercio, he obra da nossa parcialidade; e he preciso advertir, que se nós continuarmos com ella, e dissermos para nós vinte e quatro, e para vós trinta de Direitos, elles não são parvos, que não digão logo, para nós vinte e quatro, e para vós trinta ; e então estará desfeita a theoria destes Senhores, e só nos ficava a deshonra de ter tido uma pertenção injusta: era uma estocada justa, com a qual elles repellião uma estocada injusta; pelo contrario, passando o Artigo como está, nós começámos por fazer justiça; se elles fizerem o mesmo, bem estamos nós, e elles; e se fizerem o contrario, está na nossa mão uma justa repulsa.

Tambem se não pode estabelecer menor Direito do que vinte e quatro por cento, porque estando quinze por cento estabelecidos no Tractado com o Brasil, e sendo alli a regra geral dos Direitos vinte e quatro porcento, não he justo estabelecer uma differença menor; e alem disso a nossa Bandeira lem com o Brasil uma carreira aberta, que a em de occupar quasi exclusivamente, ao mesmo tempo que ella soffreria na concorrencia de outras, que podem ser mais perfeitas, se a escala não tivesse uma differença tão grande.

O Sr. Guerreiro: - Eu tomarei o mesmo thema, que tornou o Illustre Preopinante = devemos ser justos; = mas, para sermos justos, he necessario que sejamos iguaes. São para nós igualmente estranhas todas as Nações, com quem não estamos em Guerra, nem ligados por Tractados; e assim qual pode ser a razão, que justifique a desigualdade dos Direitos, só porque a Bandeira, em que vierão as Mercadorias, era, ou não do Paiz da producção? Porque razão hão de pagar uns tinte e quatro, e os outros trinta. Que maior direito tem aquelles, do que estes, da nossa benevolencia da Bandeira Portugueza deve ser mais favorecida, porque he Portugueza, e porque muito precisa de especial protecção: os Tractados devem ser religiosamente cumpridos: quanto ás outras Bandeiras, minha opinião he que todas indistinctamente paguem trinta por cento.

Quanto ás palavras = dos differentes Paizes d'America = sou de opinião, que se devem riscar, não porque eu receie offender com esta decisão a questão da legitimidade, ou Ilegitimidade dos Governos recentemente estabelecidos na America do Sul, pois me não julgo competente para o exame, e decisão dessa questão. A nossa questão he de mero facto, e nada tem commum com as questões de direiro: a existencia

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das Nações he um facto: á existencia aos Governos estabelecidos, seja qual for a legitimidade da sua origem, he outro facto: os varias producções, e as varias necessidades das Nações, he tambem facto; e de todos estes factos resulta a necessidade da Navegação, e do Commercio reciproco entre as Nações existentes: o Bandeira he para as Embarcações, o que as Marcas de Negociantes, ou Fabricantes são para os Fardos de Fazendas. Em tudo isto nada ha que respeite á questão do direito, ou legitimidade da origem dos Governos; e podemos legislar livremente, sem que ninguem possa queixar-se com razão.

A razão por que proponho que se supprimão as palavras, que indiquei, he porque ha muitos Paizes no Mundo, fóra d´America, com os quaes nenhum Tractado nos liga, e para os quaes a Bandeira Portugueza pode navegar com vantagem, e a todos deve ser extensiva a disposição desta Lei. A decadencia do nosso Commercio, e Navegação vem principalmente de que os Portuguezes outr'ora dirigirão todas as tuas especulações para a Asia, e depois exclusivamente para o Brasil: cessarão estes nossos Mercados exclusivos, e ficarão os Capitães, os Navios, e o Commercio sem emprego. O que nos convém he muita Navegação, muito Commercio, Commercio vantajoso, seja elle para que parte for. Sou por tanto de opinião que as palavras = dos differentes Paizes d' America = se devem supprimir, generalisando-se esta disposição a quaesquer Paizes do Mundo.

O Sr. Mouzinho da Silveira: - He precisa uma Resolução absoluta, disse o Sr. Deputado, e então não ha de certo mais Commercio em Bandeira Portugueza. Se elle julga que elle ha de vir da differença de 24 para 30, isto já eu observei: os outros fazem o mesmo, e a differença acaba: o Commercio he relativo ás quatro Partes do Mundo; a Bandeira Portugueza tem o exclusivo no da Asia, tem também o exclusivo no das nossas Possessões da Africa: o Artigo tracta por tanto de dous íamos de Commercio, 1.º d'aquelle, para que já havia Regras, e Direitos estabelecidos, e concorrencia geral; e 2.° do Commercio da America: não faz innovação em quanto ao primeiro; e, pelo que respeita ao consumo, deixa-o ficar como estava, nem o Thesouro está no estado de soffrer neste Commercio desfalque nos Direitos; a respeito do Commercio da America, elle era quasi restricto ao Brasil, e era isto o resultado do Systema Colonial; hoje porem que elle tem acabado para nós, e para quasi todos, ao menos de facto, o Artigo tracta de fazer o que está feito pelas Grandes Nações, e o que nos he conveniente; e neste Commercio faz duas Regras, a primeira he relativa ao caso de virem os Generos na Bandeira das Nações, que os produzem, ou na Portugueza, e he de 24 por cento quanto ao consumo: a conveniencia disto he visivel apenas se reflectir que a Nação, que produz, tambem consome; e venha ella embora para vender, depois de cá estar faz-lhe conta comprar, para não não ir em falço frete, o mesmo acontece á Portugueza; mas se a regra fosse geral, como pertende o Illustre Preopinante, bem claro está que as Bandeiras mais perfeitas, e economicas, que vivem do Commercio de Transporte, havião de usurpar necessariamente as vantagens da Bandeira Portugueza, e da dos differentes Estados da America; e neste caso estavamos trabalhando para fazer ganhar dinheiro aos Estados Unidos, e á Dinamarca: a outra Regra he tambem geral de 30 porcento, porque já se não tracta de levar uma carga para um Estado, que nos tracta bem, e consome nossas Mercadorias, tracta-se simplesmente de abrir uma concorrencia geral a quem melhor navegar, equilibrando-se essa differença com 6 por cento a favor do Thesouro. Estou convencido que, excitando-se a concorrência, e esquecendo de todo o Systema Colonial, Portugal ha de vir a ser o que era, no Artigo Navegação, no tempo do Senhor D. Manoel: os Habitantes são naturalmente espirituosos, e emprendedores; as Costas são perigosas, e de Navegação, que os faz babeis; a Localidade he vantajosa; e a Topografia do Paiz naturalmente o chama a uma perfeição, que elle só perdêo, porque subio o typo dos seus valores pelo ouro das Colonias, e perdêo muita gente para as povoar.

Para o Commercio de monopolio, e exclusivo temos ainda occupada a nossa Bandeira quasi sempre no Commercio do Brasil, e em algum Inglez, e muito no Commercio das Possessões da Asia, e da Africa, e das Ilhas; ao mesmo tempo tem a nossa Bandeira favôr de 6 por cento de commum com cada Nação da America, e tem um excitamento geral na regra geral do Artigo: he verdade que tão cedo não igualaremos os Estados Unidos, e os Dinamarquezes, e outras Nações Económicas; mas trabalharemos para isso, diminuindo as causas da não concorrencia, que são infinitas, sem darmos com tudo um estimulo particular ao ramo da Navegação, porque no fim de tudo ella he somente um ramo, e não toda a Industria Nacional, e se preciso ir contemporaneamente animando todos os outros ramos, porque desta Industria geral nasce a perfeição particular de cada ramo, e nunca da Industria particular se forma a Industria geral. Pelos principios do Sr. Guerreiro fica demonstrado que sem augmentar Industria geral, ou particular edificávamos a favôr d'aquelle, que já tem sobradas vantagens. Sou por tanto de opinião que a Emenda do Sr. Guerreiro não pode ser sustentada: eu sou franco, e devo dizer as cousas, que me occorrem; não acho o Artigo mão por dizer 24 por cento, e 30 por cento nas hypotheses, em que estão estes Direitos; acho sim de máo que nós não aprendamos de uma vez para sempre o Commercio puramente livre, e convencional, o Commercio da primitiva de ganhar dinheiro quem mais trabalhar, e melhor navegar: neste systema eramos nós grandes; nelle se formou o nosso heroismo, que se perdêo quando fundámos escravos para trabalhar por nós; quando inquietámos as entranhas da Terra para cavar minas, que fizerão grandes aquelles, que pelo amor do trabalho interior, e proprio se fazião proprietários desse ouro: se bom ser rico quando a riqueza vem do trabalho; quando ella vem das Conquistas, ou dos Escravos, ella passa, como o fumo, das mãos do possuidor para o laborioso: veja-se a França sem minas, e a sua visinha, a Hespanha com ellas; se a França as tivesse tido, ella seria hoje a Hespanha, e esta a França: quem nasce pobre aprende a trabalhar; quem nasce rico nunca trabalha: assim são as Nações; e os individuos o serão sempre.

Não pode por tanto ter lugar a regra geral do Sr. Guerreiro nem o favôr constante dado á nossa Ban-

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deira, mesmo para quando fôr a um Porto Franco; neste caso ella esmagaria a concorrencia dos outros, indo a Gibraltar; e, em lugar de fundarmos um Deposito geral, afugentavamos todas as Bandeiras, contra o espirito geral do Projecto, que se tornava logo outra cousa muito differente: deixemos por tanto estar o Artigo como está; e estou certo que o Sr. Guerreiro, depois de me ler ouvido, ha de dar-se por convencido.

O Sr. F. A. Campos: - Eu tambem não posso concordar com a Emenda do Sr. Maya, em quanto pertende que esta Legislação fique condicional, isto lie, que os Generos importados dos differentes Paizes da America pagarão os mesmos Direitos, que os nossos pagarem nos seus Portos. Alem da razão, que o Sr. Sarmento apontou, de que seria necessario fazer Tractados com esses Paizes, o que virtualmente importaria o reconhecimento da sua Independencia, ha outras de immediata utilidade, para que aquella Emenda deva ser desattendida.

Nós queremos abrir relações com aquelles Povos: elles não querem arriscar-se a virem aos nossos Portos, porque ignorão a nossa disposição a seu favor; e qual he o meio mais efficaz para os atiraríamos? He determinarmos que os seus Generos serão admittidos, e que, vindo directamente em Bandeira sua, pagarão um Direito mais módico do que se vierem indirectamente, ou em outra qualquer Bandeira.
Não me opponho a que, depois de termos estabelecido relações com elles, se diminua este Direito, se o que elles imposerem aos nossos Géneros for mais módico do que elle, porque nesta materia nada ha de invariavel: mas sendo nós os primeiros, que queremos dar impulso a este Commercio reciproco, he necessario que nós tambem sejâmos os primeiros, que offereçâmos um typo, para assim dizer, destes Direitos. Demais: a Emenda do Sr. Maya só poderia ter lugar com as Nações, com quem já commerciâmos, porque nessas ha Direitos estabelecidos para os nossos Generos; mas para aquellas, com quem não temos relações, não pode ter applicação. Isto se prova pelo seguinte exemplo: supponhâmos que de Colombia vem Géneros Coloniaes, os Direitos, que deverião pagar, segundo o Sr. Maya, senão os mesmos, que os nossos lá pagassem; mas não tendo nós ainda lá mandado Generos de nossa producção, não poderiamos impôr-lhes um Direito, que não fosse arbitrario, e sem regra, porque a regra não existia.

A's reflexões do Sr. Guerreiro respondèo plenamente o Sr. Mouzinho da Silveira, por isso abstenho-me de reproduzir os mesmos argumentos: a nossa Marinha precisa de favor, e o que o Projecto lhe dá não he excessivo: em favor delia he que são mais gravados os Géneros importados indirectamente. Ou seja pela pouca dexteridade dos nossos Marinheiros na manobra, ou seja pelos gravames, que soffre a Marinha Portugueza, he certo que a nossa Navegação não pode competir com a das outras Nações da Europa.

O Sr. Pereira de Sá: - Sr. Presidente. Levanto, me para não deixar passar em silencio o principio, que ouvi dizer ao Sr. Deputado F. A. de Campos = que uma das causas, que concorria para o atrazamento do nosso Commercio, era o não saberem os navegar. = Ninguem por certo acreditará que, sendo a Nação Portugueza a Mestra, que crismou a navegar as outras Nações da Europa, e não tendo passado por nenhum daquelles transtornos, que fazem desapparecer as Sciencias de entre um Povo, agora se diga que os Portuguezes não sabem navegar. O motivo da Navegação Portugueza ser tão dispendiosa provêm da numerosa Tripulação, e do grande número de Officiaes, com que se guarnecem os Navios; quando, pelo contrario, os Estrangeiros tudo isto fazem com maior simplicidade, e até passão no mar com maior frugalidade, seguindo-se daqui a sua maior economia nas viagens, sendo esta a razão, por que a nossa Navegação não pode competir com a dos Estrangeiros, e de forma nenhuma por não sabermos navegar; pois atrevo-me a dizer que os Portuguezes, na Arte de Navegar, estão a par das primeiras Nações Maritimas da Europa.

O Sr. F. A. Campos: - Responderei ao Sr. Deputado Pereira de Sá. Eu creio ter dicto que pela pouca dexteridade dos nossos Marinheiros na manobra a nossa Navegação não podia compelir com a das outras Nações. A prova não he difficil. De dous Navios do mesmo lote, um Inglez, e outro Portuguez, o Portuguez navega com o duplo da Tripulação. A Náo D. João VI. esteve 19 dias defronte da Barra do Rio de Janeiro, sem se atrever a entrar. A que deve attribuir-se tudo isto? Seguramente apouca dexteridade, de que fallei. He verdade que a nossa Marinha teve uma época feliz em Portugal; que o Sr. D. Affonso V. levou trezentas e tantas velas á Conquista d'Arzila; e que o Sr. D. Sebastião aprestou mil Embarcações de todos os tamanhos para a jornada da África; mas o Sr. Official de Marinha deve confessar que ella tem decahido bastante do seu antigo esplendor.
Julgada a matéria suficientemente discutida, e entregue á votação a segunda parte do Artigo, menos nas palavras = ou de Paiz, onde forem produzidos, - foi approvada. E igualmente o foi em quanto ás dieta; palavras, sendo rejeitada a Emenda offerecida pelo Sr. f. J. Maya, assim como a que verbalmente offerecêo o Sr. Guerreiro, para que se accrescentasse = ou de qualquer outra parte do Mundo. =
Por ser chegada a hora de findar a Sessão, e haver quem pedisse que se prorogasse, consultou o Sr. Presidente o voto da Camara, e se resolvêo que continuasse a discussão até se ultimar o Artigo 3.°

Continuou portanto a discussão sobre a terceira, e ultima parte do mesmo Artigo.

O Sr. Guerreiro: - Eu approvo a ultima parte do Artigo com uma pequena Emenda, e vem a ser, que a Bandeira Portugueza não pague senão 24 por cento, isto he, as Mercadorias vindas em navios Portuguezes.

Fallárão mais alguns Srs. Deputados, e julgada a matéria sufficientemente discutida, propoz o Sr. Presidente, - se se approvava com a excepção a favor das Mercadorias, que vierem em Bandeira Portugueza, seja, ou não em direitura, para pagarem sempre somente 21 por 100? E se vencêo nesta conformidade, resolvendo-se que voltasse o Artigo á Commissão para o redigir de novo, na forma do vencido.
Dêo o Sr. Presidente para Ordem do Dia das Secções Geraes, em que a Camara tem de dividir-se na Sessão seguinte, os Projectos N.º 30, e 82, e os tra-

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balhos das Commissões Centraes. E para Ordem do Dia da Sessão de 8 do corrente a continuação dos Artigos do Projecto N.° 101, o Parecer da Commissão de Petições sobre o Requerimento de Manoel Joaquim Dias, e o Parecer da Commissão Central N.º 108.

E, sendo duas horas e meia, disse que estava fechada a Sessão.

OFFICIO.

Para o Bispo de Vizeu.

Excellentissimo e Reverendissimo Senhor. - Tendo a Camara dos Srs. Deputados da Nação Portugueza resolvido, em Sessão de 5 do corrente, que se pedissem ao Governo Executivo esclarecimentos sobre os inconvenientes, que tem embaraçado a devida execução do determinado no Artigo 126 da Carta, na forma da Indicação do Sr. Deputado Visconde de fonte Arcada, que junto por cópia conforme, o participo a V. Exca., para que possa remetter á mesma Camara aquelles esclarecimentos , de que carece. Deos guarde a V. Exca. Palacio da Camara dos Deputados em 6 de Fevereiro de 1827. - Excellentissimo e Reverendissimo Senhor Bispo de Vizeu, Par do Reino - Francisco Barroso Pereira.

SESSÃO DE 7 DE FEVEREIRO.

Ás 9 horas e 35 minutos da manhã, pela chamada , a que procedêo o Sr. Deputado Secretario Ribeiro Costa, se acharão presentes 86 Srs. Deputados, faltando, alem dos que ainda se não apresentarão, 16; a saber: os Srs. Bardo de Quintella - Barão do Sobral - Leite Pereira - Bettencourt - Izidoro José dos Sanctos - Pinto Villar - Braklami - Paiva Pereira - Mascarenhas Mello - Mouzinho da Silveira - Rebello da Silva - Luiz José Ribeiro - Gonçalves Ferreira - Pereira Coutinho - Leomil - todos com causa motivada; e Ribeiro Saraiva tem ella.
Disse o Sr. Presidente que estava aberta a Sessão; e, sendo lida a Acta da Sessão precedente, foi approvada.

Pedio o Sr. Deputado Mouzinho d'Albuquerque que se lançasse na Acta o seu Voto em separado, igualmente assignado pelos Srs. sintonia Maya. - Guerreiro - Carvalho - Francisco Joaquim Maya - Campos Barreio - Cupertino da Fonseca - e Araujo e Castro; o qual diz - Na Sessão de hontem votei que as Mercadorias de qualquer Paiz, ainda mesmo em estado de Guerra, fossem admittidas a Deposito, com tanto que viessem debaixo de Bandeira Amiga, ou Neutra.

O Sr. Magalhães: - Desejara que o Sr. Deputado Secretario Barroso me informasse, se já vierão as informações, que se pedirão para continuar o Projecto sobre as Camaras.

O Sr. Secretario Barroso: - Tem passado muito pouco tempo desde que se pedirão, e a materia he de tanta consideração que talvez antes de um mez não se possão dar.

O Sr. Magalhães: - Tendo de fazer mui breve algumas reclamações, de que pode depender a Salvação do Estado, desejava que pela Secretaria d´Estado dos Negocios do Reino se pedissem copias authenticas de todos os Autos praticados pelas Camaras do Rei fio a favor dos Rebeldes; os das suas Juntas Governativas; e mais documentos, que a semelhante respeito devão existir; e bem assim pela Secretaria d'Estado doa Negocios da Justiça iguaes documentos das partes legaes relativas aos Empregados, e mais pessoas implicadas na rebellião; documentos confirmativos; e nota do estado dos seus Processos. Se a Camara annuir a esta minha requisição, peço a maior brevidade. (Apoiado. Apoiado.)

Sendo entregue á votação esta Indicação foi approvada, resolvendo-se que se pedissem os esclarecimentos, de que na mesma se tracta.

O Sr. Moraes Sarmento: - Sr. Presidente, peço a V. Exa. queira propor á Camará a necessidade de se fazer uma ligeira alteração no Regimento, somente para o fim de ser o Sr. Bispo de Cabo Verde chamado as Commissões Centraes, encarregadas de entender sobre os objectos dos meus dous Projectos sobre a Africa Portugueza. As luzes de Sua Excellencia, a experiência conseguida no seu Emprego Religioso e Político, devem, subministrar grandes meios para a informação das Commissões referidas, e utilidade pública.

Resolvêo-se que o Sr. Deputado Bispo de Cabo Verde se unisse ás duas Commissões Centraes eleitas para examinarem os Projectos N.° 93, e N.º 96.

O Sr. Deputado, Moniz lêo hum Parecer da Commissão Central, encarregada de examinar a Proposta N.º 67 do Sr. ex-Deputado Noronha, Ficou para segunda leitura.

O Sr. Deputado Camillo Ferreira , como Relator da Commissão encarregada de examinar as contas da Com missão Administrativa, que servio na Sessão extraordinoria de 1826, lêo o seguinte

PARECER.

A Commissão Central encarregada de examinar o Relatorio da Commissão Administrativa da Camara dos Srs. Deputados na Sessão Extraordinaria de 1826, depois de ter examinado com todo o escrupulo, e confrontado, todas as verbas com os documentos, a que se refere a Conta corrente, verificou a exactidão das mesmas Contas, pelas quaes se mostra que a Commissão administrativa recebêo do Thesouro Publico em duas addições a quantia de 12:500$000 rs. papel - 12:500$000 rs. metal - 25:000$000 rs. Total.

Despendêo como consta dos quatorze Documentos juntos ao mesmo Relatorio 10:972$600 11:246$037 - 22:218$637.

He o saldo a quantia de 1:527$400 - 1:853$963 - 2:781$363.
A Commissão Central conformando-se com a Indicação feita no Relatorio, julga conveniente que este saldo se entregue ao Sr. Deputado Luiz Antonio Rebello, ficando este authorisado para satisfazer a quantia de 1:158$750 rs. que ainda se devera de subsidios a alguns dos Srs. Deputados, dos mezes de Novembro e Dezembro, e o remanescente ser applicado ao pagamento das despezas Decorrentes, dando de tudo conta no fim da sua gerencia.

VOL. I. LEGISLAT. I. 34

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